O AC/DC está de volta. ‘Power Up’, décimo-sétimo álbum de estúdio da banda, foi anunciado para o dia 13 de novembro, e o primeiro single já foi liberado: a música ‘Shot in the Dark’, que pode ser conferida a seguir.
O percurso até a volta definitiva do AC/DC foi longo. A banda retomou sua formação com Brian Johnson nos vocais, Angus Young e Stevie Young nas guitarras, Cliff Williams no baixo e Phil Rudd na bateria.
‘Power Up’ traz o mais próximo do que se tem do AC/DC “clássico”, das últimas quatro décadas, pois o guitarrista Malcolm Young foi afastado da banda ainda em 2014, com demência, e morreu em 2017. Stevie, sobrinho dele e de Angus, ocupou a vaga com maestria.
Porém, essa formação ficou seriamente ameaçada nos últimos anos. Brian Johnson ficou afastado de parte da turnê do álbum anterior, ‘Rock or Bust’ (2014) por problemas auditivos. Ele foi substituído por Axl Rose nas datas que não conseguiu cumprir.
Já Phil Rudd esteve fora de toda a tour para prestar contas à Justiça em meio a acusações de porte de drogas e ter planejado um assassinato. Sua posição foi ocupada por Chris Slade, que já havia tocado com a banda entre 1989 e 1994.
Cliff Williams, por sua vez, fez todos os shows de divulgação de ‘Rock or Bust’, mas anunciou que iria se aposentar após a última apresentação. Ele se dizia desmotivado pelas perdas de Malcolm, Brian e Phil.
Em poucos anos, todas as situações se reverteram e o AC/DC renasceu – outra vez. Neste artigo, apresento tudo o que já se sabe sobre ‘Power Up’ e sobre a própria banda nos últimos anos.
Volta de Brian Johnson ao AC/DC
Fazer com que Brian Johnson voltasse ao AC/DC era uma tarefa mais complicada, já que não dependia apenas do vocalista. Ele estava com uma severa perda auditiva, afetando todos os shows que fez na turnê ‘Rock or Bust’.
Ele precisou ser afastado no meio da tour para buscar tratamento, caso contrário, a surdez seria definitiva. Ele acabou sendo substituído por Axl Rose – que, inclusive, fez parte dos shows com o pé imobilizado, após machucar-se em uma apresentação do Guns N’ Roses.
“Foi muito sério. Eu não conseguia ouvir o som das guitarras de forma alguma. Eu estava seguindo literalmente com base na memória muscular e leitura labial. Ficava muito mal com aquela situação nos shows. Não há nada pior do que ficar parado lá e não ter certeza do que está fazendo”, afirmou Johnson, à ‘Rolling Stone’.
Cliff Williams complementou: “Brian tirava seus monitores de retorno in-ear e ficava apenas balançando a cabeça. Ele não conseguia acertar os tons. Estava assando por um momento muito difícil”.
Os médicos precisaram interferir e pediram que Brian Johnson deixasse a estrada. “Brian corria o risco de ficar surdo permanentemente. Tivemos alguns dias para avisar a todos e divulgar a mensagem. Não queríamos que as pessoas chegassem e ficassem descontentes ao descobrir no último minuto (que Brian Johnson não estaria nos shows seguintes)”, comentou Angus Young.
Brian Johnson acabou fazendo um tratamento experimental, sobre o qual revelou apenas alguns detalhes. “Um expert em audição trouxe uma coisa que parecia uma bateria de carro. Falou que iriam transformar aquilo em miniatura. Levou dois anos e meio. Ele vinha todo mês. Era chato demais ficar com aqueles fios, telas de computador, barulhos. Mas valeu a pena. Ele usou a estrutura óssea do crânio como receptor de som. É tudo o que posso te dizer”, afirmou.
A banda acompanhou cada passo da recuperação. Dessa forma, o vocalista finalmente pôde voltar a cantar.
