10 curiosidades sobre “Chinese Democracy”, do Guns N’ Roses

Recordes, controvérsias e desapontamentos constam do prontuário do outrora álbum mais aguardado da história do rock

Dada a reação decepcionante a “The Spaghetti Incident?” (1993) — baixa vendagem e a imprensa musical criticando o Guns N’ Roses por lançar um álbum composto inteiramente por covers —, a Geffen Records naturalmente estava ansiosa para levar sua galinha dos ovos de ouro de volta ao estúdio o mais rápido possível.

No entanto, embora o guitarrista Slash e o baixista Duff McKagan tivessem começado a trabalhar em novas ideias, o vocalista Axl Rose permaneceu em sua mansão isolada em Malibu. Estava obcecado com a ideia de entregar o maior álbum de rock já feito.

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A seu ver, o sucessor dos duplos “Use Your Illusion” (1991) precisava superá-los em forma e conteúdo. Foi questão de tempo até os colegas saírem ou serem tirados de cena, deixando-o reinar — e pirar — absoluto em sua megalomania.

Assim começava a odisseia de “Chinese Democracy”. Veja abaixo dez curiosidades sobre ele.

10 curiosidades sobre “Chinese Democracy”, do Guns N’ Roses

1. Longa gestação e elevados custos

“Chinese Democracy” detém o recorde de uma das gestações mais longas na história da produção fonográfica. O Guns N’ Roses levou mais de 15 anos para concluí-lo, com o trabalho iniciando em meados dos anos 1990 e o álbum finalmente sendo lançado em 23 de novembro de 2008.

Sua produção foi incrivelmente cara, supostamente custando cerca de 13 milhões de dólares. Esse custo elevado deveu-se ao extenso tempo de estúdio, utilizando 14 instalações diferentes, a colaboração de vários produtores — nomes como Roy Thomas Barker, Youth e Sean Beavan trabalharam no projeto antes de Axl Rose firmar parceria com Caram Constanzo — e o uso de tecnologia de gravação de ponta.

Numa carta datada de 2 de fevereiro de 2004, Axl foi informado de que, “tendo excedido todos os custos de gravação orçados e aprovados em milhões de dólares”, agora era sua obrigação financiar e completar o disco, não mais da gravadora. Sendo assim, o vocalista arcou com os custos faltantes do próprio bolso.

2. Um épico de mudanças e colaborações

Durante a prolongada produção, a formação da banda passou por inúmeras mudanças, deixando Axl Rose como o único membro original restante. Diversos músicos contribuíram para o álbum, sendo:

  • cinco guitarristas (Robin Finck, Ron “Bumblefoot” Thal, Buckethead, Paul Tobias e Richard Fortus);
  • um baixista (Tommy Stinson);
  • três bateristas (Bryan “Brain” Mantia, Frank Ferrer e Josh Freese);
  • dois tecladistas (Dizzy Reed e Chris Pitman);
  • além de Axl tocando (arranhando?) diversos instrumentos.

Sob a batuta de Marco Beltrami e Paul Buckmaster, duas orquestras deixaram sua marca em cinco das catorze faixas do álbum. Também há participações da multi-instrumentista Suzie Katayama, da harpista Patti Hood-Lindsey e do ex-vocalista do Skid Row, Sebastian Bach; este como segunda voz em “Sorry”, retribuindo a participação de Axl em três faixas de seu disco solo “Angel Down” (2007).

Apesar do peso do nome, as contribuições do guitarrista do Queen, Brian May, para “Chinese Democracy” ficaram no chão da sala de edição. Em uma atualmente indisponível postagem em seu site, May expressou seu desapontamento, mencionando ter trabalhado bastante e ficado orgulhoso do resultado. Ele afirmou compreender a decisão de Axl de “refletir o trabalho dos membros da banda como ela era naquele momento”. O músico também revelou ter mixagens das faixas com seu solo de guitarra, mas optou por mantê-las privadas “em respeito a Axl”.

Apesar dessa garantia, uma versão de “Catcher in the Rye” com o solo de May acabou vazando na internet.

3. A pegadinha que quase virou processinho

O álbum passou por várias mudanças de título antes de Axl Rose decidir-se por “Chinese Democracy”. Alguns dos provisórios incluíam “2000 Intentions”, “Cockroach Soup” e até mesmo “Oh My God”, nome da música que o Guns N’ Roses gravou para a trilha sonora do filme “O Fim dos Dias”, em 1999.

