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“This Year’s Model”, o álbum que cimentou Elvis Costello como uma estrela

Em seu primeiro disco com o apoio do The Attractions, cantor e compositor inglês se tornou um hit em ambos os lados do Atlântico - e foi banido do "Saturday Night Live"

É justo dizer que Elvis Costello teve duas estreias. Em “My Aim is True” (1977), o cantor e compositor inglês mostrou de cara ao mundo o poder de suas músicas, sendo capaz de evocar a raiva, tristeza e confusão de uma juventude inteira.

Contudo, o som ainda não estava exatamente lá. No álbum, ele teve o acompanhamento do grupo de country rock Clover – depois renomeado Huey Lewis and The News – que, apesar de prestarem acompanhamento excelente em momentos mais suaves como “Allison”, faltava a energia punk desejada por Elvis Costello.

- Advertisement -

Por isso, ele resolveu montar uma banda. Esse conjunto, The Attractions – formado por Bruce Thomas (baixo), Pete Thomas (bateria, nenhuma relação com o anterior) e Steve Nieve (teclados) – não só acompanhou Costello pelos próximos 10 anos, como também foram vitais para a construção da sonoridade que o alavancou ao estrelato.

Vamos explorar essa história.

Formando uma banda

“My Aim is True” é um álbum excelente, mas Clover estava lá como banda de estúdio – e soa exatamente desse jeito. Sem falar que não acompanhariam Elvis Costello na estrada para promover o disco. Logo, era necessário para o cantor formar um grupo de apoio.

Bruce e Pete Thomas foram os primeiros selecionados. As notas de produção da edição deluxe de “This Year’s Model” (tradução via Scream & Yell) trazem Elvis Costello relembrando o teste mais inusitado do processo:

“Foi em 12 de julho de 1977, uma semana depois de eu deixar meu emprego. Ensaiávamos em um quartinho, e em dois dias eu estaria apresentando ao vivo minha nova banda, The Attractions. O tecladista tinha 19 anos, era estudante da Royal College of Music e foi sem dúvida o mais impressionante candidato nas audições. Ele pediu para ficar e ouvir o teste dos outros tecladistas, e mais tarde o descobrimos dormindo entre os amplificadores após ter matado uma garrafa de vinho. Ele era, obviamente, o homem para o trabalho. Seu sobrenome familiar era Nason, e todos o apelidaram de Mason, mas logo o começaram a chamar de Steve Nieve.”

Nieve teve a distinção de ser o primeiro integrante dos Attractions a aparecer em uma gravação, participando do single “Watching the Detectives”, gravado em maio de 1977. De cara, a influência dele é evidente, com seus teclados assumindo uma posição de destaque nos arranjos e ajudando a estabelecer a importância do instrumento no movimento new wave graças à sua criatividade.

Em uma entrevista de 2020 à Billboard, Costello falou sobre o papel de Nieve na gravação:

“Quando a gente gravou ‘Watching the Detectives’, foi a primeira sessão do Steve Nieve. Ele tinha 19 anos,  recém saído da Royal College, e a gente tinha acabado de se conhecer. Eu falei: ‘Essa é sobre detetives, quero um piano que soa como Bernard Herrmann’, e é claro, ele não sabia do que eu estava falando, então eu faço [som staccato e afiado] e o que você ouve no disco é esse piano galopante que apressa a batida e soa como um daqueles gestos repentinos que Herrmann fazia muito. Mas a gente não tinha 19 clarinetes ou coisa assim que ele usou em ‘Cortina Rasgada’; a gente só tinha um piano vertical detonado num estúdio de oito faixas.”

O primeiro teste do grupo foi um show na Dingwalls Dancehall dia 26 de julho. No mesmo dia, Elvis foi preso por se apresentar do lado de fora do Hilton em Londres, que recepcionava uma convenção da Columbia Records, promovendo a si mesmo e o concerto naquela noite. 

Em entrevista para a Trouser Press concedida em dezembro de 1977, Costello contou sobre a situação toda:

“A gente tinha caras andando com cartazes de propaganda para o show e eu estava tocando através desse amplificador a bateria. Eles saíram pra calçada e uma multidão se juntou bem rápido, incluindo alguns dos figurões da CBS. Todos esses caras estavam em pé lá e aplaudindo, mas o Hilton não viu a situação tendo tanta graça e chamou a polícia. A polícia também não viu graça e me prendeu.”

Um dos figurões que assistiu a performance e ficou impressionado com Costello foi Greg Geller, que os assinou para a Columbia nos Estados Unidos meses depois.

