Até o início da retomada de eventos pós-pandemia, Eclipse e Johnny Gioeli — as duas principais atrações da edição da Hard ‘n’ Heavy Party, realizada no último sábado (30) em São Paulo — nunca haviam tocado no Brasil. A saber:
- A banda sueca, fundada em 1999, só estreou no país em abril do ano passado, quando subiu ao palco da versão paulistana do Summer Breeze;
- No mês seguinte, o vocalista e guitarrista Erik Martensson tocou na mesma festa que acabou de trazer seu grupo, ao lado de Robin McAuley, John Corabi e Chez Kane;
- Por sua vez, Gioeli, cantor americano na ativa desde o fim dos anos 1980, só nos visitou pela primeira vez em fevereiro de 2023 para shows em SP e Curitiba.
Por conta disso, não dá para reclamar do repeteco. Fãs encheram, ainda que sem lotar, o novo Manifesto Bar, inaugurado em junho numa região próxima à do endereço antigo onde esteve instalado por 31 anos.
Antes de mergulhar nas apresentações, cabe o destaque ao tremendo upgrade oferecido pela mudança de logradouro: o bar está mais confortável, moderno e amplo, podendo receber até mil pessoas. Agora, sim, ganhou cara de casa de shows. Peca nos preços altos de cardápio (como quase todo local da vida noturna paulistana) e distância das estações de metrô/trem, mas compensa no restante.
*Nite Stinger, banda paulistana de hard rock, apresentou-se após a abertura Johnny Gioeli e a atração principal Eclipse, mas este que vos escreve não acompanhou o show. Em breve o grupo lançará novas músicas — e sabe-se que quatro composições inéditas foram executadas na noite de sábado (30) — e certamente existirão outras oportunidades para conferi-las ao vivo.
Johnny Gioeli
Por incrível que pareça, teve quem reclamasse da irretocável apresentação de Johnny Gioeli no modesto Legends Music & Bar, no início de 2023. O motivo? O vocalista do Hardline e Axel Rudi Pell prometeu, mas não tocou músicas do Crush 40, projeto responsável pelas trilhas sonoras de vários games do famoso personagem Sonic.
Tal pecado não se repetiu no último sábado (30). Apesar dos quase 30 minutos de atraso para subir no palco, Gioeli e sua competente banda de músicos brasileiros formada por Bruno Luiz (guitarra), Bento Mello (baixo), Gabriel Haddad (bateria) e Flavio Sallin (teclado) ofereceu um repertório com duas canções da franquia de jogos: “Live & Learn” e “What I’m Made of…”, garantindo o frenesi da fatia de público que parecia estar ali só por esse par de momentos. De resto, contemplou suas duas principais e já mencionadas bandas.
O hard rock pungente e ligeiramente pesado do Hardline, claro, dominou as escolhas de set, com oito das 13 canções. Restaram três vagas para faixas do heavy/power metal do Axel Rudi Pell — seriam quatro, mas “Rock the Nation”, que seria a penúltima, acabou cortada. Em contrapartida, as composições gravadas ao lado do guitarrista alemão eram nitidamente mais longas.
Chamou atenção o fato de três projetos diferentes despertarem reações tão distintas no público. A empolgação era, mesmo, maior quando Gioeli e banda executavam com brilhantismo canções do Hardline, especialmente do disco “Double Eclipse” (1992) como as aberturas “Dr. Love” e “Takin’ Me Down” e as derradeiras “Hot Cherie” e “Rhythm from a Red Car”, apresentada como “talvez a favorita” do artista. Até “Fever Dreams”, do relativamente recente álbum “Danger Zone” (2012), soou como clássica. De Axel Rudi Pell, “Oceans of Time” (que não entrou no set de 2023) e “Carousel” deixaram a plateia em estado de encantamento.
