A casa estava caindo para o Black Sabbath no meio da década de 1970 – e não era por causa dos volumes ensurdecedores dos shows abalando as estruturas.
A banda responsável pela popularização do heavy metal no mundo havia descoberto um esquema enorme de falcatruas sendo feitas por seu empresário até então, Patrick Meehan. Tentavam, então, arrumar a bagunça.
A batalha para se verem livres de seu contrato com Meehan foi tão pública e espinhosa a ponto do vocalista Ozzy Osbourne ser servido uma intimação judicial durante um show do grupo, dando início a dois anos de brigas em tribunal.
Mesmo assim, em meio a todo esse caos, o Sabbath conseguiu produzir um disco que conseguia voltar às raízes do que fez a banda despontar sem abrir mão da experimentação sonora dos álbuns anteriores. Essa é a história de “Sabotage”, seu sexto trabalho – e considerado por muitos o último “clássico” da formação original.
Roubalheira no Black Sabbath
Em 1974, o Black Sabbath estava exausto depois de quatro anos na estrada. Os músicos, porém, estranhavam o fato das vendas e ingressos de shows vendidos não estarem rendendo tanto para o grupo quanto deviam.
Em “Black Sabbath: A Biografia”, de Mick Wall, Ozzy Osbourne descreveu o momento quando começou a suspeitar de Patrick Meehan:
“De repente me ocorreu, quando fui ao escritório [em Londres] um dia e [Patrick Meehan] tinha um quarteirão inteiro de escritórios e Rolls-Royces para dias diferentes e toda essa m#rda e agências diferentes e sei lá mais o quê. E não é preciso ser um gênio para pensar: ‘espera lá, ele tem quatro Rolls-Royces agora e eu ainda ando com um VW’, ou algo assim.”
A banda toda começou a fazer perguntas acerca do estado das finanças para Meehan, mas nunca recebiam uma resposta concreta. Quando finalmente descobriram a dimensão da roubalheira, se viram confrontados com uma verdade horrível: tudo deles, de carros e apartamentos até a própria música gravada, era propriedade de Meehan e sua agência, a Worldwide Artists.
O gigante acordou
O Black Sabbath era um dos grupos britânicos mais bem sucedidos naquele momento, especialmente nos Estados Unidos. Mesmo assim, não tinham um centavo sequer. Foram sabotados pela pessoa cuja função era tomar conta deles. E agora eles queriam seu quinhão.
O primeiro passo foi demitir Meehan e arranjar outro empresário. O escolhido foi Don Arden, um dos nomes mais infames do showbusiness inglês por suas táticas, digamos, quase criminosas.
Ele havia oferecido agenciar o grupo em 1970, apenas para ser rejeitado. Normalmente isso faria o Sabbath inimigos mortais dele, mas uma amizade com o guitarrista Tony Iommi e o atrativo de ter uma banda de tanto sucesso nos EUA o convenceu a aceitá-los como clientes.
Em “Black Sabbath: A Biografia”, Arden conta os primeiros passos para reestabelecer o grupo:
“Minha prioridade número um era conseguir algum dinheiro para eles. Isso significava ir até a gravadora — Vertigo no Reino Unido, Warner Brothers nos Estados Unidos — e fazer com que entendessem que a banda ainda era viável e agora estava em boas mãos. Falei às duas gravadoras para esquecerem a bagunça anterior, deixar tudo comigo. Isso era exatamente o que eles queriam ouvir, e recebi um bom adiantamento, que usei para colocar a banda de volta no estúdio e fazer outro disco.”
Sabotagem no estúdio
Quando finalmente entrou no estúdio para gravar o que seria seu sexto disco, o Black Sabbath tinha em mente um retorno à simplicidade de seus quatro primeiros lançamentos. “Sabbath Bloody Sabbath”, apesar de ser bem recebido por público e – pela primeira vez na carreira – crítica, havia apontado para um caminho mais complexo, influenciado por rock progressivo, o qual a banda não tinha mais interesse.
