Como o Quiet Riot fez as massas baterem cabeça com “Metal Health”

Primeiro álbum de metal a atingir o topo das paradas recompensou a banda por anos suando a camisa no circuito de clubes de Los Angeles

Em 1983, a cena musical americana estava pronta para uma revolução e ela veio na forma de “Metal Health”. Com o seu som pesado e melódico, o terceiro álbum de estúdio do Quiet Riot se tornou um sucesso instantâneo, chegando ao topo das paradas nos Estados Unidos e lançando a banda para a fama internacional.

Mas o que para muitos pareceu um golpe de sorte foi, na verdade, a recompensa de anos suando a camisa no circuito de clubes de Los Angeles.

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Despontando para o anonimato

As sementes do Quiet Riot foram plantadas em 1975, quando o vocalista Kevin DuBrow, de 18 anos, foi convidado pelo guitarrista Randy Rhoads, de 17, para cantar em uma banda que estava formando.

Apesar do crescente número de adeptos locais, nenhuma gravadora quis saber do quarteto à época completado pelo baixista Kelly Garni e pelo baterista Drew Forsyth. Várias bandas da new wave foram contratadas enquanto apáticos executivos os rejeitavam, acusando-os de tocar música já fora de época, ultrapassada.

Em 1977, o Quiet Riot assinou com a CBS/Sony no Japão para dois álbuns — “Quiet Riot” e “Quiet Riot II”, ambos de 1978 — que os fizeram despontar para o anonimato. Finalmente, o grupo jogou a toalha em 1980.

Levando o substituto de Garni, Rudy Sarzo, a tiracolo, Rhoads juntou-se à banda de Ozzy Osbourne, enquanto DuBrow começou a tirar do papel um projeto homônimo em parceria com o baterista Frankie Banali.

Objetivos altos, expectativas baixas

Alguns pensaram que o Quiet Riot havia acabado com a saída de Rhoads. Na verdade, estava apenas começando. Segundo Sarzo, que voltou para Los Angeles depois do acidente de avião que tirou a vida de Rhoads em março de 1982, em depoimento a Tom Beaujour e Richard Bienstock no livro “Nöthin’ But a Good Time” (Estética Torta, 2022):

“O Kevin ficou chateado quando o Randy saiu pra tocar com o Ozzy? Sim, lógico que ficou. Mas essa talvez tenha sido a melhor coisa que aconteceu com ele, porque, enquanto o Randy estava na banda, o Kevin estava sempre mais focado em promover o Randy. Depois disso, quando se viu sozinho, o Kevin se concentrou mais em si mesmo. E foi capaz de desenvolver o que o Quiet Riot se tornou mais tarde.”

Passadas algumas jams descompromissadas, Sarzo ingressou de forma permanente no projeto de DuBrow e Banali. Após uma rápida audição, a formação foi completada pelo guitarrista Carlos Cavazo, de 24 anos. A Martin Popoff, autor de “The Big Book of Hair Metal” (Voyageur Press, 2014), ele dá mais detalhes:

“Quando eu e Kevin nos reunimos, concordamos que queríamos tocar músicas mais pesadas – não queríamos tocar coisas pop. Porque o Quiet Riot no começo era mais pop, e nós gostávamos de bandas como Black Sabbath, Iron Maiden, Judas Priest, principalmente bandas britânicas de heavy metal. Éramos leitores da revista Kerrang!. Muitas dessas bandas britânicas eram populares aqui [nos EUA]. A bem da verdade, o Quiet Riot fez shows com o Accept e com o Saxon. Fizemos muitos shows com bandas desse tipo.”

Cavazo acabaria se tornando parceiro de composição de DuBrow, coassinando “Don’t Wanna Let You Go”, “Breathless” e “Run for Cover” com o vocalista e fornecendo a instrumental “Battle Axe”, inteiramente de sua autoria, para o vindouro álbum do grupo que decidiu ressuscitar o nome Quiet Riot.