Forjado em turnê

Lançado naquela semana, “My Aim is True” recebeu excelentes críticas e atingiu a 12ª posição na parada de álbuns do Reino Unido na semana da morte de Elvis Presley, em agosto.

Elvis Costello e The Attractions capitalizaram em cima desse sucesso saindo em turnê com outros artistas do mesmo selo, Stiff Records – Nick Lowe, Wreckless Eric e Ian Dury and the Blockheads. O clima entre os artistas era de competição, em cima do palco e nos camarins, com bebedeiras e drogas reinando.

Foi nesse clima que “This Year’s Model” começou a tomar forma. “Pump it Up”, o maior hit do disco, foi composto durante a turnê, como Costello descreveu no encarte da compilação “Girls Girls Girls” (via Trash Theory no YouTube):

“Foi composta na escadaria de incêndio de um hotel em Newcastle durante um frenesi de anfetaminas e vodka. Essa anticanção rock’n’roll era minha última cartada antes de me entregar. A manhã dolorosa trouxe um trabalho grande, porém simples, de edição, fazendo possível que a gente aprendesse a canção para tocar na noite seguinte.”

Outro hit que ganhou forma durante a turnê foi “(I Don’t Want To Go To) Chelsea”, escrita anos antes por Costello, mas nunca aproveitada para nada. Porém, as contribuições dos outros integrantes deram um novo fôlego à canção, como o cantor escreveu no encarte da edição deluxe de “This Year’s Model” (tradução via Scream & Yell):

“Os Attractions fizeram uma grande diferença para estas canções. ‘(I Don’t Want To Go To) Chelsea’, por exemplo, tinha a mesma batida de guitarra de ‘I Can’t Explain’, do The Who (e também ‘Clash City Rockers’, do Clash). Bruce e Pete apareceram com um arranjo muito mais sincopado e Steve fez uma parte de teclado que parecia uma sirene. Sua configuração do teclado estava limitada a um órgão Vox Continental e um teclado barato. Eu, por fim, tive que mudar a minha guitarra.”

O processo de turnê e composição também fez os músicos se conhecerem melhor a partir de seus gostos musicais, que Costello descreve no mesmo encarte:

“Ao trabalhar nas músicas, eu falava para eles dos discos que eu mais gostava. Foi só depois de alguns meses que descobrimos que Steve gostava de rock pós Alice Cooper e T. Rex enquanto Pete, Bruce e eu certamente tínhamos ouvido Beatles e Small Faces, e quase todos concordávamos sobre os Rolling Stones (ao menos ‘Aftermath’, que foi o álbum que eu mais escutei naquele período. ‘This Year’s Girl’ é minha resposta para ‘Stupid Girl’). Nunca entendi as acusações de misoginia que foram feitas a este álbum. A maior parte das canções são obras da imaginação e não produtos da realidade. As tentações e distrações da vida em turnê logo iriam adicionar um olhar mais cínico e culpado sobre ‘Little Triggers’, ‘Pump it Up’ e ‘Hand in Hand’.”

Outra canção revivida durante a turnê foi “Radio Soul”, composta por Costello quando ainda fazia parte do grupo Flip City. Um ode às rádios piratas do Reino Unido durante os anos 1960, ela também havia sido influenciada por Bruce Springsteen, apesar dessa inspiração inicial ter se dissipado no ínterim, sendo substituída pela acidez do punk. 

Agora a música se chamava “Radio, Radio”, denunciando o estado lastimável do meio e como era usado para controlar a nação. Punk naquela época estava banido da BBC, mesmo com os Sex Pistols sendo um sucesso nas paradas. Ela se tornaria o estopim de um dos momentos mais polêmicos de sua carreira.

Banidos do sábado à noite

Em dezembro de 1977, “My Aim is True” era o LP importado mais vendido nos Estados Unidos naquele ano. Isso rendeu a Elvis Costello um contrato de distribuição no país pela Columbia – a mesma do show onde o artista foi preso – e uma rápida turnê pelo país.

Quando os Sex Pistols não conseguiram aprontar seus vistos de trabalho a tempo de tocar no programa “Saturday Night Live” dia 17 de dezembro, Costello e The Attractions foram posicionados para substituírem o grupo.

https://www.youtube.com/watch?v=r3C1mjB4X_8

Os problemas começaram quando ninguém no elenco do programa – na época formado por John Belushi, Dan Ackroyd, Bill Murray, Jane Curtin, Laraine Newman, Garrett Morris e Gilda Radner – conhecia a banda. Além disso, os músicos ingleses não ficaram impressionados com a comédia praticada pelos americanos.