Em entrevista à Classic Rock, Tony Iommi resumiu o desejo do grupo na época:
“A gente podia ter continuado no caminho de ficar mais técnicos, usando orquestras e tudo mais. Mas a gente queria fazer um álbum de rock.”
O problema para esse objetivo se apresentou na forma da batalha judicial da banda com Patrick Meehan – ou melhor, de Patrick Meehan com a banda. O Sabbath agora estava sendo processado pelo empresário ladrão por quebra de contrato. Eram servidos intimações para comparecer ao tribunal quase diariamente.
A situação acabou influenciando a sonoridade do disco. Estressados e furiosos, os integrantes descontavam todas suas frustrações na música, criando algumas das canções mais pesadas da banda até então, a exemplo de “Hole in the Sky” e “Symptom of the Universe” – esta última, citada por várias fontes como uma das primeiras composições de thrash metal da história. Até mesmo momentos mais experimentais, como “Megalomania”, soavam viscerais no fim das contas.
Uma dessas faixas fazia referência direta à presença de advogados no estúdio: “The Writ”. A letra da canção foi escrita por Osbourne – algo incomum, uma vez que o baixista Geezer Butler era o principal letrista do Sabbath – e é uma desopilação sem dó de tudo atravessado na garganta do vocalista.
Numa entrevista para a Guitar World em 2001, Butler falou sobre como o Sabbath batizou o álbum de “Sabotage” para refletir a condição do grupo:
“A maior parte do tempo, quando não estávamos no palco ou no estúdio, estávamos em escritórios de advogados tentando sair de todos nossos contratos. Estávamos literalmente no estúdio, tentando gravar e estaríamos assinando depoimentos e outras coisas. Por isso que chamamos o disco de ‘Sabotage’ – porque sentíamos que todo o processo foi sabotado por todas essas pessoas nos roubando.”
O último dos clássicos
Sonicamente, “Sabotage” continua as ideias estabelecidas em “Vol. 4” (1972), um dos maiores sucessos do Black Sabbath. Mantém alguns experimentos presentes em “Sabbath Bloody Sabbath”, mas sem abrir mão do peso e da assinatura sonora que consagrou o grupo anos antes.
Lançado em julho de 1975, acabaria sendo o último sucesso criativo do grupo com Ozzy na formação. Atingiu o 7º lugar nas paradas do Reino Unido e 28º nos EUA, ganhando disco de prata e ouro, respectivamente.
Qualquer sonho de capitalizar em cima desse sucesso em turnê caiu por terra em dezembro de 1975, quando Ozzy sofreu um acidente de moto e a banda precisou cancelar todos os shows.
O álbum seguinte, “Technical Ecstasy” (1976), foi marcado por brigas entre os integrantes e as consequências da rotina hedonista do grupo até então. Ao fim da turnê de promoção do álbum, Ozzy deixou o grupo apenas para retornar a tempo de gravarem “Never Say Die!” (1978). Ali, todas as tensões e vícios chegaram a níveis críticos, culminando na saída definitiva do vocalista, demitido.
Black Sabbath – “Sabotage”
- Lançado em 28 de julho de 1975 pela Vertigo Records
- Produzido por Black Sabbath e Mike Butcher
Faixas:
- Hole in the Sky
- Don’t Start (Too Late)
- Symptom of the Universe
- Megalomania
- Thrill of It All
- Supertzar
- Am I Going Insane (Radio)
- The Writ
Músicos:
- Ozzy Osbourne (vocal)
- Tony Iommi (guitarra, piano, sintetizadores, órgão, harpa)
- Geezer Butler (baixo)
- Bill Ward (bateria, percussão, piano)
Músico adicional:
- Will Malnoe (arranjos para o English Chamber Choir)
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Uma das melhores bandas do estilo, Gosto muito desse disco do Sabbath!!!! Valeu!!!!
Ótima matéria… Sempre gosto de saber das tretas da melhor banda de todos os tempos. Obrigado. De nada