A chegada da década de 1990 trouxe muitas mudanças para as bandas de hard rock que dominaram a primeira década. Com o Bon Jovi, a situação não foi diferente, mas também não trouxe prejuízos porque eles souberam se adaptar em “Keep the Faith”, álbum lançado em 3 de novembro de 1992.
O grupo terminou os anos 1980 em alta, como uma das maiores bandas do mundo, devido ao sucesso dos álbuns “Slippery When Wet” (1986) e “New Jersey” (1988). Como eles se tornaram um fenômeno pop, que furou a bolha do rock, o ritmo de atividades foi intenso: chegaram a fazer quase 200 shows em 1989, o que gerou certa estafa e demandou um hiato relativamente prolongado.
Ao fim da turnê de “New Jersey”, os integrantes do Bon Jovi tiraram um tempo não só para descansar, como, também, para trabalhar em carreira solo. Nessa época, saíram os discos “Blaze of Glory” (1990), do vocalista Jon Bon Jovi, e “Stranger in This Town” (1991), do guitarrista Richie Sambora – que também trouxe o baterista Tico Torres e o tecladista David Bryan.
Quando os músicos se reuniram para trabalhar em material próprio, o cenário que encontraram era bem diferente de 1989. Com o álbum “Nevermind” (1991), do Nirvana, e a ascensão de nomes como Red Hot Chili Peppers e Alice in Chains, entre vários outros, o grunge e o rock alternativo tomaram o espaço que era do hard rock.
E o que fazer em uma situação dessas? O primeiro passo foi chamar alguém que sabia como sobreviver nesse novo ambiente.
Bob Rock e nova identidade
Pela primeira vez desde 1985, o Bon Jovi entraria em estúdio sem o produtor Bruce Fairbairn, que tinha a agenda cheia com o Aerosmith na época. A solução veio através de um dos profissionais de estúdio mais requisitados do período: Bob Rock, que havia acabado de produzir o “Black Album” (1991) do Metallica e posicionado a banda como outro fenômeno do início da década.
Para o álbum que se tornou “Keep the Faith”, a ideia era realmente se renovar para não ficar para trás, como aconteceu com tantas bandas da década de 1980 durante a era grunge. O próprio Jon Bon Jovi resumiu o pensamento da época em entrevista para a Q Magazine, em 2007, admitindo o crescimento de sons alternativos que vieram na onda do Nirvana.
“Quando voltamos a nos reunir em uma sala em Vancouver, fechamos a porta e ignoramos o que havia acontecido com o nosso gênero musical. Fomos chutados nos dentes pelo Nirvana, mas não prestamos atenção nisso.
Nos livramos dos clichês, escrevemos letras com consciência social e cortamos o cabelo. Não fiz uma música grunge, nem fui para o rap, mas eu sabia que não poderia compor ‘Livin’ on a Prayer’ de novo, então não tentei. E funcionou.”
Além das mudanças visuais, sonoras e de atitude, o Bon Jovi também alterou a forma de administrar a banda. Antes das gravações, o grupo demitiu o empresário de longa data, Doc McGhee, e criou a Bon Jovi Management, iniciando um sistema de autogestão que até hoje funciona bem.
As gravações de Keep the Faith
Jon Bon Jovi estava realmente focado durante a etapa de composições de “Keep the Faith”. A maioria das 30 músicas escritas nas sessões eram de sua autoria, sozinho ou com Richie Sambora. David Bryan contribuiu com algumas faixas e o compositor Desmond Child, parceiro antigo da banda, também trouxe algum material.
Das 12 músicas que entraram no disco, cinco foram compostas somente por Jon. As outras sete são parcerias dele com os já mencionados Sambora, Bryan e Child.
A orientação musical era soar mais direto e sóbrio. Os teclados passaram a compor mais os arranjos do que a buscar protagonismo. Os timbres de guitarra têm uma pegada mais rock clássico, com menos efeitos e pouco uso de alavanca Floyd Rose, que tanto marcou a década de 1980.
Outro ponto que surpreende no disco é a exploração do groove, tão raro nos álbuns anteriores. A bateria de Tico Torres parece ditar o ritmo de canções como a faixa-título e “I’ll Sleep When I’m Dead”, só para citar alguns.
Os resquícios dos anos 1980 ficaram por conta das amadas e odiadas baladas, como “Bed of Roses” e “In These Arms” – que, surpreendentemente (ou não), são os maiores hits do trabalho. Foram lançadas como singles, assim como “Dry County”, “I Believe” e as já mencionadas “I’ll Sleep When I’m Dead” e faixa-título.
Bon Jovi segue em alta
“Keep the Faith” foi bem-sucedido no objetivo de manter o Bon Jovi relevante mesmo em um período diferente na indústria musical. Chegou ao primeiro lugar das paradas da Austrália e na Finlândia, conseguindo um top 3 na Áustria, Alemanha, Países Baixos, Hungria, Suécia, Japão e Suíça. Nos Estados Unidos, obteve um honrado 5º lugar em meio à explosão do grunge, tendo vendido 2 milhões de cópias por lá.
A turnê também foi um sucesso: mais de 180 shows foram realizados em pouco mais de um ano, com passagens por América do Norte, Central e Sul (incluindo Brasil), Europa, Ásia e Oceania.
Seria o último álbum do Bon Jovi com o baixista Alec John Such, que saiu em 1994. Em seu lugar, Hugh McDonald assumiria como músico contratado e só passaria a ser citado como integrante oficial em 2016.
A partir daí, o Bon Jovi seguiria por um processo que tornaria seu som mais pop, distante do hard rock dos anos 80. O mega-hit “Always”, lançado na coletânea “Cross Road” (1994), só acentuou a percepção de que aquele caminho deveria ser seguido.
Para alguns, “Keep the Faith” é o início dessa mudança. Para outros, é o último resquício do “Bon Jovi antigo”.
* Texto redigido por André Luiz Fernandes, com pauta e edição por Igor Miranda.
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