Talvez você não se recorde, mas Roland Grapow havia realizado uma turnê solo de seis datas no Brasil entre janeiro e fevereiro de 2020, pouco antes de o mundo se fechar com a maldita pandemia. Além de São Paulo, o giro ainda incluiu duas noites no Sesc Santo André e uma em Limeira, cidades também contempladas em seu regresso.
Se, quando deixávamos a estação Barra Funda do metrô rumo ao Espaço Unimed três dias antes, ouvimos uma empolgada fã afirmar não ser um show de rock, mas de Slash, referindo-se ao fato de o americano transcender estilos, a lógica invertida também valia para o sábado (3). Não se tratava de uma apresentação do Helloween ou do Masterplan e sim do guitarrista que une as duas bandas celebrando seu legado em noite de ingressos esgotados.
Sendo bastante prático, as pessoas foram à Comedoria do Sesc Belenzinho para estarem perto dele. Quer a prova? Quando chegamos, faltando meia hora para a apresentação, a “grade” do canto esquerdo da pista — direito do palco —, onde o alemão tocaria, já estava tomada. E sobrava espaço no lado oposto.
Sem banda de abertura e com insignificante atraso de dois minutos em relação ao horário divulgado de 20h30, o show foi iniciado com “Mr. Torture”, até a primeira de poucas interações de Roland, ciente de que não queriam vê-lo falando e sim tocando:
“Muito obrigado, São Paulo! Como estão? É lindo estar aqui, mas está muito quente! O que está havendo? Não tem ar-condicionado? Preciso de um. Estão prontos para um setlist especial hoje? Material bom e antigo. Espero que curtam. Cuidem-se”, declarou antes de “Spirit Never Die”, a primeira de um total de quatro do Masterplan “contra” onze do Helloween — muitas delas não tocadas mais pela banda original —, espalhadas em uma hora e trinta e sete minutos.
Tendo novamente — como em 2020 — o apoio de João Luiz (voz, Golpe de Estado), Affonso Junior (guitarra, Revenge e carreira solo), Fabio Carito (baixo, Warrel Dane e Metalium) e Marcus Dotta (bateria, também Warrel Dane e Metalium), o quinteto mostrou-se bem ensaiado e divertiu-se tanto quanto fez a alegria dos presentes, especialmente entre “Mankind” e “The Dark Ride”, quando João fez a propaganda dos produtos da barraquinha do merchan e, alheio ao que se passava em português, mas rindo, Grapow soltou um “O que você disse?” e completou: “Comprem camisetas!”.
Pontos altos? Embora não tenham sido escritas por Grapow, o combo sequencial “Eagle Fly Free” e “I Want Out”, ambas com os convidados Bill Hudson (guitarra, I Am Morbid, Doro e Northtale) e Victor Emeka (voz, Hibria), foi tiro certeiro no quesito, conforme esperado, e a primeira certamente merecia uma roda. Pessoalmente, favorita deste escriba, “The Time of the Oath” foi imbatível.
A dupla ainda participaria da festa em “Heroes”, penúltima do set e contando com a inclusão de Leandro Caçiolo, competentíssimo vocalista do Viper (entre tantos outros projetos), que também cantou “Push” e a citada “Mankind” no lugar do “vocalista titular”. E quanto ao andamento do set, o repertório foi de momentos mais cadenciados como em “A Million to One” e “Back from My Life” à pancadaria pura como na acima mencionada “Push”.
Houve espaço para canções mais “lado b”, como “A Handful of Pain”, e momentos intimistas, como os belos coros em “Crawling from Hell” e “The Dark Ride”, esta com guitarras dobradas no solo, lindo de se ver e ouvir!
Tratando-se de um show de covers (sejamos sinceros), daria para fazer uma análise mais aprofundada? Certamente, mas será que seria o caso? A banda segurou a onda do começo ao fim e o único senão foi o uso exagerado do teleprompter por parte de João Luiz para ler as letras, por vezes afetando sua desenvoltura. Leandro e Victor também se utilizaram do recurso, porém menos.
Por outro lado, João tem competência de sobra enquanto cantor, fora o fato de ter sido interessante ver a adaptação de seu timbre mais grave para melodias mais agudas. Seria desumano, obviamente, esperar uma imitação de Michael Kiske, Andi Deris ou Jørn Lande.
Dias antes do início da tour, o Masterplan de Grapow disponibilizou o single “Rise Again”, seu primeiro material inédito em mais de uma década — mais especificamente, desde “Novum Initium” (2013). Resta saber se a banda capitaneada pelo guitarrista poderia, também, passar pelo Brasil, visto que sua última visita ocorreu em 2015. Enquanto isso, celebramos o fato de Roland ter vindo mostrar seu talento cercado de músicos nacionais tarimbados. E haveria mais no dia seguinte em Limeira!
Observações sobre Santo André
Este escriba também esteve presente no primeiro dos três shows da turnê, realizado na última sexta-feira (2) no Santo Rock Bar, em Santo André. Algumas observações sobre a apresentação que iniciou a tour:
-> Rolou abertura do competentíssimo tributo a Ronnie James Dio, a Heaven And Hell, de Marcelo Saracino (vocal), Johnny Moraes (guitarra), Ricardo Flausino (baixo) e Marcus Dotta (bateria) – este em jornada dupla – e com direito à decoração de palco;
-> O show principal começou à 0h30 e só terminou às 2h10… Sendo assim, caso queira se arriscar por lá, prepare-se para voltar para casa meio da madrugada. Dicas: vá com amigos e experimente o Metallica, um dos apetitosos sanduíches locais;
-> A qualidade do som infelizmente estava inferior, abafado no geral a ponto de dificultar a compreensão das falas de Grapow e com os instrumentos mais altos do que o vocal, estranhamente imperceptível na live mantida no canal do bar no YouTube – a transmissão abre em 2h10’27”;
-> Não houve um terceiro guitarrista, ou seja, nada de Bill Hudson;
-> Ricardo Peres, ex-Seventh Seal, fez as partes de Leandro Caçoilo em “Push”, “Mankind” e “Heroes”;
-> A seleção de faixas foi idêntica, porém “Back from My Life” rolou antes de “The Time of the Oath”;
-> O clima entre os músicos e as interações com os fãs estavam ainda mais descontraídos sem a rigidez do “toque de recolher” tradicional das unidades do Sesc — algo dito sem critica alguma, pois foi ótimo partir para casa com vagar às 22h15 de um sábado;
-> Havia mais espaço na plateia, longe de dar sold out.
Roland Grapow — ao vivo em São Paulo
- Local: Sesc Belenzinho
- Data: 3 de fevereiro de 2024
Repertório:
- Mr. Torture [Helloween]
- Spirit Never Die [Masterplan]
- The Chance [Helloween]
- A Million To One [Helloween]
- The Time Of The Oath [Helloween]
- Back From My Life [Masterplan]
- A Handful Of Pain [Helloween]
- The Departed (Sun Is Going Down) [Helloween]
- Push [Helloween] [Com Leandro Caçoilo, sem João Luiz]
- Mankind [Helloween] [Com Leandro Caçoilo, sem João Luiz]
- The Dark Ride [Helloween]
- Eagle Fly Free [Helloween] [Com Bill Hudson e Victor Emeka, sem João Luiz]
- I Want Out [Helloween] [Com Bill Hudson e Victor Emeka, sem João Luiz]
- Heroes [Masterplan] [Com Leandro Caçoilo e Victor Emeka]
- Crawling From Hell [Masterplan]
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