O forte texto de membros do Anti-Flag após denúncias contra Justin Sane

Pat Thetic (bateria), Chris Head (guitarra) Chris “No. 2” Barker (baixo) declararam apoio às mulheres que acusaram vocalista de crimes sexuais e o mandaram "se f*der" por "explorar a banda e seus associados"

O baterista Pat Thetic, o guitarrista Chris Head e o baixista Chris “No. 2” Barker se manifestaram sobre as novas acusações de crimes sexuais contra o vocalista e guitarrista Justin Sane, seu agora ex-colega de Anti-Flag. A banda teve suas atividades encerradas após uma primeira alegação, feita sem citar o nome do músico. Semanas depois, uma reportagem da Rolling Stone não só confirmou que a mulher em questão falava sobre Sane (cujo nome real é Justin Geever), como, também, revelou outras 12 denúncias.

Diante disso, o trio de instrumentistas se posicionou de forma crítica ao ex-colega. Eles dizem:

“Diante do recente artigo na revista Rolling Stone, para Kristina, Jenn, Molly, Rebecca, Suzanne, Mat, Susie, Stefanie, Karina, Ella, Elizabeth, Hannah e Tali, gostaríamos de agradecer por sua coragem em compartilhar a dor que você experimentou. E, para outros que ainda possam se apresentar, embora você não deva sua história a ninguém, saiba que você não está sozinha e que acreditamos em você.

Para Justin, acreditamos que você está muito doente e precisa de ajuda profissional séria. Queremos ter compaixão e fé na justiça restaurativa, mas vá se f#der por machucar tantas pessoas, não apenas aquelas que se apresentaram corajosamente, mas qualquer pessoa que ainda carregue sua dor internamente. Vá se f#der por explorar o trabalho da banda e das muitas pessoas associadas a ela por tanto tempo. Como muitos predadores fazem, parece que você usou as nossas crenças como disfarce para atividades que você sabia claramente que nunca toleraríamos.

Para todos, coletiva e individualmente ainda temos muito mais perguntas do que respostas neste momento. Temos aprendido e processado todas essas informações em tempo real. Confiávamos muito em Justin e agora estamos vendo que fomos enganados e mantidos no escuro durante toda a nossa parceria. Para Chris Barker, pessoalmente, Justin conhecia sua história com traumas: seu pai foi condenado por abuso sexual infantil e atualmente está encarcerado, sua irmã foi vítima de abuso e o próprio Chris foi abusado sexualmente por uma criança mais velha de sua vizinhança. Compartilhamos isso para demonstrar que Justin estava perfeitamente consciente da reação visceral que teríamos diante de um comportamento tão destrutivo. Mas também porque compartilhar um palco por tanto tempo com alguém que você descobre mais tarde ser um predador acusado tem sido incrivelmente doloroso de processar e aceitar. Duas coisas podem ser verdadeiras: uma pessoa pode ser gentil e altruísta em um espaço e um monstro em outro.

Por volta das 22h30 do dia 18 de julho, fomos alertados de que um podcast seria lançado na manhã seguinte detalhando uma agressão sexual envolvendo Justin. Encaminhamos para ele uma mensagem com uma prévia do episódio e contendo foto e nome. Justin respondeu que não conhecia essa pessoa. Na manhã seguinte, quando nós três ouvimos a história de Kristina, ficou claro para nós que ele estava mentindo. Para sermos fiéis aos valores que abraçamos durante décadas, saímos da banda imediatamente e sem hesitação. Nós três removemos a presença da banda na internet em uma tentativa de limitar os espaços para as pessoas atacarem, antagonizarem ou prejudicarem Kristina enquanto tentávamos entender essa informação chocante.

À medida que mais detalhes foram compartilhados desde o lançamento do podcast, esperávamos que Justin fizesse a coisa certa. Dada a sua falta de arrependimento, fica muito claro que ele não é a pessoa que fomos levados a acreditar que ele era.

Não temos certeza de onde nosso caminho nos levará. Neste momento, as palavras parecem vazias e nenhuma declaração pode aliviar o sofrimento causado. Temos muito que aprender sobre nós mesmos – com muita reflexão e introspecção pela frente. Será necessária muita terapia e dedicação de tempo e recursos em locais equipados para ajudar com esse tipo de trauma. Nós três ainda estamos em choque e de luto, mas principalmente nossos corações estão partidos por cada vítima. Estamos profundamente tristes com cada uma de suas histórias dolorosas e seremos eternamente gratos por sua coragem em compartilhá-las.

Amor, cura e justiça para todos os sobreviventes.

Pat, Chris e Chris”

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O caso

A banda punk americana havia anunciado o fim das atividades de maneira súbita, deixando seus fãs buscando por respostas. Logo, encontraram uma entrevista da terapeuta holística Kristina Sarhadi para o podcast Enough, durante a qual ela relata a experiência de ter sido estuprada por um músico do estilo em questão, cujo nome não foi citado.

Alerta de conteúdo: Essa matéria contém menções e descrições gráficas de abuso sexual, grooming e estupro.

Agora, Sarhadi confirma à Rolling Stone se tratar de Justin Geever, mais conhecido como Justin Sane, vocalista e guitarrista do Anti-Flag. Ela e mais 12 mulheres compartilharam histórias de terem sido assediadas ou abusadas pelo músico, que havia se manifestado anteriormente negando ter cometido o crime.

As histórias mostram um padrão de comportamento. Segundo os relatos, Geever supostamente encontra garotas de aparência jovens durante shows e prossegue a desenvolver um relacionamento amigável com elas até conseguir sexo. O termo usado por especialistas em abuso sexual para descrever essa prática é grooming.

