Como o Slayer fez nascer o clássico “Reign in Blood” junto de um produtor de hip hop

Antes de ser associado ao rock e metal, Rick Rubin fundou a Def Jam, uma gravadora de rap; parceria deu certo e rendeu álbum histórico

O Slayer fez vários álbuns importantes para o thrash metal, mas dificilmente algum deles foi mais impactante do que o terceiro de sua discografia. Lançado em 1986, um dos anos mais prolíficos da história do gênero, “Reign in Blood” trazia um diferencial na comparação com obras de bandas de Metallica ou Megadeth na época: a produção de Rick Rubin, um cara que veio do hip hop.

Hoje em dia é fácil associar Rubin ao Slayer e a outras grandes bandas de rock – como o próprio Metallica, já que ele produziu “Death Magnetic” (2008), mas, na época, as coisas eram diferentes. No início da década de 1980, o profissional de estúdio fundou, ainda enquanto era estudante, o selo Def Jam Records, criado inicialmente para lançar material das bandas de hardcore das quais fazia parte.

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Isso mudaria a partir de meados de 1984, quando o produtor afastou-se do punk e migrou para o hip hop. Ao mudar-se para Nova York, envolveu-se com o DJ Jazzy Jay, que apresentou muito da cena local do estilo para ele. Com o tempo, passou a contratar artistas de rap fora de áreas mais convencionais da cidade, como o Bronx e o Harlem.

Rick Rubin, hip hop e elo com rock

Em meio a essas buscas por artistas em locais menos tradicionais, Rick Rubin encontrou nomes como Public Enemy e Run-DMC, contratados pela Def Jam e com álbuns produzidos pelo profissional. Como era um roqueiro de carteirinha, Rubin sempre trazia bases de guitarra e certo peso à sonoridade dos rappers com quem trabalhava – herança direta de seus tempos no hardcore.

Foi nesse período, inclusive, em que Rick produziu a famosa colaboração do Run-DMC com o Aerosmith. Em 1985, os artistas regravaram a música “Walk This Way”, que estourou nas paradas. O grupo de hip hop ficou mais popular, a banda de rock voltou a ser falada após muitos anos e o produtor, enfim, conquistou certa notoriedade no meio.

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Parecia um sinal para que Rubin voltasse a se envolver com rock. Inquieto, ele foi além e começou a trabalhar com uma pouco convencional banda de thrash metal de Los Angeles.

Slayer e “Reign in Blood”

Rick Rubin conheceu o Slayer após um show da banda no The Ritz, em Nova York. O produtor estava interessado em trabalhar com o grupo, porém, Tom Araya (voz e baixo), Jeff Hanneman (guitarra), Kerry King (guitarra) e Dave Lombardo (bateria) ficaram receosos com o currículo do profissional, muito focado nos artistas de hip hop da Def Jam Records.

Em entrevista a Metal Hammer, Araya relembrou a primeira impressão que teve de Rubin. Mais do que a vontade, o produtor tinha o subsídio da gravadora Columbia Records para trabalhar com a banda – algo que, certamente, ajudou o Slayer a ceder sobre trabalhar com alguém do hip hop.

“Era um pouco estranho, mas sabíamos que ele era um fã e isso era tudo. E tivemos muita sorte: aqui está esse cara que tem uma porrada de dinheiro de grandes gravadoras e ele é um fã e quer trabalhar com a gente. Não dá pra ficar melhor do que isso.”

Acertados os detalhes, a banda foi para o Hit City West Studios, onde a mágica aconteceu. “Reign in Blood” é um daqueles álbuns que já nascem clássicos – e embora Rubin e a banda não falassem a mesma língua no início, as coisas foram se ajeitando com o tempo.

Também à Metal Hammer, o produtor também relembra algumas dificuldades iniciais:

“O que mais me surpreendeu foi que Jeff e Kerry sabiam quais solos estavam bons e quais não estavam, porque naquela época, nenhum dos solos fazia sentido para mim. Era como se eles estivessem falando uma linguagem musical diferente do resto do mundo.”

“Angel of Death” e perrengues finais

Quando “Reign in Blood” ficou pronto, havia, ao todo, pouco mais de 28 minutos de música. Na época, por contrato, um álbum deveria ter pelo menos 45 minutos de duração, o que fez o Slayer se preocupar com o que Rick Rubin e a gravadora iriam dizer.

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Para o produtor, estava tudo dentro das regras, como relembra Tom Araya:

“Perguntei a Rick se isso era ok. Sua única resposta sobre isso foi: ‘são 10 músicas, que constituem um álbum – tem versos, solos e refrãos’. Ele não teve problemas com isso, o que foi realmente legal.”

A Columbia Records acabou “encrencando” com outro detalhe do álbum: a música de abertura, “Angel of Death”. Hoje clássica, a faixa que fala sobre os experimentos conduzidos na Segunda Guerra Mundial pelo médico nazista Josef Mengele. De origem judaica, o presidente da gravadora, Walter Yetnikoff, sentiu-se ofendido com a canção e pediu que ela fosse removida.

Entra, novamente, a sagacidade de Rick Rubin, que resolveu procurar outra gravadora interessada em lançar “Reign in Blood”. Usando como portfólio o catálogo de hip hop da Def Jam, o produtor conseguiu atrair a atenção da Geffen, em um contrato muito mais vantajoso para todos – afinal, a Columbia já havia bancado todo o trabalho.

“Reign in Blood” marcou o início de uma parceria duradoura entre Slayer e Rick Rubin, o que levou Rubin de volta ao rock. Um dos clássicos intocáveis do thrash metal deve muito ao hip hop da Def Jam Records.

* Texto desenvolvido em parceria por André Luiz Fernandes e Igor Miranda. Pauta e edição geral por Igor Miranda; redação e apuração adicional por André Luiz Fernandes.

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André Luiz Fernandes
André Luiz Fernandes
André Luiz Fernandes é jornalista formado pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP). Interessado em música desde a infância, teve um blog sobre discos de hard rock/metal antes da graduação e é considerado o melhor baixista do prédio onde mora. Tem passagens por Ei Nerd e Estadão.

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