Dissabores à parte, Titãs oferecem noite inesquecível em Porto Alegre

Torrente de boas emoções proporcionada por show espetacular do septeto reunido compensou problemas relacionados a troca de local às vésperas do evento

Noite de sábado, 6 de maio, e Porto Alegre se prepara para receber a turnê de reunião de uma das maiores bandas brasileiras da história. Reunidos para uma aguardada série de 22 shows em 17 cidades brasileiras (além de uma última apresentação na capital portuguesa), os Titãs voltam a executar ao vivo seu repertório de clássicos responsáveis por escrever o nome do grupo entre os gigantes do rock nacional. Mensagens fortes, memória afetiva, celebração, emoção e um enorme sentimento de união são apenas algumas das qualidades que podemos atribuir a este que já é candidato a evento do ano na capital gaúcha.

*Fotos de Liny Oliveira / @photoslinyoliveira.

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Foto: Liny Oliveira

Alteração de local

O impacto da passagem dos Titãs por Porto Alegre na vida de seus fãs começa antes do primeiro fim de semana de maio. Sem uma razão clara e supostamente devido a “problemas logísticos” – uma justificativa genérica, velha conhecida do público porto-alegrense –, a apresentação teve o seu local alterado. Saiu do Anfiteatro Beira-Rio, local de fácil acesso e excelente estrutura que já recebeu Elton John, Aerosmith, The Who, Los Hermanos e Green Day, entre outros, para ser realizada no estacionamento da Fiergs, espaço famoso por proporcionar uma péssima experiência. Difícil de se chegar e de ir embora, som ruim e inexistência de assentos são as marcas registradas daquele que é, sabidamente, o pior local possível para um grande evento.

Uma alteração do tipo, anunciada a apenas nove dias da performance, deixou muita gente insatisfeita. Também é importante lembrar que os termos do site Eventim, responsável pelas vendas dos ingressos, limita o pedido de reembolso a até cinco dias antes do evento – o que deixou o público gaúcho refém de uma janela de apenas quatro dias para tomar ciência do fato, tomar a decisão de desistir e, sendo o caso, pedir reembolso.

Desnecessário dizer que isso resultou em uma enorme indignação que pode ser sentida, seja nas conversas informais antes do show ou, ainda, na vaia colossal que a peça publicitária da produtora 30e amargou logo antes do início do espetáculo.

Foto: Liny Oliveira

Os guris da Colomy

Pouco depois das 20h a atração de abertura subiu ao palco: “os guris da Colomy”, como foram anunciados, fizeram um show curto, de apenas 30 minutos, mas que mostrou competência e entrosamento, além de composições recheadas de belas melodias e de harmonias interessantes sempre impulsionadas por uma cozinha competente.

Figuras conhecidas do underground gaúcho, o vocalista e guitarrista Pedro Lipatin e o baterista Eduardo Schuler (ex-Cachorro Grande e atual baterista de Nando Reis) formam a Colomy ao lado de Sebastião Reis, filho de Nando, nos violões e vocais. Infelizmente, a produção não teve o cuidado devido e manteve as luzes das pistas acesas durante o show – detalhe que em nada intimidou a banda ou desabonou a apresentação.

Vale conferir o trabalho do grupo, que acabou de lançar seu novo single, “Nem Tudo Está Perdido”, uma das mais impactantes do set. Outro destaque foi o cover de “O Mundo é Bão, Sebastião”, canção composta por Nando Reis em homenagem ao filho. Na voz do próprio Sebastião, esta velha conhecida do público foi responsável por encerrar a curta e excelente participação da Colomy na noite de sábado.

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Das silhuetas à festa

Após novas vaias do público por conta do atraso, o relógio marcava 21h17 quando acenderam-se os telões. Completamente brancos em contraste com o escuro das estruturas, formaram uma bela imagem contrastada. Um a um os integrantes entraram em cena de forma a evidenciar, em preto, as características silhuetas de cada membro dos Titãs.

Uma sequência simples de poucas e conhecidas notas deu início à apresentação com a emblemática “Diversão”. Ficava claro, de imediato, que a vida até parecia uma festa e que as adversidades pré-show seriam, pelo menos temporariamente, suprimidas por um sentimento coletivo mais do que especial.

Em seguida, “Lugar Nenhum” trouxe à frente da banda um Arnaldo Antunes visivelmente feliz em estar ali. Com suas danças peculiares e um carisma contagiante, Arnaldo levantou o público que, ao longo da noite, se mostraria predominantemente tímido.

Foto: Liny Oliveira

Titãs em três atos

O setlist – longo e bem pensado, longe de ser cansativo – foi dividido inteligentemente em três blocos. O primeiro, marcado por mensagens fortes, trouxe, além das já citadas, “Desordem”, “Igreja”, “Estado Violência” e “Comida”. Outros dois importantes destaques desta primeira parte foram “Tô Cansado”, com Branco Mello atropelando as consequências de uma cirurgia de câncer na garganta e remoção de laringe (algo que se repetiu posteriormente em “Eu Não Sei Fazer Música”, “32 Dentes” e “Flores”) e a inclusão do nome “Bolsonaro” em “Nome Aos Bois”, algo que fez muito feliz aqueles que entenderam o peso dessa atitude.

Foto: Liny Oliveira

Após “Cabeça Dinossauro”, os Titãs deixam o palco para a exibição de um vídeo de dois minutos e vinte segundos, formado por imagens da banda em VHS. Tempo suficiente para uma rápida reformulação no palco, juntando os músicos para um set acústico.

