O início dos anos 1980 marcou um renascimento para Ozzy Osbourne. Logo após ter deixado o Black Sabbath, em 1979, o cantor embarcou em uma carreira solo com um time de músicos impressionante. O destaque era o jovem guitarrista Randy Rhoads, mas a parceria tão celebrada acabou bem mais cedo que o esperado em função de um trágico acidente de avião.
Rhoads foi um membro fundador do Quiet Riot, mas foi em dois álbuns gravados com Ozzy que o mundo foi realmente apresentado a sua genialidade. “Blizzard of Ozz” (1980) e “Diary of a Madman” (1981) foram sucessos absolutos e a banda terminava a turnê de divulgação do segundo disco quando a fatalidade aconteceu.
A tragédia
Ozzy Osbourne e sua banda viajavam de ônibus a caminho de Orlando, no estado americano da Flórida, quando fizeram uma parada em Leesburg, durante a noite, para consertar um aparelho de ar condicionado do veículo. Ao amanhecer, o motorista Andrew Aycock, que tinha uma licença de piloto de aeronaves vencida, resolveu alugar para passeios um pequeno avião disponível no local, modelo Beechcraft Bonanza F35.
Na primeira decolagem, estavam presentes o tour manager Jake Duncan e o tecladista Don Airey, que relataram uma certa irresponsabilidade por parte do piloto. Querendo acordar o restante da banda no ônibus, Aycock passou próximo do veículo várias vezes de forma perigosa. Naquele momento, porém, nada ocorreu.
Em um segundo voo, Andrew Aycock quis levar a maquiadora Rachel Youngblood, com 58 anos à época, que tinha problemas cardíacos. Sabendo que o piloto teria que “pegar leve”, Airey convenceu Randy Rhoads a embarcar junto – por ironia do destino, o guitarrista tinha muito medo de voar. Relutante, ele aceitou porque queria tirar fotos aéreas para enviar à mãe.
Rhoads ainda tentou acordar o baixista Rudy Sarzo para que o acompanhasse, mas o colega preferiu continuar dormindo. Assim, decolaram Aycock, Youngblood e Rhoads para seu último voo.
O piloto resolveu tentar manobras perigosas novamente e acabou batendo a asa do avião no ônibus onde todos dormiam. A aeronave começou a girar, bateu em uma árvore e caiu na garagem de uma propriedade próxima, o que foi seguido por uma grande explosão.
Todos os passageiros morreram. Rhoads e Youngblood vieram a óbito ainda no primeiro impacto, sendo arremessados para frente, mas todos os corpos foram carbonizados depois da explosão. O guitarrista só foi reconhecido pela arcada dentária e por joias que usava.
Investigações posteriores mostraram que Andrew Aycock estava tentando reatar o relacionamento com sua esposa, que também estava na turnê. Ele ainda tinha histórico de uso de drogas e inclusive já tinha sofrido acidentes pilotando um avião. Exames detectaram a presença de cocaína no corpo do piloto, o que ajuda a explicar seu comportamento irresponsável.
As reações
Don Airey foi o único que presenciou o acidente de fato. O tecladista, que precisou de anos de terapia para lidar com o fato de que convenceu Rhoads a embarcar, revelou no livro “Off the Rails”, escrito por Rudy Sarzo, que tesmunhou o que parecia ser uma briga entre o guitarrista e o piloto logo antes da batida.
“Eu estava com minha câmera e estava tirando fotos do avião para dar a Randy depois. Estava com lentes teleobjetivas e posso dizer que houve algum tipo de briga a bordo do avião. As asas estavam balançando rápido de um lado para outro. Em certo ponto, o avião ficou quase perpendicular, não mais do que 2 metros do chão. Foi quando larguei minha câmera e vi o avião bem na minha frente. Eu agachei rápido para não ser acertado, olhei para trás e o vi esbarrar no ônibus, bater na árvore e explodir na garagem.”
Ozzy Osbourne e sua então noiva, Sharon, foram despertados pela batida, assim como todos os ocupantes. A empresária relatou ter acordado gritando para que todos descessem do veículo e foi até o local do acidente, onde encontrou os corpos destroçados e carbonizados.
Ozzy, em seu testemunho oficial, dá uma ideia do quão atordoados ficaram.
“Fui acordado de meu sono por uma explosão alta. Imediatamente pensei que tínhamos batido em um veículo na estrada. Saí da cama gritando para minha noiva, Sharon: ‘saia do ônibus!’. Depois de sair do ônibus, vi que um avião tinha caído. Eu não sabia quem estava no avião naquela hora.”
O baterista Tommy Aldridge e o baixista Rudy Sarzo também desceram do ônibus rapidamente. O primeiro tentou, em vão, apagar o fogo com um extintor que encontrou no ônibus, enquanto o segundo encontrou a esposa do piloto na porta do veículo, bem como o tour manager desesperado em meio à cena.
