Do vexame à emoção, como foi o encerramento do Rock in Rio 2024

Dia focado em R&B e pop provou-se acertado em meio a lineup inconsistente da edição que celebrou 40 anos do festival

O Rock in Rio encerrou no domingo (22) sua edição comemorativa de 40 anos com momentos emocionantes e decepcionantes. Com Shawn Mendes como headliner do Palco Mundo e Mariah Carey na posição de atração principal do Sunset, a data foi a primeira das cinco a ter ingressos esgotados nas vendas, em uma realização menos disputada e amplamente criticada nas redes sociais.

O lineup de 2024 era, de fato, pouco estrelado em comparação às últimas edições. Também houve certa incoerência na combinação das atrações — como o bluesman Christone “Kingfish” Ingram perdido em meio a Imagine Dragons, NX Zero e Zara Larsson no dia 14 — e sua respectiva distribuição nos palcos — no próprio domingo (22), a presença de Akon como segunda atração principal do palco Mundo gerou estranheza.

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Ainda assim, o dia final do evento se destacou positivamente. Mariah Carey, Luísa Sonza, Ne-Yo, o já mencionado Akon e Angélique Kidjo, esta em um palco secundário, evidenciaram a ideia de explorar o R&B e suas ramificações no pop nacional e internacional. Ainda que de estilos diferentes, Alcione (homenageada em um tributo com vários artistas), Ney Matogrosso e Belo, este também em espaço alternativo, também se encaixaram em tal conceito. 

A diversidade também se refletiu no público, majoritariamente composto por millennials em busca da nostalgia do pop dos anos 2000 e pela geração Z focada no astro teen que encerrou a noite. O resultado foi uma multidão enérgica que tomou conta da Cidade do Rock.

Foto: Ariel Martini / Rock in Rio

Não é exagero nem inesperado pontuar que o local estava lotado. Até porque os ingressos para a data final se esgotaram em apenas 37 minutos. Todavia, foi além de qualquer outra expectativa nesse sentido.

Já na abertura do Palco Mundo com o show de Sonza, a mobilidade se mostrou o problema do dia. A sensação era que o espaço estava com o dobro de público das outras datas. Como se não bastasse, as áreas de circulação do gramado foram fechadas por cangas onde o público descansava sem se abalar com o fluxo.

Ne-Yo: carisma e molejo

Com o fim da pouco disputada apresentação de Ney Matogrosso no Sunset — que pareceu ter sido até esnobada pela organização do festival, pois o volume ficou quase zerado na área do palco Mundo —, a mobilidade entrou em estado crítico mais uma vez. A afobação para conseguir um bom lugar para assistir a Ne-Yo gerou empurrões e tropeços nos cansados que insistiam em ficar esticados no chão. 

Felizmente, a energia se tornou menos hostil no momento que o músico americano surgiu. Repetir de imediato atrações que deram certo em outras oportunidades não é uma estratégia que costuma funcionar, mas a decisão de trazer uma das melhores apresentações do The Town 2023 para o Rock in Rio deu mais que certo. 

Com carisma, molejo e uma sequência de hits, Ne-Yo entregou o show mais animado da noite. Colocou o público para cantar e dançar do início ao fim.

Foto: Vans Bumbeers / Rock in Rio

“So Sick” e “Miss Independent” promoveram uma viagem nostálgica para os anos 2000 e rendeu um coro em uníssono. “Push Back” — colaboração com Bebe Rexha e Stefflon Don — foi a trilha sonora de uma disputa de dança entre três fãs pré-selecionadas e levadas ao palco. O público interagiu, escolheu a vencedora e manteve a energia no topo mesmo não conhecendo bem a música.

Houve até mesmo espaço para uma participação especial. O brasileiro MC Daniel subiu ao palco brevemente para cantar “Vamo de Pagodin”. Os feats do americano com Calvin Harris (“Let’s Go”) e Pitbull (“Time of Our Lives” e “Give Me Everything”) encerraram o set.

Repertório — Ne-Yo:

  1. Closer
  2. Because of You
  3. Champagne Life
  4. Sexy Love
  5. She Knows
  6. So Sick
  7. Push Back
  8. Mad
  9. 2 Million Secrets
  10. Let Me Love You (Mario)
  11. Vamo de pagodin (com MC Daniel)
  12. Miss Independent
  13. 2 The Moon
  14. Let Me Love You (Until You Learn to Love Yourself)
  15. Let’s Go (Calvin Harris)
  16. Time of Our Lives (Pitbull)
  17. Give Me Everything (Pitbull)

Akon: vergonha alheia

Ne-Yo deixou o público aquecido e com energia suficiente para aproveitar o resto da noite. Porém, a homenagem para Alcione no palco Sunset — conduzida pela própria e com participações de Diogo Nogueira, Maria Rita, Mart’Nália, Péricles e Majur — dispersou o público, que viu a oportunidade de descansar e fazer um lanche antes da sequência frenética restante. 

