“Meliora”, o álbum que transformou o Ghost em realidade

A mudança de patamar do Ghost em Meliora, seu terceiro disco de estúdio, é muito clara. Resenha sobre o álbum em questão, lançado em 21 de agosto de 2015.

Ghost – ‘Meliora’
Lançado em 21 de agosto de 2015

A mudança de patamar do Ghost em ‘Meliora’, seu terceiro disco de estúdio, é muito clara. Antes, a banda do vocalista e compositor Tobias Forge havia lançado dois álbuns, ‘Opus Eponymous’ (2010) e ‘Infestissumam’ (2013), que, pelo menos em minha visão, soam irregulares.

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O motivo é evidente: os dois primeiros trabalhos do Ghost flertam demais com o heavy metal e seus subgêneros. Dava para fazer mais. E isso ocorre em ‘Meliora’, que começa a abraçar influências fora do metal e até do rock de forma mais clara.

Fala-se muito em Tobias Forge – não à toa, pois é o líder do Ghost –, mas o grande acerto de ‘Meliora’ está na produção e, ao que tudo indica, seu respectivo método de trabalho. Aqui, a função é assumida por Klas Åhlund, sueco como Forge, que construiu extenso currículo na música pop ao trabalhar (no geral, como co-produtor ou compositor) junto de Madonna, Britney Spears, Kylie Minogue, Usher e Katy Perry, entre outros.

A visão de Åhlund parece ter ajudado Forge a se desvencilhar dos clichês do heavy metal que estão presentes nos outros álbuns. O produtor, claro, curte som pesado e tem gostos parecidos com o do líder do Ghost, mas tinha um background profissional diferente. Além disso, a dupla passou três meses em pré-produção, o que permitiu desenvolver as músicas de modo bem mais claro e, por que não, experimental.

Tobias reconhece, em entrevista à LoudTV em 2015: “Definitivamente, penso que tivemos muitas ideias e ângulos (com Klas Åhlund) que não teríamos se trabalhássemos com um produtor já estabelecido no cenário do rock”.

A pré-produção foi realizada em Los Angeles, nos Estados Unidos. Como houve bastante tempo para “polir” as músicas, o repertório já estava bem fechado quando os músicos chegaram ao estúdio, em Estocolmo. É, inclusive, um sinal de que as coisas estavam indo bem: o trabalho não havia gerado trocentas canções para escolha. Havia um conceito artístico estabelecido, e olha que não estou falando das letras, que também seguem temática comum.

As composições seguem falando do Anticristo, mas sob outra perspectiva. ‘Infestissumam’, por exemplo, discutia a presença de Lúcifer e era relativamente mais explícito nesse sentido. Já ‘Meliora’ é mais sutil, pois lida com a ausência de Deus, com a influência do Anticristo e como o “conhecimento” e o secularismo – que separa religião e política – afasta as pessoas de sua fé.

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“As letras lidam com o vazio que ocorre quando não há nenhum Deus, quando não há ninguém para te ajudar. Mesmo assim, sempre haverá algum filho da p*ta lá para lhe dar orientação. Retratamos como o partido religioso que chega lá com uma mão orientadora”, explicou Forge, em entrevista à ‘Guitar World’.

O conceito futurista nasceu, inclusive, de quando Tobias testava equipamentos de guitarra antes da turnê de ‘Infestissumam’. Quando ele chegou a um efeito típico de ficção científica, decidiu que a ideia do próximo álbum seria futurista. Ao estilo do Ghost, é claro, pois a pegada futurista aparece nas letras – e de forma não-caricata, sem batalhas épicas ao estilo ‘Star Wars’ sendo descritas nas composições –, não nos arranjos ou timbragens.

No campo musical, conforme já pontuado, a aproximação com algumas estéticas distantes do metal e até do rock, como algumas construções mais pop, foi o grande trunfo do Ghost. Além disso, os timbres e a mixagem trouxeram vida a uma banda que, antes, ficava muito atrás da voz de Tobias Forge. O baixo aparece mais, as guitarras pulsam e a bateria traz linhas mais criativas

A diferença já é sentida em ‘Spirit’, que traz uma construção bem climática e sintetizadores devidamente posicionados no groove quase cavalgado da canção. A emenda com ‘From the Pinnacle to the Pit’ é de tirar o fôlego e compõe, já de cara, um dos melhores momentos do álbum. Nesta segunda faixa, o instrumental pulsante conduz a história contada na letra: a ascensão de Lúcifer como o rei do submundo após ser banido do Paraíso.

