“OK Computer”, o disco que fez do Radiohead a banda mais importante do mundo

Terceiro álbum de estúdio da banda britânica definiu o fim dos anos 1990 e influenciou do mainstream ao underground

O maior disco da década de 90. Salvadores do rock. Profetas musicais do mundo contemporâneo. 

Podemos falar o quanto quisermos sobre como um disco qualquer é clássico, mas existem poucos álbuns verdadeiramente merecedores da classificação. Obras que não só definiram uma época, mas redefiniram o gênero dali para a frente, tendo uma influência em tudo, do mainstream até o underground.

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“OK Computer”, terceiro lançamento do quinteto inglês Radiohead, é um clássico. E a trajetória do grupo até chegar nesse ponto foi marcada por eles desafiando expectativas e tentativas da indústria de lhes fazer comprometer sua integridade artística.

Radiohead: fora do comum?

O Radiohead foi formado em Oxford em 1985 por cinco amigos de escola – o vocalista e guitarrista Thom Yorke, os guitarristas Ed O’Brien e Jonny Greenwood; o irmão de Jonny, Colin, no baixo, e Phil Selway na bateria – que se reuniam toda sexta-feira para tocar juntos. Inspirados por esse hábito, chamaram o grupo de On a Friday.

O período entre a formação e o lançamento do álbum estreia em 1993 foi marcado principalmente pela busca de identidade normal a qualquer grupo, especialmente um formado por adolescentes. Ed O’Brien contou à Rolling Stone:

“Esses anos nunca pareceram ser pindaíba. Era examinação. E musicalmente estávamos explorando. Começamos na época do ‘The Queen Is Dead’ dos Smiths, essa era. Ao fim desse período, ou no meio dele, tinha os Pixies, Happy Mondays e Stone Roses e todas essas coisas. A gente tentou, não muito bem, tudo isso. Mas ao fazer isso, chegamos a um som. Bolamos o nosso próprio negócio. E foi assim que assinamos com uma gravadora.”

O grupo foi contratado pela EMI sob a condição de mudar o nome para algo melhor. Escolheram Radiohead a partir de uma canção de mesmo nome do disco “True Stories”, do Talking Heads.

Quando “Creep”, primeiro single de seu disco de estreia, “Pablo Honey”, se tornou um hit internacional em 1993, os integrantes do grupo continuamente escutavam de agentes, empresários e gerentes de turnê o quão fora do comum era para uma banda ter sucesso tão rápido. 

Desconforto e autoconfiança

Esse sucesso contribuiu para o Radiohead não dever dinheiro para a gravadora, o que lhes deu mais liberdade para a gravação do segundo disco, “The Bends”. Essa liberdade era, novamente, incomum para uma banda jovem. 

E o grupo se beneficiou disso, uma vez que o processo de composição e gravação de “The Bends” (1995), segundo disco, foi marcado por um ritmo irregular e uma insegurança geral por parte do grupo. O engenheiro de som Nigel Godrich contou à Rolling Stone:

“Eles estavam sob uma pressão intensa. Eles tinham um monte de material, muitas canções boas, e estavam sendo empurrados para uma certa direção. Acho que talvez não quisessem ser o tipo de banda pop que a gravadora queria que fosse. Pessoas da gravadora faziam visitas e rolava desconforto geral.”

Entretanto, esse desconforto acabou revelando a capacidade do grupo de apostar no próprio potencial, como Godrich continua:

“Thom me ligou uns meses depois que eu achei que o álbum estava pronto e pediu se eu poderia gravá-los onde ensaiavam. Fizemos três ou quatro músicas, incluindo ‘Black Star’. Parecia que os adultos estavam longe e que podíamos trabalhar sem restrições. Também ficou muito, muito claro que Thom era um compositor muito, muito talentoso. Eu lembro que ele havia escrito ‘Subterranean Homesick Alien’ enquanto fazíamos ‘The Bends’. Ele ficava sentado ali com o caderninho nos joelhos virando as páginas. Isso não era ‘Anyone Can Play Guitar’. Isso era muito mais contundente.”

