A história de “Reload”, o álbum que reforçou um novo Metallica

O mundo ainda não havia se recuperado do "susto" de "Load" (1996) quando a banda deixou claro que a nova fase talvez não fosse só uma fase

As mudanças pelas quais o Metallica passou nos anos 90 se refletem até hoje, mas tiveram o seu ápice em 1997, quando a banda lançou “Reload”. A segunda parte do que era pra ser inicialmente um álbum duplo mergulhou ainda mais o grupo em uma onda de experimentação musical e visual.

Os resultados foram diversos. Os fãs mais tradicionais se afastaram, mas a banda voltou a se destacar em vendas, repercussão e importância.

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Novo susto

Até então, ninguém havia se recuperado ainda do choque do ano anterior, quando “Load”, o aguardado sucessor do “Black Album” (1991), saiu. Se o disco homônimo já “assustou” muita gente pelo som mais próximo do hard rock e distante do thrash metal, o trabalho seguinte caiu como uma bomba. Agora o Metallica parecia ter se rendido, de vez, ao mainstream – o que não é necessariamente ruim.

Com um visual bem mais comportado e até alternativo, o quarteto de San Francisco que praticamente inventou o thrash ofereceu uma mistura de influências: o rock em voga na segunda metade da década de 1990, o southern rock e alguns outros gêneros, ainda que sem abandonar o peso. E tudo isso distribuído em dois álbuns, já que “Load” e “Reload” são “irmãos”.

Sem sobras

Desde o início, sabia-se que a ideia inicial com “Load” era fazer um disco duplo, o que acabou não sendo aplicado. Quando “Reload” foi lançado, apenas um ano depois, teve-se a noção de que o álbum era feito de “sobras” do anterior, o que foi negado pelo Metallica.

James Hetfield foi ainda mais longe em uma entrevista de 1997 para a revista Guitar World. O vocalista e guitarrista sugeriu que o novo disco era mais “extremo” do que o antecessor.

“‘Reload’ consiste de todas as músicas de m*rda (das sessões originais)… essa é a coisa óbvia a se pensar para os não-pensadores por aí. Mas de verdade, essas não são músicas rejeitadas, são apenas as músicas que não estavam terminadas. Eu acho que tem uma coisa um pouco mais extrema em ‘Reload’. Mas também tem alguns riffs grandes e pesados. Não são singles de pop, isso é certeza.”

O “extremo” citado por Hetfield é obviamente uma pegadinha, já que muita gente, principalmente na época, poderia esperar um retorno ao thrash de antes. Mas o que tivemos, na verdade, foi uma experimentação mais profunda. Em “Reload”, o Metallica explorou todas as possibilidades. Goste ou não do disco, há de se reconhecer que poucos artistas estiveram dispostos a ir até onde eles foram.

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A p*rra do visual

A era “Load”/”Reload” também ficou marcada pela mudança drástica no visual do Metallica. Saíam os cabelos compridos e o visual tipicamente metal; entravam penteados curtos, roupas brilhantes, esmalte nas unhas e uma pegada mais alternativa.

A ideia do caminho a seguir visualmente veio do baterista Lars Ulrich e do guitarrista Kirk Hammett, que pareciam se sentir bem a vontade na nova pele. Por sua vez, James Hetfield nunca escondeu seu desagrado em relação a como a banda parecia no período.

Em conversa com a Classic Rock, ele confessou que não estava 100% de acordo com isso e reclamou até das fotos do encarte do álbum, além, é claro, da “famosa” capa do disco.

“Lars e Kirk estavam querendo uma vibe meio U2, Bono fazendo seu alterego. Eu não conseguia entrar naquilo. Eu diria que pelo menos metade das fotos que eram pra estar no encarte, eu tirei. A capa ia contra o que eu sentia. Lars e Kirk gostavam muito de arte abstrata, fingindo que eles eram gays. Acho que eles sabiam que isso me incomodava.”

