Madrenegra: peso no rock com pitadas de rap diretamente da periferia de Brasília

A banda brasiliense Madrenegra faz uma mistura interessante e que começa a ficar tradicional no Brasil: o rock com elementos do hip hop. Mas o quarteto, formado por Marcelino (vocal), Dervan Soares (guitarra), Allan Carvalho (baixo) e Leandro Mathiolle (bateria), soa como uma evolução do misto, especialmente pelo peso do instrumental em seu EP, “Quem tem o que dizer merece ser ouvido” (2014). Em alguns momentos, o grupo beira o heavy metal, com distorções fortes e afinações mais graves nos instrumentos de cordas.
O peso do instrumental seria apenas um elemento perdido se o vocal de Marcelino não apresentasse agressividade. A força das letras também são dignas de destaque. Os versos entoados refletem a realidade dos músicos, que saíram do Jardim Ingá, periferia de Brasília, e hoje trabalham para que o som chegue ao resto do país.
O EP “Quem tem o que dizer merece ser ouvido” está à venda em formato virtual na fanpage oficial da banda no Facebook (clique aqui). Tive a oportunidade (e o prazer) de bater um papo com o vocalista Marcelino, que falou um pouco sobre influências, surgimento na periferia, cenário, futuro e participação de Marcão Britto, guitarrista do Charlie Brown Jr, A Banca e Bula, na música “Guerreiro de fé”, que também produziu o trabalho ao lado de André Freitas (“La Família 013” – Charlie Brown Jr).
Vale mencionar a curiosidade: a banda saiu de Brasília (DF) e foi até Santos (SP), de carro, para apresentar o trabalho pessoalmente ao Marcão. Mais de 1.000 km de distância. É mole?
Confira:
IGOR MIRANDA: Confesso que antes da voz entrar na primeira música do EP, “Eu também estava lá”, eu esperava uma banda nos moldes mais tradicionais do heavy metal. Mas fui surpreendido pelo vocal quase rapper do Marcelino. Continuei surpreso – positivamente – ao longo do EP. O som de vocês é quase uma evolução natural do Charlie Brown Jr, especialmente se pensarmos que o peso foi incorporado em definitivo. Como surgiu essa mistura?
MARCELINO – MADRENEGRA: “A gente consegue, de forma não intencional, assimilar todas as influências dos integrantes da banda, coisas que vão de Iron Maiden a Legião Urbana, passando por Rage Against The Machine e Raul Seixas. Sobre o Charlie Brown Jr, é uma honra muito grande a sua comparação, porque os caras são uma referência muito grande do nosso trabalho. Se você mudar o paradigma, o som deles também é uma evolução em relação ao som da Madrenegra, por ser muito melódico e ter guitarras com timbres e arranjos maravilhosos. No fim das contas, são sonoridades que vêm de uma mesma árvore genealógica, que vai desde o rap dos Racionais MCs ao hardcore. A produção do Marcão foi muito tranquila, sem invenções mirabolantes ou tentativas de mudar a nossa identidade sonora”.

Leia também:  Entrevista: Mark Osegueda fala de Death Angel no Brasil, Kerry King e fascínio por Mercyful Fate

As letras acompanham a agressividade da parte melódica, por conta das temáticas. As fortes letras são típicas das bandas de rock de Brasília. Até que ponto o fato da banda ter surgido na periferia inspira e influencia essa agressividade?
“As letras refletem aquilo que vivemos e observamos do mundo e do lugar de onde viemos. Mas a gente foge do rótulo de ‘banda de protesto’, porque isso é uma forma de limitar o alcance da sua arte. Na verdade, toda arte traz em si um elemento de protesto, basta que ela te faça pensar ou desperte em você a vontade de amar e de mudar as coisas. Somos uma banda que diz o que pensa e não precisa ser muito esperto pra saber que no Brasil, infelizmente, a corrupção e a passividade do povo geram essas tragédias cotidianas que a gente vê na TV”.
O cenário rock n’ roll de Brasília já foi até tema de documentário (“Era Brasília: Era de Ouro”, de 2011, dirigido por Vladimir Carvalho). Legião Urbana, Capital Inicial, Raimundos, Detrito Federal, D.F.C. e Plebe Rude são só alguns exemplos no mainstream. Como está o cenário brasiliense nos dias de hoje? A capital federal ainda tem muito a oferecer?
“Sim, Brasília ainda tem muito o que oferecer. Mas é na periferia que estão as melhores bandas e é la que a cena realmente ferve, com show todo final de semana e uma galera que comparece fielmente. O rock hoje precisa de mais união e respeito. Enquanto as bandas de rock vão se queimando na fogueira das vaidades e das intrigas desnecessárias, os pagodeiros e sertacorniversitários de ostentação vão tomando todos os espaços. Só para constar, quando é que você viu uma banda de Rock do mainstream no Brasil apoiar a cena independente ou recomendar alguma banda nova? Ao contrário: se eles descobrem que você também é bom e está decolando, não querem que você abra o show deles”.

- Advertisement -
Leia também:  Entrevista: Mark Osegueda fala de Death Angel no Brasil, Kerry King e fascínio por Mercyful Fate

Marcão não apenas assume a produção do EP, como também toca na música “Guerreiro de fé”. Como foi contar com ele e também com André Freitas no EP?
“O Marcão é um guitarrista lendário, fora de série e tem uma criatividade imensa. O André Freitas é um estudioso de produção e gravação, um cara muito competente e uma pessoa muito legal. Juntos eles formam uma dupla imbatível. Trabalhar com eles foi muito gratificante, trouxe um grande aprendizado e o melhor de tudo é que se respeitou o som e a identidade estética da Madrenegra”.
Vocês estão/estiveram em turnê nacional recentemente, certo? Como foram esses shows e como a banda tem sido recebida fora de Brasília? E quais são os planos para o futuro?
“Tocamos em MG, BA, DF, GO, SC, SP e todos os shows foram foda. Graças a Deus, temos a sorte e a competência de sermos muito bons ao vivo e da resposta do público ser sempre ótima. Aonde a Madrenegra vai, o público comparece. Temos uma agenda pra cumprir, mas dois shows serão muito especiais pra nós. Dia 28 de novembro, em Curitiba (PR), com os Raimundos, e 14 de dezembro, em Santos (SP), com o Dead Fish, por tudo que essas bandas representam na história do rock nacional e pelo privilégio de começar a fazer parte dessa história também”.
ESCOLHAS DO EDITOR
InícioEntrevistasMadrenegra: peso no rock com pitadas de rap diretamente da periferia de...
Igor Miranda
Igor Miranda
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com pós-graduação em Jornalismo Digital. Escreve sobre música desde 2007. Além de editar este site, é colaborador da Rolling Stone Brasil. Trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, revista Guitarload, jornal Correio de Uberlândia, entre outros. Instagram, Twitter e Facebook: @igormirandasite.

DEIXE UMA RESPOSTA (comentários ofensivos não serão aprovados)

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Últimas notícias

Curiosidades