Tensão também aparecia entre a banda e a Columbia, que os estava pressionando para tocar a canção “Less Than Zero” no programa. Presente em “My Aim Is True”, a letra da música fala sobre Oswald Mosley, parlamentar inglês e notório fascista. Contudo, Costello estava cansado de tocar coisas do primeiro disco, querendo apresentar algo novo.

A primeira apresentação do episódio correu sem incidentes, a banda tocando “Watching the Detectives”. Contudo, quando chegou a hora da segunda canção, eles começaram “Less Than Zero” apenas para Costello interrompê-los e se dirigir à plateia:

“Me desculpem, senhoras e senhores, mas não existe razão para tocar essa música aqui.”

Anos depois, numa entrevista para Apple Music Essentials em janeiro de 2021 (via Trash Theory no YouTube), Costello relembrou o incidente:

“Eu queria que eles lembrassem da gente. Eu não tinha nada de verdade contra o programa. Eu estava mais irritado com ser dito o que tocar pela gravadora do que com a NBC, de verdade. Não lembro se avisei o que ia fazer, mas acho que só falei: ‘prestem atenção em mim’.”

O resultado foi Costello sendo banido do programa para sempre. Bem, nem tanto, considerando que ele apareceu no programa novamente em 1989 e essa performance de “Radio, Radio” se tornou lendária na história do “Saturday Night Live”, reencenando o momento com os Beastie Boys em 1999.

Energia no estúdio

Nessa época, Elvis Costello e The Attractions finalmente estavam entrando no estúdio para gravar seu disco de estreia, que se tornaria “This Year’s Model”. Como o material estava já todo composto e ensaiado, o processo durou apenas 11 dias. O baixista Bruce Thomas descreveu a rapidez e prolificidade das sessões para Graeme Thomson no livro “Complicated Shadows: The Life and Music of Elvis Costello”:

“Nós literalmente gravamos as melhores faixas do disco – ‘Pump It Up’ e ‘(I Don’t Want to Go to) Chelsea’ – em uma tarde. Era que nem Motown. A gente entrava no estúdio, tocava e era isso.”

O processo de composição foi tão prolífico que edições comemorativas do disco vêm com demos de canções lançadas posteriormente, mostrando o quanto o grupo estava indo à toda em 1977.

“This Year’s Model” saiu em 17 de março de 1978, com o single “(I Don’t Want to Go to) Chelsea” antecipando o disco duas semanas antes. O compacto chegou ao 16º lugar das paradas inglesas e o LP à 4ª posição entre álbuns no Reino Unido.

Quando o álbum finalmente saiu nos Estados Unidos, em maio, a Columbia substituiu “(I Don’t Want to Go to) Chelsea” e “Night Rally” na tracklist por “Radio, Radio”, argumentando que as letras das duas canções excluídas eram “inglesas demais”. Mesmo assim, o álbum alcançou a 30ª posição nas paradas americanas.

Durante a turnê, Elvis Costello e The Attractions já apresentavam canções de seu próximo trabalho, “Armed Forces”, porque eles não paravam quietos. Contudo, “This Year’s Model” tem a distinção de ser o momento em que o cantor e compositor se estabeleceu de verdade, nos dois lados do Atlântico, como um dos maiores nomes do rock pelos próximos 10 anos.

Artistas como Linda Ronstadt e Dave Edmonds regravariam suas canções, o próprio faria uma parceria com a lenda country George Jones. Costello havia se tornado uma estrela.

Elvis Costello & The Attractions – “This Year’s Model”

  • Lançado em 17 de março de 1978 pela Radar Records
  • Produzido por Nick Lowe

Faixas:

  1. No Action
  2. This Year’s Girl
  3. The Beat
  4. Pump It Up
  5. Little Triggers
  6. You Belong to Me
  7. Hand in Hand
  8. (I Don’t Want to Go to) Chelsea
  9. Lip Service
  10. Living in Paradise
  11. Lipstick Vogue
  12. Night Rally

Músicos:

  • Elvis Costello (voz, guitarra)
  • Steve Nieve (teclados)
  • Bruce Thomas (baixo)
  • Pete Thomas (bateria)

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Pedro Hollanda
Pedro Hollanda
Pedro Hollanda é jornalista formado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso e cursou Direção Cinematográfica na Escola de Cinema Darcy Ribeiro. Apaixonado por música, já editou blogs de resenhas musicais e contribuiu para sites como Rock'n'Beats e Scream & Yell.

