Titãs enche 1ª noite no Allianz em retorno triunfal com algumas novidades

Jogando em casa, banda paulistana adicionou quatro músicas ao repertório e, apesar de não lotar o estádio, convenceu de novo

Já fazia mais de uma hora e meia em que o Titãs enfileirava hits no Allianz Parque quando Paulo Miklos, ao introduzir o cover de “É Preciso Saber Viver”, mencionou ter frequentado as piscinas do clube dono do estádio no passado durante essa época de férias de fim de ano. Mais relaxado, o grupo estava de volta em casa e ainda tocaria por mais uma hora.

O retorno triunfal da turnê “Encontro” à cidade natal da banda teve adições ao repertório. Duas delas, de peso: “Será que é isso que eu necessito?” e “Nem sempre se pode ser deus”, faixas de “Titanomaquia” (1993), disco que teve seu trigésimo aniversário ignorado na primeira etapa do giro.

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A versatilidade do grupo ficou exposta nas outras duas novidades: “Querem meu sangue”, versão em português de Nando Reis para o reggae de Jimmy Cliff. E “O quê”, hit de Arnaldo Antunes que fechou “Cabeça Dinossauro” (1986), prenunciou sua poesia e as influências eletrônicas do trabalho seguinte.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

Cheio, mas não infernal

Diferentemente das três noites esgotadas seis meses antes na capital paulista, a primeira noite da volta, ou despedida, da turnê “Encontro”, que ganhou o subtítulo “Para Dizer Adeus”, ainda tinha ingressos disponíveis na data da apresentação — como também para o dia seguinte (sexta, 22). Apenas o show de sábado (23) vendeu todas as entradas com antecipação.

O estádio estava cheio, mas longe da lotação infernal de apresentações recentes no mesmo Allianz Parque. Ao menos era o que se notava desde duas horas antes do show começar, quando a rua de principal acesso ao centro paulistano que margeia o estádio nem tinha o usual trânsito do horário do rush. As calçadas estavam tranquilas. Apesar de quinta-feira, dia útil, o recesso de fim de ano já estava a todo vapor.

Restou a impressão, assim, de ter sido a noite inaugural das três agendadas um dos programas obrigatórios a quem ainda estava na cidade. Não era necessariamente um público interessado nos Titãs ou sequer em rock’n’roll. Muito menos na banda de abertura, Garotas Suecas.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox
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Poderia ter sido a apresentação da vida do quarteto paulistano, cujo EP de estreia já tem seus quase vinte anos de lançado e chegou a gravar “Charles Chacal”, uma música da atração principal da noite censurada nos anos 80. Mas praticamente ninguém se importava.

A maioria do público, ainda diminuto, conversou sem dedicar muita atenção à alternância de canções dançantes e intimistas do grupo. Sem a ajuda dos telões laterais e com os quatro músicos espaçados no comprido palco, o Garotas Suecas dedicou metade do seu repertório a faixas do mais recente álbum, “1 2 3 4” (2023), mas despertou alguma reação mesmo com a antiga “Codinome Dinamite”, do EP “Dinossauros” (2008), antes de encerrar com a tensa “Não tá tudo bem” seus quarenta minutos de apresentação.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox
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Mais relax, mas ainda em alto nível

Com dez minutos de atraso em relação ao horário programado, os Titãs subiram ao palco do Allianz Parque. O telão de fundo branco, com as sombras dos sete músicos projetadas à frente, já indicava que não só a produção de alto nível como toda a teatralidade seriam mantidas.

À exceção das quatro canções já mencionadas e sem a homenagem acústica a Rita Lee, o resto do repertório foi idêntico ao apresentado no primeiro semestre. A diferença foi a postura mais relaxada dos músicos no palco. Talvez um misto de triunfo, dever cumprido e reta final de maratona. Ou nada disso.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

As cinco primeiras músicas executadas formaram uma apresentação de cada um dos cantores da noite. “Diversão”, “Lugar Nenhum” e “Desordem”, trinca de “Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas” (1987), introduziram Paulo Miklos, Arnaldo Antunes e Sérgio Britto, respectivamente.

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“Tô Cansado”, a primeira das onze de “Cabeça Dinossauro”, expôs a “nova voz” após o tumor da laringe vencido por Branco Mello. Sua natural afonia chocou num primeiro momento, mas ganhou uma certa identidade agressiva e o público ovacionou o artista não só pela atitude resiliente. Combinando com o clima natalino, Nando Reis começou sua cantoria por nos dizer que não monta presépio e nem gosta de Cristo em “Igreja”, do mesmo álbum.

Feitas as apresentações, Britto chamou o público a completar o refrão de “Homem Primata”, fechando a trinca de “Cabeça Dinossauro”, e foi correspondido pelos presentes — não dos mais participativos, é preciso dizer.

