...

Os 25 anos de “Dr. Feelgood”, do Mötley Crüe

Mötley Crüe: “Dr. Feelgood”
Lançado em 1° de setembro de 1989
Como Nikki Sixx diz: “se o Mötley Crüe era a banda n° 2 dos Estados Unidos em 1987, em 1989 se tornou a banda n° 1”. Essa é uma afirmação baseada nas paradas do país, já que “Girls, Girls, Girls” (1987), disco anterior a “Dr. Feelgood”, atingiu a segunda posição dos charts. A “derrota” foi para “Whitney” de Whitney Houston. O almejado topo nos charts só veio em 1989, com o disco que hoje completa 25 anos.
Música não é uma competição. Neste caso, “apesar” do segundo lugar, “Girls, Girls, Girls” fez grande sucesso. Um contraponto, já que a vida pessoal dos integrantes do Mötley Crüe fracassava. Todos estavam com problemas relacionados a drogas e álcool. Com exceção de Mick Mars, que se desintoxicou sozinho, a formação do Crüe precisou se internar em uma clínica de reabilitação. O caso mais extremo foi o de Nikki Sixx, que chegou a ser dado como morto por conta dos abusos (o livro “The Heroin Diaries” resume bem esse período que abrange o ano de 1987).
Sóbrios – ao menos na medida do possível e naquele momento em especial -, os músicos trabalharam em um disco que deveria suceder e ser tão bom quanto “Girls, Girls, Girls”. Desde o terceiro trabalho da discografia, “Theatre Of Pain” (1985), o Crüe não flertava muito com o heavy metal observado nos anteriores. A orientação para o hard rock ficou mais evidente. Era como um “Aerosmith adulterado”.
“Dr. Feelgood” segue um pouco a linha dos anteriores. Duas diferenças, no entanto, são básicas e notáveis. A primeira é a produção de Bob Rock, que entendia que o grupo precisava soar de uma forma distinta. Para isso, os timbres e a captação sonora são impecáveis. A segunda é que, mais inspirados e menos derrotados, os músicos fizeram melhores composições. A parte autoral é capitaneada por Nikki Sixx, como de costume, mas Mick Mars coescreveu oito das 10 faixas (11, se considerarmos a abertura de 42 segundos). Um ponto muito positivo.
A abertura “TNT (Terror ‘n Tinseltown)” é uma anti-prévia. Soa como se o disco ainda tivesse a enfadonha produção do álbum anterior. Mas a entrada da faixa título, com timbres vivos e mixagem perfeita, desmistifica essa percepção. O “Aerosmith adulterado” é notável nessa música. O estilo de vocal e de harmonias lembra a banda de Boston, mas com um peso que é cortesia exclusiva de Mick Mars. Ótima forma de mostrar que o Crüe estava de volta.
“Slice Of Your Pie” começa com um violão malandro, mas descamba para um hard levemente blueseiro, com batida sensual e boa performance de Vince Neil e Mick Mars. A pegada bluesy ganha uma acelerada em “Rattlesnake Shake”, com todos os clichês que o hard rock se permitia à época. Tanto pela letra, com a óbvia temática sexual, baixo que segue a bateria, refrão grudento, guitarra com distorção no ponto certo e acréscimo de metais e até apito (!) em pontos estratégicos. Faixa fora de série.
O miolo de “Dr. Feelgood” tem o seu ponto mais alto e mais baixo. O clímax do trabalho é “Kickstart My Heart”. A letra relata a experiência de Nikki Sixx quando é revivido pelos médicos após a overdose de heroína que sofreu em 1987 e se sente “fora do próprio corpo”. O verso irresistível, o refrão feito para arenas, a bateria incrível de Tommy Lee e os riffs magníficos e o solo com talkbox de Mick Mars são alguns dos atrativos desse clássico do hard oitentista. A pior parte vem logo depois, com a terrível balada “Without You”. Enjoativa, arrastada e sem o perfil do Crüe, a canção está completamente deslocada nesse disco. Há quem goste – até atingiu o top 10 de singles dos Estados Unidos. Mas nunca me convenceu.
