A primeira e única passagem do Nirvana pelo Brasil, em janeiro de 1993, entrou para a história — principalmente no primeiro show, no Estádio do Morumbi, em São Paulo. O problema é que não foi da melhor forma possível.
Com status de maior banda do planeta naquele período, o trio formado por Kurt Cobain (voz e guitarra), Krist Novoselic (baixo) e Dave Grohl (bateria) chegou ao país no posto de headliner do festival Hollywood Rock, que aconteceu também no Rio de Janeiro. Contudo, foi o público paulista que teve o privilégio (?) de encarar um Kurt Cobain completamente chapado no palco.
À época, o grupo vivia o auge da loucura e da insatisfação com a fama. Cobain teve acesso a comprimidos de Valium no hotel em São Paulo e quando os músicos entraram no palco, foram recebidos por mais de 80 mil pessoas.
O desespero começou quando Cobain puxou o riff da primeira música do set, “School”, tocando bem mais lento do que o normal. A situação não melhorou a partir dali.
O baterista Dave Grohl relembrou sua reação em entrevista para a edição 323 (fevereiro de 2024) da revista Classic Rock:
“Krist (Novoselic, baixista) e nos olhamos tipo: ‘P#ta m$rda! O que vai acontecer?’ Foi meio assustador. E como o Nirvana sempre fazia, de alguma forma nós conseguimos sabotar o show.”
A apresentação no Morumbi entrou para a história como uma das piores já feitas na história do Nirvana e de um artista internacional no Brasil. Krist Novoselic chegou a jogar o baixo longe e abandonar o palco com meia hora de show, mas foi convencido pelo tour manager Alex MacLeod a voltar por questões contratuais. Nem afinou o baixo, pois sabia o que estava por vir.
Nirvana e os covers
Em determinado momento do show, o trio embarcou em uma sequência de covers que só tornou a situação pior do que já estava. “Run to the Hills” (Iron Maiden), “Heartbreaker” (Led Zeppelin) e “We Will Rock You” (Queen), foram parcialmente “assassinadas” por uma banda que não se entendia no palco. O Nirvana ainda resolveu trocar os instrumentos: Kurt Cobain foi para a bateria, Dave Grohl assumiu o baixo e Krist Novoselic seguiu para a guitarra.
Clássicos do Duran Duran, The Clash e outros foram tocados do jeito que dava — o que levou alguns fãs a começarem a deixar o Morumbi. Acabaram perdendo um dos momentos mais interessantes da apresentação: a execução de duas canções inéditas.
Gestação de “In Utero”
“In Utero”, último álbum do Nirvana, seria lançado em setembro daquele ano. Durante a passagem pelo Brasil, o grupo já trabalhava nele.
A intenção era clara: uma volta às origens, com uma sonoridade mais crua e raivosa, algo que Kurt Cobain sentia que estava perdendo por conta do sucesso do trabalho anterior, o aclamado “Nevermind” (1991).
Ainda à Classic Rock, Dave Grohl ofereceu um panorama de como a banda pensava no novo álbum:
“Ninguém sabia que tipo de álbum nós faríamos a seguir. Mas na época em que fomos ao Brasil, começou a ficar claro que não seria o pop açucarado de ‘Nevermind’. Seria mais dark, mais dissonante e barulhento. Tenho quase certeza de que a gravadora queria nós recriássemos ‘Nevermind’ porque seria uma forma segura de vender mais 30 milhões de discos. Mas é claro que não íamos fazer isso.”
O fato é que o público de São Paulo ganhou de presente as primeiras execuções ao vivo de “Heart-Shaped Box” e “Scentless Apprentice”, futuras faixas de “In Utero”, que fecharam o show. Elas também foram tocadas no Rio de Janeiro, onde a banda chegou a gravar demos em um estúdio.
Tudo (quase) tranquilo no Rio de Janeiro
Para o show no Rio de Janeiro, uma semana depois da apresentação em São Paulo, muita coisa mudou. Kurt Cobain brigava muito com Courtney Love na época e ameaçava tirar a própria vida ali mesmo, o que fez com que fosse colocado em um hotel com apenas um andar.
Ao vivo, o frontman estava em um estado bem melhor e a sequência catastrófica de covers foi quase toda retirada do setlist. A banda tocou com vontade e mesmo com uma quantidade considerável de piadas tirando sarro da marca de cigarros que patrocinava o festival, a conexão entre artista e público foi forte.
O momento mais memorável da noite, contudo, foi quando o líder do Nirvana cuspiu na lente da câmera da Globo, que transmitia ao vivo o festival. Em seguida, Cobain simulou o ato de masturbação.
Nada particularmente chocante no contexto da história do rock, mas o comportamento do grupo depois viria a ser alvo do tradicional ultraje da ala mais conservadora da sociedade brasileira.
A infâmia da apresentação em São Paulo e a passagem deles pelo país como um todo pode ser caracterizada de diversas maneiras. Em uma entrevista para a Folha de S. Paulo no dia seguinte ao concerto na capital paulista, o baixista Krist Novoselic descreveu a noite anterior como “um show de desconstrução de imagem do grupo”. Talvez esteja correto.
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Voce postou que don t damn me nunca foi tocada pelo Guns ? A ouvi em auto e bom som em 12/12/92 no show do Anhembi SP onde estava bem na frente do Slash
Oi, Marco. Dentro dos registros que temos, a música nunca foi tocada pelo Guns N’ Roses ao vivo.