A capa citada por Hetfield é uma obra do artista Andres Serrano, responsável também pela capa de “Load”. No trabalho de 1996, ele misturou sangue de boi com seu próprio sêmen e prensou a mistura entre duas placas de acrílico, e o resultado é o que vemos. Já em “Reload”, foram mais “ingredientes”: o sangue de boi agora seria misturado com urina.

Capa de “Reload”, álbum lançado pelo Metallica em 1997
Capa de “Reload”, álbum lançado pelo Metallica em 1997

Se a ideia alternativa desagradou Hetfield, Serrano tinha seus defensores. Kirk Hammett sempre elogiou sua arte, assim como Lars Ulrich, que, em entrevista ao Maxim, escolheu as capas de “Load” e “Reload” como as suas favoritas na discografia do Metallica.

“Não sou muito de favoritos… os álbuns ‘Load’ e ‘Reload’ com as incríveis artes de Andres Serrano. Elas sempre terão um lugar especial no meu coração. Eu o amo como artista. Adoro as imagens. Amo o fato de que escolhemos Serrano para a arte da capa desses dois discos. Essas são provavelmente minhas favoritas.”

Quebrando paradigmas

Seja visualmente ou em termos sonoros, “Reload” representou o ápice do Metallica enquanto grupo disposto a quebrar regras, incluindo as suas próprias. Infelizmente, foi o último álbum de inéditas com a formação que estreou em “…And Justice For All” (1988), já que o baixista Jason Newsted sairia em 2001, logo antes de gravarem o polêmico “St. Anger” (2003).

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O disco traz algumas peculiaridades musicais, como a nítida influência do country e do southern rock em passagens como “The Unforgiven II”, a sequência da balada do “Black Album”. Sem abandonar o peso, o Metallica entregaria ótimos momentos, como a famosa “Fuel” e a cadenciada “The Memory Remains”, que soa como algo que poderia ter entrado no disco preto, mas ao mesmo tempo é completamente diferente.

Para essa música, a banda trouxe pela primeira vez uma participação especial nos vocais: Marianne Faithfull gravou a parte final com sua voz inconfundível e a faixa caiu nas graças dos fãs hoje em dia. O mesmo não se pode dizer da boa “Better Than You”, vencedora do Grammy de Melhor Performance de Metal em 1999, mas que acabou estranhamente esquecida.

“Reload” é um álbum que se orgulha de fugir do óbvio, e parece ter sido pensado para isso. Ainda em 1997, Kirk Hammett deixava claro que esse era o caminho que a banda havia escolhido.

“Se as pessoas acham que enlouquecemos, acho que estamos fazendo a coisa certa. Essas músicas definitivamente vieram parar em um lugar em que nunca estivemos, e isso é ótimo. Acho que é bom que as pessoas esperem o inesperado de nós. Pelo menos você as está provocando e as desafiando a pensar.”

Anos depois, em conversa com a Clash Music, Hetfield resumiria bem o espírito que guia o Metallica em relação ao inesperado. A banda já sofria ataques por “sair do padrão” desde o fim dos anos 80, quando começou a mudar sua sonoridade.

“O Metallica sempre odiou qualquer tipo de regra, ou qualquer tipo de tentativa de nos categorizar ou encaixar de alguma forma. Nós não gostamos de fronteiras e limites. E eu penso… o heavy metal tem a impressão de ser meio punk, como ‘f*da-se o mundo’ e ‘nós somos nós mesmos, estamos fazendo as coisas do nosso jeito’ e isso é bom, até que você não se encaixa na maneira deles. Sabe, cortar o cabelo ou não usar uma jaqueta de couro, ou algo assim.”

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André Luiz Fernandes
André Luiz Fernandes
André Luiz Fernandes é jornalista formado pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP). Interessado em música desde a infância, teve um blog sobre discos de hard rock/metal antes da graduação e é considerado o melhor baixista do prédio onde mora. Tem passagens por Ei Nerd e Estadão.

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