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“Chinese Democracy”, o álbum mais polêmico do Guns N’ Roses

“Chinese Democracy”, um álbum de capa feia e até mesmo sem significado aparente deu início de forma oficial à nova fase do Guns N’ Roses – que já é velha, pois o guitarrista Slash e o baixista Duff McKagan voltaram à banda em 2016.

A “velha nova fase” em questão teve início em meados de 1997, quando o grupo se reconstruiu – também aparentemente – por Axl Rose no vocal, Dizzy Reed nos teclados, Robin Finck e Paul Tobias respectivamente nas guitarras solo e base, Tommy Stinson no baixo, Josh Freese na bateria Chris Pitman nos teclados e programadores.

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A vida de Axl Rose sempre foi marcada por confusão, mas a situação se agravou desde que o “novo Guns” começou a se formar. Entre 1994 e 2000, suas aparições públicas se limitaram a meia dúzia de entrevistas e sua prisão no aeroporto Sky Harbor Airport, de Phoenix, Arizona. O outro lado da personalidade de Rose se revelava à medida que antigos integrantes da banda davam declarações sobre seu modo “controlador” e “obssessivo” de agir – algo que já havia sido evidenciado quando os problemas com suas ex foram parar na justiça.

Apesar disso, o Guns N’ Roses começou a dar sinais de vida em 1999, com o lançamento da música ‘Oh My God’, para a trilha sonora do filme ‘Fim Dos Dias’. Naquele mesmo ano, a gravadora Geffen divulgou o álbum ao vivo ‘Live Era’.

Dois anos depois, um Axl Rose fora de forma voltava a fazer shows com a formação acima listada, com a adição do guitarrista Buckethead e substituição de Josh Freese para a entrada do baterista Brain Mantia. Algumas apresentações em Las Vegas, um show antológico/criticado no Rock In Rio 2001 e uma turnê norte-americana vieram em seguida.

Os fãs alimentavam a esperança de que ‘Chinese Democracy’ finalmente seria lançado (muitas demos já circulavam em uma internet pré-redes sociais), mas a turnê foi cancelada no meio de suas datas e o álbum, adiado. Mais substituições ocorreram: Paul Tobias deu lugar a Richard Fortus, Buckethead deu lugar a Ron “Bumblefoot” Thal e Brain Mantia deu lugar a Frank Ferrer. Dois anos depois, o Guns N’ Roses estava em turnê de novo… até que Stinson machucou seu pulso e as datas finais da turnê não foram cumpridas.

Finalmente, em 23 de novembro de 2008 – exatamente 15 anos após o lançamento do álbum de covers ‘The Spaghetti Incident?!’ -, a patifaria chegou ao fim: ‘Chinese Democracy’ chegou às nas prateleiras do mundo todo, ao mesmo tempo em que foi disponibilizado, na íntegra, no site MySpace. A sensação de estranhamento foi inevitável até mesmo para aqueles que já conheciam grande parte das músicas a partir das demos na internet.

Todos os músicos acima listados que integraram a banda nessa “nova fase” participaram das gravações. Logo, teria de ser inocente demais para esperar um novo ‘Appetite For Destruction’ por dois motivos simples: ‘Chinese Democracy’ soa como disco solo de Axl Rose, detentor da marca Guns N’ Roses, e os músicos envolvidos nas gravações tinham experiência com bandas de vertentes alternativas do rock e metal.

E por que, no fim das contas, ‘Chinese Democracy’ não foi lançado sob o nome de Axl Rose, em vez do Guns N’ Roses? A explicação é óbvia. “‘O nome Guns N’ Roses é uma marca internacional e começar do zero quando eu posso apenas usar a marca que todos conhecem… não posso sacrificar a marca que já está estabelecida'”, disse Rose ao baterista Chris Vrenna, ainda na década de 1990.

A essência musical de ‘Chinese Democracy’ é a mesma de ‘Use Your Illusion’, por exemplo. Ainda assim, ouve-se pouco do “velho Guns” e muito do então “novo Guns” – e não foi por acidente, já que Axl Rose queria trabalhar pitadas de rock alternativo desde antes da saída de Slash, na década anterior a este álbum.

Chinese Democracy, faixa a faixa

O álbum se abre com a pesada faixa-título ‘Chinese Democracy’, que já apresentava vocais diferentes de Axl Rose, apoiados em grande parte por notas graves. A música não tem nada a ver com o Guns antigo, desde a letra até o instrumental, mas isso não a torna ruim. Pelo contrário: é dos melhores momentos do disco.

‘Shackler’s Revenge’ dá sequência com uma pegada mais alternativa, quase industrial, que se abre no refrão e cativa um pouco mais. Essa composição tem a assinatura (e a cara) do excêntrico Buckethead.

‘Better’ dá um ar hard rock com várias camadas sonoras de instrumental. Muito bem trabalhada. ‘Street Of Dreams’, balada regida por um piano no maior estilo Queen/Elton John, vem a seguir, com performance emotiva de Axl Rose, ainda que com a voz desgastada.

A dispensável ‘If The World’ é compensada pela faixa seguinte, ‘There Was A Time’, uma das melhores do álbum. De letra inteligente, a canção apresenta boa performance de Axl Rose e ótimos solos assinados por Buckethead e Robin Finck.

