Dos padrinhos às controvérsias, a jornada explosiva do 1º álbum do Skid Row

Com influência direta do Bon Jovi, disco tornou-se um fenômeno de vendas; turnê foi marcada por episódios de violência e homofobia

Sexto lugar na Billboard, um total de cinco milhões de cópias vendidas apenas nos Estados Unidos, quatro singles de sucesso e videoclipes em alta rotatividade na MTV: esse impressionante sucesso comercial e crítico solidificou o Skid Row como presença constante nas capas das revistas de rock e nos programas de TV, catapultando o vocalista Sebastian Bach, os guitarristas Dave “Snake” Sabo e Scotti Hill, o baixista Rachel Bolan e o baterista Rob Affuso à popularidade nacional (prestes a se tornar mundial).

“Só eu sei o quanto ralamos pra estarmos aqui hoje”, disse Bolan em um depoimento a Tom Beaujour e Richard Bienstock, presente no livro “Nöthin’ But a Good Time” (Estética Torta, 2022).

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O artigo a seguir serve como prova dessa declaração.

“Eu não queria mais trabalhar na construção civil”

Um Dave “Snake” Sabo completamente desanimado estava morando temporariamente na casa do produtor e compositor Jack Ponti. Ele não conseguia acreditar que tinha sido cortado do Bon Jovi e não conquistado a vaga de guitarrista no Cinderella.

No entanto, ele conseguiu um emprego em uma loja de instrumentos musicais em Toms River, Nova Jersey. Foi lá que conheceu Rachel Bolan. “Ele entrou na loja, e eu disse: ‘esse cara parece um astro do rock!’”, relembrou Snake.

Os dois começaram a conversar, e Bolan disse a ele que era baixista e tinha sua própria banda, Godsend, cujo guitarrista era Scotti Hill. Snake, por sua vez, tentou deixar uma impressão citando sua amizade com Jon Bon Jovi e pessoas do A&R de gravadoras. “Mas o que realmente me pegou foi que ele tinha a mesma paixão e vontade de fazer o mesmo que eu”, revela Rachel.

“Havia apenas uma coisa que eu queria fazer na vida: ser músico. Eu não queria mais trabalhar na construção civil. Quando o Snake e eu unimos forças, simplesmente aconteceu. As músicas começaram a sair.”

Por meio de David Bryan, tecladista do Bon Jovi, a dupla conseguiu o baterista Rob Affuso. Em seguida, Hill foi trazido para a banda, conforme recorda:

“Depois que o Godsend acabou e Rachel começou a tocar com o Snake, eu me mudei de volta para Nova York, onde morava antes (…) Então, depois que o outro guitarrista saiu, o Rachel disse: ‘Precisamos de um cara. Venha fazer um teste’. Eles me enviaram uma fita cassete com três músicas. Uma delas era ‘Clock Strikes Midnight’, que se tornou ‘Midnight/Tornado’. E ‘18 and Life’ estava em andamento. Eles formavam uma banda incrível.”

O vocalista Matt Fallon — “que fez parte do Anthrax por meio minuto”, segundo Snake — completou o quinteto batizado de Skid Row, que em dois meses estaria fazendo shows com o Bon Jovi.

“Precisávamos do nosso David Lee Roth”

Antes mesmo de assinar com uma gravadora, o Skid Row teve a sorte de poder tocar em duas datas na turnê de “Slippery When Wet”, do Bon Jovi. “Foram duas noites [19 e 20 de dezembro de 1986] na Stabler Arena [em Bethlehem, Pensilvânia]”, evoca Bolan.

“Estávamos fazendo pequenos shows em clubes e, de repente, temos esses shows numa casa com cinco mil lugares. Foi a coisa mais legal de todas!”

Snake estava no camarim depois de um desses shows quando Doc McGhee, empresário do Bon Jovi, entrou e disse: “As músicas são ótimas, mas vocês precisam de um novo vocalista. Esse cara não dá conta”. Apesar das palavras de Doc, o fim da linha para Matt não se deu exatamente no dia seguinte, como narrado pelo guitarrista:

“Estávamos abrindo para o T.T. Quick [banda do vocalista Mark Tornillo, que integra o Accept desde 2009], e o Matt só apareceu depois de o T.T. Quick ter começado a tocar. E eu ia cobri-lo de porrada no estacionamento e ele começou a fugir de mim. Eu ia matá-lo.”

