Por que o Metallica mudou tanto no contestado álbum “Load”

Grupo passou a ter maior ambição por mudanças, o que refletiu em afastamento do metal para mergulhar de vez no hard rock

A década de 1990 é lembrada como uma época de terror para os fãs mais conservadores do Metallica. Muito disso ocorre por causa do polêmico álbum “Load”, lançado em 4 de junho de 1996.

Ainda em 1991, com o lançamento do “Black Album”, as mudanças na banda já eram evidentes. O trabalho se afasta do thrash metal e aproxima-se do hard rock, no embalo de hits como “Enter Sandman”, “Sad But True” e “Nothing Else Matters”.

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Contudo, foi em “Load” que o Metallica ficou um pouco mais “irreconhecível”. Aqui, a banda também adotou alguns padrões inéditos: é o disco mais longo da carreira do grupo, com 79 minutos de duração, além de ser o primeiro a contar com apenas três integrantes assinando as composições, deixando de fora Jason Newsted – o baixista chegou a contribuir em “My Friend of Misery”, do registro anterior, e até mesmo na sua estreia com a banda, em “Blackened”, do álbum “…And Justice For All” (1988).

O formato com três compositores voltaria a se repetir apenas no mais recente, “Hardwired… To Self-Destruct” (2016). Neste caso, porém, foi o guitarrista Kirk Hammett quem não assinou nenhuma música.

A mistura em “Load”

Em “Load”, o vocalista e guitarrista James Hetfield e o baterista Lars Ulrich tomaram as rédeas ao lado de Kirk Hammett. O trio foi encorajado pelo produtor Bob Rock a experimentar cada vez mais com novos estilos e influências.

Desse modo, o que se ouve no trabalho é uma evolução do que foi iniciado no “Black Album”, mas de forma mais eclética, mostrando que o Metallica estava atento ao que estava acontecendo em sua volta. O hard rock já apresentado no “Black Album” ganhou contornos diferentes, com influências do southern rock e até do country, além de estilos mais alternativos.

Nas letras, Hetfield foi ainda mais fundo nos temas introspectivos do álbum anterior e revirou temas como a morte de sua mãe e os vícios. Até mesmo o trauma mais importante da banda, a perda do baixista Cliff Burton em 1986, é explorado em “The Outlaw Torn”.

É claro que a diferença foi notada e a recepção não foi unânime. Entretanto, tudo indica que a banda já estava preparada para isso enquanto trabalhava no disco.

Em entrevista à Rolling Stone, em 1996, Lars Ulrich deixou claro que esse ponto era motivo de debate dentro do Metallica. Só que, no fim das contas, eles não estavam tão preocupados com isso.

“Esse álbum e o que estamos fazendo com ele – isso, para mim, é sobre o que é o Metallica: explorar coisas diferentes. No minuto em que você para de explorar, então apenas sente-se e espere a morte. Às vezes, entramos nisso: ‘isso é Metallica?’. Mas eu digo ‘James, se eu e você fizermos, isso é Metallica, ponto final.’”

O visual do Metallica

É importante ressaltar que muitas críticas feitas a “Load” não estão necessariamente ligadas à música. A mudança visual pela qual o Metallica passou nessa época, provavelmente, foi mais drástica do que a sonora.

Os integrantes adotaram cabelos curtos, roupas “estilosas” e até maquiagens em algumas sessões de fotos. De fato, não parecia a mesma banda que gravou “Kill ‘em All” (1983).

Foto: divulgação

Kirk Hammett, em especial, adotou maquiagem e os figurinos mais espalhafatosos do grupo. Houve quem tenha se doído por uma das fotos da época, onde o guitarrista aparece dando um beijo em Lars Ulrich.

O baterista falou à Metal Hammer em 2016 sobre essas impressões que chocaram os fãs mais conservadores da banda. Aparentemente, esse sempre foi o objetivo: mexer com o lado mais “dogmático” do metal, algo que o grupo sempre fez.

“Foi como um grande ‘f**a-se’. Não pra os fãs, mas para o elemento mais conservador que estava rondando a comunidade heavy metal, a previsibilidade de tudo isso. Foi um desafio para a comunidade heavy metal e eu tenho orgulho disso, porque, de vez em quando, a comunidade heavy metal precisa de um bom chute na bunda.”

Na mesma entrevista, James Hetfield mostrou que a mudança visual não foi unânime nem mesmo dentro da banda. O frontman não parece incomodado com o resultado final em si, mas considera que foi feita uma tentativa de evolução que não parecia natural, o que acabou causando mais incômodo.

“Estávamos tentando ser algo que não éramos e isso nos confundiu ainda mais musicalmente. Existem algumas boas canções ali que poderiam ter sido ainda melhores se a capa e as fotos fossem diferentes, eu acho. Muitos fãs se afastaram da música, mas a maioria, eu acho, da imagem. Não funciona. Você absolutamente tem que evoluir, mas vamos evoluir naturalmente. Não parecia natural para mim.”

O controverso resultado

A crítica e o público mais fiel – e até a própria banda – se dividiram em relação ao que achavam de “Load”. Todavia, em vendas, o trabalho foi um sucesso absoluto.

Em 15 países, o álbum atingiu o primeiro lugar, incluindo Estados Unidos, Reino Unido, Austrália, França, Alemanha, Portugal e Suécia. Foram 4 semanas no topo da Billboard e o melhor lançamento inicial até hoje de um álbum do Metallica, bem como de todo o ano de 1996.

As quatro músicas promovidas como singles retratam bem a sonoridade do disco como um todo. “Until It Sleeps”, “Mama Said”, “Hero of the Day” e “King Nothing” foram tocados a exaustão e ajudaram “Load” a ganhar disco quíntuplo de platina nos Estados Unidos, por atingir 5 milhões de cópias vendidas no país.

A fórmula foi mantida, de certa forma, no lançamento do ano seguinte, “Reload”, que não obteve o mesmo êxito comercial e dividiu ainda mais a crítica. Os dois discos são diretamente relacionados não só pelo título: a ideia inicial era de que “Load” fosse um disco duplo, com “Reload” sendo sua segunda parte.

Há quem considere “Load” mais inspirado que “Reload”, classificado por muitos como um trabalho de sobras. Fato é que os dois apontaram, de diversas formas, um caminho sem volta para o Metallica.

* Texto desenvolvido em parceria por André Luiz Fernandes e Igor Miranda. Pauta, edição geral e argumentação-base por Igor Miranda; redação geral, argumentação e apuração adicional por André Luiz Fernandes.

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André Luiz Fernandes
André Luiz Fernandes
André Luiz Fernandes é jornalista formado pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP). Interessado em música desde a infância, teve um blog sobre discos de hard rock/metal antes da graduação e é considerado o melhor baixista do prédio onde mora. Tem passagens por Ei Nerd e Estadão.

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