Lançado em 1976, meses após “Destroyer”, o álbum “Rock and Roll Over” é um dos grandes clássicos do Kiss. E sua aura começa logo na capa, uma das mais icônicas da carreira da banda.
A imagem dos quatro rostos maquiados, cercados por suas próprias “energias” dentro do círculo principal, certamente ajudou a fixar no imaginário popular as “personas” dos integrantes.
O responsável pela arte foi o ilustrador Michael Doret, que concebeu seu trabalho mais famoso sem saber quase nada sobre o Kiss. Foi necessário que enviassem a ele explicações sobre os personagens de cada músico – Demon (Gene Simmons), Starchild (Paul Stanley), Spaceman (Ace Frehley) e Catman (Peter Criss) – antes do nascimento da própria ideia.
Kiss e as inspirações orientais
Ao buscar mais informações sobre o Kiss, Michael Doret explicou em seu site oficial que lembrou imediatamente das máscaras do teatro kabuki japonês, a real inspiração para as populares maquiagens. O artista havia trabalhado recentemente na capa da revista Idea, uma publicação nipônica sobre arte, o que também influenciou na hora da criação.
Curiosamente, a capa de “Rock and Roll Over” não foi a primeira capa do Kiss com inspirações vindas do Japão. Em “Hotter Than Hell” (1974), segundo álbum da banda, a arte também é inspirada na cultura oriental, com direito a texto escrito em caracteres japoneses – nesta ocasião, para passar a (falsa) ideia de que o grupo já era popular por lá.
A aprovação da capa de “Rock and Roll Over”
De acordo com Doret, após o período de pesquisa, surgiu a ideia de criar uma espécie de mandala com todos os elementos ligados ao Kiss. Há uma serra circular ao redor, bem como o título “Rock and Roll Over”.
Em entrevista ao podcast 80’s Metal Glamcast, transcrita pelo BraveWords, o artista falou sobre a reação da banda ao ver a obra pronta, bem como as poucas alterações que foram pedidas.
“Eles amaram o que eu fiz. Haviam algumas poucas queixas sobre os rostos. As mudanças que tive que fazer eram em Gene e Paul. Eu desenhei Gene parecido demais com o Coringa, do Batman.”
O ilustrador disse ainda que o único rosto que não sofreu nenhuma alteração da versão original foi o de Peter Criss.
Outras mudanças incluíram um giro de 90º do título do álbum ao redor do círculo e pequenas adaptações na famosa logo do Kiss, com raios na parte de baixo. A ideia era transmitir a sensação de movimento.
“Sonic Boom”
Como a capa de “Rock and Roll Over” se tornou icônica, o Kiss decidiu trabalhar com Michael Doret novamente. Porém, demorou um pouco: o retorno do artista ocorreu apenas em 2009, para a arte de “Sonic Boom”, 19º disco de estúdio da banda – e o primeiro em 11 anos.
A intenção era clara: resgatar um pouco da aura do clássico trabalho de 1976. Também em entrevista ao podcast, Doret detalhou que o processo da criação da imagem de “Sonic Boom” foi diferente, com Paul Stanley diretamente envolvido no processo – como uma espécie de diretor de arte.
“Nessa, trabalhei mais com Paul. Foi ele quem dirigiu. Em ‘Rock and Roll Over’, o design foi deixado para mim. Não sei se teria feito o que fiz sem sua direção. Eles realmente queriam revisitar ‘Rock and Roll Over’, mas fazer um pouco diferente. Eles queriam recapturar um pouco da empolgação do passado. Acho que funcionou muito bem.”
O artista destacou ainda que, em “Sonic Boom”, foi orientado por Stanley a usar fotos em vez de desenhos – e imagens que já existissem, pois não haveria uma sessão para a capa. Dessa forma, foi necessário explorar mais as habilidades do profissional como ilustrador.
Outras referências
A arte de Michael Doret em “Rock and Roll Over” seria ainda revisitada em vários tributos e também pelo próprio Kiss em seu “Kiss Symphony: Alive IV” (2003). No trabalho ao vivo, a prensagem dos CDs traz uma ilustração de Ludwig Van Bethoven com maquiagens da banda e a serra circular da imagem original de 1976, com os dizeres “Rock and Roll Over Bethoven” – em um trocadilho com o hit de Chuck Berry.
Até mesmo outras bandas fizeram referências a essa arte. Em 2018, a banda de thrash metal Anthrax lançou o álbum ao vivo “Kings Among Scotland” cuja capa tem uma orientação bem similar à clássica de 1976.
* Texto por André Luiz Fernandes, com pauta e edição de Igor Miranda.