A história de “Riot Act”, álbum do Pearl Jam influenciado por tragédias

Morte de fãs durante show no festival de Roskilde e os atentados de 11 de setembro moldaram sétimo disco da banda de Seattle

Como bandas continuam após tragédias em shows? Qual a motivação por parte dos músicos a voltar a tocar e criar quando o mundo parece estar acabando? O Pearl Jam se viu tendo que responder a essas questões em 2001.

O período marcou os integrantes de modo que eles se viram diantes de tragédias ocorrendo não somente no âmbito de seus shows, mas também no mundo em geral. Foi assim que nasceu o álbum “Riot Act”.

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O legado do rock clássico que ninguém gosta

Tragédias em shows parecem seguir de mãos dadas com grandes artistas da história do rock. Os Rolling Stones têm Altamont. O The Who tem o incidente na cidade de Cincinnati onde 11 fãs foram pisoteados em 1979.

O Pearl Jam teve Roskilde em 2000. Durante um show no festival dinamarquês, ao fim da turnê europeia do disco “Binaural”, nove fãs foram pisoteados em meio à plateia. A banda chegou a parar de tocar e implorar ao público para abrir caminho, mas o socorro não chegou a tempo.

Numa entrevista ao Seattle Weekly em novembro de 2002, Eddie Vedder discutiu o efeito da tragédia no grupo.

“Nos dias logo após, estávamos inconsoláveis. Tenho certeza que as famílias e amigos passaram por um período ainda pior que o nosso. Mas nossa experiência pessoal foi que estávamos praticamente em posição fetal devido à realidade do que havia acontecido.”

Vedder disse que Pete Townshend e Roger Daltrey ambos o contataram, tendo passado pela mesma situação com o The Who.

“Pete e Roger do The Who ambos ligaram, e a única pergunta que eu tinha pro Pete era: ‘O que isso significa carmicamente? Por que isso aconteceu com a gente, uma vez que sempre trabalhamos muito para manter as pessoas indo aos nossos shows seguras?’ Porque sempre foi segurança e respeito para nossos fãs acima de tudo. E ele virou a questão de ponta cabeça: ‘Talvez tenha acontecido com vocês porque conseguem lidar com isso’.”

Pausa para o fim do mundo

Um jeito encontrado pelo Pearl Jam de lidar com isso foi tirar férias. A banda estava a todo vapor desde 1991, tendo lançado seis discos de estúdio, feito turnês mundiais e ainda por cima comprando uma briga em 1994 com a Ticketmaster sobre taxas de serviço que os colocou como testemunhas numa investigação antitruste feita pelo Departamento de Justiça dos EUA.

Eddie Vedder foi surfar no Havaí. O guitarrista Stone Gossard lançou seu primeiro disco solo, “Bayleaf”. Seu colega de instrumento, Mike McCready, trabalhou na trilha de “Vanilla Sky”. Enquanto isso, o baixista Jeff Ament e o baterista Matt Cameron tocaram com outras bandas.

Nesse meio-tempo, aconteceram os atentados de 11 de setembro junto com todas as ramificações políticas nos Estados Unidos. O Pearl Jam sempre foi uma banda politizada, Vedder sendo o catalisador. Só que o mundo agora era fundamentalmente diferente – e isso refletiu na abordagem lírica do vocalista.

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Numa entrevista para o site Philly.com, Jeff Ament falou sobre como Vedder chegou para as sessões de “Riot Act” com fogo nos olhos:

“A maior diferença que nós ouvimos, já no primeiro dia de tudo, foi como a abordagem do Ed era emocionada. Ele estava falando sobre coisas que dava pra ver importam pra ele. Coisas como ‘Bu$hleaguer’ não teriam acontecido cinco anos atrás; ele foi para um lugar diferente, tanto em termos do que as letras falam e como ele as canta.”

Apesar de todo esse fogo político, Eddie ainda encontrou espaço para auto reflexão. Na canção “Cropduster”, ele critica sua visão de mundo até então com os versos.

“I was a fool because I thought the world – turns out the world thought me.”

Mudança de abordagem

Durante as sessões de “Riot Act”, Eddie Vedder também mudou sua abordagem de trabalho. Em álbuns anteriores o vocalista passava o dia ouvindo seus companheiros trabalhando nas faixas instrumentais e levava fitas para casa de noite, quando começava a compor as letras. Agora, ele sentava num canto do estúdio com uma máquina de escrever e se punha a datilografar ideias durante o dia.