Em uma entrevista a Kurt Loder da MTV naquele mesmo ano, Axl revelou a escolha final e justificou-a:

“Há muitos movimentos pela democracia na China, e é algo sobre o qual se fala muito, e é algo que será bom de ver. [O título] também poderia ser interpretado como uma ironia. Sei lá, só sei que gosto de como soa.”

O vocalista também anunciou a intenção de lançar “Chinese Democracy” no início de 2000, mas os anos foram passando até um ponto em que o Guns quase perdeu o título do álbum.

Em 2003, o Offspring chegou a divulgar um comunicado à imprensa anunciando “Chinese Democracy” como título de seu sétimo trabalho de estúdio. “Bobeou, dançou”, disse o vocalista e guitarrista Dexter Holland na ocasião.

Na verdade, o Offspring apenas divulgou o comunicado como uma pegadinha de primeiro de abril, mas a data conhecida como Dia da Mentira passou despercebida a Axl, que enviou ao grupo uma notificação extrajudicial. “Acho que bombou um pouco mais do que pretendíamos”, comentou Holland mais tarde em entrevista à Spinner.

O Offspring acabou chamando seu sétimo álbum de “Splinter” em vez de “Chinese Democracy”. Vendeu 500 mil cópias, conquistando disco de ouro nos Estados Unidos, e gerou dois singles de sucesso: “Hit That” e “(Can’t Get My) Head Around You”.

4. Atualizando o clássico… em vão

Na supracitada entrevista a Kurt Loder, Axl Rose revelou ter regravado “Appetite for Destruction”, o clássico disco de estreia do Guns N’ Roses, com seus novos companheiros de banda. Segundo o vocalista, o disco inteiro foi refeito, “com exceção de duas músicas, que substituímos por ‘Patience’ e ‘You Could Be Mine’”.

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Ao ser questionado sobre o motivo, Axl justificou dizendo que a sonoridade oitentista das gravações originais havia envelhecido mal e que precisavam de “um pouco de enfeite… menos reverb e menos graves, coisas do tipo.”

Com o retorno de Slash e Duff McKagan ao Guns, é provável que a versão regravada do “Appetite” — se é que chegou a ser concluída — jamais veja a luz do dia; exceção feita a um trecho da regravação de “Sweet Child O’Mine”, usada a partir do 3º minuto de uma versão na trilha sonora do filme “O Paizão” (1999). No fim das contas, acabou sendo uma perda de tempo, dinheiro, e outro fator contribuinte para o atraso na entrega de “Chinese Democracy”.

5. Jogada desesperada de alarde mundial

Em 23 de março de 2004, a coletânea “Greatest Hits” do Guns N’ Roses foi lançada mundialmente, com o maior alarde, o qual incluiu até propaganda na TV no Brasil.

O que não foi amplamente discutido na época foi que o lançamento representou uma jogada desesperada da Geffen Records de recuperar parte dos milhões de dólares investidos em “Chinese Democracy”, que ainda não estava concluído após quase uma década de preparação.

Considerando que uma coletânea de maiores sucessos, um lembrete palpável da grandeza do antigo Guns N’ Roses, era a última coisa de que Axl Rose precisava enquanto reconstruía uma nova versão da banda, Merck Mercuriadis, seu então empresário, convenceu a gravadora a adiar o lançamento. Em troca, ele prometeu que “Chinese” estaria pronto até o Natal de 2003.

Com o não cumprimento dessa promessa, o CD de capa minimalista, contendo 14 faixas, incluindo o cover de “Sympathy for the Devil” dos Rolling Stones, anteriormente disponível apenas na trilha sonora do filme “Entrevista com o Vampiro” (1994), foi finalmente lançado. Vendeu mais de 13 milhões de cópias em todo o mundo, alcançando o primeiro lugar no Reino Unido e a terceira posição nos Estados Unidos.

6. Quando a paixão colide com a lei

Antes do lançamento oficial, várias faixas do “Chinese Democracy” vazaram online. Dentre esses vazamentos, destaca-se um de 18 de junho de 2008.

