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Biohazard levanta Circo Voador em noite de clássicos, set curto e abertura de luxo

Escolha dos Raimundos para esquentar a festa caiu sob medida e preparou terreno para desfile de hits dos americanos, embora eles pudessem ter tocado mais...

O histórico do Biohazard com o Brasil é caso de amor antigo: os caras são super chegados do Sepultura desde os tempos de “Chaos A.D.” (1993), tendo excursionado juntos pelos Estados Unidos e, pelo menos à época, era comum encontrar fotos deles com o uniforme da Seleção Brasileira de Futebol (é sempre bom realçar para que serve o manto sagrado) em revistas especializadas; o frontman Billy Grazadei (voz e guitarra) tem filhos brasileiros, é casado com uma e arranha um “bom” português, dados alguns descontos; e sempre houve muito boa vontade deles em tocar por aqui desde a estreia no Monsters of Rock de 1996 no Estádio do Pacaembu.

Na verdade, o que causava espanto foi o hiato de longos nove anos e meio sem virem ao país, desde a passagem pela Audio em dezembro/2014 num Matanza Fest! E se eles possuem brothers por aqui, este repórter também têm seus contatos espalhados e um deles, por coincidência, foi curtir o The Metal Fest em 20 e 21 de abril em Santiago, por onde o Biohazard se apresentou no domingo. Sem querer dar spoilers, como “Este foi o setlist!”, alguns alertas surgiram: “O Billy deu uma engordada”, e até aí, quem não?; “Ninguém fica mais sensualizando e posando de gatinho, tirando o Evan (Seinfeld, voz e baixo)”, sabidamente um ex-ator pornô; e a mais preocupante revelação: “O show foi chato! Eles pararam duas vezes para ficar ‘ensinando’ como deve ser a roda!”…

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Foi com este último receio que cruzamos a BR-116 de busão para cobrir o que aprontariam Graziadei, Seinfeld, Bobby Hambel (guitarra) e Danny Schuler (bateria) no Circo Voador em pleno feriado de São Jorge na Cidade Maravilhosa num “efeito rebote” das atrações do Summer Breeze em São Paulo, de 26 a 28 de abril. Antes, porém, o Raimundos abriria a noite apenas dois minutos após o horário divulgado e a curiosidade primordial a ser saciada era descobrir como funcionaria a química entre os membros sem o saudoso Canisso “véio de guerra”.

Foto: Ian Dias @diasphotograph
Foto: Ian Dias @diasphotograph

Raimundos

Logo a partir do começo dos trabalhos, contatamos que o baixista Jean Moura está perfeitamente adaptado à posição, “na banda há mais de oito anos”, como mais tarde afirmaria Digão (voz/guitarra) ao apresentá-lo, e seu instrumento parecia predominar, porém apenas porque a guitarra de Marquim sumira em “Deixa Eu Falar…”, recuperada a tempo de fazer seu solo.

Foto: Ian Dias @diasphotograph

Numa só tacada, vieram: “Opa! Peraí, Caceta”: o cover de Fábio Jr. para “20 E Poucos Anos”, nacionalmente famoso com o empurrãozinho de ser tema da série da MTV no segundo semestre de 2000; e a impagável “I Saw You Saying (That You Say That You Saw)”. Ainda que esta oferecesse relativo respiro coletivo em função do andamento mais cadenciado, o maior mérito era emendar tudo para não deixar a peteca cair e a toada de colar uma faixa à seguinte predominou na maioria do repertório, salvas poucas pausas de comunicação, sobretudo de Digão, às vezes visando inflamar geral ao pedir mais energia.

“Rapante” despertou a primeira roda, embora pedida, e não há muito jeito: as composições do début “Raimundos” (1994) seguem imbatíveis, mesmo se tratando de uma “banda de fases” mais perfeitinhas do que complicadas ao longo da discografia. E se a princípio a proposta era misturar o punk dos Ramones com música nordestina, o ponto agora é aliar o próprio Raimundos com… Metallica, via um trecho final de “Creeping Death”. Outra combinação semelhante viria posteriormente em “Bê A Bá” com um pedacinho de “Raining Blood”, do Slayer.

Foto: Ian Dias @diasphotograph

Em “Me Lambe”, demos uma viajada e aparentemente a lei anti-fumo não vingou no Rio, com uma queimação nervosa de baseado! Já em “Palhas Do Coqueiro” o bicho pegou de vez na segunda roda e a platéia até que enfim pegou no tranco. “Reggae Do Manêro” controlou novamente a empolgação e, encerrada, o baterista Caio Cunha, tirou onda ao puxar a levada de “Urban Discipline”, rapidamente acompanhado por Jean.