A parcela mais velha da plateia permaneceu alheia quando veio na sequência a dupla agressiva de “Titanomaquia” (1993), que soou menos pesada em relação ao restante do repertório, dada a boa equalização de som de toda a apresentação. O disco talvez pudesse ter sido representado por alguma faixa de autoria de Arnaldo Antunes, como “Disneylândia” ou “Hereditário”, única do álbum cantada por um à época insatisfeito Nando Reis.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

“Estado Violência”, faixa do baterista Charles Gavin do clássico disco de 1986, não recebeu resposta das mais empolgadas. Coube às dancinhas de Arnaldo Antunes restabelecer a conexão com o público em “O Pulso”, primeira de “Õ Blésq Blom” (1989) da noite, e, principalmente, “Comida”, do álbum antecessor, com Nando Reis abusando dos slaps funkeados no baixo em coreografia com o vocalista.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

Jogando no talo a distorção do seu instrumento, Reis reiterou o caráter político das letras do grupo com a pesada faixa-título de “Jesus Não tem Dentes no País dos Banguelas” e, de forma mais evidente, “Nome aos Bois”, última do álbum na noite, repetindo a inclusão do inelegível ex-presidente em sua letra, não tão celebrada como seis meses atrás.

Branco Mello retornou à linha de frente para encerrar a primeira parte da noite. Primeiro, com a única do criticado “Tudo ao mesmo tempo agora” (1991), que poderia ter sido mais bem representado no repertório em vez da escolha por “Eu não sei fazer música”. Depois, a tribal “Cabeça Dinossauro” incluiu um solo de bateria de Charles Gavin, que citou a introdução de “Refuse/Resist”, do Sepultura.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

Ironicamente, o baterista voltou com uma camiseta da maior banda de metal brasileira de todos os tempos para a inevitável sessão acústica da noite. O disco da apresentação para a MTV lançado em 1997 marcou o renascimento comercial dos Titãs ao final daquela década, quando o formato de fácil digestão ascendeu sua popularidade de uma ultrapassada banda de rock oitentista para um conjunto atemporal de MPB.

Segunda etapa

Após o telão exibir vídeos caseiros da história do Titãs enquanto o palco era preparado, lanternas de celulares ligadas acompanharam a cantoria em uníssono para “Epitáfio”, de “A melhor banda de todos os tempos da última semana” (2001). Porém, Sérgio Britto teve recusado seu pedido para o público sair do chão.

“Os cegos do castelo”, canção inédita do “Acústico MTV” (1997) sob os vocais de Nando Reis, também teve resposta efusiva. Não tão massiva quanto Miklos em “Pra Dizer Adeus”, cuja versão desplugada da faixa de “Televisão” (1985) foi o primeiro single extraído do disco ao vivo noventista.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

Para homenagear o falecido Marcelo Fromer, sua filha Alice segue com sua participação cantando “Toda Cor”, de autoria de seu pai no primeiro álbum autointitulado do grupo, de 1984. Seu dueto em jogral com Arnaldo Antunes em “Não vou me adaptar”, de “Televisão”, encerrou a parte acústica com uma das melhores respostas do público.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

Antes de replugarem os instrumentos, Tony Bellotto homenageou o produtor musical Liminha. O ex-baixista dos Mutantes, substituindo Fromer nas seis cordas nessa turnê, mencionou os ensaios da clássica banda brasileira nos arredores do Allianz Parque e disse se apresentar com uma guitarra que pertenceu ao falecido Titã especialmente trazida de Portugal.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

Grand finale

Nando Reis, então, voltou com “Família” e “Querem Meu Sangue”, outra novidade, sucedido por Sérgio Britto e a poesia de Torquato Neto em “Go Back”. Após introduzir “É Preciso Saber Viver” com suas reminiscências do bairro do estádio, que a cantou alto, mencionou a outra mudança do repertório. Faixa-título do álbum de 1995, “Domingo”, de música gravada executada ao final do show, passou a integrar a apresentação. Pela resposta do público, um golaço no Allianz Parque.

Branco Mello encerrou sua participação na linha de frente do show com a dupla do subrepresentado “Õ Blésq Blom” – “Deus e o Diabo” foi uma ausência gritante nessa turnê. Se a agressiva “32 Dentes” foi um momento quase lado B da noite, antes o hino “Flores” recebeu uma resposta condizente dos presentes.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

A última adição ao repertório da turnê veio na participação final de Arnaldo Antunes como vocalista principal da noite. A já citada “O Quê” foi seguida por “Televisão” e “Porrada”, primeira do quarteto de “Cabeça Dinossauro” que encerrou o repertório regular. Depois, Britto introduziu “Polícia” com um trecho de “Acorda Maria Bonita”, seguida por “AA UU” e Miklos colocou o estádio abaixo com “Bichos Escrotos”.