Quando Akon subiu ao palco Mundo, a energia da multidão já tinha abaixado. Ainda assim, as expectativas eram altas.

Como Ne-Yo, o senegalês-americano enfileirou hits no topo das paradas de sucesso nos anos 2000, ganhando ampla popularidade nas rádios brasileiras. Também colaborou com a ascensão de grandes artistas, como Lady Gaga, ao trazê-la para sua produtora.

Entretanto, o currículo recheado de acertos não se refletiu na apresentação. Houve uma sequência de erros tão absurdos que parecia uma alucinação nos padrões da série “The Office”.

Foto: Dani Ferreira @oxidany / Rock in Rio

Para começar, o protagonista deixou o show nas mãos do DJ, que repassou a função para um pen drive. Akon não fez diferente e usou, do início ao fim, um playback descarado — a ponto de se notar a diferença de voz quando ele conversava com a plateia.

A equivocada escolha da setlist, com direito a abrir com música inédita (“Beautiful Day”), deixou o público desinteressado. A debandada para o palco Sunset começou já na terceira música, “Ghetto”. Chamar o Rio de Janeiro de São Paulo já nem abalou a plateia, que estava focada em comentar o vexame. Só na 14ª música, “Belly Dancer (Bananza)”, que o público pôde começar a acompanhar. 

“Don’t Matter”, “Smack That” e “Sexy Bitch” ganharam um coro onde Akon e mais 100 mil pessoas acompanharam o playback. “Lonely”, uma das mais esperadas, recebeu um trecho do DJ brasileiro Hitmaker em ritmo de funk tão genérico que não comoveu nem os cariocas.

Em certo momento do setlist de 34 faixas (!), Akon percebeu a derrota e partiu para a apelação. Primeiro, saiu do palco para preparar uma surpresa. Enquanto isso, seu DJ enfileirou “Se ela dança eu danço” (MC Leozinho), “Só Love” (Claudinho e Buchecha), “Casca de bala” (Thullio Milionário) e “Só fé” (Grelo), juntando clássicos do funk com memes saturados sugadores de carisma. 

A estrela principal, então, retorna para “Enjoy That” dentro de uma bola gigante de plástico com a intenção de fazer crowdsurfing. (In)felizmente, o adereço furou antes da ideia ser colocada em prática. O artista lamentou ao dizer que queria muito fazer uma surpresa para os fãs. 

A receitinha do caos ainda contou com água sendo jogada no público, negação para sair do palco (em um festival notório por seguir horários à risca apesar do atraso no dia anterior) e corte de áudio do microfone (claramente usado só para conversar). Akon fez um show histórico, ainda que no quesito “vergonha alheia”.

Repertório — Akon:

  1. Beautiful Day
  2. Locked Up
  3. Ghetto
  4. Soul Survivor (Jeezy)
  5. Kush (Dr. Dre)
  6. I’m So Paid
  7. Against the Grain
  8. Sweetest Girl (Dollar Bill) (Wyclef Jean)
  9. Bartender (T-Pain)
  10. Body on me (Ashanti)
  11. Baby, I’m Back (Baby Bash)
  12. Came to Do (Chris Brown)
  13. Hypnotized (Plies)
  14. Belly Dancer (Bananza)
  15. Don’t Matter
  16. Danza kuduro (Don Omar)
  17. Dile
  18. Como no
  19. Boom boom
  20. Mama Africa
  21. I Tried (Bone Thugs n Harmony)
  22. Sorry, Blame It On Me
    Lonely
  23. Dangerous (Kardinal Offishall)
  24. I Wanna Love You
  25. Smack That
  26. The Sweet Escape (Gwen Stefani)
  27. Angel
  28. Se ela dança, eu danço / Só love / Casca de bala / Só fé
  29. Enjoy That
  30. Right Now (Na Na Na)
  31. Beautiful
  32. Play Hard (David Guetta)
  33. Sexy Bitch (David Guetta)
  34. Til the Sun Rise Up (Bob Sinclar)
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A salvadora Mimi

A área do palco Sunset já estava tomada quando o show de Mariah Carey começou. Quando começou, a sensação foi de reconexão com a realidade.

A diva, que une elementos da música gospel, R&B, hip hop e pop em suas músicas, foi além de qualquer expectativa. Com uma banda afiada e dançarinos carismáticos, a apresentação ganhou força mesmo com a pouca movimentação da protagonista, que mostrou como um repertório lotado de hits e um talento vocal raro é capaz de reanimar qualquer público. 

Mariah surgiu com o look mais correto possível: um vestido com a bandeira do Brasil bordada em muito brilho. “Obsessed” foi a escolhida para abrir os trabalhos em grande estilo e a partir daí houve um revezamento de hinos do pop — com foco no álbum “The Emancipation of Mimi” (2005), tema de sua mais recente temporada em Las Vegas  — e baladas vintage, para dizer o mínimo, que todo mundo adora no off.

