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Joe Bonamassa olha para o passado e reflete sobre o tempo no excelente “Time Clocks”

Décimo-quinto disco solo do guitarrista soa deliciosamente denso e profundo, seja em letras ou melodias

Joe Bonamassa lançou, nesta sexta-feira (29), seu décimo-quinto álbum de estúdio em carreira solo. Intitulado “Time Clocks”, o disco chega a público por meio da gravadora Provogue.

Gravado no início de 2021 – ou seja, ainda em meio às restrições causadas pela pandemia -, “Time Clocks começou a ser feito como trio. Cantor e guitarrista, Joe Bonamassa convidou apenas o baterista Anton Fig e o baixista Steve Mackey para acompanhá-lo na empreitada, além de seu produtor de longa data, Kevin Shirley.

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Conforme as gravações evoluíam, o músico americano percebeu que o material era mais complexo do que o esperado. Seriam necessários mais camadas de gravação e, sobretudo, mais instrumentos. Assim, foram convidados o pianista Lachy Doley e o percussionista Bobby Summerfield como músicos fixos, além de Brunna Lawrie no didgeridoo e das backing vocals Mahalia Barnes, Juanita Tippins, e Prinnie Stevens.

Embora não seja conceitual, “Time Clocks” tem um eixo temático definido que guia não só boa parte das letras, como, também, o tom das melodias: a passagem do tempo. Em nota, o guitarrista destacou que começou a olhar para trás e a notar os feitos de sua carreira.

“Vinte anos atrás, gravei um disco de covers que acabou se chamando ‘Blues Deluxe’. Foi gravado no estúdio de Bobby Nathan em Manhattan. Capturou uma energia e um propósito que sempre me acompanharam como artista.

Eu morava em Nova York na época e os tempos eram muito difíceis. Minha rotina semanal era uma combinação de agitadas sessões em estúdio, shows e oportunidades que pareciam poucas e distantes entre si. Eu estava com fome. Literalmente e figurativamente. O negócio da música é difícil, muito difícil. Especialmente naquela época em que as grandes gravadoras puxavam todas as cordas e, no meu caso, todos os golpes.

[…]

Corta para 2019 e me encontro de volta a Nova York e inspirado pela cidade novamente. Minhas condições de vida mudaram drasticamente nos 20 anos seguintes, mas a energia que torna Nova York grande ainda permaneceu.

Em fevereiro de 2021, nos encontramos no Germano Studios, criando como trio (mas não como música de trio) e tendo que inventar formas de fazer discos quando seu produtor de uma vida inteira está preso na Austrália devido a restrições de viagem. Kevin Shirley surgiu com uma forma de ligar continentes e consoles onde tínhamos literalmente zero delay. Adicione Steve Mackey e Anton Fig à mistura, algumas máscaras e palavrões e temos o ‘álbum de Nova York’, também conhecido como ‘Time Clocks’.”

Ouça “Time Clocks” abaixo, via Spotify, ou clique aqui para conferir em outras plataformas digitais. Uma resenha está disponível na sequência.

Deliciosamente denso e reflexivo

Fiquei espantado quando ouvi “Time Clocks”, já ciente de que seria gravado inicialmente como trio, pela primeira vez. Seria quase impossível reproduzir esse tipo de sonoridade com apenas três músicos, a não ser que vários overdubs fossem acrescentadas posteriormente.

Ainda bem que Joe Bonamassa não se limitou ao formato e decidiu expandir o projeto. “Time Clocks” é, provavelmente, um dos discos mais densos e arrojados de sua carreira. Pode ser um reflexo da própria pandemia, seja com músicos tendo mais tempo para trabalhar em estúdio, seja com composições que ficaram mais sentimentais devido ao momento. Só sei que, artisticamente, caiu muito bem.

Aliás, dá para notar facilmente que Joe soa mais reflexivo nesse disco. O aspecto mais óbvio está nas letras, que refletem bastante sobre seu passado, os desafios que enfrentou e as conquistas que acumulou. A parte melódica também acompanha esse ponto de vista.

A vinheta “Pilgrimage” prepara o ouvinte para a chegada de “Notches”, certamente uma das músicas mais poderosas lançadas por Bonamassa. Composta em parceria com Charlie Starr (Blackberry Smoke), a faixa tem um caráter dramático que é reforçado por seu peso curioso e pelo uso de instrumentos tipicamente orientais em seu miolo. Deliciosamente melancólica.

Blues mais padronizado, “The Heart That Never Waits” soa como Robert Cray atualizado e transborda elegância, especialmente pelas teclas do organista Lachy Doley. A faixa-título “Time Clocks”, por sua vez, caminha pelo country/southern e carrega beleza em tudo: da voz ao instrumental, da letra à melodia, da sutileza dos versos ao carregado refrão.

A intensa “Questions and Answers” retoma a estética de “Notches” ao mesclar blues com peso. Com maestria, Bonamassa conduz sua banda a passagens que fogem do padrão bluesy e experimenta com influências diferentes. Outra balada, “Mind’s Eye”, trafega por caminhos menos inusitados e convence mais pelos detalhes – como a letra reflexiva, a sutileza dos arranjos e o solo curiosamente econômico – do que pelo todo.

