O System of a Down estreou com seu álbum homônimo, em 1998, mas conquistou o mundo de vez com seu segundo disco, “Toxicity”.
Lançado em 4 de setembro de 2001, o disco representa uma notória evolução em relação à estreia, bem como uma afirmação da identidade do SOAD. Agora, a banda apostava ainda mais em suas raízes sonoras, da música do Oriente Médio, também com um melhor encaixe na sonoridade do grupo.
Serj Tankian (voz), Daron Malakian (guitarra), Shavo Odadjian (baixo) e John Dolmayan (bateria) estavam com a criatividade pegando fogo na época de “Toxicity”. Ao todo, cerca de 30 músicas foram trabalhadas nas sessões do álbum, mas apenas 14 delas entraram para a tracklist final.
Muito do que não foi aproveitado fez parte de “Steal This Album” (2002), o que explica a semelhança na sonoridade entre os dois álbuns. Há quem chegue a apelidar o sucessor de “Toxicity II” – o que faz algum sentido.
Trazendo as raízes à tona
A principal diferença entre “Toxicity” e o disco de estreia, homônimo, está na presença ainda mais evidente da sonoridade chamada “étnica”. Todos os integrantes do System of a Down têm raízes na Armênia e a música tradicional do país permeia riffs, melodias vocais e outros momentos, com a inserção de instrumentos próprios, como cítaras, banjo, entre outros. Há influência de música grega também em várias passagens.
Além das raízes vindo à tona, o SOAD optou por focar mais na melodia, de um modo geral, em vez da visceralidade típica do metal. Isso ajudou a criar um ecletismo sem perder o peso, além de dar mais ênfase para os vocais de Serj Tankian, que carregam muito da personalidade do grupo.
Em entrevista ao Loudwire, Daron Malakian refletiu:
“Eu sabia que Serj queria cantar mais, então acredito que foi um tipo de progressão e evolução para a banda. Eu queria fazer tudo isso, e ainda assim não perder o peso da banda e o aspecto hard, punk, metal. Você pode perder isso às vezes quando fica um pouco eclético demais. Então, estávamos tentando nos equilibrar nessa linha fina e não perder os fãs.”
A treta de “Needles”
O guitarrista, que era a principal força criativa do SOAD, estava disposto a dividir mais os holofotes com o vocalista. Ainda assim, conflitos relacionados a como determinadas músicas deveriam soar não deixaram de ocorrer.
A faixa “Needles”, em especial, guarda uma peculiaridade. O verso “pull the tapeworm out of your ass” (em tradução livre, “puxe a lombriga para fora do seu c*”) teve de ser alterado porque Malakian não curtia o “sentido” da lombriga – o pronome “seu” era, na verdade, “meu”.
Em entrevista ao podcast Broken Record, do produtor Rick Rubin, Tankian recordou:
“Originalmente, o refrão era ‘puxe a lombriga para fora do meu c*’. Daron (Malakian, guitarrista) e Shavo (Odadjian, baixista) não gostaram de ‘meu c*’. Disseram: ‘não, não, não, isso não soa legal, soa ruim, soa vulnerável’. Ou o que quer que seja, qualquer adjetivo. Mas era para ser filosófico, tipo ‘tire essa negatividade de mim’.
Acho que essa é a atitude metal versus a não-metal. Eu gosto de mostrar vulnerabilidade em nossa música. Como artista, você está vulnerável de qualquer forma. Você mostra ou não. Mas a atitude metal é: ‘de forma alguma, cara, somos metal’.”
Rubin, que comandava as gravações do álbum, chegou a pensar que a banda acabaria por conta daquela discordância.
“Senti que a banda romperia por causa da letra. Foi tão extremo, mas explica a paixão que existe na banda. Há uma paixão real incrível ali. O fato de uma letra, uma palavra insignificante, um verso cômico, ter potencial para acabar com a banda ou descartar uma ótima música. Era outra possibilidade.”
Mais controvérsia
A discordância de “Needles” foi superada e o álbum, no todo, ficou redondinho e coerente. Não só em música, como, também, em letras – a mensagem antissistema do System of a Down era forte e fazia sentido naquele momento.
Faria ainda mais sentido devido a um fato trágico que ocorreria dias após o lançamento de “Toxicity”: o atentado contra as Torres Gêmeas do World Trade Center, em 11 de setembro de 2001. O disco chegou ao topo das paradas dos Estados Unidos justamente naquele dia, como lembrou Shavo Odadjian à Kerrang:
“Descobri sobre o topo nas paradas logo em 11 de setembro. Lembro de minha mãe ligando para mim e pedindo para eu ligar a TV. Logo quando liguei, vi uma das Torres Gêmeas caindo. Não sabia o que estava acontecendo, se era real ou não, então, fiquei vendo horrorizado. Daí, o telefone tocou e era meu empresário. Ele disse: ‘parabéns, você está no primeiro lugar da Billboard’. Ao mesmo tempo, minha mãe falava que o mundo iria acabar.”
O grupo, infelizmente, sofreu um pouco das consequências do atentado: “Chop Suey!”, principal single do disco, parou de tocar nas rádios americanas na época do ocorrido. A letra era considerada controversa, já que traz algumas referências ao suicídio.
Em entrevista ao canal do Loudwire no YouTube, Odadjian lembra que o título original de “Chop Suey!” era, justamente, “Suicide”.
“É por isso que, no início, você ouve ‘roll Suicide’ (‘rode Suicide’). Sempre se chamou assim, nunca ‘Chop Suey!’. O termo ‘Chop Suey!’ é ‘Suicide’ cortado (‘chopped’) no meio. Rolaram algumas conversas sobre isso e nós tínhamos que escolher nossas batalhas, não dava para lutar contra tudo. Então, fomos esperto e fizemos algo legal em torno disso.”
A situação ficou ainda mais controversa após Serj Tankian divulgar um texto em que culpava o governo dos Estados Unidos pelo atentado, devido à política internacional falha do país. O artigo, chamado “Entendendo o petróleo“, saiu no site da banda sem que os outros integrantes soubessem – e foi retirado horas depois, tamanha a polêmica que gerou.
Imparável
Nada disso foi suficiente para segurar o System of a Down. A banda estava predestinada a estourar naquele momento. Eram méritos demais em um álbum só.
Com o experiente Rick Rubin no comando das mudanças que a banda pretendia, “Toxicity” é até o hoje o álbum favorito de muitos fãs do System of a Down, trazendo alguns dos maiores hits do grupo. Além da já mencionada “Chop Suey!”, o disco traz hits como “Aerials” e sua faixa-título, além de petardos adorados pelos fãs, como “Prison Song”, “ATWA” e “Psycho”.
Com o primeiro lugar nos Estados Unidos e Canadá, além do top 10 em outros 6 países, o álbum é multicertificado devido às suas vendas gigantes, com platina quíntupla na Austrália (350 mil cópias) e tripla nos EUA (2 milhões e 700 mil cópias). No Brasil, ganhou disco de ouro, com 50 mil cópias.
O sucesso conquistado naquele momento transformou o System of a Down em uma das principais bandas de metal no século 21 – e, não, eles não podem ser chamados de nu metal de forma alguma. Infelizmente, todo esse êxito comercial pode ter feito com que o grupo não conseguisse permanecer na ativa.
Além do já mencionado “Steal This Album!”, o SOAD lançou mais dois álbuns – “Mezmerize” e “Hypnotize”, ambos de 2005 – antes de entrar em hiato. Eles retomaram as atividades em 2010, mas sem lançar discos: apenas turnês e, mais recentemente, dois singles com arrecadação para a causa armênia.
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