É de conhecimento público que a artista não faz demonstrações de vigor e energia no palco. Em meio às breves interações, deu três passos para um lado e três para o outro, trocou de look e fez o consagrado whistle, alcançando notas extremamente agudas. Não precisava de mais do que isso para deixar a plateia satisfeita.

A versão para “I Want to Know What Love Is” (Foreigner), extremamente popular no Brasil desde o uso na trilha sonora da novela “Viver a Vida”, encerrou a apresentação de 65 minutos contra a vontade da multidão, que queria mais. Até levou um tempo para o público começar a se deslocar novamente para o palco Mundo.

*A produção não disponibilizou fotos de Mariah Carey.

Repertório — Mariah Carey:

  1. Obsessed
  2. Honey / Heartbreaker (Mashup)
  3. Touch My Body
  4. Can’t Let Go / I’ll Be There (com Trey Lorenz)
  5. Always Be My Baby
  6. My All
  7. Emotions
  8. Dreamlover
  9. Hero
  10. Dreamlover / Always Be My Baby / Fantasy
  11. Fantasy (Bad Boy Fantasy)
  12. It’s Like That
  13. Say Somethin’
  14. I Know What You Want (Busta Rhymes)
  15. Shake It Off
  16. Don’t Forget About Us
  17. We Belong Together
  18. Fly Like a Bird

Bis:

  1. I Want to Know What Love Is (Foreigner)

O retorno de Shawn Mendes

Inicialmente a presença de Shawn Mendes, que retornou ao Rock in Rio após passagem em 2017, pareceu destoar do restante das atrações, mesmo como headliner da noite. O ícone teen de 26 anos apoia sua sonoridade em um folk rock bastante inclinado ao pop, o que parecia distante do R&B que regeu várias das apresentações anteriores. Formato, arranjos e contexto jogaram a favor, porém.

Em um momento que o pop está tão sintetizado — o pen drive do Akon é só uma demonstração —, é reconfortante assistir a shows de artistas solo em que a banda entrega um real acontecimento. Shawn Mendes e seus músicos ofereceram um som preenchido, redondo e firme em suas raízes folk.

Sem projeções fantásticas no telão, o canadense se apoiou no carisma e na conexão com os fãs. O público gritava e cantava em um volume ensurdecedor, seguindo os padrões passionais dos mais jovens. “Stitches”, em versão desplugada dando início ao set acústico, reuniu todos esses pontos e rendeu um cenário fantástico. 

Foto: Ariel Martini / Rock in Rio

Em outros momentos do show, Shawn explorou seu alcance vocal juntamente com potentes solos de guitarra. Não é absurdo esperar um trabalho mais orientado ao rock no futuro.

Vale destacar que Shawn estava afastado das atividades ao vivo desde 2022, por conta de complicações de saúde física e mental em meio à rotina de turnês. O músico, aliás, cancelou uma de suas apresentações em São Paulo, em novembro de 2019, pelo mesmo motivo.

A performance no Rock in Rio marcou não apenas sua volta ao país após um episódio tumultuado, como também um retorno aos palcos. O sentimento de diferentes reencontros pareceu ter se refletido diretamente na performance.

Quem não esteve na Cidade do Rock no último domingo (22) ainda terá outra chance de revê-lo. Mendes já foi confirmado como atração do Lollapalooza Brasil, no próximo mês de março. Ao longo da performance em território carioca, destacou diversas vezes seu amor pelo país e disse que “os brasileiros têm muito a ensinar para o resto do mundo”. Tal discurso foi seguido de uma versão acústica de “Mas Que Nada”, consagrada na voz do recentemente falecido Sérgio Mendes, acompanhada em coro pelos fãs.

Artistas carismáticos, público dedicado, ausência de problemas com o som dos palcos… no balanço final, a noite de encerramento do Rock in Rio 40 Anos pareceu a única com potencial para ser lembrada na história do festival.

Repertório — Shawn Mendes:

Main Stage: Set 1

  1. There’s Nothing Holdin’ Me Back
  2. Wonder
  3. Treat You Better
  4. Monster
  5. Lost in Japan
  6. Señorita
  7. Ruin

B Stage: Acoustic Set

  1. Stitches
  2. Youth
  3. Mas que nada (Jorge Ben Jor) 11. It’ll Be Okay

Main Stage: “For Friends & Family Only” Set

  1. Isn’t That Enough
  2. Nobody Knows
  3. Heart of Gold
  4. Why Why Why

Main Stage: Set 4

  1. If I Can’t Have You
  2. Message in a Bottle (The Police cover)
  3. Mercy
  4. In My Blood

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Tairine Martins
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Tairine Martins é estudante de jornalismo na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Administra o canal do YouTube Rock N' Roll TV desde abril de 2021. Instagram: @tairine.m

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