Bruce Dickinson brilha em São Paulo ao concluir turnê pelo Brasil

Performance no Vibra faz a diferença em meio a aspectos técnicos que, incompatíveis com grandeza do artista, deixaram a desejar

O Brasil teve o privilégio de receber, com exclusividade em relação aos outros países da América do Sul, na mesma noite de sábado (4), dois artistas que são referência em seus respectivos estilos e são incontornáveis para que se possa contar a história da música no século 20 e 21.

No Rio de Janeiro, um show gratuito da Madonna reuniu algo em torno de 1,6 milhões de pessoas na Praia de Copacabana. Em São Paulo, Bruce Dickinson encerrou a turnê brasileira de sete datas que divulga seu disco mais recente, “The Mandrake Project”, mas em uma casa fechada e com ingressos a preços exorbitantes. Isso talvez explique o saldão feito pelos cambistas nas proximidades do Vibra – era possível encontrar entradas para a pista (comum, não havia premium) por R$ 200, 75% a menos em relação ao preço inteira.

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Ainda assim, era um evento concorrido. Em que pese a constância com que Bruce vem ao Brasil — não raramente mais de uma vez por ano e nem sempre para cantar —, havia 25 anos recém completos que não se apresentava por aqui como artista solo. Foi naquela ocasião, em duas noites no finado Via Funchal, que ele gravou o disco ao vivo “Scream For Me Brazil”. Nesse ínterim, ele lançou um dos mais potentes discos de sua discografia: “Tyranny of Souls” (2005), o único que não teve turnê para divulgá-lo dados os compromissos do cantor com sua banda principal, o Iron Maiden.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

Noturnall

O público ainda chegava quando, pontualmente às 20h45, o Noturnall subiu ao palco do Vibra. Liderada pelo vocalista Thiago Bianchi, a banda, composta por Saulo Xakol (baixo) e Henrique Pucci (bateria), estava acompanhada pelo jovem e soberbo guitarrista Victor Franco. Ele já havia sido reverenciado em palco pelo Edu Falaschi, no show mais recente de São Paulo (veja aqui) por ter conseguido dominar o complexo repertório do ex-Angra, tanto novo quanto antigo, em poucos dias.

As condições adversas, aparentemente, se repetiram. A formação que assumiu a abertura dos três últimos shows dessa turnê, devido a questões de saúde que impediram a continuidade do Clash Bulldog’s neste posto, sequer havia ensaiado até subirem ao palco no Rio de Janeiro.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

O entrosamento foi total e show foi muito bem recebido. Bianchi ocupou todos os espaços do palco, desceu à grade para interagir com a plateia e saudou a equipe técnica que tornou o show possível. Xakol e Pucci tocaram a cozinha sem olhar para o lado, sem limites e sem dó. Franco foi seguro e preciso como se tocasse esse repertório há décadas. Se havia algum resquício de insegurança ali, ninguém demonstrou.

O Noturnall faz um prog metal pesado e com muitas notas. Mas não se deve esconder que é uma banda sem medo de ousar. Durante a música “Fight the System”, Thiago citou “Capítulo 4, versículo 3” e “Diário de um Detento”, ambas do clássico “Sobrevivendo no Inferno” (1997), do Racionais Mc’s. Não é só na cena metálica brasileira que esse tipo de surpresa tem feito falta.

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Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

Repertório — Noturnall:

  1. Try Harder
  2. No Turn At All
  3. Fight the System
  4. Cosmic Redemption
  5. Wake Up!
  6. Reset the Game
  7. Nocturnal Human Side

Sem telão, com confusão

A falta dos telões laterais estarem ligados fez com que o palco do Noturnall estivesse escuro em demasia, só salvo do breu completo por um telão em que era projetado o nome da banda, mas era pequeno, mal ocupava metade da parede de fundo. Um pouco depois das 22h, pôde-se constatar que não era uma restrição aplicada pelo artista principal, como costuma ser.

Bruce Dickinson foi último a subir ao palco, após Dave Moreno (bateria), Mistheria (teclados), Tanya O’Callaghan (baixo), Philip Naslund (guitarra) e Chris Declercq (guitarra). As duas primeiras músicas formaram uma sequência matadora. “Accident of Birth”, cujo refrão saúda “bem-vindo ao lar, faz tempo, sentimos a sua falta”, e “Abduction”, têm o peso e tem melodias boas para se cantar aos gritos. Tanto o povo, que tinha noção o quão era raro aquele show, quanto por Bruce, que sabia o quanto aquele momento era aguardado, mereciam essa oportunidade catártica.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

O que nem um, nem outro mereciam era a pobreza da produção. A qualidade do som mal beirou o satisfatório, com ecos e chiados além do aceitável. O mini telão de fundo parecia improvisado, não só pelo tamanho, mas como pelas projeções; não poucas vezes ele projetou a si mesmo infinitamente, de um jeito que mais parecia erro do que opção estética.

