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Como o Summer Breeze Brasil buscou consolidação em seu 2º ano

Sob calor impiedoso e com bastante público, festival ocorreu sem maiores percalços, entre melhorias e velhos e novos problemas

Se em 2023 predominou no Summer Breeze Brasil o sentimento de realização de sonho ao ver acontecendo no Brasil um festival de nível gringo dedicado só à música pesada, as expectativas de 2024 eram maiores. A começar pela expansão do evento para três dias.

Obviamente, gerou alguma tensão em quem já tinha comprado seus ingressos a mudança — aparentemente não muito amigável — de uma dos produtoras do festival. Em janeiro foi anunciada a saída da Free Pass Entretenimento, tradicional promotora de shows que, em nota ao público, sequer teve a cortesia de desejar sucesso aos remanescentes.

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A parceria com a Consulado do Rock, das maiores empresas no ramo de confecção de camisetas para eventos do Brasil, poderia ter sido melhor explicada ao público. Afinal, num momento em que os acessórios vendem mais do que discos, uma loja de roupas estar num festival é um prato cheio para desovar seus produtos do evento e dos artistas escalados, normalmente em um setor no qual o lucro é abissal entre o valor de produção e o de venda.

Felizmente, o Summer Breeze Brasil ocorreu de novo como esperado, com nenhum cancelamento de última hora. Como natural em um evento que ainda busca consolidação, houve melhorias — e a alguns problemas não sanados da edição anterior somaram-se novos erros, parte deles perceptível apenas pelo estrondoso sucesso de público no sábado (27/04).

Vista geral do Summer Breeze Brasil 2024 (Foto: Equipe MHermes Arts / @silvinhaquadros)

Pacotes de banda mais atrativos trouxeram mais público

Falando primeiro das coisas boas, o mencionado ótimo público do sábado deixou claro que um pacote de uma tendência específica soa mais atrativo num ingresso caro. É preciso ressaltar que, por questões logísticas das turnês sul-americanas, nem sempre a organização de um festival tem a liberdade de escolher em qual dia cada banda vai tocar. Mas ter concentrado num mesmo dia atrações de porte como Epica, Within Temptation, Lacuna Coil, Hammerfall, Gamma Ray e Angra fez valer o preço do ingresso para fãs de estilos mais melódicos do heavy metal.

Within Temptation (Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox)

Da mesma forma, ainda que sem a mesma lotação, o domingo (28/04) teve ótimo público com elenco mais voltado à velha guarda metálica, que também atraiu fãs “menos velhos” com a escalação de bandas de tendências mais modernas, como While She Sleeps, Avatar e Killswitch Engage.

Killswitch Engage (Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox)

Na sexta-feira (26/04) poderia ter ocorrido a mesma coisa com os fãs de hard rock, mas, bem, começava às onze da manhã de um dia útil. A própria organização pode ter percebido ao anunciar um recuo estratégico para 2025, transformando o primeiro dia em um pré-show de aquecimento — mesmo tendo marcado o evento para a partir de 2 de maio, fim de semana de feriado prolongado com o Dia do Trabalhador caindo na quinta-feira.

Gene Simmons Band (Foto: Gabriel Gonçalves @dgfotografia.show)

Estrutura segue praticamente a mesma, com banheiros melhores

Em 2024, os três palcos principais se mantiveram no mesmo lugar e com a mesma hierarquia, sempre com horários seguidos à risca. Lado a lado, na área maior do Memorial da América Latina, ficavam o Hot Stage, principal cenário do festival, com uma pista mais comprida, e o Ice Stage, que tinha a parte do fundo de sua pista diminuída para o espaço para PCD, as barracas de comida e o espaço Lounge.

Hot (à direita) e Ice Stage (Foto: Equipe MHermes Arts / @diegopadilha)

O Sun Stage ficava na outra área do festival, onde também estava o Waves Stage e, entre eles, havia um espaço de “convivência”, com estandes de merchandising, a Horror Expo, uma feira gastronômica, os locais de sessão de autógrafos e o metal market, já dentro do Auditório Simón Bolívar, cujo palco foi desativado em 2024.

Sun Stage (Foto: Equipe MHermes Arts / @raphagarcia)

Entre essas áreas, havia a rua principal de passagem de veículos no Terminal Rodoviário da Barra Funda. Para atravessá-la, o Memorial construiu uma passarela permanente não muito larga, mas de estrutura segura.

Não ocorreram neste ano as “Summer Parties”, na Audio, uma casa de shows nas redondezas do Memorial da América Latina. Em tais eventos, algumas bandas tocaram madrugada adentro após o encerramento das atividades na área principal do festival em 2023, com ingressos cobrados à parte.

Uma evolução nítida foi o abandono do uso de banheiros químicos para estruturas pré-fabricadas, que se somaram aos sanitários permanentes que já existem no Memorial da América Latina. Ainda que não estivessem sempre um brilho, havia limpeza constante e pareciam sempre em condições mínimas de assepsia.