O formato mais intimista, que teve seu pontapé inicial com a obra-prima “Epitáfio”, esquentou o coração daqueles que conheceram a banda a partir do “Acústico MTV” com “Os Cegos do Castelo” e “Pra Dizer Adeus”. Emocionou, ainda, a todo o público com uma homenagem a Marcelo Fromer (que faleceu vítima de um atropelamento em 2001), tendo sua filha, Alice, nos vocais de “Toda Cor” e “Não Vou Me Adaptar”. Uma chuva de aplausos.

Por falar nela, a chuva dava as caras e sumia, de forma desordenada e que certamente contribuiu – juntando forças a tudo que nos referimos no que tange a mudanças indesejadas – para que o público não respondesse com furor a uma performance dedicada e um número expressivo de clássicos (foram 31 músicas, ao todo).

Foto: Liny Oliveira

O repertório se sustenta por si só e garante um espetáculo grandioso. No entanto, a frieza do público, que se comportou certas vezes de forma gélida, como em “Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas”, “Desordem”, “Toda Cor e até mesmo “Cabeça Dinossauro”, teve como contraponto a empolgação com hits massivos, como “Homem Primata”, “Epitáfio” e “Marvin”, que abriu a terceira parte do setlist, retornando ao formato elétrico. A partir dali, o que se viu foi um terceiro bloco formado por um verdadeiro empilhamento de sucessos: “Go Back”, “Policia”, “AA UU” e “Bichos Escrotos” voltaram a trazer aquela força dos Titãs do século passado.

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Com mais de duas horas de apresentação, a banda se despede e, protocolarmente, Retorna para o bis com “Miséria”, “Família” e “Sonífera Ilha”, primeiro sucesso, que encerrou brilhantemente a viagem nostálgica de duas horas e quinze minutos pela trajetória de um grupo que faz jus ao nome.

Foto: Liny Oliveira

Apesar dos dissabores…

Escrever sobre a reunião dos Titãs é muito mais do que apenas fazer uma resenha comum, descritiva, baseada em horário, local, repertório e performance. Na verdade, é algo muito mais complexo do que isso.

Embora o horário da apresentação tenha sido convencional, às 21h, e o local tenha sido sabidamente ruim e desprezível, essa turnê foi tudo, menos óbvia. A banda não se limitou a cumprir sua missão de apresentar um espetáculo grandioso: o fez de forma repleta de surpresas especiais.

A maior delas, por óbvio, foi a reunião em si. No entanto, o público também foi agraciado ao vê-los apresentando em uma turnê completa com Branco, apesar de sua condição vocal, e com Liminha, um dos maiores produtores do Brasil, assumindo o desafio e a honra de executar ao vivo as guitarras do saudoso Marcelo Fromer. Também agraciado ao ter a filha de Marcelo, Alice Fromer, assumindo os vocais em algumas canções, e, ainda, com surpresas pontuais, como a participação de Miklos nos teclados em “Go Back” e o imprevisto do tombo de Tony Bellotto no palco. Desabonando um pouco o espetáculo, Charles Gavin pareceu incapaz de esboçar um sorriso que pudesse ser flagrado, mas compensou com perfeição técnica e uma classe fora de série ao tocar bateria.

Foto: Liny Oliveira

Apesar de todos os inconvenientes e dissabores que só o estacionamento da Fiergs consegue proporcionar, o que realmente marcou a noite do último sábado foi a torrente de boas emoções que os sete senhores proporcionaram. Os fãs voltaram para casa com a alma lavada pela chuva, inundada de boas lembranças que ficarão para sempre. Ficou a certeza do privilégio de vermos Arnaldo, Branco, Charles, Nando, Paulo, Tony e Sérgio juntos fazendo o que fazem de melhor.

Vimos os sete Titãs juntos pela última vez em terras gaúchas? Não sabemos. Só sabemos que foi incrível.

*Fotos de Liny Oliveira / @photoslinyoliveira.

Foto: Liny Oliveira

Titãs – ao vivo em Porto Alegre

  • Local: Estacionamento da Fiergs
  • Data: 6 de maio de 2023
  • Turnê: Titãs Encontro

Repertório:

> Elétrico parte 1:

  1. Diversão
  2. Lugar Nenhum
  3. Desordem
  4. Tô Cansado
  5. Igreja
  6. Homem Primata
  7. Estado Violência
  8. Pulso
  9. Comida
  10. Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas
  11. Nome aos Bois
  12. Eu Não Sei Fazer Música
  13. Cabeça Dinossauro

> Acústico:

  1. Epitáfio (sem Arnaldo no palco)
  2. Cegos do castelo (sem Arnaldo)
  3. Pra Dizer Adeus (sem Arnaldo)
  4. Toda Cor (volta Arnaldo com a Alice Frommer)
  5. Não Vou me Adaptar (com Alice e Arnaldo)

> Elétrico parte 2:

  1. Marvin
  2. Go Back
  3. É preciso saber viver (cover de Erasmo Carlos)
  4. 32 Dentes
  5. Flores
  6. Televisão
  7. Porrada
  8. Polícia
  9. AA UU
  10. Bichos Escrotos

> Bis:

  1. Introdução por Mauro e Quitéria + Miséria
  2. Família
  3. Sonífera Ilha

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Marcel Bittencourt
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Marcel Bittencourt é jornalista musical, produtor musical e baixista da banda Hit the Noise. Esteve presente em mais de 600 shows, sendo mais de 200 na qualidade de repórter dos hoje extintos sites PoaShow e Rockbox, dos quais também foi editor. Nas horas vagas joga poker e espalha a palavra dos suecos do Hellacopters.

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