“Curtain Call” é um daqueles momentos que existe em quase todo álbum do guitarrista: um tributo à obra do Led Zeppelin. Só enjoa um pouco por ancorar-se demais na mesma progressão melódica. “The Loyal Kind”, com refrão forte e dose maior de melodia ao blues rock típico do artista, é a canção que mais faz alusão ao álbum anterior, “Royal Tea”. Não por acaso: foi composta ainda nas sessões do disco passado, junto de Bernie Marsden.

Formatos mais convencionais e até acessíveis são explorados mais ao fim do álbum. “Hanging on a Loser”, penúltima da tracklist, é um blues de pegada quase honky-tonk, com direito a palminha e uso mais presente de backing vocals femininos. “Known Unknowns”, no encerramento, é incrivelmente grudenta, mas sem abdicar da profundidade notada em outros momentos.

É difícil fazer uma comparação justa entre “Time Clocks” e seu antecessor, o também excelente “Royal Tea”, ou mesmo outros álbuns da trajetória de Joe Bonamassa. Produtivo e inquieto, o guitarrista tenta cada vez mais diferenciar uma obra da outra ao adotar conceitos e direcionamentos distintos – o que inviabiliza comparações simplistas.

“Royal Tea”, por exemplo, vai às origens do blues rock britânico. É incrível, mas tem um caminho mais definido e não permitiu tantos “desvios”. “Time Clocks” segue pela via oposta: experimenta, testa, inclui mais músicos, traz outras camadas de gravação. Além disso, é claramente mais pessoal. São bichos diferentes.

Mas se pude classificar “Royal Tea” como um dos melhores álbuns da carreira do artista, “Time Clocks” também merece entrar para esse rol – o que é um grande feito para uma discografia já repleta de bons trabalhos.

O prazer que sinto por acompanhar a obra desse grande músico sendo construída perante os meus olhos, progressivamente, é indescritível. E quando faltam palavras, entra a música. Ouça este álbum e entenda o que estou falando.

O álbum está em minha playlist de lançamentos, atualizada semanalmente. Siga e dê o play:

Joe Bonamassa – “Time Clocks”

  1. Pilgrimage
  2. Notches
  3. The Heart That Never Waits
  4. Time Clocks
  5. Questions And Answers
  6. Mind’s Eye
  7. Curtain Call
  8. The Loyal Kind
  9. Hanging On A Loser
  10. Known Unknowns
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Igor Miranda
Igor Miranda
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com pós-graduação em Jornalismo Digital. Escreve sobre música desde 2007. Além de editar este site, é colaborador da Rolling Stone Brasil. Trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, revista Guitarload, jornal Correio de Uberlândia, entre outros. Instagram, Twitter e Facebook: @igormirandasite.

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Joe Bonamassa lançou, nesta sexta-feira (29), seu décimo-quinto álbum de estúdio em carreira solo. Intitulado “Time Clocks”, o disco chega a público por meio da gravadora Provogue.

Gravado no início de 2021 – ou seja, ainda em meio às restrições causadas pela pandemia -, “Time Clocks começou a ser feito como trio. Cantor e guitarrista, Joe Bonamassa convidou apenas o baterista Anton Fig e o baixista Steve Mackey para acompanhá-lo na empreitada, além de seu produtor de longa data, Kevin Shirley.

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Conforme as gravações evoluíam, o músico americano percebeu que o material era mais complexo do que o esperado. Seriam necessários mais camadas de gravação e, sobretudo, mais instrumentos. Assim, foram convidados o pianista Lachy Doley e o percussionista Bobby Summerfield como músicos fixos, além de Brunna Lawrie no didgeridoo e das backing vocals Mahalia Barnes, Juanita Tippins, e Prinnie Stevens.

Embora não seja conceitual, “Time Clocks” tem um eixo temático definido que guia não só boa parte das letras, como, também, o tom das melodias: a passagem do tempo. Em nota, o guitarrista destacou que começou a olhar para trás e a notar os feitos de sua carreira.

“Vinte anos atrás, gravei um disco de covers que acabou se chamando ‘Blues Deluxe’. Foi gravado no estúdio de Bobby Nathan em Manhattan. Capturou uma energia e um propósito que sempre me acompanharam como artista.

Eu morava em Nova York na época e os tempos eram muito difíceis. Minha rotina semanal era uma combinação de agitadas sessões em estúdio, shows e oportunidades que pareciam poucas e distantes entre si. Eu estava com fome. Literalmente e figurativamente. O negócio da música é difícil, muito difícil. Especialmente naquela época em que as grandes gravadoras puxavam todas as cordas e, no meu caso, todos os golpes.

[…]

Corta para 2019 e me encontro de volta a Nova York e inspirado pela cidade novamente. Minhas condições de vida mudaram drasticamente nos 20 anos seguintes, mas a energia que torna Nova York grande ainda permaneceu.

