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Como “Jazz” marcou o auge dos excessos do Queen

Freddie Mercury e companhia estavam no auge da extravagância, com direito a hinos tarados e uma festa lendária de lançamento

“Maior” sempre foi melhor para o Queen. O grupo formado por Freddie Mercury (voz), Brian May (guitarra), John Deacon (baixo) e Roger Taylor (bateria) havia conquistado o mundo através de uma fórmula musical extravagante, incorporando elementos de música clássica ao rock sem descambar para o progressivo.

Ao longo de seus seis primeiros discos, a banda se estabeleceu como uma entidade única, incapaz de ser contida em sua exuberância. Isso se aplicava no tamanho dos lugares onde se apresentavam ou nas limitações musicais vigentes.

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Cada vez maiores, eles simplesmente se tornavam mais autoindulgentes. Essa é a história de como o Queen fechou os anos 1970 com seu disco mais hedonista, cujo lançamento foi comemorado numa festa lendária.

Vamos falar de “Jazz”.

Queen e os frutos do sucesso 

O sexto disco de estúdio do Queen, “News of the World” (1977), foi construído para tocar ao vivo. A dupla de canções que abre o álbum, “We Will Rock You” e “We Are The Champions”, se tornou o carro-chefe das apresentações do grupo no que acabou virando a turnê mais bem-sucedida deles até então.

Para Brian May em particular, o sucesso do grupo nesse período – eles lotaram múltiplas noites no Madison Square Garden – significou algo a mais. Seu pai, um engenheiro aeroespacial, nunca havia aprovado sua escolha por uma carreira musical. 

Entretanto, o guitarrista pode dar ao May mais velho um presente especial, como contou no livro “A Verdadeira História do Queen”, de Mark Blake:

“Fiz com que meu pai viajasse em um avião Concorde, para que viesse assistir à nossa apresentação. Ele trabalhara para a Concorde por todo aquele tempo, mas jamais voara em um avião da companhia. Ele assistiu à nossa apresentação no Madison Square Garden, e, após o show, veio até mim e disse: ‘T=tudo bem, agora compreendo a sua escolha’. Aquele foi um momento maravilhoso.”

Nesse período, o grupo também viu o final de seu relacionamento profissional com John Reid. A razão para isso foi simples: Freddie Mercury e Elton John se odiavam, mas ambos eram agenciados pelo empresário. Ele precisou tomar um lado e escolheu permanecer com o artista solo, com quem trabalhava desde 1970.

O Queen acabou substituindo Reid com Jim Beach, até então advogado da banda. Suas primeiras ações no cargo foram o estabelecimento de empresas responsáveis pela organização das turnês, recebimento de direitos autorais e produção de mais videoclipes – o grupo havia sido pioneiro no uso desse formato na promoção de singles.

Houve também uma renegociação milionária do contrato com a EMI, que bateu com uma taxação imposta pelo governo britânico. O Queen precisaria se tornar um grupo de exilados fiscais.

Nessa época, Mercury também anunciou publicamente seu término com Mary Austin. Apesar de não assumir ser homossexual, tornou-se nada discreto. O círculo de amigos do cantor era aludido na imprensa através de pseudônimos femininos — e seu companheiro da vez, Peter Straker, ganhou um contrato de gravação na EMI.

Enquanto os demais integrantes se mudaram para outros países e construíam famílias, o vocalista se gabava dos gastos extravagantes na imprensa inglesa. Tudo no universo de Freddie Mercury era enorme. O próximo disco do Queen precisaria ser maior ainda.

Variedade acima de tudo

O encarregado da produção desse novo disco foi Roy Thomas Baker, com quem trabalharam nos primeiros quatro álbuns da carreira. Freddie Mercury e o produtor se reencontraram durante as sessões de “This One’s On Me”, estreia de Peter Straker.

Baker estava recém-saído de um sucesso enorme como produtor da estreia do The Cars. As lições aprendidas nesse disco foram aplicadas em uma evolução sonora o Queen.

A banda se estabeleceu entre Genebra e Nice durante as gravações. A única distração real para os trabalhos foi a fascinação desenvolvida por Freddie Mercury pelo Tour de France.

Em “A Verdadeira História do Queen”, é levantada a hipótese de um caso entre o vocalista e um dos ciclistas, o que explicaria o interesse de Freddie pela competição e a subsequente composição de “Bicycle Race”. Roy Thomas Baker resumiu sua opinião sobre o assunto de maneira simples no livro:

“Se tanto, a vida pessoal de Freddie afetava seu trabalho de maneira positiva, na medida que o tornava teatral. Seus horizontes eram amplos e ser homossexual dava-lhe um ponto de vista adicional para contemplá-los.”

Brian May por sua vez incorporou a sexualidade no ar e compôs “Fat Bottomed Girls”, um dos maiores hits da banda. Ele falou a inspiração por trás em  “A Verdadeira História do Queen”:

“Eu a compus tendo Fred em mente. Tal como é feito quando se conta com um vocalista que gostava de garotas — ou garotos — com posteriores avantajados.”