“The Bends” saiu em março de 1995 e embora não tenha um single com o mesmo sucesso de “Creep”, foi um sucesso que estabeleceu o grupo como algo além do one-hit wonder previsto por muitos da imprensa musical. Mais ainda, eles agora eram uma banda queridinha da crítica.

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Uma árdua turnê mundial promovendo o álbum tomou a maior parte de 1995 e 1996, um período marcado por um desejo geral de continuar o ímpeto criativo e pelo choque de realidade trazido por uma turnê abrindo para Alanis Morissette em 1996, como Ed O’Brien comentou para a Rolling Stone:

“Aquela turnê era algo importante mesmo. O álbum dela era pop de verdade. Nós tocamos coisas do ‘The Bends’ e ‘Creep’. Ninguém conhecia nada do ‘The Bends’. Conheciam ‘Creep’ porque era um hit no top 40. Então a gente ficou tipo ‘oh….’ Então acabamos só tocando ‘Creep’ e o resto eram canções novas.”

Por mais que o processo de “The Bends” havia sido estressante, o grupo já estava mais interessado no sucessor.

Bora gravar num castelo?

Procurando por um lugar melhor para as gravações do disco após as limitações do espaço de ensaio se mostrarem evidentes, o Radiohead e o agora produtor Nigel Godrich mimaram a si próprios e alugaram St. Catherine’s Court, uma residência da era de Elizabeth I pertencente à atriz Jane Seymour.

Com mais liberdade ainda da gravadora após o sucesso de “The Bends”, o grupo não tinha nenhuma interferência, como Jonny Greenwood resumiu à Rolling Stone:

“Éramos muito privilegiados. Não tínhamos que pensar em nada a não ser comer e fazer música.”

E o disco que saiu dessas sessões é um reflexo disso. Sem nenhuma pressão externa, o grupo conseguiu reagir a tudo à sua volta de maneira livre e experimentar com novas formas de construir uma canção de rock.

Seja nos loops de bateria de “Airbag”, o discurso monótono lido pela ferramenta de voz de um Macintosh em “Fitter Happier”, aos experimentos mais progressivos de “Subterranean Homesick Alien”, “The Tourist” e a canção que combinava a fanfarra de “Bohemian Rhapsody” com as imagens surreais de “Happiness is a Warm Gun” e viria a se tornar uma das canções definitivas do grupo, “Paranoid Android”.

Em entrevista à Q Magazine em 1997, Thom Yorke descreveu a abordagem para compor as letras abstratas do disco:

“Era como se houvesse uma câmera escondida numa sala e estivesse vigiando o personagem que entrasse – um personagem diferente para cada canção. A câmera não é exatamente eu. É neutral, sem emoção. Mas não é sem emoção. Na verdade, o exato oposto.”

Outra inspiração foi o fato de St. Catherine’s Court ser uma casa supostamente assombrada. A sensação de incômodo com forças sobrenaturais afetando o sono dos integrantes mostra-se presente em “Climbing Up the Walls”.

Ceticismo

Contudo, um dos maiores temas presentes em “OK Computer” é um ceticismo geral com relação aos rumos da sociedade. Thom Yorke havia se tornado um leitor ávido de autores como Noam Chomsky e as letras em muitas das canções apontavam uma crítica ácida a movimentos políticos demagogos e principalmente como tudo havia se tornado um mecanismo do capitalismo.

Entretanto, por mais que o tom seja pessimista e grande parte lide com alienação, ainda existe uma ponta de humor perverso a tudo. A inspiração para “Paranoid Android” foi Marvin, o androide depressivo de “O Guia do Mochileiro das Galáxias”, escrito por Douglas Adams. O nome do disco foi também retirado de uma fala solta da adaptação de rádio dos livros.

O senso de alienação do Radiohead era reminiscente da maior influência criativa do grupo, o Talking Heads, que sempre soube inserir humor seco às observações sobre o vazio do mundo moderno. Os britânicos continuaram essa escola.

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Radiohead reinventa o rock

Quando o grupo entregou o disco finalizado para a gravadora, a reação dessa foi reduzir as expectativas de vendas por quase 75%. Apenas o selo britânico do grupo, Parlophone, parecia entusiasmado com o material. Nenhum outro distribuidor via um single radiofônico como “Creep”.

