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A história de “Main Offender”, o segundo voo solo de Keith Richards

Parceria com os X-Pensive Winos ajudou a moldar, de certa forma, os últimos 30 anos dos Rolling Stones

Muita coisa mudou na terra dos Rolling Stones entre “Talk is Cheap” (1988) e “Main Offender” (1992), respectivamente primeiro e segundo álbuns solo de Keith Richards.

Para começo de conversa, o guitarrista só se arriscou no voo solo inicialmente porque os Stones estavam inativos por causa de uma briga grave entre ele e Mick Jagger. Tão séria era a situação a ponto de sequer fazerem uma turnê para promover o disco “Dirty Work”, em 1986.

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Em 1992, porém, o grupo estava num período de paz e extrema prosperidade. O sucesso estrondoso da turnê “Steel Wheels” ajudou a fazer todos os conflitos ficarem em segundo plano.

Ao mesmo tempo, a banda se tornou um trabalho para Richards. Em uma entrevista de 1992 para a Rolling Stone, o guitarrista detalhou as dificuldades inerentes de manter uma banda após quase 30 anos de estrada:

“Como um músico, você precisa ter algo para fazer praticamente o tempo inteiro. Você não precisa se matar de tanto trabalhar necessariamente, mas se não tem razão pra trabalhar, você se deixa ficar mole. Trazer a banda de volta disso virou um esforço. O último grande ponto de tensão foi se Mick e eu poderíamos colocar tudo em ordem entre a gente durante a turnê Steel Wheels. E isso se provou mais fácil do que eu achava. Mick e eu começávamos a dar risada no primeiro minuto que a gente sentava pra escrever música: ‘Do que você me chamou no Daily Mirror, seu babaca?’”

Apesar dos Stones pagarem as contas, Keith queria sentir novamente como era nos primeiros dias da banda. E a maneira que ele encontrou para fazer isso foi outro álbum solo, acompanhado dos X-Pensive Winos.

Coadjuvantes de luxo

Os X-Pensive Winos eram a banda de apoio recrutada por Keith Richards para “Talk is Cheap”. Tudo começou com o baterista Steve Jordan, uma indicação feita por Charlie Watts. Aos dois se juntaram o guitarrista Waddy Wachtel – lenda da cena de Los Angeles dos anos 70 -, o baixista Charley Drayton e o pianista Ivan Neville.

“Talk is Cheap” foi um sucesso de vendas e, principalmente, de crítica. A fórmula funcionava; por consequência, Keith ficou querendo mais, como ele revelou numa entrevista para David Fricke em 2022:

“‘Main Offender’ surgiu porque a gente gostou tanto de fazer o ‘Talk is Cheap’. Nós percebemos que não estávamos sequer perto de descobrir o que éramos capazes de fazer juntos com os Winos. Havia essa janela de oportunidade, porque a esse ponto eu havia reunido os Stones com ‘Steel Wheels’ e tinha feito meu único, meu negócio solo e era isso. Mas ao mesmo tempo tinha essa faísca, esse desejo de seguir o caminho que os Winos podiam trilhar.”

Grande parte desse atrativo, para todos os integrantes, era o fato de Richards não tratá-los como músicos de apoio. Wachtel, Jordan, Neville e Drayton haviam construído carreiras fazendo isso, desejando no fundo fazerem parte de uma banda de verdade. Os Winos eram isso.

Em “Main Offender” isso se manifestou de algumas formas. A principal delas está a expansão da voz de todos na hora de compor e produzir.

Colaborativo

“Talk is Cheap” tinha sido calcado na parceria criativa entre Keith Richards e Steve Jordan, com um grupo sendo construído em volta. Desta vez, Waddy Wachtel é creditado também como produtor e compositor em algumas faixas. Charley Drayton também colaborou com duas canções. Sarah Dash, backing vocal dos Winos, também ajudou a compor uma música.