O baixista, em entrevista para uma rádio em 2021, ofereceu um dos relatos mais assustadores sobre o momento, transcrito pelo site Rock Celebrities.
“Assim que percebemos que Randy, Rachel e o motorista do ônibus tinham… que o avião tinha caído, houve desesperança. E a desesperança tem um som. É uma frequência muito baixa e muito assustadora. Minhas cordas vocais não conseguem ir tão baixo, é essa vibração sinistra, e eu não conseguia ouvir nada. Meus sentidos estavam em choque, tudo o que eu ouvia era isso dentro da minha cabeça, essa frequência baixa – isso é desesperança. Eu nunca senti uma desesperança tão profunda quanto essa e espero nunca mais passar por isso.”
De longe, o acidente também causou impacto. O Black Sabbath, antiga banda de Ozzy, também estava em turnê pelos Estados Unidos e o baixista Geezer Butler relembrou em entrevista de 2021 qual foi a reação dos membros do grupo ao saber do que havia acontecido.
“Estávamos no hotel, em turnê, e saiu no rádio: ‘membros da banda de Ozzy Osbourne morrem em uma queda de avião’. Todos nós entramos em pânico e ligamos para os empresários, a equipe dele, e eles disseram que era Randy que havia morrido e Ozzy estava ok.”
Outra banda que estava em turnê nos Estados Unidos na mesma época era o Uriah Heep, que contava com o baterista Lee Kerslake e o baixista Bob Daisley. Os dois haviam gravado os álbuns solo de Ozzy com Randy Rhoads e estavam fora da banda solo do vocalista há pouco tempo.
Kerslake contou na época que também soube do ocorrido pela imprensa.
“Eu estava sentado no bar quando Bob Daisley chegou. Me virei, olhei para Bob e disse: ‘p#rra, você está pálido… o que há de errado?’. Bob disse: ‘Lee, houve uma queda de avião essa manhã e Randy estava nele… e ele está morto’. Foi isso. Oh Deus, ouvir aquilo – só me virei e chorei muito. Bob e eu choramos muito por ele, porque o amávamos. Ele era um cara tão amável.”
O impacto da morte de Randy Rhoads
A ausência de Randy Rhoads foi um baque que Ozzy Osbourne levou anos para superar. De certa forma, a situação atormenta o cantor até hoje.
Na última conversa entre os músicos, o guitarrista havia se queixado dos excessos do vocalista, que só pioraram após sua morte. Muito de toda a loucura associada ao Madman nos anos 1980 tem suas raízes na perda de seu guitarrista e grande amigo.
Rudy Sarzo também foi muito afetado, pois conhecia Randy desde os tempos de Quiet Riot. Ao ver o estado do vocalista piorando cada vez mais, o baixista acertou sua volta ao QR, pois também sentia que não conseguiria seguir no projeto sem Rhoads. Aldridge e Airey permaneceram na formação por mais algum tempo.
O primeiro substituto de Rhoads foi o guitarrista sueco Bernie Tormé, que tocou apenas 7 shows com Ozzy. Em entrevista ao Ultimate Classic Rock, ele contou o que viu quando chegou para terminar a turnê: uma banda que se esforçava para continuar, mas sem conseguir.
“Cheguei em uma quinta-feira e Randy havia falecido no sábado anterior. Não havia passado uma semana. Ninguém falou comigo no dia em que cheguei, exceto Don Airey. A atmosfera era terrível, com razão.”
Tormé foi logo substituído por Brad Gillis, que gravou o ao vivo “Speak of the Devil”, só com músicas do Black Sabbath, lançado no mesmo ano. Tempos depois, Ozzy revelou que o álbum ao vivo que iriam lançar, por contrato, era o mesmo que saiu como “Tribute” (1987) cinco anos depois. Porém, o vocalista optou por gravar às pressas um disco com clássicos do Sabbath para que ninguém pensasse que ele estava lucrando pela morte de Rhoads.
Até hoje, a morte de Randy Rhoads é um assunto delicado para Ozzy. Quando o guitarrista foi homenageado pelo Rock and Roll Hall of Fame por Excelência Musical, em 2021, o vocalista escreveu um longo depoimento publicado pela revista Rolling Stone, onde exterioriza muitos dos sentimentos que ficaram guardados por tanto tempo.
“Eu o conheci por muito pouco tempo, mas o que ele me deu naquele curto espaço de tempo foi de uma grandeza imensurável. Conseguir que alguém como Randy Rhoads toque em dois álbuns, e que esses dois álbuns soem tão bem quanto no dia em que foram gravados, é outra coisa. Sou eternamente grato por isso. Só Deus sabe onde aquele homem estaria hoje. O próprio fato de que ele não está aqui para respirar esse ar é uma p#rra de um crime.”
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Parabéns pelo trabalho.