Bolan não se opôs à ideia de dispensar Fallon.

“Um dia entrei na loja de instrumentos e o Snake disse: ‘Vamos nos livrar do Matt…’ Eu concordei: ‘Beleza’. Ele disse: ‘Nossa, você aceitou isso com muita facilidade!’”

Apesar de ter se revelado um mau colega de banda, segundo Snake, “Matt era bom”. Só “não era ótimo”.

“Ele não era um astro. Precisávamos de um astro, sabe? Precisávamos do nosso David Lee Roth ou do nosso Axl Rose.”

“Os pais do Bon Jovi achavam que eu me encaixaria bem”

A busca por esse astro revelou-se um completo desastre. Oni Logan (futuro vocalista do Lynch Mob) e John Corabi foram alguns dos cantores testados, mas não se encaixaram. “Pareceu uma eternidade”, resumiu Bolan.

“Mas o que aconteceu foi que havia um cara chamado Dave Feld de quem éramos todos amigos. Ele trabalhava como assistente de fotografia do Mark Weiss. E um dia ele mencionou: ‘Não sei se vocês ainda estão procurando por um vocalista, mas vi um garoto subir no palco no casamento do Mark…’”

O garoto era o barulhento, tempestuoso, bonito e incrivelmente talentoso Sebastian Bach, então vocalista do grupo Madam X.

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O casamento foi realizado no Molly Pitcher Inn, em Red Bank, Nova Jersey, conta Sebastian na autobiografia “18 and Life” (Benvirá, 2017).

“O dia estava ensolarado. Fui à piscina usando meu short jeans cortado e tirei a camisa. Comecei a pegar um bronze (…) Abri uma garrafa de Jack Daniel’s e comecei a beber. No meio da tarde (…) Havia uma banda de casamento presente na recepção. Lembro de Zakk e eu conversando sobre quais músicas iríamos tocar quando tomássemos conta do palco.”

O Zakk a quem Sebastian se refere é Zakk Wylde, guitarrista que tinha acabado de conseguir a vaga na banda de Ozzy Osbourne. A dupla assumiu o comando do casamento.

“Cantamos ‘Whole Lotta Love’, do Led Zeppelin. Dei aquele grito absolutamente ensurdecedor, de rasgar as pregas (…) Foi bem engraçado. Os pais de Jon Bon Jovi também estavam presentes. Depois que cantei, fui convocado à mesa deles, onde me pediram para sentar. Foi incrível conhecê-los.”

Carol Sharkey e John Francis Bongiovi Sr. explicaram a Sebastian que o filho tinha um amigo chamado Snake, que tinha uma banda.

“Estavam procurando um vocalista. Os pais do Bon Jovi achavam que eu me encaixaria bem na banda. Tinha um cara chamado Dave Feld no casamento também. Ele pegou meu telefone e prometeu aos Bongiovi que entregaria minha fita ao Snake. A banda do Snake se chamava Skid Row.”

Fiel à sua promessa, Feld fez a ponte, e em pouco tempo Sebastian recebeu de Snake uma fita contendo as músicas “18 and Life”, “Rattlesnake Shake” e “Youth Gone Wild” e um convite para ir a Nova Jersey tocar com a banda. “Depois de algumas cartas, topei”, conta o vocalista.

“Eles me compraram uma passagem de avião por 180 dólares de Toronto a Nova Jersey. Fiquei bem impressionado, tudo pago. Claro que levei um choque e tive que rir quando, uns dois anos depois, vi a conta voltar para mim, através do meu contador, para que eu pagasse. Como não amar o showbiz?”

“Essa música vai entrar no disco”

Depois que Sebastian se juntou, Doc concordou em assinar um contrato de agenciamento com a banda. Em seguida, escolheram um contador, um gerente de turnê e um advogado.

Então, seguiram-se shows nos estados de Connecticut, Nova York e Nova Jersey. Eventualmente, a Atlantic Records entrou em cena, contratando o Skid Row após uma apresentação no Cat Club, em Nova York.

