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Crítica: “O Telefone Preto” mostra como adaptar nem sempre é o caminho

Desperdiçando personagem assustador, filme do diretor Scott Derrickson faz escolhas equivocadas ao dar versão cinematográfica fiel demais ao conto de Joe Hill

Para entender o problema de “O Telefone Preto”, precisamos esclarecer a diferença entre três pilares: baseio, inspiração e adaptação.

Um filme baseado em alguma obra tem como sustentação apenas base da história. Não há obrigação em ser fiel a nada – apenas se utiliza de uma estrutura existente para escrever uma nova história. Já a inspiração passa mais longe ainda da obra original, uma vez que tal leitura serviu apenas como influência para outro enredo.

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O terceiro pilar é a adaptação. Consiste em pegar cada ideia e palavra de um livro ou conto e reproduzi-lo em tela o máximo possível. É aqui onde reside a falha de “O Telefone Preto”, um filme que gritava por mais inspiração do que adaptação.

A trama de “O Telefone Preto”

Com autoria de Joe Hill – filho de Stephen King e Tabitha King – e lançado originalmente como livro, “O Telefone Preto” conta a história de um sequestrador chamado The Grabber, interpretado por Ethan Hawke na adaptação cinematográfica. Nos anos 1970, o criminoso sequestrava crianças e as aprisionava em um porão com o intuito de castigá-las até a morte.

Ao sequestrar o jovem Finney, as coisas começam a mudar para The Grabber, uma vez que a vítima se comporta diferente das demais crianças. Um dos motivos é o velho telefone preto que está preso na parede do cárcere. Na teoria, o objeto não deveria funcionar, mas acaba tocando diversas vezes.

Dessa forma, Finney se comunica com as antigas vítimas e consegue criar soluções para escapar de seu antagonista. Enquanto tudo isso se desenrola, a irmã de Finney passa a fazer suas próprias buscas pelo irmão, uma vez que ela tem sensações e sonhos místicos que podem ajudar a encontra-lo.

Conto vs. filme

A versão cinematográfica de Scott Derrickson (“Doutor Estranho”), com colaboração de C. Robert Cargill (também “Doutor Estranho”), adapta palavra por palavra do conto de Joe Hill. E para impressionar e não dar margens ao erro, as assustadoras máscaras do personagem foram feitas pelo genial Tom Savini, um dos maiores maquiadores da história.

Quem se dispuser a ler o conto “O Telefone Preto”, vai se impressionar – especialmente se estiver em um quarto, sozinho e à noite. Porém, a mescla de suspense, terror e resoluções místicas costumam me dispersar um pouco de algumas obras. Entra aí o que foi explicado no começo do texto: nem todo livro ou conto deve ser adaptado à tela de forma fiel.

Muitas vezes, o que funciona em um livro não traz bons resultados no cinema. O longa em questão perde demais ao querer seguir os caminhos que Joe Hill traçou para sua história. É, por exemplo, muito difícil ver em tela um grupo de policiais deixando a investigação de um crime nas mãos de uma garotinha que tem sonhos místicos.

A história em si é extraordinária. Um digno suspense/terror com um vilão mascarado doentio e assustador, interpretado de forma magistral por Ethan Hawke. As máscaras, se fossem melhor trabalhadas e desenvolvidas no roteiro, certamente cairiam no gosto popular como novo adereço para o Halloween.

Entretanto, o diretor abre mão desse tesouro para adaptar palavra por palavra de um conto com misticismo. O resultado é confuso, sem profundidade e a solução final beira o ridículo – ainda mais quando falamos de crianças contra adultos armados.

Elenco forte

Um dos grandes desafios que um ator pode enfrentar na carreira é atuar usando máscaras. Indicado quatro vezes ao Oscar, Ethan Hawke conseguiu brilhar com seu The Grabber mesmo nessa situação, embora não tenha sido bem aproveitado em tempo de tela.

É assustadora e poética a forma como Hawke trabalha cada uma das máscaras que usa. O corporal, a voz… cada gesto é engrandecido por esse brilhante ator que poderia concorrer a premiações se fosse bem trabalhado no roteiro.

As crianças presentes no longa são muito carismáticas. Mason Thames, que interpreta o protagonista Finney, enche a tela de forma competente – afinal, quando você torce pro protagonista sobreviver, significa que o ator está fazendo algo certo. A pequena Madeleine McGraw, que interpreta Gwen, a irmã de Finney que tem sonhos místicos com pistas que podem ajudar a localizar o irmão, também se destaca por sua simpatia e força. Ao lado de Hawke, ela é o “coração” do filme.

Tiro certo da Blumhouse?

No fim das contas, “O Telefone Preto” tornou-se um filme mediano para baixo por conta do roteiro. Ao menos representa um novo acerto da Blumhouse em termos técnicos – barato em orçamento e com trailer chamativo, certamente o investimento se pagará.

Mas vale a ida ao cinema? Talvez não seja uma má ideia esperar pelo lançamento no streaming.

Com distribuição da Universal Studios, “O Telefone Preto” estreia nos cinemas brasileiros dia 21 de julho.

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Raphael Christensen
Raphael Christensenhttp://www.igormiranda.com.br
Ator, Diretor, Editor e Roteirista Formado após passagem pelo Teatro Escola Macunaíma e Escola de Atores Wolf Maya em SP. Formado em especialização de Teatro Russo com foco no autor Anton Tchekhov pelo Núcleo Experimental em SP. Há 10 anos na profissão, principalmente no teatro e internet com projetos próprios.

5 COMENTÁRIOS

  1. ALERTA DE SPOILER!
    Não entrarei na questão sobre adaptação ou inspiração, msm pq não li o conto, mas o filme não se trata ao meu ver do sequestrador e sim do menino. É um filme sobre superação de um menino inseguro e que precisa da ajuda e da aprovação de terceiros para acreditar em sua própria força. O telefone nunca toca na vdd, é a imaginação do próprio menino que o faz tocar para que “ouça” dos outros sequestrados, q são seus conhecidos, palavras de encorajamento para que possa acreditar em sua própria força para enfrentar a situação não só do sequestro, mas TB da violência doméstica q sofria do pai e dos abusos na escola…

  2. O filme é bom, não espetacular, mas é bom. Prende bastante.
    Superou minhas expectativas, e foi por um caminho que eu não esperava pelo que vi no trailer.
    Sobre a parte de não ir ao cinema vê-lo, apesar de ser meio tarde (pelo menos em minha cidade já tem poucas sessões), mas vale muito a pena por ter muito jump scare. Fora que o negócio foi tão tenso, que mesmo sendo meio “absurdo” uma criança matar um adulto daquela forma, o cinema inteiro aplaudiu e vibrou quando ele fez.

  3. Que crítica mais venenosa e amargurada. O filme é ótimo e você só quis bancar o do contra. E nada se compara a experiência de assistir um filme no cinema!!!!

    • Okay, eu realmente achei a sua crítica bem equivocada.
      A narrativa do filme é muito boa justamente porque o conceito apresentado é simples e você consegue entender o Porquê daquilo estar ali sem ademais explicações.
      Por exemplo, “a garota dos sonhos místicos” só teve relevância pra polícia por ter demonstrado saber de detalhes da trama de antemão.
      Você sequer prestou atenção nisso?

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