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A espera pelo bis não foi muito longa. O público acionava de novo as lanternas dos celulares chamando pela banda quando luzes fortes vermelhas iluminaram o estádio. A “Introdução por Mauro e Quitéria” de “Õ Blésq Blom” indicou a execução de “Miséria”, com Miklos e Britto dividindo uma das melhores letras do grupo, que, coincidentemente ou não, posicionava-se primordialmente à esquerda do palco para tocá-la.

Depois, Nando Reis tomou a frente e botou o público para cantar sozinho “Marvin”. Miklos pôs um ponto final na noite com “Sonífera Ilha”, a música que começou tudo e terminou com todos parados como estátuas no palco, lembrando suas apresentações nos programas oitentistas de auditório. As bandeiras do movimento LGBTQIAPN+ empunhadas pelos músicos ao se despedirem do público retomaram o momento presente.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

Até quando dura o “Encontro”

A grande questão que vai ficar para 2024 é até quando os Titãs vão estender a turnê “Encontro”. Apesar das apresentações finais de 2023 incluírem o subtítulo “Pra Dizer Adeus”, o grupo já está confirmado no lineup do Lollapalooza Brasil do próximo ano.

Haverá banda quando o quarteto dissidente retomar cada um sua respectiva carreira? Alguém ainda vai querer ver shows do trio remanescente — embora algumas datas já estejam até marcadas, como em Blumenau para 2024?

Se a turnê “Encontro” marcar o fim dos Titãs, cujo disco de estreia celebrará quarenta anos em 2024, ela terá servido para encerrar em alta a carreira de um dos ícones do rock nacional. E talvez marque o início de novos tempos para apresentações no país, com produtoras mais interessadas em promover espetáculos grandiosos para artistas nacionais.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

*O Titãs também se apresenta nesta sexta-feira (22) e sábado (23) no Allianz Parque, em São Paulo. Tocará ainda em Florianópolis (28/12) e no Réveillon de Fortaleza (31/12), bem como na edição 2024 do festival Lollapalooza Brasil. Mais informações no site oficial.

**Fotos de Gustavo Diakov / @xchicanox. Mais imagens ao fim da página.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

Titãs — ao vivo em São Paulo

  • Local: Allianz Parque
  • Data: 21 de dezembro de 2023
  • Turnê: Titãs Encontro — Pra Dizer Adeus

Garotas Suecas

  1. Tire Seus Dedos
  2. What U Want
  3. Todo Dia É Dia De Mudança
  4. Objeto Opaco
  5. New Country
  6. Veneno
  7. Fera
  8. Gentrificação
  9. Codinome Dinamite
  10. Não Tá Tudo Bem

Titãs

Set 1:

  1. Diversão
  2. Lugar nenhum
  3. Desordem
  4. Tô cansado
  5. Igreja
  6. Homem primata
  7. Será que é isso o que eu necessito?
  8. Nem sempre se pode ser Deus
  9. Estado violência
  10. O pulso
  11. Comida
  12. Jesus não tem dentes no país dos banguelas
  13. Nome aos bois
  14. Eu não sei fazer música
  15. Cabeça dinossauro

Parte acústica:

  1. Epitáfio
  2. Os cegos do castelo
  3. Pra dizer adeus
  4. Toda cor
  5. Não vou me adaptar

Set 2:

  1. Família
  2. Querem meu sangue
  3. Go Back
  4. É preciso saber viver
  5. Domingo
  6. Flores
  7. 32 dentes
  8. O quê
  9. Televisão
  10. Porrada
  11. Polícia
  12. AA UU
  13. Bichos escrotos

Bis:

  1. Introdução por Mauro e Quitéria + Miséria + Vinheta final por Mauro e Quitéria
  2. Marvin
  3. Sonífera ilha
Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox
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Thiago Zuma
Thiago Zuma
Formado em Direito na PUC-SP e Jornalismo na Faculdade Cásper Líbero, Thiago Zuma, 43, abandonou a vida de profissional liberal e a faculdade de História na USP para entrar no serviço público, mas nunca largou o heavy metal desde 1991, viajando o mundo para ver suas bandas favoritas, novas ou velhas, e ocasionalmente colaborando com sites de música.

3 COMENTÁRIOS

  1. Materia tendenciosa com críticas vistas pela ótica a partir das pessoas que o cercavam, trechos como… pessoas que estavam ali somente por estar na cidade ou que estavam a conversar durante a apresentação, ao meu ver não condiz, no show (21.12) pude presenciar fans vindos de Hortolandia pulando e cantando todo o repertório. Mesmo que a pessoa fosse somente para prestigiar o show ou conversar é um direito dela e não ser alvo de falas enraizadas de pré conceito de quem deveria estar ali era somente um público “dançante”.

  2. Pessoas adultas, maduras não vão a um show para ficar pulando e gritando. Cada um curte o show como quiser e isso não é demérito para o artista. Os ingressos se esgotaram todos os dias. Ou seja, ninguém está interessado na sua opinião.

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