Dá para dizer que algumas das capas de álbuns do Pink Floyd são tão marcantes quanto as músicas ali inseridas. Com “Wish You Were Here”, um dos trabalhos mais clássicos da banda, não é diferente.
O disco de 1975 teve a arte elaborada pelo grupo Hipgnosis, comandado por Storm Thorgerson. A empresa produziu imagens para a banda em vários de seus álbuns. De “Saucerful of Secrets” (1968) até “Animals” (1977), todas as imagens que estampam discos do grupo foram criadas pelo estúdio.
O conceito da capa surgiu de Thorgerson, que tinha predileção por fazer longas sessões de brainstorm com a banda enquanto ouviam as músicas do disco. Através de sensações despertadas e trechos de letras, conceitos eram criados e imaginados, conforme o próprio designer contou em seu livro “Mind Over Matter: The Images of Pink Floyd”, lançado em 1997.
“Nós discutimos o que a música nos fazia sentir. Ou a intenção das letras. Ou sobre o que o álbum realmente seria, mesmo se o Floyd não tivesse dito, ou ainda não soubesse.”
Pink Floyd e a ausência
Com “Wish You Were Here”, Pink Floyd e Hipgnosis chegaram a uma conclusão de que o sentimento geral das músicas era o de ausência.
Parte disso pode ter relação com a música “Shine on You Crazy Diamond”, que, dividida em 9 partes, abre e fecha o álbum. A canção reflete sobre os distúrbios psiquiátricos do ex-integrante e fundador Syd Barrett, que chegou a visitar a banda durante as gravações da faixa.
A falta de Barrett levou o brainstorm para outros caminhos, que chegaram à ideia de ausência de sentimentos. O pensamento de que as pessoas muitas vezes escondem suas emoções, com receio de se sentirem prejudicadas – ou “queimadas” –, acabou dando origem à icônica foto da capa.
Todo um trabalho de arte foi feito para o lançamento, sempre abordando o mesmo conceito de formas diferentes: ausência.
Do charuto às chamas
“Have a Cigar”, outra faixa do álbum, provocou a ideia principal: dois homens, possivelmente executivos, se encontrariam e dariam um aperto de mão. O gesto, tão comum, foi descrito por Storm Thorgerson como tendo uma “ausência de sentido” em muitas ocasiões. Daí, um dos empresários apareceria pegando fogo, em uma representação dos sentimentos que escondia.
Aubrey “Po” Powell foi o fotógrafo responsável por desenvolver a foto – que, sim, é real. Os dublês retratados são Ronnie Rondell Jr. (o homem em chamas) e Danny Rogers (o outro). Por baixo do terno, Rondell Jr. usava um traje antichamas e uma touca, coberta por uma peruca, para proteger sua cabeça.
Mesmo assim, houve contratempos na hora de criar a histórica foto: o vento nos estúdios da Warner Bros, em Burbank, Califórnia, estava contra Rondell, que teve parte do bigode queimado. Foi necessário mudar a posição dos dublês e espelhar a imagem na hora da edição – trabalho que acabou se provando mais difícil do que o imaginado, devido a um número em um dos prédios na parte de trás.
Ao todo, foram clicadas 15 fotos antes que o fogo chegasse ao rosto do dublê. Assim que as chamas tomaram seu bigode, Ronnie Rondell Jr. se jogou no chão e foi socorrido por bombeiros com extintores e cobertores.
Felizmente, o pouco tempo foi mais do que o suficiente para registrar boas imagens. Dois retratos foram utilizados em versões distintas: um na versão britânica; outro, na americana.
O pacote de “Wish You Were Here”
Ainda no clima de ausência, Storm Thorgerson teve outras ideias para “Wish You Were Here”. O artista copiou uma ideia do disco “Country Life” (1974), do Roxy Music, ao sugerir que o álbum fosse vendido coberto por um plástico preto, denotando a ausência de uma capa. O aperto de mãos viraria uma espécie de logomarca do trabalho e apareceria em outros locais também.
Fotos da contracapa e do encarte mostravam pessoas sem rosto (ausência de expressão) e até um mergulhador saltando sem causar perturbações na água do lago Mono, na Califórnia (ausência de impacto). Todas as fotos foram feitas por Aubrey “Po” Powell, o segundo no comando na Hipgnosis.
O resultado final agradou bastante. A gravadora Columbia Records, responsável pelo lançamento do álbum nos Estados Unidos, foi contra o plástico preto, enquanto a EMI, que lançou o trabalho no Reino Unido, esteve mais disposta a tentar algo novo.
Ao serem apresentados ao projeto, os integrantes do Pink Floyd receberam o álbum com um sonoro aplauso. Eles sabiam que um bom trabalho visual só destacaria as músicas ali criadas.
* Texto desenvolvido em parceria por André Luiz Fernandes e Igor Miranda. Pauta e edição geral por Igor Miranda; redação, argumentação e apuração adicional por André Luiz Fernandes.
Bacana o texto. Só um reparo: cigar é charuto em inglês, não cigarro.