Em 1985, o The Cult estava na ascendente. O segundo disco do grupo, “Love”, que deixava para trás os elementos pós-punk gótico da estreia em favor de um som influenciado pela psicodelia do The Doors, vendeu mais de dois milhões de cópias e rendeu uma turnê mundial que os posicionou como a próxima grande banda britânica.
O giro de shows durou de setembro de 1985 até junho de 1986. Na sequência, a banda procurou repetir o sucesso criativo de “Love” ao se reunir com o produtor Steve Brown no Manor Studios em Oxfordshire, onde gravaram doze canções de um álbum a ser chamado de “Peace”.
Entretanto, a insatisfação do The Cult – então formado por Ian Astbury nos vocais, Billy Duffy na guitarra, Jamie Stewart no baixo e o novo adepto Les Warner na bateria – com a polidez das gravações e a incapacidade delas de capturar a energia ao vivo do grupo causou as sessões serem abandonadas. Dessa forma, os músicos foram levados a buscar um novo caminho em Nova York.
Em uma entrevista de 1987 ao programa de TV alemão Hard & Heavy, transcrita pelo site IgorMiranda.com.br, Astbury falou sobre o assunto:
“Nosso segundo disco, ‘Love’, tinha duas faixas chamadas ‘Love’ e ‘The Phoenix’ com influência de blues rock e essa era a direção para qual o grupo estava indo. É o som que queríamos fazer quando nos juntamos há quatro anos. É que trabalhar com produtores que já passaram do auge acabou nos levando para uma direção errada.”
Entra em cena Rick Rubin
Rick Rubin em 1987 era sinônimo de hip-hop, mas suas origens vêm da cena punk nova-iorquina. O selo fundado por ele, Def Jam Recordings, começou com um single da banda garage punk de Rubin, chamada Hose. Caracterizado por um som cadenciado influenciado por blues, o grupo fazia turnês pelos Estados Unidos com bandas alternativas como Meat Puppets, Hüsker Dü, Circle Jerks, Butthole Surfers e Minor Threat.
Mesmo após o fim da banda em 1984 e seu subsequente trabalho com rap e metal – Rubin se tornou amigo dos integrantes do Slayer e produziu o clássico “Reign in Blood” em 1986 –, o produtor não deixou para trás suas sensibilidades sonoras, marcadas por produções secas com batidas poderosas. O maior exemplo disso é a colaboração seminal entre o Run-DMC e o Aerosmith em “Walk this Way”, cuja sonoridade crua chamou a atenção do The Cult.
Em entrevista ao site Vanyaland, Ian Astbury falou sobre o que os atraiu a Rick Rubin:
“Fomos atrás do Rick Rubin por causa do hip-hop, porque eles estavam pegando baterias do Led Zeppelin e incorporando-as às faixas. Isso era muito interessante, especialmente por ser tão despido de camadas.”
Os integrantes do The Cult entraram em contato com Rubin para remixar o carro-chefe do novo álbum, a música “Love Removal Machine”. Rubin topou trabalhar com eles na condição de regravar a faixa do zero. Depois, os convenceu a refazer o disco inteiro – para descontentamento da gravadora, Beggars Banquet, que já havia gasto 250 mil libras com o sucessor de “Love”. Porém, era inegável o bom resultado inicial das sessões em Nova York, em que Rubin usou clássicos do hard rock como AC/DC na hora de moldar o som.
No livro “AC/DC: Maximum Rock & Roll: The Ultimate Story of the World’s Greatest Rock-and-Roll Band”, lançado em 2009, o engenheiro de som Mike Platt contou sobre a influência que o grupo australiano teve no método de trabalho de Rubin:
“Rick Rubin estava gravando com o The Cult no Studio A e a gente ficava em pé na antessala imediatamente fora da sala do estúdio. Um pedaço de ‘Highway to Hell’ tocava e aí um pedaço de ‘Back in Black’ e então um pedaço de Led Zeppelin e a gente ficava tentando entender o que estava acontecendo. Aí um assistente disse que ele está pegando a guitarra do ‘Back in Black’, a bateria de ‘Highway to Hell’ e os vocais do Led Zeppelin e comparando com o material do The Cult para conseguir o que ele quer da banda.”
O que era paz virou eletricidade
“Love Removal Machine” foi lançada como single em fevereiro de 1987, com direito a um clipe icônico dirigido pelo lendário designer de capas de discos Storm Thorgerson, da Hipgnosis. Na filmagem, o grupo se veste como uma repaginação dos motoqueiros dos anos 1960, o que serviu como uma nova apresentação do The Cult ao público, fazendo uso certeiro da MTV.
Ao site Vanyaland, Astbury discutiu o impacto que a MTV teve em mostrar a identidade visual do grupo:
“Quando a MTV apareceu de repente a gente tinha esse meio visual e quem quer ficar em pé no palco vestindo um macacão?”
Essa aposta na mudança sonora aliada com a identidade visual roqueira clássica reimaginada caiu nas graças do público. O álbum, rebatizado de “Electric”, foi lançado em 6 de abril de 1987 e atingiu o número 4 nas paradas britânicas, além do top 40 nos Estados Unidos. Acabou vendendo mais cópias que seu antecessor, “Love”.
Para a turnê, o grupo ganhou o reforço de Kid Chaos no baixo, movendo Stewart para a guitarra base. A configuração era a mesma de uma banda então desconhecida para fazer a abertura da porção americana da turnê, chamada Guns N’ Roses.
Entretanto, problemas não faltaram. Eles destruíram o equivalente a 30 mil libras de equipamento durante uma passagem pela Austrália e por consequência não puderam tocar no Japão, já que nenhuma empresa os alugaria equipamento novo.
Isso não atrapalhou o ímpeto de “Electric”, que ao final da turnê recebeu disco de ouro no Reino Unido e vendeu aproximadamente três milhões de cópias pelo mundo. E aí começaram outros problemas. O grupo mal se comunicava ao final da turnê. Kid Chaos saiu assim que pôde para formar o grupo The Four Horsemen e Warner foi sumariamente demitido juntamente com a equipe de empresários do grupo por Astbury e Duffy.
Os dois líderes pegaram Stewart e se mudaram para Los Angeles, onde continuam com o The Cult até hoje. A popularidade seria mantida no disco seguinte, “Sonic Temple” (1989), que junto de “Electric” é considerado o auge da banda.
The Cult – “Electric”
Lançado em 6 de abril de 1987 pela Beggars Banquet / Sire, com produção de Rick Rubin.
- Wild Flower
- Peace Dog
- Lil’ Devil
- Aphrodisiac Jacket
- Electric Ocean
- Bad Fun
- King Contrary Man
- Love Removal Machine
- Born to Be Wild” (cover do Steppenwolf)
- Outlaw
- Memphis Hip Shake
Músicos:
- Ian Astbury (vocal)
- Billy Duffy (guitarra)
- Jamie Stewart (baixo)
- Les Warner (bateria)
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Uma pena que o Stewart depois optou por se afastar dessa vida e ir viver com a família. O cara mandava muito no baixo. Sou uma fã do The Cult e adorei esta matéria em comemoração aos 30 anos do disco.