A dispensa aos telões laterais foi um problema à parte. A casa dispõe deste recurso, visto em outras apresentações com cobertura realizada pelo site. Porém, Bruce chegou a indicar em entrevistas que não utilizaria essa e outras funcionalidades, visando um show “como se estivéssemos em 1972”.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

Uma coisa é, em um espaço menor, não existir essa opção; como no Terra SP, durante apresentação do Black Veil Brides. O público saudou a banda no nível de histeria, mas era possível ver o palco satisfatoriamente de diversos pontos da casa.

Em um espaço que pode receber até 6,5 mil pessoas, no qual se apresenta um artista idolatrado do nível do Dickinson, abdicar dos telões se torna uma questão de segurança, principalmente na pista. Muita gente quer vê-lo de perto e se esforça para isso. Assim se instala a lei do mais forte e está dada a receita do empurra-empurra.

Houve princípio de briga perto do palco, ao lado direito, e dois seguranças tiveram de intervir. Sem falar no caso das pessoas de menor estatura, abandonadas à própria sorte. Uma configuração indigna da casa, do artista e, principalmente, do público, que recebeu muito menos pelo que pagou em questão de estrutura.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

O show

Quanto à apresentação em si, não houve miséria. “Laughing in the Hiding Bush” foi a terceira música, cantada em uníssono. Quem esperava que isso acontecesse somente em “Tears of the Dragon” ou “Chemical Wedding” teve o mesmo sucesso de quem esperava que ele tocasse músicas que ele escreveu para o Maiden, como “The Evil That Men Do” ou “Bring Your Daughter… to the Slaughter”:  nenhum.

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No primeiro dia do festival Summer Breeze, Gene Simmons foi bem-sucedido ao provar que a música do Kiss sobrevive bem sem os aparatos típicos, como fogos, maquiagem, tirolesa, plataforma voadora e tudo o mais. Nessa turnê inaugural, Bruce Dickinson mostrou, por sua vez, que é uma entidade com vida própria, independente do Maiden. Esse desprendimento ao projeto mais popular é feito para poucos. Um dos que conseguiu isso é Dave Grohl, que conseguiu construir uma carreira que dispensa qualquer associação ao Nirvana para vender discos e ingressos.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

Ciente e seguro disso, Bruce não tem problema em deixar a banda que o apoia livre. Philip Naslund corre pelo palco, joga palheta a todo momento, interage testa a testa com Tanya. Mistheria, o tecladista que lembra muito Tuomas Holopainen (Nightwish), corre por todo palco com seu instrumento portátil, muito usado pelo Roupa Nova aqui no Brasil.

O incrível baterista Dave Moreno teve direito a um excelente solo, curto, que anuncia “Frankestein”, cover de The Edgar Winter Group. É uma música instrumental e vira a hora do recreio para a turma: além do kit de percussão no qual o Bruce já havia tocado em “Rain on the Graves”, ele também faz um solo de teremim e, aos poucos, o restante da banda se junta para a festa.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

Após “Darkside of Aquarius”, uma das músicas mais celebradas da noite, houve o bis. Bruce foi o primeiro a voltar ao palco. Fez um discurso em solidariedade a Porto Alegre, lamentou a tragédia climática que ocorre em território gaúcho e dedicou a eles “Navigate the Seas of the Sun”.

Apresenta nominalmente a banda antes de “The Tower” e promete voltar não apenas com o Maiden ainda em 2024, mas com a banda solo em 2025. Tomara que com um Rio Grande do Sul recuperado da situação que se encontra e tanto Bruce quanto público com um tratamento à altura do que merecem.

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox

Bruce Dickinson — ao vivo em São Paulo

  • Local: Vibra
  • Data: 4 de maio de 2024
  • Turnê: The Mandrake Projet
  • Produção: MCA Concerts

Repertório:

  1. Accident of Birth
  2. Abduction
  3. Laughing in the Hiding Bush
  4. Afterglow of Ragnarok
  5. Chemical Wedding
  6. Many Doors to Hell
  7. Gates of Urizen
  8. Resurrection Men
  9. Rain on the Graves
  10. Frankenstein (cover do The Edgar Winter Group)
  11. The Alchemist
  12. Tears of the Dragon
  13. Darkside of Aquarius

Bis:

  1. Navigate the Seas of the Sun
  2. Book of Thel
  3. The Tower

Noturnall:

Foto: Gustavo Diakov / @xchicanox
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Bruce Dickinson:

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Rolf Amaro
Rolf Amarohttps://igormiranda.com.br
Nasceu em 83, é baixista do Mars Addict, formado em Ciências Sociais pela USP. Sempre anda com o Andreas no braço, um livro numa mão e a Ana na outra.

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