“Same Ol’ Situation (S.O.S.)” tem a mesma personalidade de arena que “Kickstart My Heart”. Os versos destacam a voz de Vince Neil, que ainda dava para o gasto. O refrão gruda na cabeça e demora para sair. Tommy Lee volta a se destacar, assim como Mick Mars na execução do solo. “Sticky Sweet” resgata a pegada Aerosmith – tanto que Steven Tyler faz backing vocals na música. O riff é tentador e a cozinha é desacelerada de forma estratégica.
A sensualidade continua em “She Goes Down”, mais direta e descarada na letra. O instrumental dessa canção é incrível – mal dá para lembrar que existe voz no meio dela, só no refrão. “Don’t Go Away Mad (Just Go Away)” é a única boa balada do disco, até por ter um pouco da pegada do Crüe: não é completamente melosa, mas é melódica a ponto de grudar na cabeça. O final acelerado é uma sacada de gênio. “Time For A Change” conclui um dos discos mais clássicos do hard rock de forma morna, infelizmente. Mas é interessante perceber que a composição funciona quase como um prenúncio. Em tradução livre, o refrão diz: “Mudança; Agora é hora de mudança; Nada vai ficar igual; Agora é hora pra mudança”.
Claro que a letra de “Time For Change” tem um contexto social – em tempos de fim da União Soviética, os estadunidenses resolveram ter alguma compaixão com o resto do mundo. Politicagem a parte, o prenúncio se refere ao que aconteceria com o Mötley Crüe após “Dr. Feelgood”. O enorme sucesso e a rentável turnê não foram suficientes para que o quarteto sofresse uma baixa em 1992.
Pouco depois do lançamento da turnê “Decade Of Decadence”, Vince Neil deixou de integrar a banda. Há controvérsias sobre ele ter saído por conta própria ou ter se demitido. Fato é que sua vaga foi ocupada por John Corabi e o legado altamente popular do Crüe chegou ao fim – junto da década de 1980, ironicamente. “Dr. Feelgood” foi a escalada ao topo e o último suspiro neste pico. Com exceção das duas baladas mencionadas no texto, trata-se de um disco irretocável, que marca o fim de uma era.
Vince Neil (vocal, guitarra rítmica em 7)
Mick Mars (guitarra, violão)
Nikki Sixx (baixo)
Tommy Lee (bateria, piano)
Músicos adicionais:
Bob Rock (baixo em 11, backing vocals em 1, 4, 8, 9, produção)
Steven Tyler (backing vocals em 8 e introdução de 3)
John Webster (honky tonk piano em 4, teclados e programações)
Bryan Adams (backing vocals em 8)
Sebastian Bach (backing vocals em 11)
Tom Keenlyside, Ian Putz, Ross Gregory, Henry Christian (marguerita horns em 4)
Jack Blades (backing vocals em 7 e 8)
Rick Nielsen (backing vocals em 9)
Robin Zander (backing vocals em 9)
Ian Geiger (guitarra e baixo adicionais)
Donna McDaniel (backing vocals)
Emi Canyon (backing vocals)
Marc LaFrance (backing vocals)
David Steele (backing vocals)
Mike Amato (backing vocals em 11)
Bob Dowd (backing vocals em 11)
01. T.N.T. (Terror ‘N Tinseltown)
02. Dr. Feelgood
03. Slice Of Your Pie
04. Rattlesnake Shake
05. Kickstart My Heart
06. Without You
07. Same Ol’ Situation (S.O.S.)
08. Sticky Sweet
09. She Goes Down
10. Don’t Go Away Mad (Just Go Away)
11. Time For Change

