Quando Roberto Carlos e Tim Maia se ajudaram em “Não Vou Ficar”

Roberto, já “rei”, queria se afastar do repertório romântico e gravou composição de Tim, que buscava lançar sua carreira musical após tentativas fracassadas; deu certo para os dois

Tim Maia e Roberto Carlos são duas das maiores figuras da música popular brasileira, mas antes mesmo de serem famosos, eram amigos de longa data. Em 1957 cantaram juntos no grupo vocal The Sputniks, que se apresentou na TV Tupi no programa “Clube do Rock”, de Carlos Imperial. 

Após a apresentação, Roberto procurou Imperial para tentar marcar uma apresentação solo no programa. Tim descobriu e a briga entre os dois foi tão feia que o grupo acabou sendo desfeito. Cada um por si, ambos promovidos por Imperial. 

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Entretanto, em 1959, os dois começaram a trilhar caminhos bem diferentes quando Tim foi para os Estados Unidos, onde permaneceu por alguns anos. O cantor lá fez parte do grupo The Ideals, mas ainda assim passou muito perrengue, como conta um artigo do New Yorker:

“Suas condições de vida não eram boas – ele dormia em sofás de amigos e uma mulher da vida o acolheu por um tempo; e sua ambição, baseada numa paixão por soul music americana e seu conhecimento de bossa nova, parecia quixotesca no melhor dos casos.”

Jovem Guarda

Enquanto Tim estava nos EUA, Roberto aos poucos se tornou o rosto da cultura jovem no Brasil. Graças a seus discos e ao programa de TV “Jovem Guarda”, o cantor se tornou sinônimo do fenômeno da música chamado por aqui de iê-iê-iê. 

Maia, por sua vez, havia sido deportado em 1964 após um período de seis meses na cadeia. Voltou ao Brasil e viu todo mundo que conhecia se dando bem, como escreveu Nelson Motta no livro “Vale Tudo – O Som e a Fúria de Tim Maia”:

“O Rio de Janeiro não era mais a capital, o presidente era um general, o sonho da volta de JK tinha ido pro espaço, o poder estava nas mãos dos militares em Brasília. E ninguém queria mais saber de bossa nova. Roberto, Erasmo e Jorge não iam mais ao Divino. Estavam estourando nas rádios com ‘Parei na Contramão’, ‘Mas Que Nada’ e ‘Festa de Arromba’, tinham se mudado para São Paulo e faziam sucesso na televisão.”

Os amigos famosos tentavam ajudar, mas a fama não vinha para Tim, seja por sua fama de problema ou pela percepção de sua música ser demais para as meninas provincianas que assistiam à Jovem Guarda. Maia tinha amigos na indústria dispostos a gravar suas canções, mas o sucesso não vinha de jeito nenhum.

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Com o passar do tempo, Roberto se viu em uma encruzilhada. Cansado da música que o fez famoso, ele queria se aventurar por material mais ousado, menos romântico. Auspiciosamente, foi quando Tim o abordou. O cara certo, na hora certa, mas com a música errada.

Faça isto que eu gravo

Tim Maia sabia que o caminho para o ouvido de Roberto Carlos era sua mulher, Nice. Ela já havia o ajudado antes a se reconectar com o rei, o que lhe conseguiu a desastrosa aparição no programa “Jovem Guarda”. Dessa vez, Maia vinha armado de um futuro clássico escrito por ele para Eduardo Araújo, “Você”. 

A versão de Araújo havia ficado aquém das expectativas de Tim, por considerar a voz e o estilo do cantor “selvagens demais” para uma canção tão sensível. A voz ideal para a música era a de Roberto, e Maia conseguia imaginar – além do arranjo de metais acompanhando o rei – o sucesso e o dinheiro subsequentes.

Nice adorou a música, que era perfeita para o marido, mas Roberto queria algo diferente. Estava cansado de ser o cantor romântico, queria ser impiedoso. E mesmo recusando gravar “Você”, o rei fez um desafio ao amigo de longa data, como contou Paulo César de Araújo no livro “Roberto Carlos em Detalhes”:

“Tião, faça uma música sobre um cara que não quer mais ficar com a menina. Eu preciso de um tema deste para o meu próximo disco. Faça isto que eu gravo.”

O cara certo para “Você” a recusou porque queria algo completamente diferente. Algo que soasse como Eduardo Araújo, o cara errado.

Furioso com a negativa, mas determinado a cumprir o pedido, Tim no dia seguinte compôs “Não Vou Ficar” e a entregou na mesma semana.

A canção se tornou um dos maiores destaques do disco homônimo do rei lançado em 1969. Ajudou a simbolizar uma guinada para longe do iê-iê-iê em favor de uma sonoridade combinando soul com música popular brasileira.

Maia finalmente se viu validado como compositor e o sucesso de “Não Vou Ficar” abriu-lhe as portas para ser o cara que sempre quis ser: o síndico.

No ano seguinte, ele assinou contrato com a gravadora Polydor e lançou seu primeiro álbum, com os hits “Primavera” e “Azul da Cor do Mar”. “Não Vou Ficar” foi regravada por ele, em uma versão ainda mais audaciosa, em 1971.

* Texto por Pedro Hollanda, com pauta e edição por Igor Miranda.

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Pedro Hollanda
Pedro Hollanda
Pedro Hollanda é jornalista formado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso e cursou Direção Cinematográfica na Escola de Cinema Darcy Ribeiro. Apaixonado por música, já editou blogs de resenhas musicais e contribuiu para sites como Rock'n'Beats e Scream & Yell.

3 COMENTÁRIOS

  1. Essas músicas do Robertão sempre lembra do meu falecido Pai!!!! Cresci ouvindo Roberto Carlos, Beatles, john lennon, José augusto, Renato blue e seu blue caps…bons tempos de antigamente!!!! Essa fase roqueira, infelizmente hoje em dia Roberto tenta não lembrar mais, essa é a verdade…fase boa era essa dele no rock!!!! valeu

  2. Adorei conhecer essa história.
    Quando encontro essas histórias de bastidores não consigo parar de ler até chegar ao fim.
    Valeu

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