Retorno de Phil Rudd ao AC/DC
No fim de 2014, Phil Rudd se enrolou com a justiça do país onde mora, a Nova Zelândia, em meio a acusações de que teria planejado um assassinato e estaria em posse de metanfetamina e maconha.
Ele se declarou culpado na questão da posse de droga, mas negou ter planejado um assassinato. A segunda acusação acabou sendo desconsiderada.
Em julho de 2015, ele foi condenado a prisão domiciliar e pagamento de multa. A pena foi concluída em 2016.
Antes de tudo isso, ainda em 2014, o AC/DC já havia anunciado o retorno de Chris Slade, já que Phil Rudd estava com problemas, para a turnê de ‘Rock or Bust’, entre 2015 e 2016. A situação complicava até mesmo as viagens do baterista, pois ele não poderia deixar a Nova Zelândia antes do julgamento.
A turnê de ‘Rock or Bust’ foi concluída em 2016 e Malcolm Young morreu um ano depois, em 2017. O funeral do guitarrista marcou o reencontro entre Angus e Phil. Foi aí que surgiu o convite para voltar à banda.
“Ele (Phil) parecia tão bem. Estava em boa forma. Estava com a cabeça no lugar. Estava fazendo terapia. Estava muito bem”, revelou Angus, em entrevista recente à ‘Rolling Stone’.
Brian Johnson, nesta ocasião, completou: “Falo por todos os caras – nós defendemos Phil até o fim. O que aconteceu naquela ocasião não era o Phil que conhecemos. Foi outra coisa. Ele está muito bem agora e fazendo tudo de forma ótima”.
Fim da aposentadoria de Cliff Williams
Cliff Williams surpreendeu a todos ao anunciar, ainda em 2016, que o show final da turnê ‘Rock or Bust’ seria, também, o seu último. O músico declarou que iria se aposentar, já que não conseguia suportar as baixas recentes na formação.
A apresentação final ocorreu no Wells Fargo Center da Filadélfia, nos Estados Unidos, em 20 de setembro de 2016. Sem despedidas melosas ou anúncios premeditados: o show foi realizado normalmente. Parecia um sinal de que ele voltaria atrás na decisão.
https://www.youtube.com/watch?v=TXPYH3JCvuQ
A tour chegou ao fim e Cliff seguiu vivendo sua vida. O retorno dele ao AC/DC, “revogando” sua aposentadoria, só se deu após a confirmação de que Brian Johnson e Phil Rudd estariam de volta. Nada contra Axl Rose e Chris Slade – ele só queria seguir tocando com os amigos de sempre.
“Era como a velha banda voltando. Não era como começar de novo, mas era o mais próximo possível de uma banda que está junta há mais de 40 anos. Não queria perder isso”, afirmou, à ‘Rolling Stone’, destacando a única ausência: Malcolm Young.
Nesta mesma entrevista, Cliff também revelou algo que poucos sabiam até o momento: ele também estava com problemas de saúde. A doença não foi revelada.
“Para ser franco, não foi uma turnê fácil de se concluir. Tive alguns problemas de saúde sobre os quais não irei te aborrecer com os detalhes. Porém, tive coisas acontecendo na estrada, vertigem terrível. Achei que estava na minha hora”, afirmou.
Rumores ainda em 2018
Desde 2018, circulavam boatos de que o AC/DC estaria gravando um novo álbum de estúdio, com a mesma formação presente nas imagens vazadas no site da banda.
Os cinco integrantes foram fotografados em diferentes situações no Warehouse Studios, em Vancouver, no Canadá, onde gravaram seus três últimos discos – ‘Stiff Upper Lip’ (2000), ‘Black Ice’ (2008) e ‘Rock or Bust’ (2014).
A partir de então, passaram a rodar nas redes sociais diversos rumores sobre os próximos planos do AC/DC. O vocalista Dee Snider, do Twisted Sister, disse em várias entrevistas que a banda iria lançar um novo álbum com homenagens a Malcolm Young, incluindo gravações inéditas do guitarrista.
