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Accept despeja hinos, entrosamento e heavy metal na essência em Brasília

Novidade na formação, guitarrista substituto Joel Hoekstra cai como uma luva e catalisa show da banda alemã, que se recusa a soar ultrapassada

Quem vê Joel Hoekstra (Whitesnake, Trans-Siberian Orchestra) em ação com o Accept até duvida que o guitarrista é um mero convidado, escalado em pleno 2024 apenas para as apresentações ao vivo. Imponente do alto de seus 1,91m de altura, o “novato” que substitui Philip Shouse – ausente das turnês temporariamente – toma conta de uma porção considerável do palco e personifica muito do que a banda alemã ainda representa para o heavy metal: um gigante entrosado, capaz de ótimos truques que contemplam o âmago do estilo, mas que também se recusa a soar ultrapassado.

É claro que nem tudo exala frescor ou naturalidade. Os movimentos são milimetricamente calculados e remontam a uma coreografia que já beira 50 anos, quando Scorpions, Kiss e, sobretudo, Judas Priest estabeleceram os vindouros parâmetros visuais de um show de metal. Entretanto, o próprio Accept deu sua contribuição significativa nesse quesito na virada para a década de 1980 — e nada mais justo do que continuar desfrutando de uma estética consolidada.

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Foto: Rodrigo Piruka @rodrigo_piruka

Quando o fundador e único membro original Wolf Hoffmann emparelha sua Flying V com a de Hoekstra ou de Uwe Lulis (ex-Grave Digger), que completa a tríade de guitarristas, tem-se a combustão vital no motor dessa engrenagem germânica, tal qual imortalizado na capa do clássico disco “Restless and Wild” (1982). Algum risco de parecer datado? Não para o público que praticamente abarrotou as dependências da Toinha na noite da última sexta-feira (17) para ver a estreia do Accept em Brasília, numa exibição de gala do, atualmente, sexteto – completo com Mark Tornillo (vocal), Christopher Williams (bateria) e Martin Motnik (baixo).

Foto: Rodrigo Piruka @rodrigo_piruka

Estreando disco e turnê no Brasil

Não foi a primeira vez só de Brasília ou de Joel Hoekstra com o Accept. A banda se tornou habitué no Brasil e nessa nona passagem pelo país (2011, 2013, 2015, 2016, 2017, 2018, 2019, 2023 e agora) já se sente confortável o bastante para estrear por aqui um disco novo, “Humanoid”, bem como a turnê mundial de mesmo nome.

O álbum foi lançado há menos de um mês, em 26 de abril, e várias músicas estão vendo a luz do dia justamente em solo brasileiro. A estratégia de abrir a apresentação com duas faixas novas, “The Reckoning” e “Humanoid”, aparentava ser arriscado, mas comprovou a confiança dos alemães e sua total sintonia com os fãs daqui.

Foto: Rodrigo Piruka @rodrigo_piruka

Sem grupo de abertura, exatamente às 22h03 os riffs iniciais foram despejados por um ataque mortífero de Flying V’s que duraria quase duas horas. Algo que logo chamou a atenção foi a ausência de amplificadores tradicionais no palco. Nada daqueles gabinetes e cabeçotes robustos. Explica-se: o Accept usa um equipamento chamado Kemper Profiler, uma espécie de emulador de amps. Tal ferramenta se baseia na tecnologia de “impulse response” e permite reproduzir com fidelidade a sonoridade de um Marshall, por exemplo, sem a necessidade de tê-lo consigo ao vivo.

Além da praticidade, o resultado acaba sendo também um palco mais “limpo” e que permite a movimentação constante dos integrantes, em especial dos três guitarristas. Mais compenetrado em riffs e bases, porém, Uwe Lulis é o que menos se vale desse expediente. É quem faz o trabalho sujo, mas, claro, não menos importante.

Foto: Rodrigo Piruka @rodrigo_piruka

Do disco novo, também foram executadas “Straight Up Jack” e “Frankenstein”, que aposta em um refrão grudento, mas não necessariamente bom. Em ambas, percebe-se que se algo faz falta no Accept atual é o baixista original Peter Baltes, que saiu em 2018. Recrutado no ano seguinte, Martin Motnik ainda não mostrou a que veio e tem performance burocrática ao vivo, destoando do restante do grupo.