Caminhando para o final, mandaram: “A Mais Pedida”; “Mulher De Fases”; “Puteiro Em João Pessoa”, com Digão só cantando, como fizera em “Deixa Eu Falar…”, e gerando a terceira roda da noite, com direito a um imbecil empunhando um sinalizador verde, dificultando a respiração – é, minha gente, o Rio não é para amadores… As duas derradeiras foram exatamente as duas primeiras pedradas de “Lavô Tá Novo” (1995): “Tora Tora” e “Eu Quero É Ver O Oco”, concluindo exata uma hora no relógio.

Foto: Ian Dias @diasphotograph

A constatação era a de terem entregado o que deles se esperava, agitando a galera, que prestigiou o evento se espalhando por todas as áreas da casa, até porque o preço de cento e vinte reais a meia-entrada, fosse de estudante ou com quilo de alimento na porta era deveras convidativo. Por fim, não se tratou de uma outro, mas “Body Count’s In The House”, do próprio Body Count, recomeçando a discotecagem para o intervalo, se encaixou perfeitamente ao contexto!

Foto: Ian Dias @diasphotograph

Biohazard

No aguardo do Biohazard, notamos dois banners laterais indicarem a celebração de trinta anos de “State Of The World Address”, curiosamente com a criança da capa virada sempre para fora, como se “fugisse” do palco. Como decoração, era isto e o uso do telão atrás do kit de Danny – este sim deu uma bela “encorpada”, não Billy. Ah, em forma, “Spyder Jonez” tocou sem camisa e está mais bem cuidado hoje do que jovem em início de carreira.

Eram 21:45 quando a discotecagem cessou, as luzes se apagaram e foram necessários mais cinco longos e estranhos minutos de (quase) silêncio até as entradas de Danny, Evan, Billy e Bobby, nesta ordem, e “Urban Discipline”, verdadeira voadora no lustre, provocar uma roda já batidas tribais. E dá-lhe clássicos: “Shades Of Grey”, “Tales From The Hard Side”, “Wrong Side Of The Tracks” e “Black And White And Red All Over”, em que uns bravos fãs estenderam um bandeirão na pista com o pau comendo solto. Se bobear, devido à luz baixa, o quarteto nem reparou em nada ali do palco.  Se você os conhece, faz idéia do que essa seqüência matadora ofereceu e, se não manja o poderio delas juntas, confira agora mesmo em alguma plataforma ou YouTube da vida!

Foto: Ian Dias @diasphotograph

“Retribution” foi um surpreendente resgate do play de estréia e com meia hora de show já era possível constatar que a banda segue sabendo comandar seu público, estimulando a participação o tempo todo, via música, gestos, olhares e palavras, mas o tempo cobra seu preço para todos nós: ainda há as trocas de lado entre os guitarristas, mas eles já saltam menos. E até aí, este que vos escreve também não consegue mais agitar e curtir as pauladas como antes.

Entenda bem: sobra garra, eles permanecem super bem ensaiados, até porque, se você jamais assistiu ao grupo, as versões ao vivo são bem próximas do que se escuta em estúdio, sem firulas. Mas eles não são mais garotões e sim cinquentões que aprenderam a dosar energia para o que realmente importa: tocar! O que não se sabia era que, com trinta e cinco minutos, “Five Blocks To The Subway” superava-se pouco além da metade do set e ela foi uma novidade em relação ao setlist do Chile, bem como a ótima e swingada “How It Is”, antes de um bloco mais lado b formado por “Down For Life”, “Victory” e “Love Denied”, esta sem a introdução no piano e guitarra.

Foto: Ian Dias @diasphotograph

Durante o interessante cover do Bad Religion, “We’re Only Gonna Die”, Evan interrompeu a roda com doze segundos, dela “reclamando” e ficou evidente que ele não estava tentando corrigir ou ensinar coisa alguma, mas provocar a massa ao compará-la com o que rolara em Santiago, citando até a garantia dada por Billy de que aqui seria melhor. E analisando em vídeos no YouTube, a atividade por lá pareceu ter mais engajamento.

