Direto ao ponto, Manowar mostra força de suas músicas com produção grandiosa em SP

Com atuação irrepreensível do vocalista Eric Adams, banda minimizou excessos e evitou polêmicas ao encher sem lotar o quente e barulhento Espaço Unimed

Chega o verso final da última música, e um senhor de 71 anos canta nos mesmos tons altos de quando a canção foi lançada, 36 anos atrás. Incluindo o mesmo grito hercúleo de quase 15 segundos no derradeiro refrão. 

A voz de Eric Adams ainda segue como uma força da natureza e carregou o Manowar em suas cordas vocais no que foi a principal marca do show da banda na noite do último sábado (23) no Espaço Unimed: o poder de suas músicas com seus fãs numa produção grandiosa e volume intenso.

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Repertório equilibrado, mas mal escolhido

A infernalmente quente casa na zona oeste paulistana não estava lotada, mas longe de estar vazia para ver a quinta passagem no Brasil dos auto-proclamados “reis do metal”. O repertório da noite não foi polêmico como no show de 2010, no Credicard Hall, em que a banda ignorou por completo todo o seu material dos anos 80 e anos 90. 

A escolha das músicas para a atual turnê “Crushing the Enemies of Metal”, que celebra quarenta anos da banda, poderia ter seguido a receita tradicional e sido mais abrangente em sua discografia. O Manowar, porém, não fez sua carreira com base em qualquer cartilha e quis dar peso similar ao escasso material do milênio atual em relação ao passado oitentista, ignorando três de seus quatro seminais primeiros discos.

Foto: Jake Owens / Magic Circle Entertainment

Só não dá para brigar com os fatos. Não se compara a reação que “Immortal”, música de “Highlights from the Revenge of Odysseus”, EP lançado em 2022, teve na sequência da ressuscitada “Holy War”, de “Fighting the World” (1987), que em raras turnês figurou no repertório do grupo. 

O abismo fica ainda maior em relação à frenesi do público durante a trinca inicial da noite, com “Manowar”, de “Battle Hymns” (1982); “Kings of Metal” e “Fighting the World”, as emendadas faixas-título dos discos de 1988 e 1987, respectivamente.

Direto ao ponto

Foi uma apresentação que felizmente se focou nas músicas da banda, minimizando excessos de virtuose – ainda que agora tenha na formação Michael Angelo Batio, um guitarrista de renome no onanismo guitarrístico. Apenas dois desnecessários e curtos interlúdios de guitarra e baixo interromperam a sequência de canções antes do bis – o primeiro deles ainda teve problemas técnicos, mas introduziu a clássica “Hail and Kill”, também de “Kings of Metal”, que pôs a casa abaixo.

Depois de ter o ex-guitarrista Karl Logan preso em posse de pornografia infantil, é natural que a banda tenha podado qualquer aceno misógino-sexista de seu show. Com uma formação quase septuagenária — à exceção de Dave Chedrick, baterista caçula de meros 53 anos de idade —, também o visual “Conan, o Bárbaro” deu lugar a um vestuário de armaduras para combinar com os grandiosos cenários envelopando o palco com panos de fundo que mudavam conforme as músicas.

Foto: Jake Owens / Magic Circle Entertainment

Ainda assim, o controle quase paranoico da própria imagem fez a banda proibir a filmagem do show para passar nos telões, além de restringir o acesso de fotógrafos na cobertura do evento. Talvez para prevenir sua exposição em frente ao palco com o volume altíssimo já tradicional nos shows do Manowar, mas numa qualidade de equalização raras vezes ouvida no Espaço Unimed.

Apresentação fluida

Se não dá para elogiar a escolha das músicas, pelo menos a sequência com que foram apresentadas deu fluidez à apresentação do Manowar. O público cantou junto o épico refrão da cadenciada “Call to Arms”, a primeira de três tiradas de “Warriors of the World”, de 2002 – quase quatro, se considerada “The Dawn of Battle”, do EP do mesmo nome e do mesmo ano. Depois, a interpretação convincente de Eric Adams na power ballad “Heart of Steel” foi acompanhada quase um uníssono pelo público e arrancou algumas lágrimas.