“‘Estou fazendo jus à minha reputação’ hoje é um eufemismo. Eu gostaria de compartilhar com vocês nove faixas do novo álbum do Guns N’ Roses, ‘Chinese Democracy’. Estas são versões masterizadas e finalizadas que vocês provavelmente nunca ouviram”, escreveu Kevin Cogill, utilizando o pseudônimo Swerl, em uma postagem no site Antiquiet. “Valeu a pena esperar (…) O Guns N’ Roses está de volta, e com a corda toda”, completou o blogueiro.

O que começou de forma bastante simples – com um fã apaixonado por música postando faixas de um de seus artistas favoritos online – logo se tornou caso de polícia.

Os advogados de Axl Rose rapidamente entraram em contato para exigir a remoção da postagem, mas, apesar de atender ao pedido, Cogill foi logo preso e acusado pelo incidente. Inicialmente, ele enfrentaria uma sentença de até um ano de prisão por sua infração, além do pagamento de uma multa de cerca de 100 mil dólares.

No entanto, após decidir que não havia intenção de Cogill de lucrar com o crime — “nunca quis prejudicar o artista, pretendia promovê-lo porque sou um fã”, disse ele — e considerando o fato de que o acusado cooperou com as autoridades quando seu erro foi apontado, o juiz americano Paul Abrams decidiu reduzir a punição. Depois de um ano de disputas legais, o blogueiro foi condenado a cumprir dois meses de prisão domiciliar e um ano de liberdade condicional por violar a lei federal de direitos autorais.

No entanto, um mistério permanece: quem forneceu a Cogill as gravações?

7. Expectativas desapontadas

Na ocasião da prisão de Cogill, Slash expressou ao Los Angeles Times: “Espero que ele apodreça na prisão. Isso [o vazamento] afetará as vendas do disco e não é justo”.

O então ex-guitarrista do Guns N’ Roses parecia antever o futuro.

Apesar da longa espera e das crescentes expectativas, “Chinese Democracy” estreou em terceiro lugar na Billboard 200, nos Estados Unidos, vendendo 261 mil cópias na primeira semana — número significativamente abaixo das previsões. As vendas tiveram uma queda acentuada na segunda semana, chegando a pouco menos de 57 mil cópias, e o álbum caiu para a 18ª posição na parada.

A performance aquém do esperado no principal mercado consumidor de discos do planeta foi atribuída ao acordo exclusivo de distribuição com a rede Best Buy e à falta de aparições promocionais por Axl Rose.

Esse baixo desempenho estendeu-se a outros territórios. Embora tenha alcançado o primeiro lugar em oito países, estima-se que “Chinese” tenha vendido cerca de 2,6 milhões de cópias em todo o mundo. Para efeito de comparação, isso é pouco mais da metade do que “The Spaghetti Incident?” conseguiu vender.

8. Carnaval da China?

O retrato em sépia não era a primeira escolha para a capa de “Chinese Democracy”. A ideia original de Axl Rose era utilizar a reinterpretação feita por Chen Zhuo e Huang Keyi de uma imagem da Praça da Paz Celestial, local famoso em Pequim, China, que foi palco dos protestos pró-democracia em 1989.

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A obra faz parte de uma série chamada “Carnaval da China”, que retrata o país como um parque de diversões gigante. Segundo os artistas, a série expressa “a exuberância e o otimismo de uma geração mais jovem que cresceu após o caos e a angústia da Revolução Cultural (…) Embora a atmosfera das obras pareça comemorativa, há um sentimento subjacente mais sombrio da sociedade como um carnaval sinistro onde a diversão pode chegar a um fim imprevisível e repentino”.

Não foi a primeira vez que Rose propôs uma ideia polêmica. Inicialmente, ele queria usar uma imagem da explosão do ônibus espacial Challenger em “Appetite for Destruction”. No entanto, os executivos da gravadora Geffen rapidamente rejeitaram a ideia, dada a tragédia que resultou na morte de sete pessoas.

Quando Zhuo e Keyi recusaram a cessão de direitos devido às rígidas leis de censura da China e aos riscos de colaborar com um projeto potencialmente controverso, a capa de “Chinese” acabou apresentando a foto tirada por Terry Hardin na cidade murada de Kowloon, em Hong Kong, na qual vê-se uma bicicleta velha encostada em uma parede em ruínas, com as palavras “Guns N’ Roses” pintadas em spray ao fundo. Muitos fãs, que esperaram 17 anos pelo lançamento, ficaram desapontados com a arte simplória.