Com um álbum a ser produzido, os cinco começaram a bater cabeças criativamente. Sebastian recorda:

“Estávamos no porão do Rachel tocando algumas de suas músicas antigas quando ouvi um riff que achei muito bacana. Um clima meio Peter Gunn misturado com Batman. Rachel perguntou: ‘Você gostou disso?’, e me olhou. ‘Sim, realmente adorei isso’. A música se chamava ‘Piece of Me’. Achei que seria uma grande música. Décadas antes da turnê de Britney Spears que levou o mesmo nome, ‘Piece of Me’ se tornou nosso terceiro single e clipe, e um de nossos maiores hits.”

Outra música que o vocalista achou que seria um grande sucesso foi “I Remember You”. Ele conta:

“Sabia que poderia cantá-la diretamente do meu coração. Amei a melodia e a letra. Sabia que poderia inserir alguns gritos incríveis na canção porque a emoção dos acordes era palpável (…) Rachel achava que a música era muito doce e não combinava com nossa imagem de caras superdurões. Ignorei-o e continuei falando sobre a música para todos.”

Um dia, Doc foi ao ensaio na garagem da casa de Rachel e Sebastian insistiu que a banda tocasse a música para o empresário. Rachel sacudiu a cabeça e explicou que a música não cabia no disco. Bach prossegue:

“Enquanto entrávamos no primeiro verso e íamos caminhando para o refrão, olhei para Doc. Ele estava olhando para mim e rindo. Quando a música acabou, eu disse: ‘Rachel não quer a música no disco’. Doc começou a gargalhar. ‘Isso é engraçado. Porque essa música vai entrar no disco’.”

“I Remember You” se tornaria o maior sucesso do Skid Row.

“E ‘18 and Life’ simplesmente estourou”

Produzido por Michael Wagener e lançado em 24 de janeiro de 1989, o álbum “Skid Row” não se conectou imediatamente com os ouvintes. Isso só aconteceria meses depois, durante a turnê de abertura para o Bon Jovi — na estrada promovendo “New Jersey” (1988) —, que começou em 26 de janeiro. Snake observa:

“Éramos completos desconhecidos. Ainda não tínhamos clipes em alta rotatividade na MTV. O Headbangers Ball talvez tenha passado ‘Youth Gone Wild’ uma ou duas vezes. E então, lembro que em fevereiro estávamos fazendo um show na Flórida e vi o clipe durante o dia. Foi como: ‘Uau…’.”

Mas quando “18 and Life” conquistou o público, as coisas saíram de controle. O Skid Row estava por toda parte. Scotti aponta:

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“A MTV tinha o Dial MTV [o equivalente ao Disk MTV, da antiga MTV Brasil] naquela época, em que você podia ligar e solicitar o seu clipe favorito do dia. Então, estávamos cobrindo as arenas com panfletos do Dial MTV, e ‘18 and Life’ simplesmente estourou.”

Esse sucesso fez com que as arenas começassem a lotar mais cedo. As pessoas queriam ver de perto o que alguns menosprezavam como “Bon Jovi Jr”. E também queriam consumir seus produtos: as vendas de merchandising aumentaram a ponto de ultrapassar as da atração principal.

Em 1995, a Recording Industry Association of America (RIAA) certificou “Skid Row” com Disco de Platina Quíntuplo, pelas mais de 5 milhões de cópias vendidas somente nos Estados Unidos; mais do que o dobro das vendas do sucessor, “Slave to the Grind” (1991).

“Pensei que devia ser ketchup ou algo parecido”

Depois de concluir os compromissos em apoio ao Bon Jovi — que incluíram a performance no Moscow Music Peace Festival e um episódio em que Jon e Sebastian chegaram às vias de fato —, o Skid Row abriu a turnê de “Pump”, do Aerosmith, que começou em outubro de 1989 e se estendeu por um ano. Esse giro também foi marcado por episódios de violência e controvérsia.