A trinca de singles de sucesso foi completa com “Don’t Stop Me Now”, uma canção que embora capturasse toda a exuberância do Queen, Brian May reconheceu anos depois ser um pedido de ajuda. Todas as coisas descritas por Freddie Mercury na letra eram um reflexo de seu estilo de vida alucinado — e estavam o desgastando ao mesmo tempo.

Por outro lado, “Jazz” ainda contou com uma homenagem do vocalista às suas origens culturais. Nascido Farrokh Bulsara em Zanzibar, ele era de etnia Parsi, indianos descendentes de persas. Ao longo da carreira do Queen, Freddie sempre fez alusões à cultura islâmica, mas “Mustapha” era o cantor abraçando com força sua história. 

A letra cita frases de louvor muçulmanas, além de usar tanto inglês quanto árabe como idioma. Mercury ainda se diverte um pouco com sua herança cultural ao arriscar um gromelô em persa.

Pelo resto do disco, a banda elaborava uma visão completa de seu hard rock com elementos de rebuscados – influenciados por ópera, cabaré, can-can, seja lá qual referência ao passado preferir. A ponto do nome “Jazz” parecer um desejo do grupo de remeter a um período anterior distante de opulência e excelência cultural.

Excessos do Queen na era “Jazz”

Finalizado “Jazz”, o Queen se pôs a trabalhar nos aspectos promocionais do primeiro single, um duplo A-side composto de “Bicycle Race” e “Fat Bottomed Girls”. A primeira das duas canções teve um videoclipe filmado em volta de Wembley, em Londres, com 65 modelos nuas pedalando na pista de ciclismo que circunda o estádio.

A EMI ficou nada feliz com o vídeo e com a capa do single, que trazia a imagem de uma mulher pelada numa bicicleta vista por trás. Apesar de não haver nu frontal, a bunda era um convite para a censura, uma sentença de morte para vendas. A banda concordou em pintar uma calcinha na garota, mas o pôster comemorativo – sem a peça de roupa – causou furor.

Mesmo assim, a peripécia mais lendária do período promocional de “Jazz” foi sua festa de lançamento, realizada no Dia das Bruxas de 1978, em Nova Orleans. A equipe do grupo havia sido instruída a percorrer o French Quarter da cidade no período antecedendo o evento à procura de todo e qualquer tipo excêntrico que aparecesse.

O resultado foi um desfile de strippers, travestis e artistas de circo à meia-noite, justamente quando todo mundo estava cheio de comida e champanhe. Nas décadas desde então, rezam lendas de anões – em alguns casos descritos como hermafroditas – carregando bandejas de cocaína na coroa da cabeça, sexo em público e todo tipo de hedonismo possível.

Entretanto, numa entrevista de Roger Taylor em “A Verdadeira História do Queen”, de Mark Blake, ao menos a lenda dos anões é meio exagerada:

“Veja, se isso for verdade, eu nunca vi. Mas devo dizer que a maioria das histórias sobre aquela noite não é, assim, tão exagerada.”

“Jazz” acabou saindo em 10 de novembro de 1978. Atingiu o segundo lugar na parada britânica e a sexta posição na Billboard 200.

A imprensa não reagiu bem ao disco. Os próprios integrantes, desde então, o descrevem como o pior da fase clássica da banda.

Independente das críticas, eles estavam maiores que nunca. Seus shows nessa turnê – eternizados no disco ao vivo “Live Killers” (1979) – foram o estopim para o que hoje em dia é visto como rock de estádio. Arenas normais eram incapazes de conter o Queen naquele ponto.

E nos anos seguintes, até estádios se tornaram pequenos demais.

Queen — “Jazz”

  • Lançado em 10 de novembro de 1978 pela EMI / Elektra / Ariola (na França)
  • Produzido por Queen e Roy Thomas Baker

Faixas:

  1. Mustapha
  2. Fat Bottomed Girls
  3. Jealousy
  4. Bicycle Race
  5. If You Can’t Beat Them
  6. Let Me Entertain You
  7. Dead on Time
  8. In Only Seven Days
  9. Dreamer’s Ball
  10. Fun It
  11. Leaving Home Ain’t Easy
  12. Don’t Stop Me Now
  13. More of That Jazz

Músicos:

  • Freddie Mercury (vocais, piano)
  • Brian May (guitarra, violão, vocais)
  • Roger Taylor (bateria, vocais, percussão, guitarra, baixo)
  • John Deacon (baixo, guitarra, violão)

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Pedro Hollanda
Pedro Hollanda
Pedro Hollanda é jornalista formado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso e cursou Direção Cinematográfica na Escola de Cinema Darcy Ribeiro. Apaixonado por música, já editou blogs de resenhas musicais e contribuiu para sites como Rock'n'Beats e Scream & Yell.

1 COMENTÁRIO

  1. Ótima análise, porém Freddie e Elton nunca se odiaram…eram grandes amigos desde 75 e já até cantaram junto em um show do Elton em 82.
    Aliás, Elton John foi muito presente nos últimos dias de vida do astro do Queen.

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