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“This Year’s Model”, o álbum que cimentou Elvis Costello como uma estrela

Em seu primeiro disco com o apoio do The Attractions, cantor e compositor inglês se tornou um hit em ambos os lados do Atlântico - e foi banido do "Saturday Night Live"

É justo dizer que Elvis Costello teve duas estreias. Em “My Aim is True” (1977), o cantor e compositor inglês mostrou de cara ao mundo o poder de suas músicas, sendo capaz de evocar a raiva, tristeza e confusão de uma juventude inteira.

Contudo, o som ainda não estava exatamente lá. No álbum, ele teve o acompanhamento do grupo de country rock Clover – depois renomeado Huey Lewis and The News – que, apesar de prestarem acompanhamento excelente em momentos mais suaves como “Allison”, faltava a energia punk desejada por Elvis Costello.

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Por isso, ele resolveu montar uma banda. Esse conjunto, The Attractions – formado por Bruce Thomas (baixo), Pete Thomas (bateria, nenhuma relação com o anterior) e Steve Nieve (teclados) – não só acompanhou Costello pelos próximos 10 anos, como também foram vitais para a construção da sonoridade que o alavancou ao estrelato.

Vamos explorar essa história.

Formando uma banda

“My Aim is True” é um álbum excelente, mas Clover estava lá como banda de estúdio – e soa exatamente desse jeito. Sem falar que não acompanhariam Elvis Costello na estrada para promover o disco. Logo, era necessário para o cantor formar um grupo de apoio.

Bruce e Pete Thomas foram os primeiros selecionados. As notas de produção da edição deluxe de “This Year’s Model” (tradução via Scream & Yell) trazem Elvis Costello relembrando o teste mais inusitado do processo:

“Foi em 12 de julho de 1977, uma semana depois de eu deixar meu emprego. Ensaiávamos em um quartinho, e em dois dias eu estaria apresentando ao vivo minha nova banda, The Attractions. O tecladista tinha 19 anos, era estudante da Royal College of Music e foi sem dúvida o mais impressionante candidato nas audições. Ele pediu para ficar e ouvir o teste dos outros tecladistas, e mais tarde o descobrimos dormindo entre os amplificadores após ter matado uma garrafa de vinho. Ele era, obviamente, o homem para o trabalho. Seu sobrenome familiar era Nason, e todos o apelidaram de Mason, mas logo o começaram a chamar de Steve Nieve.”

Nieve teve a distinção de ser o primeiro integrante dos Attractions a aparecer em uma gravação, participando do single “Watching the Detectives”, gravado em maio de 1977. De cara, a influência dele é evidente, com seus teclados assumindo uma posição de destaque nos arranjos e ajudando a estabelecer a importância do instrumento no movimento new wave graças à sua criatividade.

Em uma entrevista de 2020 à Billboard, Costello falou sobre o papel de Nieve na gravação:

“Quando a gente gravou ‘Watching the Detectives’, foi a primeira sessão do Steve Nieve. Ele tinha 19 anos,  recém saído da Royal College, e a gente tinha acabado de se conhecer. Eu falei: ‘Essa é sobre detetives, quero um piano que soa como Bernard Herrmann’, e é claro, ele não sabia do que eu estava falando, então eu faço [som staccato e afiado] e o que você ouve no disco é esse piano galopante que apressa a batida e soa como um daqueles gestos repentinos que Herrmann fazia muito. Mas a gente não tinha 19 clarinetes ou coisa assim que ele usou em ‘Cortina Rasgada’; a gente só tinha um piano vertical detonado num estúdio de oito faixas.”

O primeiro teste do grupo foi um show na Dingwalls Dancehall dia 26 de julho. No mesmo dia, Elvis foi preso por se apresentar do lado de fora do Hilton em Londres, que recepcionava uma convenção da Columbia Records, promovendo a si mesmo e o concerto naquela noite. 

Em entrevista para a Trouser Press concedida em dezembro de 1977, Costello contou sobre a situação toda:

“A gente tinha caras andando com cartazes de propaganda para o show e eu estava tocando através desse amplificador a bateria. Eles saíram pra calçada e uma multidão se juntou bem rápido, incluindo alguns dos figurões da CBS. Todos esses caras estavam em pé lá e aplaudindo, mas o Hilton não viu a situação tendo tanta graça e chamou a polícia. A polícia também não viu graça e me prendeu.”

