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Dream Theater oferece em “Parasomnia” peso extra e referências ao passado

Conceitual e supercoeso, álbum que marca o retorno do baterista fundador Mike Portnoy reivindica seu posto de principal nome do prog metal mundial

Para quem tem fé, era questão de tempo até que Mike Portnoy retornasse ao Dream Theater. E levou tempo — 13 anos, para ser exato — para que o baterista fundador reassumisse seu posto na banda que se tornou sinônimo de metal progressivo.

Com o anúncio de um novo álbum de estúdio, a expectativa veio acompanhada de certo receio. Não que Mike Mangini, o substituto de Portnoy, tenha deixado a desejar, mas os álbuns gravados pelo grupo durante sua passagem, sim; sobretudo o pretensioso e enfadonho “The Astonishing” (2016).

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Ao ouvir o conceitual “Parasomnia”, a primeira coisa que fica evidente é que o Dream Theater, de fato, retomou a partir de onde “Black Clouds & Silver Linings” (2009), o último antes da saída de Portnoy, havia parado, especialmente no que diz respeito à coesão e ao direcionamento musical. O Mike que todos preferem voltou sentando-se à janela e sua influência tentacular se estende até mesmo à escolha do setlist dos shows comemorativos dos 40 anos da banda.

Junto com a supracitada coesão, há um peso adicional — perceptível principalmente nas afinações e timbragens adotadas pelo guitarrista John Petrucci e pelo baixista John Myung, além da redução dos experimentalismos creditados ao tecladista Jordan Rudess. Também há referências ao passado mais distante, como na arte da capa assinada por Hugh Syme, que atualiza e obscurece o conceito visual criado por Larry Freemantle para o clássico “Images and Words” (1992).

“O termo ‘parassonia’ é usado para descrever distúrbios do sono”, explicou Petrucci no comunicado oficial de lançamento do disco. “Como o nome da nossa banda significa literalmente ‘um teatro que funciona enquanto você sonha’, é incrível que não tenhamos pensado nisso [em usar essa temática] antes.” Dito isso, todas as letras de “Parasomnia” exploram fenômenos como sonambulismo, paralisia do sono e terrores noturnos, e as atmosferas refletem as inquietações descritas nos versos e refrães interpretados por James LaBrie.

Faixa a faixa

A abertura cinematográfica “In the Arms of Morpheus” estabelece o tom grandioso e atmosférico do álbum, com uma peça instrumental rica em transições dinâmicas e complexidade rítmica. A maestria de Petrucci na guitarra de oito cordas e a bateria de Portnoy entram em cena com força, contrapondo-se à tranquilidade inicial da faixa e preparando o ouvinte para uma jornada musical intensa e repleta de nuances.

“Night Terror” é um excelente exemplo da capacidade do Dream Theater de combinar ingredientes consagrados do prog metal com uma sonoridade moderna e agressiva. A letra a respeito de terrores noturnos é repleta de metáforas, como no pré-refrão, que lista diferentes formas de tortura e as compara à sensação de pavor e impotência diante de pesadelos recorrentes. Musicalmente, há alternância entre momentos de intensidade — com mudanças de tempo e tom — e melodias mais suaves. É o know-how técnico da banda em sua essência; justamente por isso, uma escolha certeira para primeiro single.

A performance vocal de LaBrie em “A Broken Man” reflete a angústia e o sofrimento de um protagonista vítima de transtorno de estresse pós-traumático (TEPT). A atmosfera opressora da letra, com suas imagens vívidas de guerra e trauma, é reforçada pela bateria explosiva de Portnoy e pelo baixo preciso e destacado de Myung. Mas o mais interessante na faixa é o solo de guitarra com contornos blueseiros, um contraste inesperado dentro do contexto do álbum.

A história real de um homem que matou a esposa acidentalmente em um episódio de sonambulismo inspirou “Dead Asleep”. A narrativa retrata o horror e a confusão do protagonista ao despertar e se deparar com as consequências de seu ato inconsciente — “O que foi que eu fiz?”, questiona-se no lancinante refrão. Petrucci brilha nos acordes melancólicos da introdução, enquanto LaBrie transmite desespero em sua interpretação afetada e inspirada.

Com a balança pesando mais para o metal do que para o prog, “Midnight Messiah” apresenta uma faceta mais agressiva da banda. Musicalmente, traz influências de Judas Priest e Metallica, enquanto sua letra descreve o escape para um mundo onírico onde se encontra liberdade e poder. Além disso, acrescenta uma camada de intertextualidade ao referenciar “Strange Déjà Vu” e “Home”, mostrando que, para além do dado sonoro, o Dream Theater continua dialogando com seu próprio legado escrito. E que solo desconcertante o Sr. Petrucci nos oferece!

“Are We Dreaming?” é um interlúdio curto e minimalista que tanto proporciona um momento de pausa como prepara o terreno para a introspectiva balada “Bend the Clock”, uma das faixas mais marcantes do repertório. Retomando a temática dos pesadelos recorrentes e da impotência diante deles, sua letra compartilha o DNA de “Night Terror”, mas acrescenta uma camada extra ao sugerir o desejo de escapar desse ciclo no refrão em que LaBrie canta que, se pudesse manipular o tempo, encontraria um lugar melhor e não mais seria acometido por sonhos paralisantes.