Colin Greenwood explicou à revista Select em julho de 1997 por que o grupo não esperava um sucesso esmagador:

“‘OK Computer’ não é o disco com que iremos conquistar o mundo. Não é tão ‘acertando tudo com força pra fazer barulho balançando a língua’, que nem ‘The Bends’. Tem menos do fator Van Halen.”

Apesar de distribuidoras pelo mundo consideraram o disco suicídio comercial e essa previsão morna do baixista, “OK Computer” estreou em primeiro lugar nas paradas britânicas e em 21º nos Estados Unidos. Ao fim de 1997, era o disco mais vendido do ano no Reino Unido e foi indicado ao Grammy de Álbum do Ano.

Em relação à reação do público, Thom Yorke contou à revista Select em dezembro de 1997 o quanto ficou surpreso:

“Fiquei maravilhado com a reação que teve. Nenhum de nós tínhamos a menor ideia se era bom ou ruim. O que explodiu minha cabeça foi que as pessoas entenderam tudo, todas as texturas e os sons e atmosferas que estávamos tentando criar.”

Desde seu lançamento, “OK Computer” se tornou figura cativa em listas de melhores discos da década de 1990 e da história do rock, geralmente em uma posição alta. Seu impacto é sentido até hoje em gerações de músicos procurando expandir os horizontes do que uma canção de rock pode ser.

Nada de inércia

Enquanto isso, o Radiohead não permaneceu parado. Em reação à primeira leva de bandas diluindo seu som, o grupo decidiu em seu lançamento seguinte dar um passo além.

Lançado em 2000, “Kid A” fez o mundo precisar recalibrar noções de gênero musical, tamanha era a influência da música eletrônica e a ausência de guitarras tradicionais. O público foi junto e a crítica também, e o disco foi um sucesso.

Alguns trabalhos depois, em 2007, não satisfeitos com revolucionar a música em termos criativos, o Radiohead resolveu introduzir uma nova maneira de monetizar música. O álbum “In Rainbows” foi lançado digitalmente num esquema de pagar o que quiser, hoje prevalente em plataformas digitais como o Bandcamp. Apesar de protestos de artistas e escárnio da indústria musical, foi o lançamento que mais rendeu dinheiro à banda até então.

Ao todo, o Radiohead lançou cinco discos desde “OK Computer”. O mais recente, “A Moon Shaped Pool”, saiu em 2016 e foi sucesso de público e crítica.

Em 2022, não se sabe se o grupo continuará a lançar discos. Em maio deste ano, um projeto paralelo chamado The Smile, formado por Thom Yorke, Jonny Greenwood e o baterista Tom Skinner, lançou seu disco de estreia, “A Light for Attracting Attention”. O trabalho mostra que a chama criativa dos integrantes continua queimando com força.

A chama de “OK Computer” queima com a mesma intensidade 25 anos após seu lançamento. Um verdadeiro clássico.

Radiohead – “OK Computer”

  • Lançado em 21 de maio de 1997 pela Parlophone / Capitol, com produção de Nigel Godrich e Radiohead.

Faixas:

  1. Airbag
  2. Paranoid Android
  3. Subterranean Homesick Alien
  4. Exit Music (For a Film)
  5. Let Down
  6. Karma Police
  7. Fitter Happier
  8. Electioneering
  9. Climbing Up the Walls
  10. No Surprises
  11. Lucky
  12. The Tourist

Músicos:

  • Thom Yorke (vocal, guitarra, teclados)
  • Jonny Greenwood (guitarra, teclados)
  • Philip Selway (bateria)
  • Ed O’Brien (guitarra)
  • Colin Greenwood (baixo)

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Pedro Hollanda
Pedro Hollanda
Pedro Hollanda é jornalista formado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso e cursou Direção Cinematográfica na Escola de Cinema Darcy Ribeiro. Apaixonado por música, já editou blogs de resenhas musicais e contribuiu para sites como Rock'n'Beats e Scream & Yell.

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