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Sob a batuta de Spencer Proffer, produtor responsável pelo clássico “Acid Queen” (1975), de Tina Turner, e dono do selo Pasha filiado à CBS Records, os quatro entraram em estúdio com objetivos altos e — pudera — expectativas baixas.

O tiro que — ainda bem — saiu pela culatra

“Metal Health” foi lançado em 11 de março de 1983 e embalado pelo videoclipe de sua faixa-título rapidamente ganhou disco de ouro e rendeu ao Quiet Riot um convite para tocar no histórico US Festival em maio, mas foi em agosto, mês de lançamento do segundo single “Cum On Feel the Noize” que o grupo estourou pra valer.

Originalmente escrita e gravada pela banda britânica de glam rock Slade, a faixa foi trazida ao grupo por Proffer, que relembra a história em “Nöthin’ But a Good Time”:

“Quando ouvi ‘Cum On Feel the Noize’ no radio, pensei: ‘P#ta m#rda. Se eu pudesse encontrar uma banda pra tocar essa música…’. Me disseram que havia uma banda que tocava num lugar chamado Country Club, em Reseda. O líder era um cara chamado Kevin DuBrow.”

Para os autores de “Louder Than Hell” (HarperCollins, 2013), Jon Wiederhorn e Katherine Turman, Banali conta:

“Spencer achava a voz de Kevin e a de Noddy Holder [do Slade] muito parecidas, algo com o qual Kevin nunca concordou. Então Kevin se recusou terminantemente a gravar a música.”

No fim das contas, a banda acabou topando gravá-la, mas com um plano sujo em mente, o qual o baterista revela na mesma entrevista:

“Decidimos não ensaiar a música [antes da gravação]. Planejávamos tocá-lo tão mal que Spencer diria: ‘Querem saber? Vamos deixar essa ideia pra lá’. Então aqui estamos nós no estúdio da Pasha. Estou sentado à bateria, Rudy está no baixo, Carlos está na guitarra, Spencer está sentado em um banquinho a cerca de meio metro de distância de mim, e Kevin está num canto mais afastado, e dava para vê-lo sorrindo, antecipando cenas do próximo capítulo.”

Só que o tiro saiu totalmente pela culatra — e ainda bem que saiu —, conforme revela Banali:

“Não dou conta de fazer nada intencionalmente mal e, devagar, mas com segurança, Rudy e Carlos foram se achando na música. Apesar de uns alguns erros aqui e ali, continuamos tocando. Mais ou menos na metade dela, Kevin começou a tentar me atrapalhar, fazendo caretas e tal. Comecei a rir, mas mantive a batida firme. Chegamos ao final da música e Spencer disse: ‘Foi ótimo; gostaria que tivéssemos gravado isso’, e o engenheiro de som [Duane Baron] diz: ‘Eu gravei’. Então, o que você ouve no disco [‘Metal Health’] é a primeira vez que tocamos essa música! Sempre serei eternamente grato ao Spencer por ter recomendado que fizéssemos ‘Cum On Feel the Noize’.”

O primeiro de peso a chegar no topo

“Cum On Feel the Noize” disparou para as Dez Mais e se tornou um sucesso nacional, impulsionando “Metal Health” cada vez mais alto nas paradas até que, em novembro de 1983, ele chegou ao número um. Além de derrubar “Synchronicity”, do The Police, do topo, consagrou-se o primeiro álbum de heavy metal a atingir a primeira posição da Billboard 200, principal parada de álbuns dos Estados Unidos.

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A notícia foi celebrada como mandava o figurino, de acordo com Carlos Cavazo:

“Estávamos em turnê com o Black Sabbath, que promovia o álbum ‘Born Again’ com Ian Gillan quando ‘Metal Health’ alcançou o primeiro lugar. Os caras do Sabbath entraram em nosso camarim com cocaína e espumante e nós bebemos e cheiramos todas antes do show. Subi ao palco tão na m#rda que decidi que nunca mais tocaria chapado. Foi a pior sensação da minha vida.”

