Poucas bandas têm capas de discos tão famosas quanto o Pink Floyd. E uma das mais populares é a de “Animals” (1977), com o famoso porco inflável voando por cima dos prédios.
A ideia, apesar de simples, não foi a primeira opção da banda e da Hipgnosis, empresa responsável por essa e outras artes icônicas do grupo. Acabou sendo mantida, mesmo com execução pra lá de difícil.
Pink Floyd e a ideia de Animals
Lançado em 21 de janeiro de 1977, o álbum “Animals” tinha como inspiração o livro “A Revolução dos Bichos”, de George Orwell, embora não seja uma adaptação exata. Publicada em 1945, a fábula narra uma espécie de insurreição dos animais de uma granja contra seus donos – como resultado, os bichos se tornam ainda mais tiranos que os humanos.
Assim que as gravações terminaram, os integrantes do Pink Floyd começaram a se reunir com os designers Storm Thorgerson e Aubrey Powell, da Hipgnosis. A dupla trouxe a primeira ideia para a capa, que foi – felizmente – descartada: a imagem de uma criança pequena entrando no quarto dos pais e os flagrando em uma relação sexual.
O conceito de “animal” talvez não tenha sido completamente compreendido pela Hipgnosis. No livro “For the Love of Vinyl”, Thorgerson relembra:
“O que veio à mente foi uma criança, um menino de 3 ou 4 anos, acidentalmente presenciando seus pais fazendo sexo. Ele vê isso como um ato de amor e paixão ou algo violento? Isso o deixa animado, confuso ou o traumatiza? De repente, eles se tornam animais aos seus olhos, e não mais seus amados pais?”
Uma usina de ideias
Por terem descartado a proposta inicial, os caras do Pink Floyd foram desafiados a sugerir algo melhor. A resposta viria do vocalista e baixista Roger Waters.
Na época, ele havia tirado algumas fotos da antiga e desativada usina termelétrica de Battersea, na região sudoeste de Londres. O músico passava com frequência naquela área enquanto pedalava.
O projeto completo de Waters incluía um porco inflável flutuando no céu – proposta que Storm Thorgerson achou um tanto boba de início, mas foi voto vencido, pois os demais aprovaram.
Agora era hora de colocar a ideia em prática. Mas a capa conceitual de Roger Waters acabaria rendendo uma história pra lá de inusitada.
As fotos e o porco voador
No dia 2 de dezembro de 1976, a equipe de imagens da Hipgnosis, comandada por Aubrey Powell, foi à usina de Battersea para fazer as fotos. Um porco inflável de 12 metros (apelidado de Algie) foi produzido pela equipe, que contratou o artista australiano Jeffrey Shaw para desenhá-lo e a empresa alemã de dirigíveis Ballon Fabrik para tornar o projeto real.
Junto com a equipe de fotos, Powell providenciou um atirador de elite que ficaria pronto para furar o porco caso ele se soltasse do cabo que o prendia ao chão. Inflado com gás hélio, o objeto poderia sair voando sem rumo e atrapalhar o movimentado espaço aéreo de Londres – algo que ninguém queria, é claro.
O problema é que o primeiro dia agendado para as fotos não deu certo. Boas imagens da usina foram feitas, mas houve problemas com o porco, que não voou. Então, Algie voltou ao local no dia seguinte com todos os envolvidos – na verdade, quase todos, pois Powell esqueceu de contratar o atirador para o segundo dia.
Dessa forma, em uma bela exibição da chamada “lei de Murphy” (que diz que tudo o que puder dar errado, certamente dará), Algie voou, mas se soltou do cabo, flutuando alegremente pela capital da Inglaterra. A situação provocou caos no espaço aéreo londrino: Voos foram cancelados ou adiados no aeroporto de Heathrow, pilotos de aeronaves não paravam de relatar às torres de comando a presença de um enorme porco no céu e a população no geral entrou em pânico.
O animal inflável viajou bastante: atravessando a foz do rio Tâmisa, ele aterrissou em uma fazenda no condado de Kent. Ele foi encontrado pelo dono do local, que ficou bastante bravo, já que o enorme objeto assustou suas cabeças de gado.
Com Algie resgatado, só restava voltar a Battersea para um terceiro dia de fotos. Felizmente, em 4 de dezembro, tanto equipe quanto atirador e porco estavam onde deveriam. Mas é claro que outro problema surgiu: o “bom” tempo, pois um raro dia de sol se abriu sobre Londres naquele dia, tirando boa parte do clima obscuro que a capa deveria passar.
Vencidos pela lei de Murphy, eles não voltaram para um quarto dia. Recorreram a uma foto da usina tirada no primeiro dia da usina e outra do porco produzida no terceiro dia para fazer uma sobreposição com efeitos. Ainda não eram tempos de Photoshop, mas dava para realizar algumas modificações.
O legado de Algie
Como esperado, “Animals” tornou-se um grande sucesso do Pink Floyd. Isso transformou Algie em uma marca registrada da banda: o porco marcou presença inclusive em shows da banda e segue aparecendo em apresentações da carreira solo de Roger Waters, geralmente com conotação política, com comparações a algum político de ideias extremistas.
O popular Algie apareceu até mesmo na abertura das Olimpíadas de Londres, em 2012, durante a sequência chamada de Isles of Wonder. Numa imagem aérea de Londres, quando se olha em direção a usina de Battersea, é possível ver o porco flutuando ao lado, numa óbvia referência à capa de “Animals”.
O inflável quase foi leiloado em 2015, mas os integrantes remanescentes do Pink Floyd impediram que o objeto fosse vendido e o mantiveram em posse até hoje. Por sua vez, a usina de Battersea estava praticamente desativada nos anos 1970 e foi fechada oficialmente em 1983. Hoje, o prédio e o bairro passaram por um processo de renovação.
* Texto por André Luiz Fernandes, com pauta e edição por Igor Miranda.
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