Para a compra de comidas e bebidas, com variada oferta, principalmente na área entre o Sun Stage e o Waves Stage, foi utilizado o sistema “cashless”, com a possibilidade de se comprar um cartão e abastecê-lo, ou de comprar diretamente os produtos com cartões de crédito e débito. Além de bares distribuídos por toda a área do festival, ambulantes oficiais do festival vendiam as bebidas pela pista.

Volume mais baixo, qualidade de som e o palco novo

Em 2023, o volume do som vindo dos dois palcos principais beirava o insalubre — o mais alto que este repórter, com experiência de mais de vinte anos em festivais pelo mundo, já tinha ouvido. Neste ano, o volume deu uma reduzida, mas não significou que não tenham parado de deixar os ouvidos zunindo; afinal, também é um dos atrativos de shows grandes.

A qualidade de som, porém, ficou um pouco abaixo em comparação a 2023 — principalmente no Ice Stage quando, na sexta-feira, todas as bandas sofreram para achar a equalização razoável para suas apresentações.

Ice Stage (Foto: Equipe MHermes Arts / @diegopadilha)

Em compensação, o Sun Stage, palco dos maiores problemas em 2023, teve som de alto volume e ótima equalização. Não à toa, foi palco de várias apresentações que se tornaram especiais por sua configuração permitir uma maior proximidade entre o público em geral e a banda, com espaço suficiente para que todos curtissem os shows do jeito que queriam, fosse na pancadaria na pista, de boa mais ao fundo ou pelas suas laterais.

O Waves Stage, por sua vez, pareceu baixo demais em altura e apresentou uma série de problemas técnicos. Como os artistas que lá se apresentaram eram de menor interesse do público em geral — com notórias exceções como Jeff Scott Soto e The Troops of Doom —, na maior parte do tempo foi prestigiado por pouca gente, mais descansando dos shows principais numa área agradável e menos lotada, e assim, menos quente.

Waves Stage (Foto: Equipe MHermes Arts / @ThiagoHenriqueFotografia)

Calor infernal e cadê a água?

É muito provável que, ao ler as resenhas dos shows da segunda edição do Summer Breeze Brasil, um fator influente em quase todas tenha sido o calor infernal ocorrido em São Paulo no fim de semana. Foi uma reclamação quase unânime das bandas no palco, chegando ao cúmulo de, durante o show do Carcass no domingo — dia das maiores temperaturas —, Jeff Walker ter passado mal e a banda reduzido seu set habitual.

Evidentemente, não dá para culpar a organização do festival pela emergência climática. Contudo, é preciso pensar em formas de amenizar o seu impacto com o público.

Como em 2023, não houve sinalização adequada de pontos de distribuição de água. Este repórter, ao chegar, precisou perguntar à equipe médica no primeiro dia como fazer para consegui-la — e descobriu que só havia um lugar, ao lado do Ice Stage, sob a passarela que deu acesso ao Sun Stage. Em certos momentos, formaram-se filas homéricas para o público conseguir encher suas garrafinhas. É um ponto que precisa de mais atenção.

Confusão na venda de ingressos e na entrada do 1º dia

Um dos problemas que mais irritou o público na primeira edição — e se manteve para a segunda — foi a venda de ingressos por lotes, com posteriores e intermináveis promoções. Até hoje, ninguém sabe exatamente quanto custava um ingresso inteiro, de tantas as ofertas de desconto acumuladas ao longo do período em que as entradas estiveram disponíveis.

Neste caso, em vez de lotes, determinar períodos para cada valor dos ingressos talvez seja uma estratégia mais eficaz do que fazê-lo por quantidade não divulgada. Isso permitiria ao público de fora de São Paulo organizar melhor sua vinda à capital paulista, ajudando-o na procura pelas melhores ofertas de transporte e acomodação para sua viagem.

Outra falha a se repetir em 2024 foi uma confusão no acesso ao festival na sexta-feira, mesmo tendo sido o dia com menos público do festival. Em uma das entradas, onde havia o acesso de quem comprou o “Summer Lounge”, formaram-se filas diferentes que ninguém sabia dizer exatamente para qual finalidade, até que se travou tudo. A entrada para o “Lounge”, que prometia ser ágil e exclusiva, registrou demora de mais de 30 minutos. Na outra, mais próxima ao Waves Stage, as pessoas entravam rapidamente.

Muito público, poucas rotas

O fato de o sábado ter tido o maior público da história do evento até aqui é um fato a se comemorar. Contudo, também deixou escancarado um problema que parecia menor na edição de 2023: a circulação do público entre os palcos, principalmente quando havia bandas concomitantes no Ice Stage e no Sun Stage. O problema: essa passagem ficava ao lado do Ice Stage e do Sun Stage.

Mapa do Summer Breeze Brasil 2024, em arte de divulgação

Pelo lado do Sun Stage, acessá-la era razoavelmente tranquilo, pois havia um espaço com banheiros do lado oposto ao do palco, sendo possível contornar a pista, mesmo lotada, pelo fundo e chegar por esse setor na passarela.