Um dos figurões que assistiu a performance e ficou impressionado com Costello foi Greg Geller, que os assinou para a Columbia nos Estados Unidos meses depois.

Forjado em turnê

Lançado naquela semana, “My Aim is True” recebeu excelentes críticas e atingiu a 12ª posição na parada de álbuns do Reino Unido na semana da morte de Elvis Presley, em agosto.

Elvis Costello e The Attractions capitalizaram em cima desse sucesso saindo em turnê com outros artistas do mesmo selo, Stiff Records – Nick Lowe, Wreckless Eric e Ian Dury and the Blockheads. O clima entre os artistas era de competição, em cima do palco e nos camarins, com bebedeiras e drogas reinando.

Foi nesse clima que “This Year’s Model” começou a tomar forma. “Pump it Up”, o maior hit do disco, foi composto durante a turnê, como Costello descreveu no encarte da compilação “Girls Girls Girls” (via Trash Theory no YouTube):

“Foi composta na escadaria de incêndio de um hotel em Newcastle durante um frenesi de anfetaminas e vodka. Essa anticanção rock’n’roll era minha última cartada antes de me entregar. A manhã dolorosa trouxe um trabalho grande, porém simples, de edição, fazendo possível que a gente aprendesse a canção para tocar na noite seguinte.”

Outro hit que ganhou forma durante a turnê foi “(I Don’t Want To Go To) Chelsea”, escrita anos antes por Costello, mas nunca aproveitada para nada. Porém, as contribuições dos outros integrantes deram um novo fôlego à canção, como o cantor escreveu no encarte da edição deluxe de “This Year’s Model” (tradução via Scream & Yell):

“Os Attractions fizeram uma grande diferença para estas canções. ‘(I Don’t Want To Go To) Chelsea’, por exemplo, tinha a mesma batida de guitarra de ‘I Can’t Explain’, do The Who (e também ‘Clash City Rockers’, do Clash). Bruce e Pete apareceram com um arranjo muito mais sincopado e Steve fez uma parte de teclado que parecia uma sirene. Sua configuração do teclado estava limitada a um órgão Vox Continental e um teclado barato. Eu, por fim, tive que mudar a minha guitarra.”

O processo de turnê e composição também fez os músicos se conhecerem melhor a partir de seus gostos musicais, que Costello descreve no mesmo encarte:

“Ao trabalhar nas músicas, eu falava para eles dos discos que eu mais gostava. Foi só depois de alguns meses que descobrimos que Steve gostava de rock pós Alice Cooper e T. Rex enquanto Pete, Bruce e eu certamente tínhamos ouvido Beatles e Small Faces, e quase todos concordávamos sobre os Rolling Stones (ao menos ‘Aftermath’, que foi o álbum que eu mais escutei naquele período. ‘This Year’s Girl’ é minha resposta para ‘Stupid Girl’). Nunca entendi as acusações de misoginia que foram feitas a este álbum. A maior parte das canções são obras da imaginação e não produtos da realidade. As tentações e distrações da vida em turnê logo iriam adicionar um olhar mais cínico e culpado sobre ‘Little Triggers’, ‘Pump it Up’ e ‘Hand in Hand’.”

Outra canção revivida durante a turnê foi “Radio Soul”, composta por Costello quando ainda fazia parte do grupo Flip City. Um ode às rádios piratas do Reino Unido durante os anos 1960, ela também havia sido influenciada por Bruce Springsteen, apesar dessa inspiração inicial ter se dissipado no ínterim, sendo substituída pela acidez do punk. 

Agora a música se chamava “Radio, Radio”, denunciando o estado lastimável do meio e como era usado para controlar a nação. Punk naquela época estava banido da BBC, mesmo com os Sex Pistols sendo um sucesso nas paradas. Ela se tornaria o estopim de um dos momentos mais polêmicos de sua carreira.

Banidos do sábado à noite

Em dezembro de 1977, “My Aim is True” era o LP importado mais vendido nos Estados Unidos naquele ano. Isso rendeu a Elvis Costello um contrato de distribuição no país pela Columbia – a mesma do show onde o artista foi preso – e uma rápida turnê pelo país.

Quando os Sex Pistols não conseguiram aprontar seus vistos de trabalho a tempo de tocar no programa “Saturday Night Live” dia 17 de dezembro, Costello e The Attractions foram posicionados para substituírem o grupo.

https://www.youtube.com/watch?v=r3C1mjB4X_8

Os problemas começaram quando ninguém no elenco do programa – na época formado por John Belushi, Dan Ackroyd, Bill Murray, Jane Curtin, Laraine Newman, Garrett Morris e Gilda Radner – conhecia a banda. Além disso, os músicos ingleses não ficaram impressionados com a comédia praticada pelos americanos.

