Como o Quiet Riot quase se boicotou ao regravar o hit “Cum On Feel the Noize”

Produtor obstinado foi o grande responsável pelo cover que virou hit e levou o metal para o topo das paradas dos Estados Unidos nos anos 1980

Contrariando a crença de que o Quiet Riot, à época com dois álbuns lançados exclusivamente no Japão, estava liquidado quando o guitarrista Randy Rhoads saiu para se juntar à banda de Ozzy Osbourne, o vocalista Kevin DuBrow não se deu por vencido. Com Carlos Cavazo no lugar de Rhoads e a formação completada por Rudy Sarzo no baixo e Frankie Banali na bateria, o grupo, momentaneamente atendendo pela alcunha de DuBrow, viu-se refeito e pronto para estourar.

Ou seja, quando “Metal Health” (1983), terceiro álbum do Quiet Riot, derrubou “Synchronicity”, do The Police, do primeiro lugar da parada de álbuns da Billboard e se tornou o primeiro disco de heavy metal a atingir o topo do chart, não se tratou de um caso de sucesso da noite para o dia. Foi, na verdade, a recompensa tardia ao grupo já veterano da cena de Los Angeles após anos suando a camisa no underground.

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Esse sucesso se deve sobretudo a uma única música: “Cum On Feel the Noize”, originalmente gravada pelo britânico Slade, que sequer fazia parte do repertório de covers de Kevin e cia.

Uma baita ideia

O momento do lançamento de “Metal Health” coincidiu perfeitamente com a então incipiente demanda da MTV por clipes de artistas que fossem atraentes não apenas musical, como também visualmente. A faixa-título, escolhida como primeiro single, fez moderado sucesso e ajudou o álbum a obter Disco de Ouro. Mas foi só quando entregou seu segundo clipe para a emissora, dessa vez para o cover de “Cum On Feel the Noize”, do Slade, que o Quiet Riot se tornou um verdadeiro fenômeno mainstream.

Em entrevista aos autores Tom Beaujour e Richard Bienstock publicada no livro “Nöthin’ But a Good Time: A História Completa e Sem Censura do Hard Rock Anos 80” (Estética Torta, 2022), Spencer Proffer, proprietário do selo/estúdio Pasha Records e produtor responsável por “Metal Health” reivindica o crédito pela regravação que bombou.

“Eu estava dirigindo por Los Angeles e ouvi a versão de ‘Cum On Feel the Noize’ gravada pelo Slade, em 1973, no rádio, numa estação pop. Ela tocou entre ‘Roxanne’, do The Police, e ‘Tainted Love’, do Soft Cell. Mas se destacou das outras. Era um hino do rock participativo. [A letra] convidava as pessoas a participarem. E eu disse: ‘P#ta m3rda. Se eu pudesse encontrar uma banda pra tocar essa música…’. Liguei para todo mundo que conhecia na cidade e me disseram que havia uma banda de nome DuBrow. O líder era um cara chamado Kevin DuBrow. Eles me disseram que ficariam muito felizes em gravá-la.”

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Em 1982, Spencer assistiu a um show do DuBrow e foi até o camarim da banda depois, onde a encheu de elogios. Ele se recorda desse primeiro encontro:

“Fui até o Kevin e fui muito, muito franco. Eu disse: ‘Ei, cara, muito legal o som. Meu nome é Spencer Proffer’. E o Kevin, que era um estudioso do rock, disse: ‘Não foi você que produziu ‘Acid Queen’, da Tina Turner, e a colocou no [longa-metragem] ‘Tommy’?’ Ele conhecia toda a minha história de vida. Eu disse: ‘Se liga – vou te dar um tempo de estúdio. Se você topar gravar uma música que acho que poderia ser um sucesso, gravo três das suas, com tudo pago. Acabei de fechar com a gravadora CBS e acho que posso colocar vocês pra dentro. Que tal?’”