Essa informação foi negada posteriormente pelos integrantes do AC/DC. Ideias de Malcolm compostas junto de Angus serão aproveitadas, mas não há gravações inéditas do saudoso guitarrista rítmico da banda.
Gravação e composição de Power Up
As fotos vazadas em 2018 indicavam algo que realmente estava acontecendo: o AC/DC gravava um novo álbum no Canadá. Apesar das imagens, toda a equipe da banda trabalhou de modo que o processo ocorresse em segredo.
Nem mesmo o engenheiro de som Mike Fraser sabia detalhes do novo projeto. Em entrevista ao podcast do site AC/DCFans.Net, com transcrição da Classic Rock, Fraser contou que só o avisaram quais músicos gravariam o novo álbum do AC/DC quando eles, de fato, chegaram ao local.
“Até onde eu sabia, Brian e Cliff haviam se aposentado e Phil tinha alguns problemas em sua terra natal, Nova Zelândia, então, quem sabia que ele teria permissão para sair do país?”, afirmou.
No primeiro dia em estúdio, o engenheiro de som não fazia ideia do que iria acontecer. “Ninguém da banda havia chegado quando eu cheguei lá. Porém, vários profissionais técnicos já estavam”, disse.
Um dos colegas de Mike Fraser foi o responsável por “dar a grande notícia” a ele. “Um dos técnicos perguntou se eu sabia o que estava rolando e eu falei que não, só sabia que estávamos ali e estávamos arrumando tudo. Então, ele falou: ‘toda a banda está aqui, Brian, Cliff, Phil e Stevie, e eles estão prontos para detonar em outro disco’. Foi uma surpresa chocante e incrível”, comentou.
As gravações duraram seis semanas e foram conduzidas pelo produtor Brendan O’Brien, o mesmo de ‘Black Ice’ (2008) e ‘Rock Or Bust’. O estúdio em Vancouver também foi utilizado nesses dois discos, bem como em ‘Stiff Upper Lip’ (2000).
Ainda durante o bate-papo, Mike Fraser contou que Angus Young chegou para gravar ‘Power Up’ com “muitas ideias e riffs e sem muitas músicas completas” – processo foi similar ao de ‘Rock or Bust’, primeiro da banda sem Malcolm Young, falecido em 2017. “Ele e Malcolm fizeram várias músicas antes de Mal ficar doente e eventualmente morrer. Ele tem um tesouro de riffs e ideias e deve ter passado alguns anos polindo essas ideias”, afirmou.
Cerca de três ou quatro músicas já estavam concluídas e precisavam apenas de ajustes, como algum refrão ou algo do tipo. “Mas, sim, basicamente esse material nasceu dos riffs que Angus e Mal fizeram ao longo dos anos. Só precisavam montar tudo. Passaram um dia ou dois fazendo isso e aí nós entrávamos. E tudo soa bem ao vivo no estúdio. O que você ouve é o que eles fizeram. Eles trabalham muito bem juntos”, concluiu.
Dedicatória a Malcolm Young
‘Power Up’ não é, nem de longe, um álbum conceitual. Porém, os músicos destacaram em entrevista à ‘Rolling Stone’ que o disco busca homenagear Malcolm Young – assim como ‘Back in Black’ (1980) foi um tributo ao vocalista Bon Scott, morto também em 1980.
“Este álbum é basicamente dedicado a Malcolm, meu irmão. É uma homenagem a ele como ‘Back in Black’ foi uma homenagem a Bon Scott”, afirmou Angus, que também perdeu George Young, irmão mais velho dele e de Malcolm, um mês antes, em outubro de 2017.
Angus, aliás, confirma que várias ideias de riffs presentes em ‘Power Up’ foram compostas ao lado de Malcolm. Entretanto, o guitarrista rítmico não terá nenhuma gravação usada no álbum. As bases são todas de Stevie Young.