ESCOLHAS DO EDITOR
InícioResenhasOs 25 anos de "Dr. Feelgood", do Mötley Crüe
Igor Miranda
Igor Miranda
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com pós-graduação em Jornalismo Digital. Escreve sobre música desde 2007. Além de editar este site, é colaborador da Rolling Stone Brasil. Trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, revista Guitarload, jornal Correio de Uberlândia, entre outros. Instagram, Twitter e Facebook: @igormirandasite.

DEIXE UMA RESPOSTA (comentários ofensivos não serão aprovados)

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui


Últimas notícias

Curiosidades

Os 25 anos de “Dr. Feelgood”, do Mötley Crüe

Mötley Crüe: “Dr. Feelgood”
Lançado em 1° de setembro de 1989
Como Nikki Sixx diz: “se o Mötley Crüe era a banda n° 2 dos Estados Unidos em 1987, em 1989 se tornou a banda n° 1”. Essa é uma afirmação baseada nas paradas do país, já que “Girls, Girls, Girls” (1987), disco anterior a “Dr. Feelgood”, atingiu a segunda posição dos charts. A “derrota” foi para “Whitney” de Whitney Houston. O almejado topo nos charts só veio em 1989, com o disco que hoje completa 25 anos.
Música não é uma competição. Neste caso, “apesar” do segundo lugar, “Girls, Girls, Girls” fez grande sucesso. Um contraponto, já que a vida pessoal dos integrantes do Mötley Crüe fracassava. Todos estavam com problemas relacionados a drogas e álcool. Com exceção de Mick Mars, que se desintoxicou sozinho, a formação do Crüe precisou se internar em uma clínica de reabilitação. O caso mais extremo foi o de Nikki Sixx, que chegou a ser dado como morto por conta dos abusos (o livro “The Heroin Diaries” resume bem esse período que abrange o ano de 1987).
Sóbrios – ao menos na medida do possível e naquele momento em especial -, os músicos trabalharam em um disco que deveria suceder e ser tão bom quanto “Girls, Girls, Girls”. Desde o terceiro trabalho da discografia, “Theatre Of Pain” (1985), o Crüe não flertava muito com o heavy metal observado nos anteriores. A orientação para o hard rock ficou mais evidente. Era como um “Aerosmith adulterado”.
“Dr. Feelgood” segue um pouco a linha dos anteriores. Duas diferenças, no entanto, são básicas e notáveis. A primeira é a produção de Bob Rock, que entendia que o grupo precisava soar de uma forma distinta. Para isso, os timbres e a captação sonora são impecáveis. A segunda é que, mais inspirados e menos derrotados, os músicos fizeram melhores composições. A parte autoral é capitaneada por Nikki Sixx, como de costume, mas Mick Mars coescreveu oito das 10 faixas (11, se considerarmos a abertura de 42 segundos). Um ponto muito positivo.
A abertura “TNT (Terror ‘n Tinseltown)” é uma anti-prévia. Soa como se o disco ainda tivesse a enfadonha produção do álbum anterior. Mas a entrada da faixa título, com timbres vivos e mixagem perfeita, desmistifica essa percepção. O “Aerosmith adulterado” é notável nessa música. O estilo de vocal e de harmonias lembra a banda de Boston, mas com um peso que é cortesia exclusiva de Mick Mars. Ótima forma de mostrar que o Crüe estava de volta.
“Slice Of Your Pie” começa com um violão malandro, mas descamba para um hard levemente blueseiro, com batida sensual e boa performance de Vince Neil e Mick Mars. A pegada bluesy ganha uma acelerada em “Rattlesnake Shake”, com todos os clichês que o hard rock se permitia à época. Tanto pela letra, com a óbvia temática sexual, baixo que segue a bateria, refrão grudento, guitarra com distorção no ponto certo e acréscimo de metais e até apito (!) em pontos estratégicos. Faixa fora de série.
O miolo de “Dr. Feelgood” tem o seu ponto mais alto e mais baixo. O clímax do trabalho é “Kickstart My Heart”. A letra relata a experiência de Nikki Sixx quando é revivido pelos médicos após a overdose de heroína que sofreu em 1987 e se sente “fora do próprio corpo”. O verso irresistível, o refrão feito para arenas, a bateria incrível de Tommy Lee e os riffs magníficos e o solo com talkbox de Mick Mars são alguns dos atrativos desse clássico do hard oitentista. A pior parte vem logo depois, com a terrível balada “Without You”. Enjoativa, arrastada e sem o perfil do Crüe, a canção está completamente deslocada nesse disco. Há quem goste – até atingiu o top 10 de singles dos Estados Unidos. Mas nunca me convenceu.