Adams teve seu pequeno momento de virtuose vocal ao aquecer o público para cantar a cadenciada, nada original, mas pegajosa “Warriors of the World (United)”, do disco de 2002. Combinou com o tema dos guerreiros unidos do mundo convidar os ex-membros brasileiros do grupo, o guitarrista Evandro “E.V.” Martel e baterista Marcus Castellani, acompanhados ainda do vocalista da banda-tributo Kings of Steel, Cleber Krichinak, que cantou sozinho a primeira parte da música.

A parte inicial da apresentação se encerrou em alta velocidade, com quatro músicas em que os bumbos dispararam e foi possível perceber que o entrosamento da formação atual, junta desde 2022, ainda não é dos melhores. Apesar disso, Eric Adams mostrou de novo todo seu carisma na parte épica de “The Dawn of Battle” e fôlego e voz para segurar os tons altíssimos de “The Power”, única de “Louder than Hell” (1996).

No meio dessa seção em que o Manowar mostrou que pode fazer power metal como nenhuma outra banda, foram tocadas “King of Kings”, faixa do totalmente esquecível “Gods of War” (2007), além da bem recebida, mas nada memorável “Fight Until We Die”, de 2002. A primeira parte do show poderia ter se encerrado melhor caso tivesse optado por faixas dos ignorados discos, mas influentes na formação do estilo, “Into Glory Ride” (1983), “Hail to England” e “Sign of the Hammer” – ambos de 1984.

Foto: Jake Owens / Magic Circle Entertainment

Velhas manias e fim apoteótico

Assim como é difícil para um velho cantor de 71 anos deixar de lado seus gestos falocêntricos enquanto canta, não vai existir show do Manowar sem discursos do seu baixista e líder Joey DeMaio. E ele veio quase totalmente em português quando a banda voltou para o bis, perguntando até sobre a origem regional dos fãs no show daquela noite, além de pedir para pressionar a produção a trazê-los na próxima edição do Monsters of Rock.

O discurso não foi tão longo como no passado ou como o totalmente desnecessário vídeo de homenagem a um membro brasileiro da equipe técnica. Claramente uma piada interna com Manoel, ou “Manwell” nas palavras do baixista, que fazia aniversário na data e viu o público lhe cantando parabéns.

Foto: Jake Owens / Magic Circle Entertainment

Logo a banda emendou quase que às pressas com a épica “Battle Hymn”, icônica faixa do disco quase homônimo de de 1982. O encerramento veio com a ultrarrápida “Black Wind, Fire and Steel”, de “Fighting the World”, aquela música do início do texto, que precedeu a Joey DeMaio arrancando as cordas, uma a uma, de seu baixo. Isso em meio a explosões, muita fumaça e a sempre ridicularizada saudação do “sinal do martelo” pelo resto da banda e público.

Se o Manowar tivesse se preocupado em sua carreira mais com a produção de seus shows do que com todo o tipo de excessos que trazia ao palco, seriam maiores as chances da qualidade de suas músicas se sobressair em relação a detratores que buscam fama atirando em alvos fáceis. Enquanto Eric Adams demonstrar a potência vocal como nessa noite de sábado, pelo menos ao vivo a banda ainda terá lenha para queimar. 

Foto: Jake Owens / Magic Circle Entertainment

Manowar – ao vivo em São Paulo

  • Local: Espaço Unimed
  • Data: 23 de setembro de 2023
  • Turnê: Crushing the Enemies of Metal Anniversary Tour

Repertório:

  1. (Intro: March of the Heroes Into Valhalla)
  2. Manowar
  3. Kings of Metal
  4. Fighting the World
  5. Holy War
  6. Immortal
  7. Call to Arms
  8. Heart of Steel
  9. (Screams of Blood – Solo vocal)
  10. Warriors of the World United
  11. (Solo de guitarra e baixo)
  12. Hail and Kill
  13. The Dawn of Battle
  14. King of Kings
  15. (Solo de guitarra)
  16. The Power
  17. Fight Until We Die

Bis:

  1. (Joey conversa com o público)
  2. Battle Hymn
  3. Black Wind, Fire and Steel
  4. (Outro: Army of the Dead, Part II)

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Thiago Zuma
Thiago Zuma
Formado em Direito na PUC-SP e Jornalismo na Faculdade Cásper Líbero, Thiago Zuma, 43, abandonou a vida de profissional liberal e a faculdade de História na USP para entrar no serviço público, mas nunca largou o heavy metal desde 1991, viajando o mundo para ver suas bandas favoritas, novas ou velhas, e ocasionalmente colaborando com sites de música.

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