A seguir, duas músicas que não convencem: ‘Catcher In The Rye’ não desagrada, mas é pouco cativante, enquanto a pesada ‘Scraped’ peca pelo exagero de influências industriais. ‘Riad N’ The Bedouins’, por sua vez, chama a atenção não só pelos bons ganchos melódicos, como, tambném, pela letra baseada em seu ex-cunhado, irmão de Erin Everly, que alegava ser negociador internacional de armas. O sujeito também inspirou a criação da clássica ‘Civil War’.

Outra boa letra está na música em seguida, a sentimental ‘Sorry’. Muito se falou sobre a composição ter sido inspirada no sentimento de Axl Rose com relação aos seus ex-companheiros de Guns N’ Roses, mas ele nega que tenha criado a música com esse intuito. A audição continua com duas faixas que vazaram muito antes do álbum ter sido lançado: a impactante ‘I.R.S.’, que perambula entre a calmaria e o frenesi, e a arrastada ‘Madagascar’, que peca pela falta de pegada: em sua versão demo, era bem melhor.

Perto do fim, dois destaques: a melhor balada do álbum, ‘This I Love’, e a grudenta ‘Prostitute’, com uma das melhores letras do disco – profunda e cheia de significados e interpretações.

Repercussão e legado

Embora ‘Chinese Democracy’ tenha conquistado bastante repercussão midiática, as vendas ficaram abaixo do esperado. O álbum ficou no top 10 das paradas de 27 países, incluindo Estados Unidos (3°), Reino Unido (2°), Canadá e até Brasil (ambos em 1°), no entanto, o mercado americano consumiu apenas 1 milhão de cópias – número baixo para o padrão do Guns N’ Roses.

A turnê de divulgação, por sua vez, trouxe o Guns N’ Roses em seu melhor momento de sua formação alternativa. O único deslize, mesmo, foi justamente no Brasil, com uma performance esquecível no Rock In Rio 2011.

‘Chinese Democracy’ não é um álbum de fácil assimilação, nem é recomendável para ouvintes que já não sejam grandes fãs da banda. Confesso que precisei escutá-lo várias vezes para entendê-lo. E é necessário compreender todo o seu contexto para ser devidamente apreciado.

A grande prova de que o álbum não é dispensável é a presença de algumas músicas no repertório da “Not In This Lifetime… Tour”, que marcou o retorno de Slash e Duff McKagan ao Guns N’ Roses. Músicas como ‘Better’, ‘There Was A Time’, ‘Catcher In The Rye’, ‘This I Love’ e a faixa-título foram aproveitadas para o setlist, com direito a solos adaptados pelo icônico guitarrista da cartola.

Por outro lado, Tommy Stinson já disse, em entrevistas, que Axl Rose não gostou do resultado final de ‘Chinese Democracy’. “Apenas o fato dele ter levado tanto tempo para ficar pronto e no fim das contas parecer que Axl não ter ficado feliz com o resultado, lançado meio que às pressas… me senti meio desapontado, acho que fizemos o melhor que pudemos”, afirmou ao Observer, em 2017.

Talvez ‘Chinese Democracy’ não entregue tudo o que os fãs esperam, já que tantos problemas de produção e planos abandonados (a ideia era que o disco fizesse parte de uma trilogia) marcaram a história do disco de lançamento mais atrasado da história. Ainda assim, é um bom trabalho, com momentos de destaque. Dez anos depois, dá para dizer que a maior parte de suas faixas resistiu ao teste do tempo.

Guns N’ Roses – Chinese Democracy

Axl Rose – vocal, teclados, piano (em 7, 13 e 14)
Dizzy Reed – piano, teclados, sintetizadores, backing vocals
Buckethead – guitarra, violão (em 5)
Robin Finck – guitarra, violão (em 10), teclados (em 3)
Ron “Bumblefoot” Thal – guitarra
Paul Tobias – guitarra, piano (em 6)
Richard Fortus – guitarra
Tommy Stinson – baixo, backing vocals
Chris Pitman – teclados, programadores, violão de 12 cordas (em 5), backing vocals
Frank Ferrer – bateria, percussão
Bryan “Brain” Mantia – bateria, percussão

Músicos adicionais:

Josh Freese – arranjos de bateria (em 4, 6, 9 e 14)
Pete Scaturro – teclados (em 10)
Sebastian Bach – backing vocals (em 10)
Patti Hood – harpa (em 13)
Paul Buckmaster – condutor de orquestra, arranjos orquestrados (em 4, 6, 12 e 14)
Marco Beltrami – arranjos orquestrados (em 4, 6, 12, 13 e 14)

01. Chinese Democracy
02. Shackler’s Revenge
03. Better
04. Street Of Dreams
05. If The World
06. There Was A Time
07. Catcher In The Rye
08. Scraped
09. Riad N The Bedouins
10. Sorry
11. I.R.S.
12. Madagascar
13. This I Love
14. Prostitute

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Igor Miranda
Igor Miranda
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com pós-graduação em Jornalismo Digital. Escreve sobre música desde 2007. Além de editar este site, é colaborador da Rolling Stone Brasil. Trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, revista Guitarload, jornal Correio de Uberlândia, entre outros. Instagram, Twitter e Facebook: @igormirandasite.

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