O fim da década de 1970 foi um período conturbado para o Aerosmith. Após alcançar o topo do mundo, a banda chegou ao limite graças ao abuso de drogas e uma intensa rotina de turnês e gravações de álbuns. Sob pressão, a relação entre os músicos se desgastou e a convivência virou um barril de pólvora que explodiu em julho de 1979.
Nos bastidores do festival World Series of Rock – que aconteceu na cidade de Cleveland, nos Estados Unidos -, Elyssa Jerret, então esposa de Joe Perry, e Terry Cohen, esposa de Tom Hamilton, se desentenderam e iniciaram uma briga durante a qual um copo de leite foi atirado. A situação respingou no grupo e foi a gota d’água para Perry e Steven Tyler, que já vinham se desentendendo há um tempo.
Ao longo dos anos, o episódio foi comentado pelos envolvidos que compartilharam diferentes versões dos acontecimentos. No livro “Walk This Way: The Autobiography Of Aerosmith” – via Ultimate Classic Rock -, Tom Hamilton relembrou a briga das esposas como um reflexo da turbulência que o grupo passava.
“Terry conseguia ser hostil e certeira. Acho que ela disse algo para Elyssa, que jogou um copo de leite nela. Então houve um confronto físico entre elas antes de Cleveland. Foi barulhento. Teve gritos, e dava pra ouvir de longe. Ninguém se machucou, mas também foi um reflexo dos conflitos que aconteciam na banda.”
“[…] Steven fazia algo para irritar Joe, então Joe o tratava friamente no palco – era muito óbvio. No final desta noite em particular, lembro que Steven estava exaltado, ele estava com muita raiva.”
A versão de Steven Tyler veio a público em 2004 por meio da biografia “Does the Noise in My Head Bother You?”, onde revelou sua reação perante a briga. O frontman tinha problemas de convivência com Elyssa, o que resultou em uma postura mais agressiva que não agradou Perry.
“Joe e eu não estávamos lá quando aconteceu o Big Bang. Eu entrei ofegante e pingando, encharcado, e Elyssa e Terry estavam gritando uma com a outra. ‘Dê o fora daqui’, eu gritei. ‘Você não vê que estamos trabalhando aqui?’ Foi quando descobri que Elyssa tinha jogado leite em Terry e Terry simplesmente não tolerou. Elyssa não aceitava desaforo de ninguém e era assim. E nem a Terry. Tom estava vomitando.”
“Eu briguei com Joe. ‘Cara, você não pode vir aqui e controlar sua mulher?’… Joe estava agindo como se Elyssa tivesse o direito de fazer o que ela fez, e ele está dizendo isso enquanto Terry ainda está na sala. Não importava.”
No fim da noite Joe Perry deixou o Aerosmith. Por fim, Tyler relatou que se precipitou e demitiu o guitarrista no calor do momento.
“Lembro claramente de estar nos degraus do trailer, descendo e gritando para Joe: ‘Você está demitido!’… Éramos uma gangue, uma unidade, mas eu estava com muita raiva… Você pode entrar em uma situação maluca onde tudo o que você quer dizer é ‘Vá se foder!’ Eu poderia simplesmente ter dito: ‘Estou caindo fora daqui’. Mas não o fiz; em vez disso, disse: ‘Você está demitido!’ Essas foram as palavras! Na verdade, nunca dei um soco em Joe, mas naquela noite cheguei muito perto.”
Porém, Joe Perry tem uma visão diferente de sua saída da banda. Em entrevista à Classic Rock, o guitarrista refletiu sobre o momento que o Aerosmith passava e afirmou que se desligar do grupo foi o melhor naquele momento.
“Se eu tivesse continuado na banda, a mesma coisa teria acontecido. Teria que haver uma dose de realidade [para que as coisas mudassem]. Eu teria que ter acordado sóbrio e dito: ‘Preciso tirar uma folga’. Estávamos tocando em estádios, sendo a atração principal de todos esses grandes shows. Poderíamos ter tirado férias, depois nos reunido e voltado juntos. Mas estávamos tão acostumados a fazer essa coisa de turnê-álbum-turnê-álbum que isso nos derrubou. A melhor coisa que eu poderia ter feito era sair naquele momento e deixar tudo se acalmar.”
O músico – que passou a se dedicar a Joe Perry Project entre 1979 e 1984 – revelou que sentiu falta dos colegas de Aerosmith e ainda comentou como a separação de Elyssa Jerret, em 1982, esclareceu algumas coisas.
“Senti falta da galera, eu amo eles, mas tinha tanta bagunça e tantas outras coisas que vinham junto… Mas eu estava lá, só tocando, me divertindo. Eu estava em um relacionamento nos anos 70 [com Elyssa], então tive a chance de sair e correr solto de uma forma que não fazia naqueles primeiros anos. E percebi que não era tudo o que parecia ser.”
Aerosmith sem Joe Perry
A saída de Joe Perry em julho de 1979 abalou o Aerosmith. Em meio às gravações de “Night in the Ruts”, Brad Whitford teve que assumir a função dupla de guitarrista base e solo enquanto o substituto de Perry não chegava. O músico escolhido foi Jimmy Crespo que estreou com a banda na turnê de promoção do trabalho.
Nesse ponto o Aerosmith enfrentou a primeira baixa de sua carreira. O grupo que lotava estádios passou a se apresentar para públicos menores e com o álbum “Rock in a Hard Place” (1982) recebeu críticas mistas e passou por uma queda no desempenho comercial. A crise ainda foi agravada pelo abuso de drogas por parte de Steven Tyler, que prejudicava apresentações a até mesmo o convívio entre os músicos.
O período marcou o pior momento da carreira da banda, que começou a se reinventar em 1984. Com Tyler reabilitado e Joe Perry de volta, o Aerosmith retomou seu local de destaque com o álbum “Permanent Vacation” de 1987. O trabalho entrou para o top 20 da Billboard Hot 100 graças ao desempenho dos singles “Dude (Looks Like a Lady)” e “Angel” que ganharam grande rotatividade na MTV e nas rádios norte-americanas.