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Rafael Bittencourt fará laudo técnico para apoiar processo de plágio contra Adele

Guitarrista do Angra fica a cargo de análise que sustenta acusação de Toninho Geraes, compositor de “Mulheres” (Martinho da Vila)

Um nome conhecido dos fãs de heavy metal no Brasil será o autor do laudo técnico que apoia a acusação do compositor Toninho Geraes contra a cantora Adele. Rafael Bittencourt, guitarrista do Angra e bacharel em Composição Musical e Regência pela Faculdade Santa Marcelina, avalia que “Million Years Ago”, faixa creditada à cantora britânica junto ao produtor Greg Kurstin e lançada no álbum “25” (2015), é plágio de “Mulheres”, criação de Geraes célebre na voz de Martinho da Vila ainda na década de 1990.

De acordo com o jornal O Globo, o documento foi encomendado por Deborah Sztajnberg, advogada de Toninho. Em entrevista ao veículo de comunicação, Bittencourt disse que “existem muitas coincidências para que tudo não passe de pura coincidência”. Apontou, ainda, que “as duas obras podem ser executadas simultaneamente sem cacofonia, sem macular a harmonia, a ideia rítmica ou a melodia”.

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Ele explica:

“Imagine que eu peça para várias pessoas desenharem um trem com uma locomotiva e sete vagões, representando a regra dos oito compassos musicais. Os vagões podem ter tamanhos diferentes. E cada um deles deve ter pelo menos quatro camadas com texturas e cores diferentes. Qual a chance de duas pessoas, no mundo todo, desenharem praticamente o mesmo trem?”

A defesa de Adele alega que a composição utiliza um clichê musical conhecido como Progressão de Acordes pelo Círculo de Quintas — sequência de notas distanciadas por intervalos de quinta justa. Rafael, porém, rechaça o argumento ao defini-lo como uma “tentativa desesperada de defender uma coincidência quase exata”. Por outro lado, não acredita que a cópia tenha ocorrido por má-fé, pois é normal que músicos fiquem com melodias já ouvidas previamente em suas mentes.

“Eu já tive ideia de música que depois descobri que era um sucesso da Turquia que tinha ganhado uma versão no Brasil e provavelmente ficou na minha cabeça.”

Também ao jornal O Globo, Deborah Sztajnberg explicou os critérios para escolha de Rafael Bittencourt para o laudo. O texto aponta:

“Ela [Deborah] queria que o autor do laudo não fosse sambista, como seu cliente, para evitar acusações de coleguismo; que fosse uma pessoa reconhecida internacionalmente; que dialogasse com a música popular e, ao mesmo tempo, tivesse uma sólida formação clássica.”

Adele vs. Toninho Geraes

A Justiça do Rio de Janeiro ordenou em dezembro que “Million Years Ago”, música lançada por Adele no álbum “25” (2015), seja retirada das plataformas digitais e só seja reproduzida ou comercializada sob autorização de Toninho Geraes. A decisão, que cabe recurso, foi tomada em meio ao processo de plágio movido pelo brasileiro, compositor do hit “Mulheres”, gravada por Martinho da Vila.

Caso a determinação não seja seguida, será aplicada uma multa de R$ 50 mil. Apesar da exigência de suspensão imediata, a canção segue disponível em streaming.

O juiz Victor Agustin Cunha, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, indicou que “Million Years Ago” teria forte indício “da quase integral consonância melódica” com “Mulheres”, gravada por Martinho da Vila em 1995, no disco “Tá Delícia, Tá Gostoso”. Especialistas analisaram ambas as composições.

Toninho Geraes acusou Adele publicamente de plágio em setembro de 2021. Quase três anos depois, ingressou de forma oficial com um processo contra a artista, além do produtor e co-autor Greg Kurstin, as gravadoras Universal Music Publishing MGB Brasil Ltda e Sony Music Entertainment Brasil Ltda e o selo Beggars Group.

O compositor pede R$ 1 milhão de indenização. Em declaração à Folha, o advogado Fredímio Trotta declarou ter tentado um acordo extrajudicial. Sem sucesso, decidiu por ingressar com uma ação. Além disso, ele alega que as companhias disseram não ter responsabilidade sobre a composição da obra, apenas sobre sua distribuição.

O que diz a defesa

A Universal Music apresentou recurso visando derrubar a liminar que vetou a execução de “Million Years Ago”. A empresa defende que a faixa “não viola direitos autorais”, conforme “atestado por dois pareceres independentes”, e que “as semelhanças entre as duas obras se devem, em essência, ao fato de diversas músicas utilizarem um clichê musical conhecido como Progressão de Acordes pelo Círculo de Quintas [nota: sequência de notas distanciadas por intervalos de quinta justa]”.

Um trecho da defesa afirma:

“A concessão da liminar é desproporcional e provoca dano inverso aos Réus, uma vez que a suspensão imediata de ‘Million Years Ago’ acarretará prejuízos econômicos significativos e comprometerá a liberdade artística dos envolvidos, especialmente considerando a popularidade e o impacto cultural de suas produções.”

Entenda a acusação

Em documentos obtidos pela revista Veja ainda no ano de 2021, o brasileiro alega que as notas da introdução de “Mulheres” seriam repetidas em vários momentos da música de Adele. A avaliação feita por Toninho Geraes aponta que 88 compassos, quase 90% da canção completa, teria sido reproduzida em “Million Years Ago”.

À revista, Geraes se limitou a dizer:

“Fiquei estarrecido quando me dei conta. A melodia e a harmonia são iguais. É uma cópia escancarada.”

Acusações de plágio são mais comuns do que se imagina, mas há uma coincidência neste caso. A mesma música de Adele já foi comparada com outras duas composições: uma lançada pelo turco Ahmet Kaya, chamada “Acilara Tutunmak”, e “Hay Amores”, gravada por Shakira em 2007.

Caso essas alegações também sejam provadas, similaridades com outras faixas podem ter sido descobertas. E mal dá para saber quem teria copiado quem, já que a composição de Kaya, lançada em 1985, é mais antiga que todas as outras.

O advogado de Toninho Geraes, Fredímio Biasotto Trotta, apontou ao jornal O Estado de S. Paulo que a decisão é mundial, não apenas nacional, e “inédita na história da música brasileira por ser proferida no início do processo e em um caso de plágio internacional”. Vale lembrar que Jorge Ben Jorvenceu uma ação do tipo contra Rod Stewart, porém, décadas atrás — ou seja, quando ainda não existiam plataformas de streaming — e sem uma deliberação similar logo de cara.

Ainda de acordo com Trotta, um vídeo publicado em seu canal no YouTube se mostrou, em sua visão, como “a maior prova de plágio trazida até agora ao processo”. Trata-se de um registro onde um grupo de músicos, incluindo a cantora Ju Vianna, interpreta de forma simultânea “Million Years Ago” e “Mulheres”, visando sobrepor as composições. Segundo o advogado, a ideia da versão — que adequa tom e ritmo — é “eliminar alguns dos disfarces composicionais ou interpretativos dos responsáveis pelo plágio”.

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Igor Miranda
Igor Miranda
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com pós-graduação em Jornalismo Digital. Escreve sobre música desde 2007. Além de editar este site, é colaborador da Rolling Stone Brasil. Trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, revista Guitarload, jornal Correio de Uberlândia, entre outros. Instagram, Twitter e Facebook: @igormirandasite.

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