“Same Ol’ Situation (S.O.S.)” tem a mesma personalidade de arena que “Kickstart My Heart”. Os versos destacam a voz de Vince Neil, que ainda dava para o gasto. O refrão gruda na cabeça e demora para sair. Tommy Lee volta a se destacar, assim como Mick Mars na execução do solo. “Sticky Sweet” resgata a pegada Aerosmith – tanto que Steven Tyler faz backing vocals na música. O riff é tentador e a cozinha é desacelerada de forma estratégica.
A sensualidade continua em “She Goes Down”, mais direta e descarada na letra. O instrumental dessa canção é incrível – mal dá para lembrar que existe voz no meio dela, só no refrão. “Don’t Go Away Mad (Just Go Away)” é a única boa balada do disco, até por ter um pouco da pegada do Crüe: não é completamente melosa, mas é melódica a ponto de grudar na cabeça. O final acelerado é uma sacada de gênio. “Time For A Change” conclui um dos discos mais clássicos do hard rock de forma morna, infelizmente. Mas é interessante perceber que a composição funciona quase como um prenúncio. Em tradução livre, o refrão diz: “Mudança; Agora é hora de mudança; Nada vai ficar igual; Agora é hora pra mudança”.
Claro que a letra de “Time For Change” tem um contexto social – em tempos de fim da União Soviética, os estadunidenses resolveram ter alguma compaixão com o resto do mundo. Politicagem a parte, o prenúncio se refere ao que aconteceria com o Mötley Crüe após “Dr. Feelgood”. O enorme sucesso e a rentável turnê não foram suficientes para que o quarteto sofresse uma baixa em 1992.
Pouco depois do lançamento da turnê “Decade Of Decadence”, Vince Neil deixou de integrar a banda. Há controvérsias sobre ele ter saído por conta própria ou ter se demitido. Fato é que sua vaga foi ocupada por John Corabi e o legado altamente popular do Crüe chegou ao fim – junto da década de 1980, ironicamente. “Dr. Feelgood” foi a escalada ao topo e o último suspiro neste pico. Com exceção das duas baladas mencionadas no texto, trata-se de um disco irretocável, que marca o fim de uma era.
Vince Neil (vocal, guitarra rítmica em 7)
Mick Mars (guitarra, violão)
Nikki Sixx (baixo)
Tommy Lee (bateria, piano)
Músicos adicionais:
Bob Rock (baixo em 11, backing vocals em 1, 4, 8, 9, produção)
Steven Tyler (backing vocals em 8 e introdução de 3)
John Webster (honky tonk piano em 4, teclados e programações)
Bryan Adams (backing vocals em 8)
Sebastian Bach (backing vocals em 11)
Tom Keenlyside, Ian Putz, Ross Gregory, Henry Christian (marguerita horns em 4)
Jack Blades (backing vocals em 7 e 8)
Rick Nielsen (backing vocals em 9)
Robin Zander (backing vocals em 9)
Ian Geiger (guitarra e baixo adicionais)
Donna McDaniel (backing vocals)
Emi Canyon (backing vocals)
Marc LaFrance (backing vocals)
David Steele (backing vocals)
Mike Amato (backing vocals em 11)
Bob Dowd (backing vocals em 11)
01. T.N.T. (Terror ‘N Tinseltown)
02. Dr. Feelgood
03. Slice Of Your Pie
04. Rattlesnake Shake
05. Kickstart My Heart
06. Without You
07. Same Ol’ Situation (S.O.S.)
08. Sticky Sweet
09. She Goes Down
10. Don’t Go Away Mad (Just Go Away)
11. Time For Change

ESCOLHAS DO EDITOR
InícioResenhasOs 25 anos de "Dr. Feelgood", do Mötley Crüe
Igor Miranda
Igor Miranda
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com pós-graduação em Jornalismo Digital. Escreve sobre música desde 2007. Além de editar este site, é colaborador da Rolling Stone Brasil. Trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, revista Guitarload, jornal Correio de Uberlândia, entre outros. Instagram, Twitter e Facebook: @igormirandasite.

DEIXE UMA RESPOSTA (comentários ofensivos não serão aprovados)

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui


Últimas notícias

Curiosidades