“Let It Be… Naked”, o álbum que conserta o trabalho de Phil Spector com os Beatles

Por anos, Paul McCartney esteve incomodado com a versão final de "Let It Be" e em 2003 ele tentou consertar isso

As sessões de “Let It Be” (1970), o último álbum dos Beatles, foram tumultuadas e contaram com uma série de interrupções e problemas. No final, o produtor Phil Spector, famoso por sua técnica conhecida como “wall of sound”, foi encarregado de produzir tudo o que havia sido gravado até aquele momento. O resultado sempre foi motivo de polêmica, mesmo entre os músicos.

John Lennon, George Harrison e Ringo Starr pareceram aprovar o tratamento dado por Spector às músicas do álbum. Já Paul McCartney tinha uma opinião diferente. Ele sempre enfatizou que a ideia original de “Let It Be” era fazer um álbum mais simples, sem grandes produções, num retorno ao som básico do início da carreira – tanto que o nome do disco inicialmente seria “Get Back”.

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Entre as coisas que mais irritavam McCartney estava o estilo “wall of sound” adicionado por Spector em músicas como “The Long and Winding Road”, que o baixista concebeu como uma balada de voz e piano, mas acabou virando um épico orquestrado na mãos do famoso produtor americano.

Tantos anos depois, nasceu a proposta de relançar “Let It Be” em um estilo mais próximo do original. Em novembro de 2003, enfim, saiu “Let It Be… Naked” – um trabalho que, de certa forma, “conserta” a produção original de Phil Spector.

Como surgiu a ideia

A ideia de recolocar “Let It Be” sob a ótica original surgiu de um encontro de Paul McCartney com o diretor Michael Lindsay-Hogg, responsável por filmar o processo de composição do álbum, com a ideia de lançar um filme a respeito. O material dele – quase 60 horas de filmagens – deu origem ao longa também batizado “Let It Be” (1970) e seria usado anos mais tarde por Peter Jackson, em um formato expandido, no documentário “The Beatles: Get Back” (2021).

McCartney e Lindsay-Hogg falaram sobre o filme e a possibilidade de resmasterizar o disco como trilha sonora. A partir disso, o Beatle, que dizia ter a aprovação de George Harrison – falecido em 2001 –, começou a trabalhar com os engenheiros de som Allan Rouse, Paul Hicks e Guy Massey nas fitas originais, no Abbey Road Studios.

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Com um título sugestivo, “Let It Be… Naked” (“deixa estar… nu”, em tradução livre) removeu não só o trabalho de Phil Spector como o de Glyn Johns, seu antecessor no projeto, que trabalhou no material pensando-o como uma trilha sonora para o filme. O resultado final disponibilizado em 2003 é inegavelmente bem diferente do que o mundo conheceu em 1970.

As diferenças de “Let It Be… Naked”

A diferença mais visível está na ordem das músicas, além da escolha das músicas inseridas. Houve adições e retiradas, além vários takes terem sido muitas vezes combinados em uma só faixa.

As sessões de “Let It Be” foram divididas em dois períodos, com material muito diferente em cada um deles. Além disso, houve em 1969 o chamado Rooftop Concert, o último show dos Beatles, feito de surpresa no telhado da Apple Corps. Na ocasião, a banda fez mais de um take de algumas canções, agora aproveitadas em “Let It Be… Naked” por trazerem uma ideia mais próxima da original, antes da produção de Spector.

A versão de 2003 abre com “Get Back”, que fechava o tracklist em 1970, e teve os diálogos do início cortados. Em “Dig a Pony”, alguns detalhes como a introdução fora de tempo e um erro de John Lennon na letra, foram retirados digitalmente. No entanto, trata-se da gravação do Rooftop Concert, que constava também no álbum original.

“For Your Blue” também foi remixada e teve vocais de George Harrison gravados em 1970 sobrepostos na faixa, que é de 1969, bem como um solo do mesmo. “The Long and Winding Road”, para o alívio de McCartney, aparece em um take diferente, muito mais próxima da versão que ele tinha em mente e sem as orquestrações de Spector.

“Two of Us” é a mesma de 1970, mas com algumas pequenas correções digitais, enquanto “I’ve Got a Feeling” é fruto da junção de dois takes do Rooftop Concert. “One After 909” também é a versão original, mas sem o final, onde a banda emenda “Danny Boy”, também do show no telhado da Apple Corps.

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“Don’t Let Me Down” não estava no álbum original, tendo saído apenas como lado B do single de “Get Back”. A versão que consta no álbum de 2003 não é a mesma do single, sendo também produzida a partir dos dois takes do show ao vivo. Em “I Me Mine”, o trabalho de Spector foi totalmente removido, com direito a até uma diminuição na duração da faixa.

“Across the Universe” teve até seu andamento alterado, novamente em um esforço para retirar quaisquer efeitos que Phil Spector tenha adicionado, incluindo instrumentos que não estavam lá originalmente. O disco fecha com “Let It Be”, também “desnudada” e com um solo de George Harrison colado de outro take.

Recepção

“Let It Be… Naked” foi tão bem recebido quanto qualquer novo lançamento dos Beatles certamente é, mas dividiu opiniões. Phil Spector, apesar das controvérsias, é tido como uma lenda da produção musical. A retirada de seu trabalho fez com que muitos sentissem falta daquilo que sempre incomodava McCartney: os sons mais “cheios”.

A produção de “Let It Be”, como um todo, é um ponto importante da carreira dos Beatles, bem como seu capítulo final. Essa época voltaria a ser abordada recentemente, no já citado documentário “The Beatles: Get Back”, do Disney+, onde entendemos melhor as circunstâncias de onde o álbum nasceu e seu conceito original – algo que o disco de 2003 entrega com competência, mas com um sentimento agridoce.

* Texto por André Luiz Fernandes, com pauta e edição por Igor Miranda.

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André Luiz Fernandes
André Luiz Fernandes
André Luiz Fernandes é jornalista formado pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP). Interessado em música desde a infância, teve um blog sobre discos de hard rock/metal antes da graduação e é considerado o melhor baixista do prédio onde mora. Tem passagens por Ei Nerd e Estadão.

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