Sobre o guitarrista, aliás, cabe um capítulo à parte: a atmosfera fica levíssima e engraçada ao vê-lo professar o amor pelo Brasil e se expressando em português. Frases como: Oi, galera! Tudo bem? Para São Jorge!”, “Vamos, galera”; “Estão prontos”; “Tamo junto”; “Faz barulho”; “Fica frio”; “Calma, gente”; “Relaxa”; e “Quebra tudo”, nem sempre corretas e carregadas de sotaque fizeram a alegria da galera.

Folha com as falas em português (foto: Vagner Mastropaulo)

Outras interações hilárias foram: “Meu português é uma ‘bousta’, mas eu ‘tentar falo’ com vocês!”; e, dirigindo-se a Evan, “Amigo, eu te amo, mas cala a boca. Eu ‘falar’ português!”. O capricho e seriedade eram tantos que ele chegou a fixar uma “colinha” em seu retorno, da maneira como deveria pronunciar algumas sentenças!

Foto: Ian Dias @diasphotograph

E se as letras e o discurso pregam união, respeito, amor (sim, amor!), eles praticam o discurso. Quer provas? Vez por outra, um garoto aparecia filmando do palco e, lá pelas tantas, Evan fez questão de explicar que se tratava de seu filho, Sammy. E tudo ficou ainda mais digno e bonito quando Billy revelou que, após o show, autografariam camisetas para um leilão em prol de pesquisas para o câncer de mama.

Foto: Ian Dias @diasphotograph

Curiosamente, o elogio mais sincero feito por Evan foi um sucinto “Nada mau!”, realmente surpreso após o apoio do povo, berrando os versos iniciais de “Punishment”, em uníssono! Antes da última, “Hold My Own”, uma revelação da parte do baixista: “Assim que acabarmos nossa turnê, vamos voltar para casa e fazer um álbum novinho em folha”, sem detalhar título, faixas ou previsão de lançamento. Terminada a festa quase às 23:00, “Fucking Hostile” foi disparada no sistema de som, mas não como outro, enquanto constatávamos terem sido quatorze pedradas em uma hora e oito minutos e nada de “Mata Leão” (1996) a “Reborn In Defiance” (2012).

Resumindo, cronologicamente foram: três de “Biohazard” (1990); cinco de “Urban Discipline” (1992), sendo quatro delas entre o quinteto inaugural; e mais cinco de “State Of The World Address” (1994) – além da citada releitura cover de “We’re Only Gonna Die”. Faltou algo? Confiando nos dados disponíveis no site Setlist.fm, apresentações recentes ocasionalmente incluíam “Chamber Spins Three”, cuja falta pouca gente sentiu, especialmente caso a poderosa “How It Is”, ausente na mesma fonte, tenha a substituído.

Foto: Ian Dias @diasphotograph

E para o gosto deste escriba, poderiam ter acrescentado “What Makes Us Tick”, mais proclamada como poema do que efetivamente cantada, e talvez “State Of The World Address” ou qualquer outra de sua preferência para “botar mais água nesse feijão” aí. Afinal de contas, na boa: se como headliner não chegaram a setenta minutos, a tendência é que não utilizem a totalidade da hora e vinte minutos a eles destinada para fechar o Sun Stage na primeira noite de Summer Breeze… Ou vão inventar algo? E aí, como fica o Rio de Janeiro?

Foto: Ian Dias @diasphotograph
Foto: Ian Dias @diasphotograph

Biohazard — ao vivo no Rio de Janeiro

  • Local: Circo Voador
  • Data: 23 de abril de 2024
  • Produtora: Ride R2

Repertório – Raimundos:

  1. Deixa Eu Falar…
  2. Opa! Peraí, Caceta
  3. 20 E Poucos Anos (cover de Fábio Jr.)
  4. I Saw You Saying (That You Say That You Saw)
  5. Rapante (snippet de “Creeping Death”, do Metallica)
  6. Me Lambe
  7. Palhas Do Coqueiro
  8. Bê A Bá (snippet de “Raining Blood”, do Slayer)
  9. Reggae Do Manêro
  10. A Mais Pedida
  11. Mulher De Fases
  12. Puteiro Em João Pessoa
  13. Tora Tora
  14. Eu Quero É Ver O Oco

Repertório — Biohazard:

  1. Urban Discipline
  2. Shades Of Grey
  3. Tales From The Hard Side
  4. Wrong Side Of The Tracks
  5. Black And White And Red All Over
  6. Retribution
  7. Five Blocks To The Subway
  8. How It Is
  9. Down For Life
  10. Victory
  11. Love Denied
  12. We’re Only Gonna Die (cover de Bad Religion)
  13. Punishment
  14. Hold My Own

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