Belo Horizonte, 1983. Belo Horizonte, 1º de março de 2024. Quatro décadas separam dois inícios para o Sepultura: a fundação da banda e o começo da turnê de despedida “Celebrating Life Through Death”, que ainda se estenderá até o segundo semestre do ano que vem e passará por vários outros países.
Nada mais justo, portanto, que a capital mineira seja o ponto de partida de uma tour tão importante. Não apenas o adeus planejado, como a celebração dos 40 anos da maior banda de heavy metal do Brasil.
Festa mineira para abrir os trabalhos
O metal mineiro foi celebrado logo na abertura do evento realizado no Arena Hall, com os belorizontinos do Eminence dando o pontapé inicial. Aqui, um dos poucos pontos negativos da noite: muitos reclamaram que não sabia que haveria banda para iniciar os trabalhos, ainda mais preparada para começar antes das 20h. Uma pena, pois o grupo composto por Bruno Paraguay (voz), Allan Wallace Bello (guitarra), Davidson Mainart (baixo) e Alexandre Oliveira (bateria) fez uma apresentação sensacional.
O início se deu pontualmente às 19h50, com “Burn It Again”, faixa do álbum mais recente, “Dark Echoes” (2021). Mesmo diante de um público que ainda chegava, a banda se sentiu em casa e desfilou de forma enérgica seu death metal com levadas de groove/metalcore. Quem se entregou, não se arrependeu: houve um grande circle pit já na segunda música, “Written in Dust”, e um wall of death na metade do set, precedendo “Devil’s Boulevard”.
O Eminence, claro, não deixou de agradecer ao Sepultura e relembrou como as histórias de ambos se cruzaram, do apoio que receberam e das parcerias ao longo do caminho. O curto set de oito músicas foi concluído com “Unfold” e “Day 7”, reforçando a competência de uma banda que já se apresentou em festivais europeus e em duas edições do Rock in Rio.
Estreante e apreensão
O Arena Hall já estava totalmente tomado pelos fãs por volta das 20h30. A história de “sold out” não era marketing: a essa altura, já era impossível andar pela pista e arquibancadas.
A ansiedade do público se dava não apenas por ser uma turnê de despedida — e celebrativa dos 40 anos de carreira. O Sepultura surpreendeu ao anunciar, na terça-feira (27), uma mudança no banco da bateria: Eloy Casagrande, membro desde 2011, saiu “sem aviso prévio” para se dedicar a outros projetos. O americano Greyson Nekrutman foi confirmado em substituição.
A notícia gerou alguma desconfiança, pois Nekrutman se destacou inicialmente como exímio jazzista — embora tenha se juntado ao Suicidal Tendencies no ano passado. Mas não havia motivo para preocupação, seja pela competência ou pela recepção do público.
O início do fim
As luzes do Arena Hall já estavam baixas, deixando o clima preparado para os anfitriões, quando o Sepultura apareceu no telão, diretamente do camarim, avisando que entrariam no palco em 30 minutos. O alerta se repetiu faltando 15 minutos, em meio a um clima bem festivo nos bastidores.
Mesmo com os avisos, um pequeno atraso começou a se desenhar quando a casa ficou no breu, com apenas uma luz no palco e “Polícia” tocando no som. Já dava para ver, contudo, que o palco havia sido montado com uma enorme bandeira ao fundo, além de um telão central e dois laterais.
Quando a música dos Titãs acabou, Paulo Xisto (baixo), Derrick Green (voz) e Andreas Kisser (guitarra) adentraram com as luzes ainda reduzidas e se juntaram a Greyson Nekrutman, já no palco. A partir daí, foi um novo — e derradeiro — capítulo de uma das mais importantes histórias do metal nacional.
Os acontecimentos da semana tiveram zero interferência no show. Talvez até tenham sido elementos motivadores, especialmente se considerar a empolgação de Andreas, enérgico do início ao fim. Era como se fosse seu primeiro grande show.
A trinca escolhida para abertura veio do álbum “Chaos A.D.” (1993), com “Refuse/Resist”, “Territory” e “Slave New World”. Era o início de um setlist que despertava curiosidades — e que foi noticiado em primeira mão no site IgorMiranda.com.br. O repertório compilou 22 músicas, abrangendo igualmente as fases com Max Cavalera e Derrick Green nos vocais.