“Parasomnia” encerra com um épico sombrio que aborda os medos mais profundos da mente humana. Com quase 20 minutos de duração, “The Shadow Man Incident” é mais um exemplo da fórmula comprovada do Dream Theater: estrutura complexa e variada, mudanças constantes de tempo, solos virtuosos (muitos deles!) e passagens instrumentais embebidas em diferentes texturas sonoras. Na letra, o “Shadow Man” se apresenta como uma entidade aterrorizante e onipresente, a personificação do medo do desconhecido e da luta contra os próprios demônios internos. Portnoy e Myung fornecem os elementos fundamentais para essa atmosfera que vai da tensão à redenção, quando o despertador finalmente toca, sinalizando o fim do álbum.

Já um dos melhores lançamentos de 2025, “Parasomnia” abre um novo capítulo na história do Dream Theater, que, com o retorno de Mike Portnoy, reivindica seu posto de principal nome do metal progressivo mundial. É um disco que merece ser ouvido repetidamente e que certamente se tornará um clássico do gênero.

Dream Theater – “Parasomnia”

  1. In the Arms of Morpheus (05:22)
  2. Night Terror (09:55)
  3. A Broken Man (08:29)
  4. Dead Asleep (11:06)
  5. Midnight Messiah (07:58)
  6. Are We Dreaming? (01:28)
  7. Bend the Clock (07:24)
  8. The Shadow Man Incident (19:32)

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Igor Miranda
Igor Miranda
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com pós-graduação em Jornalismo Digital. Escreve sobre música desde 2007. Além de editar este site, é colaborador da Rolling Stone Brasil. Trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, revista Guitarload, jornal Correio de Uberlândia, entre outros. Instagram, Twitter e Facebook: @igormirandasite.

6 COMENTÁRIOS

  1. Cara , chamar o The Astonishing de enfadonho , para mim , desabona completamente sua resenha. São absolutamente injustas opiniões do tipo . The Astonishing é um dos álbuns mais incríveis do DT. Azar de quem não absorve .

  2. Acho que a análise ia muito bem até a hora em que se emocionou e confundiu as bolas: o Portnoy foi “só baterista” nesse álbum, que já estava praticamente pré-produzido pelo Petrucci (assim como todos na era Mangini). Portnoy não participou de nada na conceituação e brainstorming. Só chegou e gravou a bateria, assim como o Mangini fez. Tanto é que o álbum tem várias características de produção do Petrucci (guitarra extremamente “na cara” na mix, solos improvisados gigantes, approach mais “metal” e modal, lore “sombria” etc.) e nada das maluquices do Portnoy na produção (referência a medalhões da música, easter eggs, temas mais pessoais, influência de estilos atuais, fuga da estrutura “parte A B C” etc.).

    Por isso não faz sentido nenhum colocar esse álbum como “A VOLTA DO DT DE VERDADE, NENHUM DA ERA MANGINI FOI FIEL À IDENTIDADE”.

    Menos, bem menos.

    Só veremos o Portnoy “produtor” e ativo no processo criativo no próximo álbum. Nesse álbum ele basicamente fez o que o Mangini fazia: “só” tocava bateria.

    Quis polemizar no texto, mas só broxou quem conhece a banda e o processo de criação.‍♂️

    Álbum excelente, mas AINDA não é o full-retorno do Portnoy.

  3. Do raciocínio lógico.

    Ou: do fato de o álbum ter sido composto meses antes dos primeiros ensaios com o MP. Quem sabe como funciona (e quanto demora) dinâmica de criação na banda sabe que o espaço de tempo (2, 3 meses?) entre a saída do Mangini e os ensaios com o Portnoy é um lapso insuficiente pra que o álbum tenha sido composto integralmente.

    Se você conhecer como funciona a timeline de uma composição de álbum do DT, facilita. São muitos meses de troca de informações, ensaios, brainstorming, debates etc. Sugiro que assista aos “making of” disponíveis por aí.

    De posse dessa noção, calcule as datas entre a saída do Mangini, entrada do MP, início dos ensaios, gravação do álbum e lançamento.

    E pra quem é fã da banda e conhece os estilos de composição, arranjos e produção — tanto do Petrucci quanto do MP — sabe que o álbum tem “cara” de Petrucci.

    Ouvir os álbuns solo dele e os álbuns da era Mangini também ajudam a ter essa noção.

    Ou, se quiser, aponte as características “Portnoy” nos arranjos e na produção (pré, mix/master). Talvez eu não esteja “enxergando”.

    • Posso convidar o autor da resenha para entrar nessa conversa (pois não assino este texto), mas te perguntei de onde vieram essas informações porque Portnoy é creditado pela autoria de todas as músicas e pela letra de uma delas. O simples fato de ter assinado uma das letras já faz cair por terra a tese de que ele “não participou de nada” e “só chegou e gravou a bateria”.

      Além disso, em entrevistas — uma delas conduzida por mim com James LaBrie — os próprios integrantes têm dito que o álbum foi composto de forma coletiva, em ensaios, após a volta de Portnoy. O autor desta resenha entrevistou dois integrantes, Jordan Rudess e o próprio Mike Portnoy, que também reforçaram esse ponto. Pode ser que estejam mentindo? Aí é outra conversa. Mas as informações que temos são essas.

  4. Bem produzido, ótimos timbres, riffs e solos mas sei lá. Tirando a Bend The Clock achei os vocais mto deslocados pro tipo de voz do Labrie. Não gosto das musicas recentes porque me passam a mesma impressão. E a fórmula música grande, pesada, com parte instrumental forçada no meio pra agradar fanbase que não me soa natural. Na minha opinião, muito parecido com os últimos. Meio genérico. Nota 6.

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