‘Cirice’, em seguida, elucida em sua letra como o Anticristo começa a exercer domínio. Musicalmente falando, é o elo que liga ‘Meliora’ com ‘Infestissumam’. O riff principal é tão heavy que até James Hetfield, frontman do Metallica, já foi visto tocando a passagem em questão em ensaios de sua banda. Pedia um refrão mais envolvente, mas a canção posterior, a “balada” ‘He Is’ – ligada pela vinheta instrumental ‘Spoksonat’ –, preenche esse vazio e entrega alguns dos melhores ganchos melódicos do álbum.

Curiosamente, ‘He Is’ foi composta em 2007 e quase foi parar no disco anterior, mas não entrou porque tentaram fazê-la “soar como Ghost”. Não deu certo, mas ganhou espaço, de forma mais orgânica e livre, em ‘Meliora’. Ainda bem, pois é excelente. O único “problema” é preceder o ponto mais fraco do álbum: ‘Mummy Dust’, que soa enjoativa pelos riffs clichês e pelos vocais não muito bem explorados. Dá para pular essa daqui.

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A parte final de ‘Meliora’ é bem climática e mergulha mais a fundo no conceito lírico. ‘Majesty’, por exemplo, soa como um hard setentista com dose extra de peso, crescendo de forma espetacular no refrão. Outra vinheta, ‘Devil Church’, desagua em ‘Absolution’, outra faixa de ganchos melódicos muito bem trabalhados e aura típica de rock/metal de arena. Dentro da temática, é aqui que a fé satânica estabelecida pela ausência de Deus começa a ser questionada.

Tudo isso nos leva para o fechamento do álbum com aquela que é, pelo menos para mim, a melhor música do Ghost: ‘Deus in Absentia’. É quando tudo pega fogo, seja na temática ou na melodia que consegue ser, ao mesmo tempo, apocalíptica e apoteótica. A bateria – que, poucos sabem, sempre é gravada em estúdio por Ludvig Kennberg – dita o tom e os recursos inusitados para refrão e até mesmo fechamento são de impressionar.

Com um resultado artístico tão satisfatório, não é de se surpreender que ‘Meliora’ tenha elevado o Ghost a outra posição em termos de reconhecimento dos fãs e da crítica. O álbum chegou ao oitavo lugar das paradas gerais dos Estados Unidos (‘Infestissumam’ havia atingido a 28ª posição no país), além de uma primeira colocação na Finlândia e Suécia, segunda na Noruega e nona no Canadá, só para citar alguns.

Veio de ‘Meliora’, também, o primeiro Grammy do Ghost: a música ‘Cirice’ venceu o prêmio de Melhor Performance de Metal em 2016. Com tudo isso, as turnês também passaram a ficar maiores, com a banda assumindo mais vezes o papel de headliner em grandes locais.

‘Prequelle’ (2018), álbum sucessor, ampliou esse crescimento do grupo em popularidade e crítica, mas ainda cito ‘Meliora’ como o melhor disco do Ghost até o momento. Beira a perfeição. E espero que essa minha escolha não dure por tanto tempo, pois a ascensão dessa banda cria expectativas ainda maiores para os trabalhos futuros.

01. Spirit
02. From The Pinnacle To The Pit
03. Cirice
04. Spöksonat
05. He Is
06. Mummy Dust
07. Majesty
08. Devil Church
09. Absolution
10. Deus In Absentia

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Igor Miranda
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com pós-graduação em Jornalismo Digital. Escreve sobre música desde 2007. Além de editar este site, é colaborador da Rolling Stone Brasil. Trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, revista Guitarload, jornal Correio de Uberlândia, entre outros. Instagram, Twitter e Facebook: @igormirandasite.

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