Tensão também aparecia entre a banda e a Columbia, que os estava pressionando para tocar a canção “Less Than Zero” no programa. Presente em “My Aim Is True”, a letra da música fala sobre Oswald Mosley, parlamentar inglês e notório fascista. Contudo, Costello estava cansado de tocar coisas do primeiro disco, querendo apresentar algo novo.

A primeira apresentação do episódio correu sem incidentes, a banda tocando “Watching the Detectives”. Contudo, quando chegou a hora da segunda canção, eles começaram “Less Than Zero” apenas para Costello interrompê-los e se dirigir à plateia:

“Me desculpem, senhoras e senhores, mas não existe razão para tocar essa música aqui.”

Anos depois, numa entrevista para Apple Music Essentials em janeiro de 2021 (via Trash Theory no YouTube), Costello relembrou o incidente:

“Eu queria que eles lembrassem da gente. Eu não tinha nada de verdade contra o programa. Eu estava mais irritado com ser dito o que tocar pela gravadora do que com a NBC, de verdade. Não lembro se avisei o que ia fazer, mas acho que só falei: ‘prestem atenção em mim’.”

O resultado foi Costello sendo banido do programa para sempre. Bem, nem tanto, considerando que ele apareceu no programa novamente em 1989 e essa performance de “Radio, Radio” se tornou lendária na história do “Saturday Night Live”, reencenando o momento com os Beastie Boys em 1999.

Energia no estúdio

Nessa época, Elvis Costello e The Attractions finalmente estavam entrando no estúdio para gravar seu disco de estreia, que se tornaria “This Year’s Model”. Como o material estava já todo composto e ensaiado, o processo durou apenas 11 dias. O baixista Bruce Thomas descreveu a rapidez e prolificidade das sessões para Graeme Thomson no livro “Complicated Shadows: The Life and Music of Elvis Costello”:

“Nós literalmente gravamos as melhores faixas do disco – ‘Pump It Up’ e ‘(I Don’t Want to Go to) Chelsea’ – em uma tarde. Era que nem Motown. A gente entrava no estúdio, tocava e era isso.”

O processo de composição foi tão prolífico que edições comemorativas do disco vêm com demos de canções lançadas posteriormente, mostrando o quanto o grupo estava indo à toda em 1977.

“This Year’s Model” saiu em 17 de março de 1978, com o single “(I Don’t Want to Go to) Chelsea” antecipando o disco duas semanas antes. O compacto chegou ao 16º lugar das paradas inglesas e o LP à 4ª posição entre álbuns no Reino Unido.

Quando o álbum finalmente saiu nos Estados Unidos, em maio, a Columbia substituiu “(I Don’t Want to Go to) Chelsea” e “Night Rally” na tracklist por “Radio, Radio”, argumentando que as letras das duas canções excluídas eram “inglesas demais”. Mesmo assim, o álbum alcançou a 30ª posição nas paradas americanas.

Durante a turnê, Elvis Costello e The Attractions já apresentavam canções de seu próximo trabalho, “Armed Forces”, porque eles não paravam quietos. Contudo, “This Year’s Model” tem a distinção de ser o momento em que o cantor e compositor se estabeleceu de verdade, nos dois lados do Atlântico, como um dos maiores nomes do rock pelos próximos 10 anos.

Artistas como Linda Ronstadt e Dave Edmonds regravariam suas canções, o próprio faria uma parceria com a lenda country George Jones. Costello havia se tornado uma estrela.

Elvis Costello & The Attractions – “This Year’s Model”

  • Lançado em 17 de março de 1978 pela Radar Records
  • Produzido por Nick Lowe

Faixas:

  1. No Action
  2. This Year’s Girl
  3. The Beat
  4. Pump It Up
  5. Little Triggers
  6. You Belong to Me
  7. Hand in Hand
  8. (I Don’t Want to Go to) Chelsea
  9. Lip Service
  10. Living in Paradise
  11. Lipstick Vogue
  12. Night Rally

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  • Steve Nieve (teclados)
  • Bruce Thomas (baixo)
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Pedro Hollanda
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Pedro Hollanda é jornalista formado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso e cursou Direção Cinematográfica na Escola de Cinema Darcy Ribeiro. Apaixonado por música, já editou blogs de resenhas musicais e contribuiu para sites como Rock'n'Beats e Scream & Yell.

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