No show em Springfield, Massachusetts, em 27 de dezembro, um fã jogou uma garrafa no palco durante a apresentação do Skid Row. Snake conta como o rápido episódio ocorreu:

“Estávamos tocando ‘Piece of Me’ e vi algo do lado do meu olho esquerdo. E então acho que ouvi algo bater na bateria, que era a garrafa. E o Sebastian se virou pra mim, e eu não soube o que era imediatamente, mas tinha sangue escorrendo pelo rosto dele. Pensei que devia ser ketchup ou algo parecido. E então o vi pegar a garrafa e pensei: ‘C#ralho, f#deu!’.”

Sebastian jogou a garrafa de volta para a plateia e acertou uma fã de 17 anos no rosto. O incidente foi filmado e o vocalista, preso após o show. “E tome queixa, fiança…”, elabora Scotti.

“O Sebastian foi processado, é claro. E os empresários acharam que seria justo se o resto da banda ajudasse a arcar com os custos. E então, eu não vou falar por mais ninguém, mas tomei um prejuízo de 15 mil dólares só porque: ‘ei, estamos numa banda juntos, seu lunático irresponsável do c#ralho’.”

“Dava m#rda o tempo todo, sabe?”

Em outro show em 1990, Sebastian usou uma camiseta com o slogan antigay “Aids kills fags dead” (em português, “Aids mata bichas”). Essa foi “outra pérola”, comenta Bolan.

“Acho que estávamos em Winnipeg [Canadá] e um garoto deu essa camiseta pra ele nos bastidores. E então, quando a foto saiu nas revistas, pensei: ‘bem, isso é problema dele, não meu’. Tenho muitos amigos gays. Não foi legal pra mim. Não achei engraçado.”

A comunidade gay ficou “p#ta pra c#ralho”, lembra Scotti.

“Foi um pesadelo para o Sebastian. Ele recebeu ameaças de morte. Ele teve que se mudar. As pessoas diziam: ‘Vamos botar fogo na sua casa’. Foi difícil pra ele. Acho que foi uma das poucas experiências de aprendizagem que permaneceram.”

Mas quanto mais problemas Sebastian se metia, mais discos o Skid Row vendia. Rob afirma:

“Toda vez que rolava algo como o incidente da garrafa ou o da camiseta, nossas vendas disparavam. É ridículo como isso funciona. Então, por um lado você odeia, mas por outro você está vendendo o dobro de álbuns naquela semana. Eu gostaria que pudesse ter sido diferente, mas era assim que a coisa funcionava.”

Scotti conclui:

“Os incidentes de que estamos falando são aqueles dos quais o público tem conhecimento. Mas dava m#rda o tempo todo, sabe? Foi apenas mais uma noite para mim. Porque m#rdas assim aconteciam o tempo todo.”

A turnê em suporte ao álbum “Skid Row” encerrou-se com duas apresentações no World Series of Rock, onde a banda compartilhou o palco com Bad English, Great White, Hericane Alice e Whitesnake. Após isso, os cinco membros, juntamente com o produtor Michael Wagener, deram início às gravações do próximo disco, o notavelmente mais pesado “Slave to the Grind”. E sim, as “merdas” continuariam acontecendo o tempo todo…

Skid Row — “Skid Row”

  • Lançado em 24 de janeiro de 1989 pela Atlantic
  • Produzido por Michael Wagener

Faixas:

  1. Big Guns
  2. Sweet Little Sister
  3. Can’t Stand the Heartache
  4. Piece of Me
  5. 18 and Life
  6. Rattlesnake Shake
  7. Youth Gone Wild
  8. Here I Am
  9. Makin’ a Mess
  10. I Remember You
  11. Midnight / Tornado

Músicos:

  • Sebastian Bach (voz)
  • Dave Sabo (guitarra, backing vocals)
  • Scotti Hill (guitarra, backing vocals)
  • Rachel Bolan (baixo, backing vocals)
  • Rob Affuso (bateria, percussão)

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Marcelo Vieira
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Marcelo Vieira é jornalista graduado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso (FACHA), com especialização em Produção Editorial pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Há mais de dez anos atua no mercado editorial como editor de livros e tradutor freelancer. Escreve sobre música desde 2006, com passagens por veículos como Collector's Room, Metal Na Lata e Rock Brigade Magazine, para os quais realizou entrevistas com artistas nacionais e internacionais, cobriu shows e festivais, e resenhou centenas de álbuns, tanto clássicos como lançamentos, do rock e do metal.

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