Foto: Rodrigo Piruka @rodrigo_piruka

Velhos e novos hinos

Felizmente, o mesmo não se pode dizer de Mark Tornillo. Desde 2009, ele tem a árdua tarefa de substituir o icônico Udo Dirkschneider e, dentro do possível, consegue cumprir muito bem a função designada. Seja pelo timbre de voz semelhante ou pela contribuição com novos hinos para o repertório da banda.

Basta ver a divisão equilibrada: das 19 músicas do show, 10 são da fase Udo e nove, da fase Tornillo. Obviamente, velhos clássicos como “Restless and Wild”, “Midnight Mover”, “London Leatherboys” e “Breaker” estão entre os momentos mais festejados, mas composições relativamente recentes, como as ótimas “Shadow Soldiers”, de “Stalingrad” (2012), e “Teutonic Terror”, de “Blood of the Nations” (2010), mantêm a solidez do setlist.

“Riff Orgy”, por sua vez, é um medley com quatro velharias: “Demon’s Night“, “Starlight”, “Losers and Winners” e “Flash Rockin’ Man“. Trata-se de um artifício que pode dividir opiniões, levando-se em conta que todas mereciam ser tocadas na íntegra, mas que vale ao menos pela intenção.

Mesmo lidando com pequenos problemas técnicos, como falha no microfone e volume baixo na voz em alguns momentos, Tornillo conduziu a apresentação com eficiência. Aos 69 anos, o cantor pode não ter a mesma vitalidade dos colegas e claramente precisa dosar no entusiasmo, mas demostra conhecer os atalhos.

Foto: Rodrigo Piruka @rodrigo_piruka

“Princess of the Dawn” e “Metal Heart” levaram o público direto aos tempos áureos do metal oitentista, quando o Accept viveu seu auge criativo. Na faixa-título do álbum de 1985, Wolf Hoffmann atrai todos os holofotes e brilha naquele que provavelmente é seu solo mais emblemático, evocando influências de música clássica com trechos de “Slavonic March”, de Tchaikovsky, e “Für Elise”, de Beethoven.

Foto: Rodrigo Piruka @rodrigo_piruka

Arremate com… AC/DC

É brincadeira, mas tem um fundo verdade. No encore, o Accept estoura dois clássicos absolutos, “Fast as a Shark” e “Balls to the Wall”, e faz uma pequena homenagem a uma de suas maiores influências nos primórdios, o AC/DC.

“I’m a Rebel”, que abre o disco de mesmo nome lançado em 1980 pelos alemães, é, na verdade, uma composição de Alex Young (o mais velho dos irmãos Young) e, portanto, cover da banda australiana. O AC/DC chegou a gravá-la em 1976, mas nunca lançou.

Foto: Rodrigo Piruka @rodrigo_piruka

Festiva até dizer chega, digamos que a música é um arremate inusitado, mas bastante condizente com a real proposta do show do Accept: nada menos que uma celebração à longevidade do heavy metal. Autêntica e verdadeira em sua essência.

Foto: Rodrigo Piruka @rodrigo_piruka

Accept – ao vivo em Brasília

  • Local: Toinha
  • Data: 17 de maio de 2024
  • Turnê: Humanoid
  • Produtora: Live Concert

Repertório:

  1. The Reckoning
  2. Humanoid
  3. Restless and Wild
  4. Midnight Mover
  5. London Leatherboys
  6. Straight Up Jack
  7. Dying Breed
  8. Zombie Apocalypse
  9. Riff Orgy (Demon’s Night + Starlight + Losers and Winners + Flash Rockin’ Man)
  10. Breaker
  11. Shadow Soldiers
  12. Frankenstein
  13. Princess of the Dawn
  14. Metal Heart
  15. Teutonic Terror
  16. Pandemic

Bis:

  1. Fast as a Shark
  2. Balls to the Wall
  3. I’m a Rebel
Foto: Rodrigo Piruka @rodrigo_piruka
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Guilherme Gonçalves
Guilherme Gonçalves
Guilherme Gonçalves é jornalista formado pela Universidade Federal de Goiás (UFG). É repórter do Globo Esporte e atua no jornalismo esportivo desde 2008. Colecionador de discos e melômano, também escreve sobre música e já colaborou para veículos como Collectors Room e Rock Brigade. Atualmente revisa livros da editora Estética Torta e é editor do Morbus Zine, dedicado ao death metal e grindcore.

5 COMENTÁRIOS

  1. Accept é um monstro sagrado do Metal e o show no Toinha foi uma amostra da maestria da banda.
    Casa cheia e público cantando praticamente todas as músicas.

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