Como esperado, algumas canções ficaram de fora, o que gerou uma mínima frustração — como a ausência de qualquer faixa do disco “Beneath the Remains” (1989). Ainda assim, a escolha do setlist foi bem acertada: atendeu às expectativas dos fãs que já conheceram o grupo com Derrick nos vocais — com canções que também podem ser chamadas de clássicas, a exemplo de “Choke” e “Sepulnation” —, assim como preencheu os pedidos de quem está ali pelas pérolas da era Max, duas delas posicionadas ao final: “Ratamahatta” e “Roots Bloody Roots”, empolgantes até mesmo para quem assiste aos vídeos da noite.
Recepção ao novato e saldo final
Nem o mais otimista integrante da equipe do Sepultura poderia imaginar uma recepção tão calorosa a Greyson Nekrutman como se viu na noite de sexta-feira (1º). Desde o intervalo das primeiras músicas, ecoava pela casa os gritos de “Greyson! Greyson!”. Antes mesmo de Andreas Kisser apresentar o baterista, o público já fazia as honras.
O americano correspondeu. Mostrou que realmente estava preparado para assumir essa bronca de assumir uma posição importante em um grupo com 40 anos de estrada, iniciando uma turnê mundial de despedida e ainda na sua terra de origem. Representou um legado construído por Iggor Cavalera, Jean Dolabella e Eloy Casagrande, instrumentistas que se tornaram referência pelo que fizeram nesta banda.
Como seus antecessores, Nekrutman desfilou uma pegada firme e muita precisão. Com viradas e bumbos bem marcados, Greyson logo caiu nas graças da plateia. Inclusive, em alguns momentos do show, ouvia-se coros altos de “Ei, Eloy, vai tomar no c*!”. O grupo, contudo, não entrou na pilha de alfinetar este ou qualquer outro ex-integrante. Seriam duas horas de plena celebração.
Em termos de entrega, os três veteranos de Sepultura não ficaram atrás. Derrick Green até arriscou mais no português, enquanto Paulo Xisto — este realmente em casa como o único mineiro remanescente — se divertiu com o público e até arriscou uma dança em “Kaiowas”. Andreas Kisser, por sua vez, seguiu na função de “maestro” da noite. Seus discursos tiveram sempre tom de agradecimento e enaltecimento à história criada.
A performance sem defeitos e o setlist abrangente, juntos, representaram o acerto da noite. Se em outros shows o público não correspondia tão bem às músicas mais novas, nesta apresentação era possível ver fãs cantando e se emocionando com “Kairos” ou “Guardians of Earth”.
O início da “Celebrating Life Through Death” serviu para reforçar que o Sepultura tem história muito maior do que qualquer integrante ou acontecimento fora dos palcos. A prova disso esteve na sensação de que o público presente no Arena Hall reuniu fãs de todas as fases. ver um show completamente lotado com os dois públicos: os saudosistas e os mais novos. Todos testemunharam uma banda cuja força é incalculável.
*O Sepultura continua em turnê pelo Brasil com a “Celebrating Life Through Death”. Para mais informações sobre os shows já confirmados, clique aqui.
Sepultura — ao vivo em Belo Horizonte
- Local: Arena Hall
- Data: 1º de março de 2024
- Turnê: Celebrating Life Through Death
Repertório — Eminence:
- Burn It Again
- Written in Dust
- Dark Echoes
- The God of All Mistakes
- Devil’s Boulevard
- N3Mbers
- Wake up the Blind
- Unfold
- Day 7
Repertório — Sepultura:
- Intro Polícia + Refuse/Resist
- Territory
- Slave New World
- Phantom Self
- Dusted
- Attitude
- Kairos
- Means to an End
- Cut-Throat
- Guardians of Earth
- Mindwar
- False
- Choke
- Escape to the Void
- Kaiowas (jam de percussão)
- Sepulnation
- Biotech is Godzilla
- Agony of Defeat
- Troops of Doom
- Arise
- Ratamahatta
- Roots Bloody Roots
Clique para seguir IgorMiranda.com.br no: Instagram | Twitter | Threads | Facebook | YouTube.