Sem saber que o Quiet Riot havia sido rejeitado por todas as gravadoras, Proffer levou a banda para o estúdio e gravou as quatro primeiras músicas de “Metal Health” num fim de semana.

O tiro que saiu pela culatra

Enquanto para Frankie Banali não havia problema algum em gravar “Cum On Feel the Noize”, para Kevin DuBrow não era bem assim. O baterista comenta:

“Kevin ficou furioso com a ideia. Ele se via como um compositor de mão-cheia. Ele não precisava tocar músicas dos outros.”

Banali e DuBrow cogitaram sabotar a gravação para demover o produtor de sua ideia. Frankie detalha o “plano infalível”:

“Sabíamos que, sem concordar em fazer aquela música, nada seria possível. Então, o que fiz foi dizer ao Kevin: ‘Ouça, temos uma situação potencial aqui em que talvez possamos fazer um álbum, talvez seja lançado, talvez venda algumas cópias. Vamos apenas dizer ao Spencer que vamos gravar a música e, em seguida, não trabalhar nela, não ensaiá-la, não fazer nada. Então, quando chegar o dia de tocar a música, será um desastre. E o Spencer apenas dirá: ‘Vocês já têm essas outras músicas, vamos continuar, esqueçam [‘Cum On Feel the Noize’]’”.

No dia de gravar “Cum On Feel the Noize”, sabendo o que estava para acontecer, Kevin sentou-se num banquinho alto no canto dos fundos do estúdio morrendo de rir. Frankie começou a tocar a introdução de bateria que nunca tinha tocado, e, então, de repente, todos começam a tocar a música… E Spencer acabou adorando. Banali prossegue:

“O Spencer disse: ‘Gente, gostaria que tivéssemos gravado isso!’. E o engenheiro de som diz: ‘Mas eu gravei!’. O Spencer então sai correndo da sala. E, quando ele sai correndo, o Kevin vem do canto, me agarra pelo braço e me arrasta para fora da sala. E pergunta: ‘Que p#rra foi essa?’. Eu respondo: ‘Sei lá, cara. Toquei de qualquer jeito’. Eu nem sabia o que dizer. Ele pergunta: ‘O que eu devo fazer agora?’. Então eu respondo a ele: ‘Bem, você pode estragar tudo cantando mal pra c@ralho’. E eu me virei e fui embora. Porque eu sabia que, na mente do Kevin, ele não se permitiria fazer isso. E não fez e até que cantou muito bem.”

Embora Rudy Sarzo confirme a tentativa de sabotagem, Proffer se recusa a acreditar:

“Eles não tocaram mal. Tocaram muito bem! Eram profissionais. Não avacalharam. Trataram a canção igual trataram ‘Metal Health’ ou algumas das suas outras músicas.”

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O resto é história…

Não obstante as gravadoras não estarem contratando bandas do estilo do Quiet Riot na época, Spencer Proffer partiu para Nova York levando as fitas daquela sessão. Após uma primeira recusa da CBS Records, o produtor apelou para Walter Yetnikoff, presidente da gravadora, que deu sinal verde para que o álbum fosse terminado.

“Metal Health” vendeu seis milhões de cópias somente nos Estados Unidos. Contra todas as probabilidades a banda chegou lá e, em seguida, escancarou a porta para inúmeras outras que seriam ainda mais bem-sucedidas comercialmente.

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Marcelo Vieira
Marcelo Vieirahttp://www.marcelovieiramusic.com.br
Marcelo Vieira é jornalista graduado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso (FACHA), com especialização em Produção Editorial pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Há mais de dez anos atua no mercado editorial como editor de livros e tradutor freelancer. Escreve sobre música desde 2006, com passagens por veículos como Collector's Room, Metal Na Lata e Rock Brigade Magazine, para os quais realizou entrevistas com artistas nacionais e internacionais, cobriu shows e festivais, e resenhou centenas de álbuns, tanto clássicos como lançamentos, do rock e do metal.

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