A maior parte das composições usadas veio das sessões de ‘Black Ice’. “Houve muitas ótimas ideias para músicas daquela época. Naquela época, ele me disse: ‘vamos deixar essas músicas por enquanto e se continuarmos, já vamos estar no mar… pegamos essas ideias no próximo’. Isso ficou na minha mente. Quando ouvi o material, pensei: ‘se eu tiver que fazer alguma coisa na minha vida, será trabalhar nessas músicas’. […] Mesmo quando me sento em casa, pego a guitarra e começo a tocar, a primeira coisa que me passa pela cabeça é: ‘acho que Mal vai gostar desse riff que estou tocando’. É assim que julgo muitas coisas”, declarou.
O músico também refletiu sobre a importância de Malcolm e George Young (que produziu vários álbuns do AC/DC) em sua vida. “Meu irmão George foi uma grande parte do AC/DC, especialmente em nossos primeiros anos. George e Malcolm sempre foram os dois caras com quem eu confiei. Não importava se estivéssemos em um estúdio ou qualquer outro lugar, eu sempre pedia conselhos sobre o que quer que eu estivesse fazendo”, disse.
As músicas de Power Up
Ao todo, ‘Power Up’ terá 12 músicas. São elas:
01. Realize
02. Rejection
03. Shot In The Dark
04. Through The Mists Of Time
05. Kick You When You’re Down
06. Witch’s Spell
07. Demon Fire
08. Wild Reputation
09. No Man’s Land
10. Systems Down
11. Money Shot
12. Code Red
‘Shot in the Dark’ já é conhecida do público. Angus Young a definiu como uma música que “tem aquela grande vibe do AC/DC, ótimo ritmo e um bom refrão. O título é meio atrevido, pois todos nós curtimos tomar algumas doses na noite, ou algumas doses no escuro. Fiquei feliz quando a gravadora disse que era uma música muito forte e deveria ser a primeira a ser lançada”, afirmou, à ‘Rolling Stone’.
‘Money Shot’, por sua vez, faz referência a um termo usado por fotógrafos para indicar que eles faziam pose de quem “tem dinheiro”. Porém, a expressão também é uma gíria para ejaculação masculina dentro do ramo de filmes pornográficos. Angus só descobriu – ou se lembrou – desse outro significado depois que a música já estava feita.
“Os fotógrafos diziam: ‘faça essa posse’. Daí falavam: ‘é a pose da grana’. Quando estávamos gravando a música com Brendan (O’Brien, produtor), contei a ele, que respondeu: ‘Todo mundo sabe o que é money shot’. Eu falei: ‘hã?’. Foi por acidente”, comentou.
Já ‘Through the Mists of Time’ traz o AC/DC em um raro momento reflexivo, em uma letra que aborda os vários anos de carreira do AC/DC. “Estamos juntos há todos esses anos – é quase como se você estivesse atravessando o tempo. Você meio que ainda está naquela época em que toca rock. Não é como se estivéssemos tocando outro tipo de música. A gente se limitou a fazer o que fazemos de melhor. É como um museu. Pinturas como ‘Mona Lisa’ são atemporais. É assim que vejo essa música”, afirmou.
AC/DC em mais uma turnê?
O AC/DC, claro, cogita levar ‘Power Up’ para divulgação na estrada, com uma turnê em estádios e grandes arenas. O problema é que a pandemia do novo coronavírus forçou a banda não só a eliminar qualquer plano de show no momento, como, também, a adiar o lançamento do álbum, que sairia no primeiro semestre deste ano.
Além disso, há cautela extra com a situação de Brian Johnson. Entretanto, o próprio vocalista culpou a pandemia.
“Pensamos em fazer alguns shows pequenos para começar. Foi o mais longe que chegamos. Dois dias depois de uma reunião que tivemos, a m*rda foi jogada no ventilador. (O coronavírus) Foi na China, depois Europa e aí começou a se espalhar. Não parecia mais possível”, afirmou Johnson.