Molly Newborn afirma que tinha 17 anos quando, em 1999, Geever tentou lhe beijar e levá-la ao seu quarto de hotel após ouvir que ela era virgem. Ela disse:

“Eu não falei nada por um monte de razões. Mas uma enorme seria: eu não acho que pessoas acreditariam, que esse cara é um predador, porque ele canta sobre feminismo.”

A inglesa Hannah Stark chegou a prestar queixa e fazer exame de corpo de delito para corroborar seu depoimento. Contudo, segundo ela, a polícia de seu país abandonou o caso porque ela nunca disse “não” para o vocalista.

Ao refletir sobre a existência de outras mulheres que alegam ser vítimas do músico, Sarhadi afirmou:

“Eu não fazia ideia de que havia acontecido com outras. Eu me senti estúpida, envergonhada e confusa, porque como isso poderia ter acontecido com essa pessoa? Ele é o cantor antiestupro. Eles são a banda abertamente feminista que lançaram um disco com renda destinada a mulheres vítimas de crimes. Não faz sentido. Mas até na natureza, os predadores mais perigosos têm a melhor camuflagem.”

Mais relatos

De acordo com a Rolling Stone, sete das mulheres entrevistadas disseram que eram adolescentes menores de idade quando tiveram suas experiências com Justin Geever / Justin Sane. Uma oitava, Tali Weller, contou tinha apenas 12 anos quando o artista, na época com 17, a teria manipulado para fazer sexo com ele. Ela disse:

“Eu ainda estou tentando compreender minha sexualidade e o que foi afetado por ele por causa desse relacionamento. Eu lembro dele me instruir a gemer para lhe mostrar ‘que eu estava gostando’. É tão desconfortável falar disso e como isso afetou minha vida sexual até hoje.”

Três das vítimas também alegaram que os outros integrantes do Anti-Flag não teriam como fingir ignorância do assunto. Uma mulher identificada como Rebecca, que afirma ter se relacionado com Geever enquanto ela tinha 17 anos, falou:

“Eles sabiam o quão jovens todas eram. Havia um limite claro que ele passava constantemente e isso deveria ter levantado suspeitas pra todo mundo.”

Declarações anteriores de Anti-Flag e Justin Sane

Ainda em julho, os integrantes do Anti-Flag se manifestaram, em dois comunicados separados, sobre as acusações de estupro contra Justin Geever / Justin Sane. Na época, vale reforçar, a suposta vítima não havia citado o nome do músico — internautas fizerama conexão a partir de uma declaração dela a um podcast, ligando também ao anúncio repentino de fim do grupo.

Justin divulgou um texto onde nega ter cometido qualquer crime. Porém, ele confirmou que as atividades da banda foram encerradas em função dos problemas causados pelas acusações.

“Recentemente, foram feitas acusações de abuso sexual feitas contra mim e posso dizer que essas histórias são categoricamente falsas. Nunca tive uma relação sexual que não fosse consensual, nem nunca fui abordado por uma mulher após um encontro sexual para ser informado de que, de alguma forma, agi sem o consentimento dela ou a violei de alguma forma. Agora que tive alguns dias para absorver o choque inicial, estou fazendo esta declaração para esclarecer as coisas.

O abuso sexual é real e tem um impacto devastador nas vítimas. Dediquei toda a minha vida adulta a defender essas vítimas, bem como aquelas que sofrem opressão e desigualdade, que são humilhadas e abusadas. Sempre fui e sempre serei essa pessoa. As declarações que estão sendo feitas sobre mim são a antítese do que acredito e de como me comportei ao longo da minha vida.

Em relação à dissolução do Anti-Flag, como banda, foi tomada a decisão de que, nessas circunstâncias, seria impossível continuar.

Quero agradecer à minha família e amigos, e aos muitos, muitos fãs, músicos e bandas que me procuraram para oferecer apoio e ajuda.”

Os demais integrantes – o baterista Pat Thetic, o guitarrista Chris Head e o baixista Chris “No. 2” Barker – se pronunciaram em outro texto. O trio afirma que o fim das atividades do grupo tem a ver com princípios estabelecidos por eles próprios.

“Um princípio central da banda Anti-Flag é ouvir e acreditar em todos os sobreviventes de violência e abuso sexual. As recentes alegações sobre Justin estão em contradição direta com esse princípio. Portanto, sentimos que a única opção imediata era a dissolução.

Ficamos chocados, confusos, tristes e com os corações partidos desde o momento em que ouvimos essas alegações. Embora acreditemos que isso seja extremamente sério, nos últimos 30 anos nunca vimos Justin ser violento ou agressivo com mulheres. Essa situação nos abalou profundamente.

Entendemos e pedimos desculpas por esta reação não ter sido rápida o suficiente para algumas pessoas. Este é um território novo para todos nós e está demorando para processarmos a situação.

Foi um privilégio para nós estarmos na banda Anti-Flag, pois buscamos encontrar nosso caminho a seguir desejamos cura a todos os sobreviventes.”

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Igor Miranda
Igor Miranda
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com pós-graduação em Jornalismo Digital. Escreve sobre música desde 2007. Além de editar este site, é colaborador da Rolling Stone Brasil. Trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, revista Guitarload, jornal Correio de Uberlândia, entre outros. Instagram, Twitter e Facebook: @igormirandasite.

1 COMENTÁRIO

  1. Eu visitei a exposição dos itens de Freddie Mercury em Londres, cheguei a tocar algumas notas no poano (vejam no nome instagram marcusvvvsantos ), mas logo os seguranças vieram em minha direção,
    pensei que seria expulso da exposição. Quanto aos itens e a exposição, realmente ESPETACULAR, mas uma pena que tudo será espalhado, acredito que deveriam manter tudo junto.

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