O culto em torno do Pretty Maids no Brasil não se explica apenas pela solidez de sua discografia — que soma 16 álbuns de estúdio —, mas por uma série de conexões afetivas e circunstanciais que transcendem os discos. No passado, os dinamarqueses chegaram a passar despercebidos por aqui, com apenas “Future World” (1987) ganhando lançamento nacional em vinil. Hoje, são reverenciados como referência cult por fãs que os descobriram de maneiras diversas: seja por meio das participações marcantes de Ronnie Atkins no Avantasia — especialmente no álbum “Moonglow” (2019), onde divide com Tobias Sammet os vocais da impactante “The Raven Child” —, ou por quem se comoveu com sua história de luta.
Diagnosticado com um câncer de pulmão em estágio avançado em 2019, Atkins foi informado de que teria pouco tempo de vida. A resposta veio em forma de arte: desde então, lançou cinco álbuns solo — “One Shot” (2021), “4 More Shots (The Acoustics)” (2021), “Make It Count” (2021), “Symphomaniac” (2022) e “Trinity” (2023) — e dois com o Pretty Maids: “Undress Your Madness” (2019) e o ao vivo “Maid in Japan” (2020). Um exemplo comovente de resistência e produtividade em tempos sombrios.
Independentemente da porta de entrada, o que importa é onde ela levou: à recepção calorosa no Bangers Open Air 2025, onde o Pretty Maids subiu ao palco Hot Stage na sexta-feira (2) de abertura do festival. A experiência viu-se prejudicada por problemas técnicos recorrentes àquele dia — especialmente no vocal de Atkins e nas guitarras de Ken Hammer e Chris Laney, que quase sumiram da mixagem. A bateria de Allan Sørensen e o baixo de René Shades acabaram assumindo protagonismo sonoro não intencional, o que contrastou com a proposta melódica e equilibrada do hard ‘n’ heavy da banda, marcado por refrões grudentos e guitarras em camadas.
O repertório privilegiou cinco álbuns da carreira do grupo. O já citado “Future World” contribuiu com três faixas, incluindo a espetacular faixa-título e “Love Games”, que formaram a empolgante dobradinha de encerramento. Já “Pandemonium” (2010) também foi generosamente lembrado, com destaques para a poderosa “I.N.V.U.” — com seu refrão catártico “I envy you, your perfect life” — e a balada “Little Drops of Heaven”, que ganhou uma interpretação sentida e emocionada, elevando o clima do festival a um raro momento de contemplação.
No entanto, o ápice emocional veio com “Please Don’t Leave Me”, originalmente composta por Phil Lynott e John Sykes — este último, guitarrista fundamental do Whitesnake, falecido em dezembro de 2024. A interpretação de Ronnie Atkins transformou a canção em lamento pessoal e homenagem ao amigo que partiu. A voz rouca, combalida mas firme, parecia implorar com urgência real.
Em segundos, o Memorial da América Latina virou templo. Diante de um público com olhos marejados, ficou claro: Ronnie pode ter recebido uma sentença, mas se recusa a viver sob ela. E nós, enquanto houver canções como essa, nunca o deixaremos.
**Este conteúdo faz parte da cobertura Bangers Open Air 2025 — clique para conferir outras resenhas com fotos e vídeos.
Repertório — Pretty Maids no Bangers Open Air 2025
- Mother of All Lies
- Kingmaker
- Rodeo
- Back to Back
- Red, Hot and Heavy
- Pandemonium
- I.N.V.U.
- Little Drops of Heaven
- Please Don’t Leave Me (original de John Sykes)
- Future World
- Love Games
Clique para seguir IgorMiranda.com.br no: Instagram | Bluesky | Twitter | TikTok | Facebook | YouTube | Threads.