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Por que os Titãs resolveram soar pesados no revolucionário “Cabeça Dinossauro”

Peso do trabalho veio não só pela sonoridade, mais próxima do punk rock, como também pelas letras intensas

Em 1986, os Titãs lançavam o álbum que iria mudar a carreira da banda e a forma com que ela era vista por fãs e pela mídia: o pesado “Cabeça Dinossauro”.

Neste trabalho, o peso não vinha apenas da sonoridade, muito mais próxima do punk rock do que nos trabalhos anteriores: as letras também estavam mais intensas. Além disso, a banda estava realmente disposta a entregar um disco mais forte, após dois lançamentos mornos.

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Na época das gravações deste terceiro álbum, os Titãs eram compostos por oito integrantes: Arnaldo Antunes (vocal), Branco Mello (vocal), Paulo Miklos (vocal), Nando Reis (baixo e vocal), Marcelo Fromer (guitarra), Tony Bellotto (guitarra), Charles Gavin (bateria) e Sérgio Britto (teclados).

O disco de estreia homônimo (1984) e o sucessor “Televisão” (1985) não tinham estourado e o próximo trabalho seria o último do contrato inicial com a gravadora WEA. Se poderia ser uma despedida, que fosse em grande estilo, mas parece que o próprio selo estava disposto a fazer de “Cabeça Dinossauro” um sucesso.

A prova disso foi a escalação de Liminha para produzir o disco. Na época, o ex-integrante dos Mutantes era diretor artístico da WEA e “Cabeça Dinossauro” acabou sendo o início de uma longa parceria com ele, que chegou a ser chamado de “o nono Titã” a partir dali.

Contexto histórico-musical

Àquela altura, os Titãs impressionavam mais ao vivo do que em estúdio. Dessa forma, a ideia era trazer a sonoridade dos palcos para o álbum – objetivo alcançado com êxito sob a produção de Liminha.

Contudo, o que torna “Cabeça Dinossauro” um trabalho único dos Titãs também diz respeito ao contexto em que foi gravado e como o Brasil se encontrava naquele momento.

O país vivia o fim da ditadura militar e o início do processo de redemocratização. José Sarney já havia assumido o comando do governo no lugar do falecido Tancredo Neves e o Plano Cruzado era a estratégia para contar a inflação e outros problemas que assolavam o país.

Porém, na prática, nem tudo havia mudado. A população não via essa mudança em suas vidas.

Um polêmico incidente pessoal também influenciou na concepção de “Cabeça Dinossauro”. Em 1985, Arnaldo Antunes e Tony Bellotto foram presos por posse de heroína, o que certamente desgastou a imagem da banda.

O que os Titãs fizeram foi usar esse “tropeço” como uma alavanca para produzir um álbum ousado, instigante, crítico e que segue relevante até os dias de hoje.

A experiência de Bellotto com Antunes, por exemplo, renderia a hoje clássica “Polícia”, marcada pelos vocais raivosos de Sérgio Britto. Já músicas como “Homem Primata”, “Igreja” e “Bichos Escrotos” criticam o sistema como um todo e exibem a veia punk que a banda resolveu abraçar nesse disco – e que vinha sendo suprimida por uma boa dose pop nos trabalhos anteriores.

Charles Gavin, em entrevista ao jornal O Globo, refletiu em 2016:

“Havia o momento do Brasil que estava se desenhando muito problemático, uma ditadura militar ainda se desmanchando, a morte de Tancredo. O clima era de desilusão, um cenário de distopia. E havia também nosso momento como banda. Tínhamos vindo de “Televisão”, nosso segundo disco, incompreendido pela gravadora, que não foi bem trabalhado. Isso nos provocou certo dissabor, ceticismo com a música, a carreira. Chegamos ao disco com raiva do mercado, da gravadora, de todo mundo.”

Charles Gavin

O sucesso dos Titãs com “Cabeça Dinossauro”

Os Titãs estavam divididos quanto a possibilidade de “Cabeça Dinossauro” ser um sucesso. Em entrevista ao G1 feita em 2016, os quatro integrantes remanescentes de 1986 – Mello, Britto, Miklos (hoje já fora da banda) e Bellotto – relembraram as impressões que tiveram na época.

A expectativa em torno do álbum rendeu até uma aposta entre Tony Bellotto e Branco Mello, cujo prêmio era uma garrafa de uísque. O guitarrista é quem conta:

“Eu achava que o disco não ia vender nada. O mercado na época era diferente, ainda tinha a regra de: ‘não pode ter música com mais de tantos minutos’. Eu achava que não iam entender a gente e o Branco levou a melhor. Mas perdi a aposta com o maior prazer do mundo.”

Tony Bellotto

Os números mostram que Branco Mello estava certo em ser otimista: em um ano, “Cabeça Dinossauro” vendeu 250 mil cópias. Das 13 músicas, 11 foram tocadas em rádios na época e seis delas chegaram a sair como singles: “AA UU”, “O Quê”, “Polícia”, “Homem Primata”, “Família” e “Bichos Escrotos”.

A turnê chegou a contar com a execução do álbum na íntegra, tamanho o sucesso. Curiosamente, a divulgação nos palcos em si não começou tão forte, com um show complicado no teatro Carlos Gomes, no Rio de janeiro. Contudo, aquele evento acabou sendo o estopim que os Titãs precisavam.

Após um atraso grande causado pela equipe de uma atração anterior, que demorou a desmontar o equipamento, a apresentação terminou em tumulto. A publicidade acabou sendo positiva e os shows passaram a lotar, como lembra o vocalista Sérgio Britto, também falando ao G1.

“Quando estreou o show no Projeto SP, a gente esperava 300, 400 pessoas, e foi tudo vendido. E o público cantava todas as músicas. Para a gente aquilo foi um choque.”

Sérgio Britto

Aos poucos o novo trabalho foi ganhando espaço, com exibições de clipes no “Fantástico”, da TV Globo, e execução massiva nas rádios.

“Cabeça Dinossauro” se tornou o álbum mais lembrado da discografia dos Titãs, dando o tom para os ousados trabalhos seguintes. Até hoje, suas músicas estão entre alguns dos maiores clássicos do rock brasileiro.

* Texto desenvolvido em parceria por André Luiz Fernandes e Igor Miranda. Pauta, edição geral e argumentação-base por Igor Miranda; redação geral, argumentação e apuração adicional por André Luiz Fernandes.

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André Luiz Fernandes
André Luiz Fernandes
André Luiz Fernandes é jornalista formado pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP). Interessado em música desde a infância, teve um blog sobre discos de hard rock/metal antes da graduação e é considerado o melhor baixista do prédio onde mora. Tem passagens por Ei Nerd e Estadão.

2 COMENTÁRIOS

  1. Muito bom o texto! Fiquei feliz que citou a reportagem que fiz em 2016. Esse disco realmente é um divisor de águas não apenas na carreira dos Titãs, mas tb no rock brasileiro, na minha opinião. Sucesso pra vc! Cabeça, cabeça, cabeça dinossauro!

    • Lucas! Uma grata surpresa tê-lo comentando no site. Sua reportagem ficou tão bacana, com perguntas tão precisas, que senti que deveríamos citá-la. Obrigado!

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