Em fevereiro de 2021, nos encontramos no Germano Studios, criando como trio (mas não como música de trio) e tendo que inventar formas de fazer discos quando seu produtor de uma vida inteira está preso na Austrália devido a restrições de viagem. Kevin Shirley surgiu com uma forma de ligar continentes e consoles onde tínhamos literalmente zero delay. Adicione Steve Mackey e Anton Fig à mistura, algumas máscaras e palavrões e temos o ‘álbum de Nova York’, também conhecido como ‘Time Clocks’.”

Ouça “Time Clocks” abaixo, via Spotify, ou clique aqui para conferir em outras plataformas digitais. Uma resenha está disponível na sequência.

Deliciosamente denso e reflexivo

Fiquei espantado quando ouvi “Time Clocks”, já ciente de que seria gravado inicialmente como trio, pela primeira vez. Seria quase impossível reproduzir esse tipo de sonoridade com apenas três músicos, a não ser que vários overdubs fossem acrescentadas posteriormente.

Ainda bem que Joe Bonamassa não se limitou ao formato e decidiu expandir o projeto. “Time Clocks” é, provavelmente, um dos discos mais densos e arrojados de sua carreira. Pode ser um reflexo da própria pandemia, seja com músicos tendo mais tempo para trabalhar em estúdio, seja com composições que ficaram mais sentimentais devido ao momento. Só sei que, artisticamente, caiu muito bem.

Aliás, dá para notar facilmente que Joe soa mais reflexivo nesse disco. O aspecto mais óbvio está nas letras, que refletem bastante sobre seu passado, os desafios que enfrentou e as conquistas que acumulou. A parte melódica também acompanha esse ponto de vista.

A vinheta “Pilgrimage” prepara o ouvinte para a chegada de “Notches”, certamente uma das músicas mais poderosas lançadas por Bonamassa. Composta em parceria com Charlie Starr (Blackberry Smoke), a faixa tem um caráter dramático que é reforçado por seu peso curioso e pelo uso de instrumentos tipicamente orientais em seu miolo. Deliciosamente melancólica.

Blues mais padronizado, “The Heart That Never Waits” soa como Robert Cray atualizado e transborda elegância, especialmente pelas teclas do organista Lachy Doley. A faixa-título “Time Clocks”, por sua vez, caminha pelo country/southern e carrega beleza em tudo: da voz ao instrumental, da letra à melodia, da sutileza dos versos ao carregado refrão.

A intensa “Questions and Answers” retoma a estética de “Notches” ao mesclar blues com peso. Com maestria, Bonamassa conduz sua banda a passagens que fogem do padrão bluesy e experimenta com influências diferentes. Outra balada, “Mind’s Eye”, trafega por caminhos menos inusitados e convence mais pelos detalhes – como a letra reflexiva, a sutileza dos arranjos e o solo curiosamente econômico – do que pelo todo.

“Curtain Call” é um daqueles momentos que existe em quase todo álbum do guitarrista: um tributo à obra do Led Zeppelin. Só enjoa um pouco por ancorar-se demais na mesma progressão melódica. “The Loyal Kind”, com refrão forte e dose maior de melodia ao blues rock típico do artista, é a canção que mais faz alusão ao álbum anterior, “Royal Tea”. Não por acaso: foi composta ainda nas sessões do disco passado, junto de Bernie Marsden.

Formatos mais convencionais e até acessíveis são explorados mais ao fim do álbum. “Hanging on a Loser”, penúltima da tracklist, é um blues de pegada quase honky-tonk, com direito a palminha e uso mais presente de backing vocals femininos. “Known Unknowns”, no encerramento, é incrivelmente grudenta, mas sem abdicar da profundidade notada em outros momentos.

É difícil fazer uma comparação justa entre “Time Clocks” e seu antecessor, o também excelente “Royal Tea”, ou mesmo outros álbuns da trajetória de Joe Bonamassa. Produtivo e inquieto, o guitarrista tenta cada vez mais diferenciar uma obra da outra ao adotar conceitos e direcionamentos distintos – o que inviabiliza comparações simplistas.

“Royal Tea”, por exemplo, vai às origens do blues rock britânico. É incrível, mas tem um caminho mais definido e não permitiu tantos “desvios”. “Time Clocks” segue pela via oposta: experimenta, testa, inclui mais músicos, traz outras camadas de gravação. Além disso, é claramente mais pessoal. São bichos diferentes.

Mas se pude classificar “Royal Tea” como um dos melhores álbuns da carreira do artista, “Time Clocks” também merece entrar para esse rol – o que é um grande feito para uma discografia já repleta de bons trabalhos.

O prazer que sinto por acompanhar a obra desse grande músico sendo construída perante os meus olhos, progressivamente, é indescritível. E quando faltam palavras, entra a música. Ouça este álbum e entenda o que estou falando.

O álbum está em minha playlist de lançamentos, atualizada semanalmente. Siga e dê o play:

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  2. Notches
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Igor Miranda
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com pós-graduação em Jornalismo Digital. Escreve sobre música desde 2007. Além de editar este site, é colaborador da Rolling Stone Brasil. Trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, revista Guitarload, jornal Correio de Uberlândia, entre outros. Instagram, Twitter e Facebook: @igormirandasite.

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