Não houve do que reclamar da interpretação de Gioeli. Raríssimo caso de cantor de hard rock que chegou a idade avançada sem perder alcance e timbre, o nova-iorquino de 57 anos roubrou entregou uma performance muito próxima do que se ouve nas gravações em estúdio de décadas atrás. Complementou isso com presença enérgica e bastante interação, sem aliviar ao longo dos 70 minutos em cima do palco — e, como em 2023, manteve o público na palma da mão. Roubou a cena da atração principal junto à banda de apoio, descrita pelo próprio como “seu Hardline sul-americano”, também caprichosa na execução de músicas com diferentes ingredientes, com destaques à precisão de Bruno Luiz ao emular solos e timbragens e à intensidade de Gabriel Haddad.
Repertório — Johnny Gioeli:
- Dr. Love (Hardline)
- Takin’ Me Down (Hardline)
- Long Live Rock (Axel Rudi Pell)
- Live & Learn (Crush 40)
- Take You Home (Hardline)
- Oceans of Time (Axel Rudi Pell)
- Carousel (Axel Rudi Pell)
- Fever Dreams (Hardline)
- Everything (Hardline)
- What I’m Made Of (Crush 40)
- Hot Cherie (Hardline; original de Danny Spanos / Streetheart)
- Rock The Nation (Axel Rudi Pell)
- Rhythm From A Red Car (Hardline)
Eclipse
Conseguindo reduzir pela metade o atraso provocado pelo show inaugural de Johnny Gioeli, o Eclipse subiu ao palco por volta das 23h15 com um desafio imenso de manter o sarrafo lá no alto, tendo em vista a entrega de sua atração de abertura. Não conseguiu — o que nem de longe significa que Erik Martensson (voz e guitarra), Magnus Henriksson (guitarra), Victor Crusner (baixo) e Adde Moon (bateria) tenham decepcionado.
A apresentação de aproximadamente 85 minutos evidenciou, sim, algo que se percebe não nos singles, mas nos álbuns do grupo: a execução quase religiosa de uma mesma fórmula de composição. Chega ao ponto de deixar muitas músicas parecidas entre si, sem diferenciais notórios.
Conforme o desenrolar do set, vai cansando; especialmente porque estão próximas do fim as canções mais interessantes. Os exemplos incluem a trinca pesada “Falling to My Knees” (trazendo até solo com whammy) + “Stand On Your Feet” (sucedida por um trecho de “Sign of the Southern Cross”, do Black Sabbath) + “Black Rain” (curiosamente emendada em “Twilight”, fazendo parecer que esta ainda é a anterior), a tocante “Still My Hero” (tocada por Erik sozinho e composta em homenagem ao pai recentemente falecido) e o encerramento com “Viva la Victoria”, com refrão surpreendentemente dançante.
Talvez ouvidos mais exigentes esperem algo além das melodias tipicamente nórdicas de “Downfall of Eden” e “Battlegrounds”, das acessíveis e quase pop “All I Want” e “Wylde One” e da compilação de clichês em “Saturday Night (Hallelujah)”. Há de se concordar, porém, que funciona bem para o contexto de música ao vivo. Ainda que ligeiramente prejudicado pelo som alto da bateria e diminuto das guitarras, o show agradou a quem o presenciou não apenas pelo perfil das composições, como também pela performance correta em âmbito técnico do quarteto — com destaque ao fôlego vocal de Martensson, cuja interpretação soa ligeiramente mais grave e rasgada ao vivo — e a seleção abrangente de setlist, abraçando oito dos dez álbuns lançados e dando foco a “Armageddonize” (2015) e “Wired” (2021). Se não surpreendente, ao menos foi convincente.
Repertório — Eclipse:
- Roses on Your Grave
- All I Want
- Run for Cover
- Battlegrounds
- Anthem
- The Downfall of Eden
- Runaways
- Saturday Night (Hallelujah)
- Solo de guitarra + Blood Enemies
- Wylde One
- Still My Hero
- Falling to My Knees
- Stand On Your Feet
- Black Rain
- Twilight
Bis:
- I Don’t Wanna Say I’m Sorry
- Trecho de Bleed & Scream + Viva La Victoria
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