Porém, no Ice Stage, era impossível passar sem ter que transitar pelo público que assistia os shows ali. No sábado, era de fato muita gente. E, obviamente, ninguém fica feliz se, do nada, umas mil pessoas querem passar no meio de uma pista onde outras dez mil já estão aglomeradas. O festival precisa encontrar uma fórmula de fazer essa circulação ocorrer sem causar esse tipo de estresse.

Trancados na frente do palco vazio

Outro problema evidenciado no sábado ocorreu no “Front Row”, uma estreita pista premium à frente do Ice e Hot Stage, de acesso exclusivo para quem comprava o “Summer Lounge”, um adicional ao ingresso que também dava direito a uma entrada exclusiva e um ambiente com open bar de comidas e bebidas, entre outros benefícios.

Para acessar este Front Row, havia apenas uma entrada por um corredor lateral ao lado do fundo da pista do Hot Stage, que fazia uma curva para outro estreito corredor em frente aos dois palcos, um ao lado do outro. Basicamente, a pista premium fazia um L. O problema: não havia outra saída deste setor que não fosse o mesmo da entrada.

Assim, quando um show terminava no Ice Stage, o público precisava passar em frente ao Hot Stage para conseguir ir ao banheiro ou sair deste setor para ir ao Lounge ou ao Sun Stage. Já dá para imaginar o que acontecia quando o Hot Stage estava lotado de fãs ansiosos pela próxima banda, que muitas vezes começava minutos depois de terminado o show do Ice Stage, com a galera dali desesperada para sair.

Nesse caso, não deve ser difícil abrir uma saída exclusiva do “Front Row” ao lado do Ice Stage, próximo à passarela e aos bebedouros. O problema pode acabar sendo o trânsito posterior, mas como isso deve acontecer principalmente quando terminado o show naquele palco, não parece ser grave.

Expectativas para 2025

Ok, o anúncio oficial da edição do ano que vem foi mal pensado pela organização. Feito em um palco que se esvaziava, não houve uma catarse coletiva do público quando Marcello Pompeu, vocalista do lendário Korzus — atração do festival —, confirmou as datas para 2025.

Aparentemente, a organização entendeu que é puxado promover um festival de três dias no Brasil. Assim, foi retomado o formato para ocorrer apenas no fim de semana, somado a um dia de aquecimento na sexta-feira, cujo molde ainda carece de maiores explicações — sabe-se apenas que começará no fim da tarde e contará com atrações internacionais.

Apesar dos inúmeros festivais que ocorrem no país hoje em dia, o preço de suas entradas ainda é muito alto para a renda média de um trabalhador brasileiro. Logo, não é fácil para o público comprar o ingresso para todos os dias do evento apenas para estar lá, como ocorre em vários festivais gringos.

Mercyful Fate (Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox)

O Summer Breeze Brasil, com inúmeros palcos e conflitos de horários, exige uma cultura de maior circulação entre as suas áreas, de o público estar aberto a ver uma banda que não conhece e, depois de um tempo, decidir se permanece lá, vê outro grupo ou apenas aproveita os outros ambientes disponíveis.

O público de música pesada brasileira ainda está acostumado majoritariamente a eventos de palco único, como o Monsters of Rock, ou de atrações sequenciais não simultâneas, como tradicional nos dias do metal do Rock in Rio ou ocorrido no Knotfest em 2022. Convenhamos: ninguém está disposto a pagar um salário-mínimo apenas para ir beber ouvindo uma maioria de bandas que não conhece.

Para 2025, é ótimo que o Memorial da América Latina continue como o palco do Summer Breeze Brasil. De localização central na cidade e acesso fácil de ônibus e metrô, apenas o calor insuportável por uma área asfaltada numa região dominada por prédios é um problema. Mas, em tempos de emergência climática, uma onda de calor como a ocorrida em pleno outono deste ano faria estrago em qualquer outro lugar.

Os “blind tickets” para as duas datas e o “warm-up” do Summer Breeze Brasil em 2025 estiveram disponíveis, inicialmente, entre 30 de abril e 6 de maio, quando a organização anunciou que os bilhetes estavam esgotados. Na última quarta-feira (15), foi anunciado um lote extra, ofertado até o próximo dia 6 de junho, junto de uma ação social: a cada entrada vendida, R$ 30 serão doados em apoio à reconstrução do Rio Grande do Sul após enchentes que destruíram o estado. O preço desta modalidade é de R$ 1.200,00, sem taxas e com parcelamento em até seis vezes sem juros ou até dez parcelas, acrescidas de taxa.

Guia com textos sobre (quase) todos os shows

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Thiago Zuma
Thiago Zuma
Formado em Direito na PUC-SP e Jornalismo na Faculdade Cásper Líbero, Thiago Zuma, 43, abandonou a vida de profissional liberal e a faculdade de História na USP para entrar no serviço público, mas nunca largou o heavy metal desde 1991, viajando o mundo para ver suas bandas favoritas, novas ou velhas, e ocasionalmente colaborando com sites de música.

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