Ele admitiu ao Philly.com que a mudança foi complicada – e exigiu paciência.

“É como tentar pegar uma borboleta. Quando você pensa que vai desistir, depois de horas sentado, do nada a porteira abre e começa a sair coisa… Os caras foram ótimos sobre isso. Eu sabia que dava pra confiar neles, de aparecer e experimentar na frente deles. Essa foi a parte divertida. Depois disso vira dever de casa.”

Quanto às músicas, uma grande mudança sonora em “Riot Act” foi a presença de Kenneth “Boom” Gaspar nos teclados. O havaiano conheceu Eddie Vedder surfando e foi convidado para uma jam informal com a banda, gerando “Love Boat Captain”. O músico se juntou ao grupo ao vivo desde então.

Estilisticamente, “Riot Act” marcou um retorno à sonoridade diversa, porém calcada no rock clássico de discos como “Vs.” e “Vitalogy”. Mesmo assim, a necessidade de fugir de clichês pop continuava para Vedder, como ele disse ao Philly.com:

“Se algo estiver palatável demais, a gente dá uma f#dida de propósito. Tem uma parte em nós que não quer que as coisas sejam óbvias demais.”

Só que, como é verdade ao longo da trajetória do Pearl Jam, esse aspecto foi um ponto de discórdia entre Vedder e o guitarrista Stone Gossard, que retrucou na mesma entrevista:

“O nosso trabalho é extrair esses momentos de ouro nas músicas, e o dele é tirá-los. A gente fica achando que uma canção está finalizada, aí descobrimos que ele está no estúdio repensando o negócio inteiro… Quando ele termina, a gente não precisa se preocupar mais com ser palatável.”

Menos sucesso

“Riot Act” foi lançado em 12 de novembro de 2002, alcançando o 5º lugar da Billboard 200 na sua semana de estreia. Contudo, acabou vendendo apenas 575 mil cópias nos EUA – bem menos que seu antecessor, “Binaural”.

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Uma razão para isso talvez tenha sido o tom político do disco. Durante os shows da turnê, Eddie Vedder começou a usar uma máscara de borracha com o rosto do presidente George W. Bush durante a música “Bu$hleaguer”. Numa apresentação em Denver, o vocalista a removeu e a empalou no stand de seu microfone, criando uma polêmica.

Durante um show em Nova York, o público tentou confrontá-lo com gritos patrióticos, mas Vedder comprou a briga, dizendo (via Ultimate Pearl Jam):

“Vocês não gostam dessa. Eu não entendo, talvez vocês gostem dele porque ele vai te dar um corte nos impostos, Talvez vocês gostem dele por que ele é ‘um cara de verdade’ que entende vocês porque ele é tão simples.”

Enquanto mais gritos patrióticos soavam, ele completou:

“Acho que todos nós nesse lugar devíamos ter uma voz em como os EUA são representados.”

Fazendo as pazes com o público ao vivo

“Riot Act” acabou sendo muito bem sucedido fora dos EUA, atingindo o topo das paradas na Austrália, onde recebeu disco de platina, e chegando ao top 5 na Itália, Nova Zelândia, Noruega e Canadá.

A turnê do disco também rendeu 72 registros ao vivo graças ao projeto iniciado pela banda de disponibilizar gravações em seu site oficial das performances, com uma pequena homenagem por exclusão.

A canção “Arc”, parte de “Riot Act”, é uma homenagem aos fãs que morreram em Roskilde, e só foi apresentada nove vezes durante a turnê. 

O Pearl Jam havia relaxado sua postura com relação a singles e clipes. Porém, refletindo o mesmo cuidado com relação à conexão da banda com seus fãs que os levou a proibir o lançamento de “Black” como música de trabalho em 1992, decidiram manter esses nove momentos entre eles e os fãs presentes.

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Pedro Hollanda
Pedro Hollanda
Pedro Hollanda é jornalista formado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso e cursou Direção Cinematográfica na Escola de Cinema Darcy Ribeiro. Apaixonado por música, já editou blogs de resenhas musicais e contribuiu para sites como Rock'n'Beats e Scream & Yell.

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