As vendas de “Metal Health” ultrapassaram seis milhões de cópias, demonstrando claramente que o hard rock era tudo menos ultrapassado. Na verdade, era o som do momento e, como ficou provado, também do futuro próximo.

Mais queimado que carvão em dia de churrasco

Pouco se comenta, no entanto, que a exemplo da curta permanência de “Metal Health” em primeiro lugar — na semana seguinte, “Can’t Slow Down”, de Lionel Richie, já era o disco mais vendido nos Estados Unidos —, também foi breve o auge do Quiet Riot. E a principal causa foi o falastrão Kevin DuBrow.

Sem papas na língua ou alguém que ousasse lhe dizer para pegar leve nas declarações à imprensa, o vocalista proferiu uma série de absurdos que fizeram nada além de fechar as portas da indústria para sua banda.

Quando “Condition Critical”, o sucessor de “Metal Health”, foi lançado em 27 de julho de 1984, o Quiet Riot já estava mais queimado que carvão em dia de churrasco. Embalado por outro cover do Slade (“Mama Weer All Crazee Now”), o disco estreou na 15ª posição, mas só vendeu um milhão de cópias nos Estados Unidos e três milhões no mundo inteiro. A Popoff, DuBrow reconhece se tratar de um trabalho equivocado:

“Mal produzido. Tentar repetir a mesma fórmula duas vezes nunca dá certo. A única música de que realmente gosto nesse álbum é a faixa-título. Não deveríamos ter entrado em estúdio naquele momento. Não estávamos prontos. Não tínhamos repertório. O produtor [Spencer Proffer] estragou tudo. Tudo que havia de legítimo no ‘Metal Health’ foi enfraquecido no ‘Condition Critical’.”

Sarzo deixou o grupo em 1985, sendo substituído por Chuck Wright, e o próprio DuBrow foi expulso no final de 1986 após o fiasco de “QRIII”, cujas vendas estagnaram na casa das 410 mil cópias.

Apenas cinco anos após o lançamento de “Metal Health”, o Quiet Riot se separou. DuBrow e Cavazo reformaram o grupo em 1991, com Banali e Sarzo voltando antes do final da década, mas sem nunca alcançar nada comparável à quando estavam no topo.

Quiet Riot – “Metal Health”

  • Lançado em 11 de março de 1983 pela Pasha Records
  • Produzido por Spencer Proffer

Faixas:

  1. Metal Health
  2. Cum On Feel the Noize (cover de Slade)
  3. Don’t Wanna Let You Go
  4. Slick Black Cadillac
  5. Love’s a Bitch
  6. Breathless
  7. Run for Cover
  8. Battle Axe
  9. Let’s Get Crazy
  10. Thunderbird

Músicos:

  • Kevin DuBrow (vocais)
  • Carlos Cavazo (guitarra, backing vocals)
  • Rudy Sarzo (baixo, backing vocals)
  • Frankie Banali (bateria, backing vocals)

Músicos adicionais:

  • Chuck Wright (baixo nas faixas 1 e 3)
  • Riot Squad – Tuesday Knight, Spencer Proffer, Donna Slattery (backing vocals)
  • Pat Regan (teclados)

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Marcelo Vieira
Marcelo Vieirahttp://www.marcelovieiramusic.com.br
Marcelo Vieira é jornalista graduado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso (FACHA), com especialização em Produção Editorial pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Há mais de dez anos atua no mercado editorial como editor de livros e tradutor freelancer. Escreve sobre música desde 2006, com passagens por veículos como Collector's Room, Metal Na Lata e Rock Brigade Magazine, para os quais realizou entrevistas com artistas nacionais e internacionais, cobriu shows e festivais, e resenhou centenas de álbuns, tanto clássicos como lançamentos, do rock e do metal.

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