Uma capa alternativa apresentando uma mão vermelha brilhante cercada por pequenas figuras humanas, feitas para se parecerem com formigas, foi lançada em edição limitada e desde então se tornou um item de colecionador.

9. A trilha proibida

David Flumenbaum abriu o editorial do Huffington Post em 24 de fevereiro de 2009 com a seguinte observação:

“Sabe o que nunca chegará à China? Algo que o mundo espera pacientemente para ver há anos. Algo que todos esperávamos ver algum dia, mas achávamos que nunca veríamos. Se você disse ‘Democracia Chinesa’, acertou. E, infelizmente, não estamos falando do direito ao voto pelo povo chinês, embora gostássemos de ver isso também. Estamos falando do primeiro álbum de estúdio do Guns N’ Roses em 17 anos, ‘Chinese Democracy’, lançado em todos os lugares, menos na China.”

Isso porque as autoridades chinesas proibiram as vendas do álbum, citando o título como o principal motivo; regras estabelecidas pelo Ministério da Cultura da China proíbem o uso da palavra “democracia” no título de qualquer música, livro ou filme no país continental.

Sendo assim, as lojas de discos não foram autorizadas a vender “Chinese Democracy”, e os fãs, proibidos de comprar o álbum no iTunes. O maior portal da China, Baidu.com, bloqueou todas as buscas na internet por “Chinese Democracy”, e o acesso ao hotsite do disco foi impedido de norte a sul do país.

Sem poder obter o álbum por meios legais, os fãs de rock na China deram um jeito. Versões piratas de “Chinese Democracy”, uma delas em caixinha de lata, circularam por baixo dos panos. E como tudo que é proibido é mais gostoso, o banimento só atiçou a curiosidade das pessoas, tornando o disco um fenômeno cultural justamente no país onde era menos provável que isso acontecesse.

10. “Chinese Democracy” nos palcos

Todas as músicas de “Chinese Democracy” foram apresentadas ao vivo pelo Guns N’ Roses, sendo que três delas – a faixa título, “Better” e “This I Love” – estão entre as 20 mais frequentemente tocadas nos shows da banda. Abaixo, segue o cronograma das estreias das músicas do álbum nos palcos:

  • “Chinese Democracy”, “Street of Dreams” (então conhecida como “The Blues”), e “Riad N’ the Bedouins” fizeram sua estreia no House of Blues, em Las Vegas, no dia 1º de janeiro de 2001. Este foi o primeiro show do Guns N’ Roses desde 17 de julho de 1993 e também o primeiro sem Slash e Duff McKagan desde 1985. Além disso, foi a primeira apresentação da formação que trazia os guitarristas Paul Tobias, Buckethead e Robin Finck, o baixista Tommy Stinson, o baterista Bryan “Brain” Mantia e o tecladista Chris Pitman.
  • Posteriormente, “Madagascar” teve sua estreia duas semanas depois, em 14 de janeiro, durante a participação do Guns no Rock in Rio III, na Cidade do Rock, no Rio de Janeiro.
  • Um intervalo de cinco anos se passou até que novas músicas de “Chinese” fossem incluídas no repertório da banda. Em 12 de maio de 2006, os presentes no Hammerstein Ballroom, em Nova York, testemunharam as primeiras performances ao vivo de “Better”, “There Was a Time” e “I.R.S.”.
  • Somente em 2009 a lista foi completada, começando por “Shackler’s Revenge”, “If the World” e “This I Love”, que estrearam em 11 de dezembro no Taipei Stadium, em Taiwan. “Sorry” teve sua première dois dias depois no Olympic Gymnastics Arena em Seul, capital da Coreia do Sul. Por fim, “Catcher in the Rye”, “Scraped” e “Prostitute” foram apresentadas três dias mais tarde no Kyoucera Dome, em Osaka, Japão.

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Marcelo Vieira
Marcelo Vieirahttp://www.marcelovieiramusic.com.br
Marcelo Vieira é jornalista graduado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso (FACHA), com especialização em Produção Editorial pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Há mais de dez anos atua no mercado editorial como editor de livros e tradutor freelancer. Escreve sobre música desde 2006, com passagens por veículos como Collector's Room, Metal Na Lata e Rock Brigade Magazine, para os quais realizou entrevistas com artistas nacionais e internacionais, cobriu shows e festivais, e resenhou centenas de álbuns, tanto clássicos como lançamentos, do rock e do metal.

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