E não parou por aí: a banda estava mais confiante e solta, levando a mais brincadeiras no estúdio. Integrantes trocavam instrumentos entre si para arranjar o take certo, não necessariamente em termos de ser mais exato, mas o mais característico de como a banda queria soar. O som era algo sendo expandido em meio a esse jogo da cadeira. A música “Words of Wonder” é um reggae muito mais fiel às raízes jamaicanas do gênero do que as tentativas dos Stones nos anos 70. 

Apesar das brincadeiras, o regime de trabalho era, como Keith Richards descreve em sua autobiografia “Vida”, antes de entregar a palavra para Waddy Wachtel detalhar o cronograma:

“No início, chegávamos ao estudio às sete da noite, e ficávamos pelo menos doze horas trabalhando. Com o tempo, dissemos, ‘Ah, vamos começar às oito, vamos começar às nove, vamos começar às onze’. Então, de repente, e eu juro por Deus que isso é verdade, nós começamos a chegar à uma, às três da madrugada. Nós estavamos no carro um dia de manhã e Keith estava sentado de óculos escuros com uma bebida na mão, era um dia de sol e ele disse, ‘Ei, espere um minuto! Que horas são?’. E nos respondemos, ‘São oito da manhã.’ Então ele disse, ‘Podem dar meia volta! Eu não vou começar a trabalhar às oito da manhã!’ Ele tinha trocado completamente a noite pelo dia.”

Influenciando os Stones

Ao final da turnê “Steel Wheels”, Bill Wyman deixou os Rolling Stones alegando estar cansado da rotina da estrada. Seu substituto foi um amigo de Charley Drayton, Darryl Jones, que toca com a banda até hoje.

Quando Charlie Watts adoeceu e foi anunciado que ele não poderia terminar a turnê mais recente do grupo em 2021, Steve Jordan foi anunciado como seu substituto. A situação se tornou permanente após a morte de Watts em agosto do mesmo ano.

Relançado recentemente em edição especial pela BMG, “Main Offender” não foi o mesmo sucesso de público e crítica de “Talk is Cheap”. Contudo, ajudou Keith Richards a idealizar o futuro dos Rolling Stones como uma banda, servindo de laboratório.

Os Winos demoraram até 2015 para gravar outro disco, “Crosseyed Heart”, porém a esse ponto o impacto foi ajudar a fazer os Stones sobreviverem por mais 30 anos.

Keith Richards – “Main Offender”

  • Lançado em 19 de outubro de 1992 pela Virgin Records
  • Produzido por Keith Richards, Steve Jordan e Waddy Wachtel

Faixas:

  1. 999
  2. Wicked as It Seems
  3. Eileen
  4. Words of Wonder
  5. Yap Yap
  6. Bodytalks
  7. Hate It When You Leave
  8. Runnin’ Too Deep
  9. Will but You Won’t
  10. Demon

Músicos:

  • Keith Richards (vocal, guitarra, baixo, teclados, percussão)
  • Steve Jordan (bateria, conga, percussão, castanholas, órgão Farfisa, backing vocals)
  • Waddy Wachtel (guitarra, piano, celesta, percussão, backing vocals)
  • Charley Drayton (baixo, piano, órgão elétrico Hammond B-3, guitarra barítono, backing vocals)
  • Ivan Neville (piano, órgão, cravo, clavinete, baixo, backing vocals)
  • Sarah Dash (vocais na faixa 6, backing vocals)
  • Bernard Fowler e Babi Floyd (backing vocals)
  • Jack Bashkow, Crispin Cioe e Arno Hecht (sopros)

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Pedro Hollanda
Pedro Hollanda
Pedro Hollanda é jornalista formado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso e cursou Direção Cinematográfica na Escola de Cinema Darcy Ribeiro. Apaixonado por música, já editou blogs de resenhas musicais e contribuiu para sites como Rock'n'Beats e Scream & Yell.

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