“Você pode sentir o poder? Você pode sentir a glória?”. Os versos de “Power and the Glory”, um dos inúmeros clássicos do Saxon, retratam com exatidão o sentimento que o show da banda desperta. Quem esteve na Toinha, em Brasília, na noite de sábado (18) pôde sentir não apenas o poder e a glória do heavy metal, mas uma autêntica sensação de pertencimento oferecida por veteranos que ajudaram a moldar o gênero.
A apresentação que encerrou a passagem da turnê “Seize the Day” pelo Brasil deixou claro que a devoção recíproca entre público e o vocalista Biff Byford, maestro dessa instituição do metal britânico, é algo raro e genuíno. E que o Saxon não foi uma das primeiras bandas a se assumir como tal, sem qualquer pudor em exaltar as características definidoras do estilo, por acaso.
Os caras realmente se orgulham do legado forjado com autoridade a partir das influências de, principalmente, Motörhead e AC/DC em fins da década de 1970.
Único remanescente da formação original, Biff tem uma aura quase magnética e concentra boa parte das atenções. No entanto, está rodeado de ótimos comparsas. Ainda que “coadjuvantes”, e talvez seja um pecado chamá-los assim, Nigel Glockler (bateria), Doug Scarratt (guitarra), Nibbs Carter (baixo) e Brian Tatler (guitarra) são a força motriz atual de uma locomotiva com 45 anos e 23 álbuns de estúdio.
Tatler, aliás, se encaixou como uma luva. Ocupando a vaga de Paul Quinn, que se afastou das turnês no início de 2023, o líder e fundador do Diamond Head não só tem dado conta do recado como acrescentou uma dose extra de carisma ao quinteto, outrora acusado de ser um tanto quanto sisudo. O encontro entre esses dois ícones da New Wave of British Heavy Metal (NWOBHM) tem saído melhor que a encomenda, e o guitarrista inclusive deve contribuir com composições no próximo disco.
Breve contraste
A magia do heavy metal clássico, porém, não se fez presente o tempo inteiro. A abertura ficou a cargo da jovem banda equatoriana Madzilla, criada em 2016 e atualmente radicada nos Estados Unidos, que esteve longe de empolgar.
Mesmo com bastante gente já tomando conta da pista na Toinha, as reações foram frias perante o thrash “melódico”, termo escolhido pelo próprio grupo para denominar seu som. Na prática, não é exatamente isso, mas uma espécie de Gojira pouco inspirado.
Nem quando o vocalista e guitarrista David Cabezas arriscou um portunhol para se comunicar com o público a coisa funcionou. Ao citar o que vem admirando nesse giro pelo Brasil, ele falou da “comida”, das “belezas” e das “garotas” brasileiras. Não comoveu ninguém e ainda gerou certo desconforto para as várias mulheres presentes.
Ao todo, tocaram oito músicas e até “Destiny’s Eyes”, escolhida para o encerramento e que deveria ser um arremate certeiro, foi recebida com indiferença.
A águia aterrissa na capital
Às 22h05, o Saxon surgiu no palco para se apresentar em Brasília pela segunda vez. A banda já havia tocado na capital federal em 2002, na turnê do disco “Killing Ground”. O show foi no Minas Tênis Clube, e o baterista era Fritz Randow, pois Nigel Glockler estava fora de combate tratando de uma lesão no pescoço.
Na primeira parte do show, o Saxon mesclou músicas do disco mais recente, “Carpe Diem” (2022), com clássicos como “Motorcycle Man”, “Power and the Glory” e “Dallas 1 PM”. Dentre as novas, a faixa-título foi a mais cantada, graças a um refrão cativante.
Após o hino “Heavy Metal Thunder”, Biff Byford pediu aos fãs para escolher a próxima a ser executada: “Broken Heroes”, “Crusader” ou “Ride Like the Wind”. Com sobras, “Crusader” foi a mais pedida, mas logo em seguida a banda também tocou o cover de Christopher Cross, que abre o disco “Destiny” (1988).
Essa “pegadinha” também se repetiria com “And the Bands Played On” e “Never Surrender”, com Biff admitindo que as duas seriam executadas, independentemente do resultado da votação. Um belo fanfarrão britânico.
Ao invés de “Dogs of War”, em Brasília o medley com “Solid Ball of Rock” foi completado com “Strong Arm of The Law”. Por diversas vezes, Biff jogou garrafas de água ao público tanto para retribuir o carinho quanto para aplacar o calor.
Ainda que não esteja na ponta da língua dos fãs e nem venha a se tornar um clássico, se é que isso ainda é possível hoje em dia para uma banda como o Saxon, a nova “The Pilgrimage” se mostrou uma power ballad muito bacana e que funciona bem ao vivo. Quando a turnê de “Carpe Diem” chegar ao fim, provavalmente ela cairá no ostracismo. Mas, sem dúvida, tem seu valor e merece ser mais apreciada.
“747 (Strangers in the Night)”, com harmonias exuberantes, comprovou que a qualidade do som na Toinha foi melhorando bastante ao longo do show. Felizmente, pois trata-se, arrisco dizer, do ponto alto da vasta carreira do Saxon e merecia nada menos que uma execução de gala, o que aconteceu.
Beirando duas horas de show, a banda voltou para um segundo bis com “Denim and Leather”, o ápice de sua declaração de amor pelo heavy metal, e “Princess of the Night”, cuja princesa mencionada na letra é, na verdade, uma locomotiva inglesa. Que, assim como o Saxon, já viveu seus tempos áureos, mas ainda evoca poder e glória.
*Fotos de Rodrigo Piruka.
Saxon – ao vivo em Brasília
Local: Toinha
Data: 18 de novembro de 2023
Turnê: Seize the Day
Repertório:
- Carpe Diem (Seize the Day)
- Motorcycle Man
- Age of Steam
- Power and the Glory
- Dambusters
- Dallas 1 PM
- Heavy Metal Thunder
- Crusader
- Ride Like the Wind (cover de Christopher Cross)
- Strong Arm of the Law / Solid Ball of Rock
- And the Bands Played On
- Never Surrender
- Wheels of Steel
- The Pilgrimage
- 747 (Strangers in the Night)
- Denim and Leather
- Princess of the Night
Madzilla
Repertório:
- The Beginning of the End (Intro)
- A Deadly Threat
- Asphyxiating Cries
- Vengeance
- Warfare Within
- Your Nemesis
- Darkest Night
- Destiny’s Eyes
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O show foi sensacional! O público cantou junto quase todas as músicas!
O ritmo e a consistência da bateria do Nigel Glockler (um septuagenário, como quase toda a banda) foi impressionante. O baixista Nibbs Carter foi outra figura carismática no show, muito animado (pra não dizer doido) no palco. O vocal Biff esbanjou o carisma e domínio de palco, com a mesma voz da época do “Crusader” (1984) e “Innocence is no Excuse” (1985) – quando conheci a banda, em LP-zão de vinil !
Um show Classe A, a nível das grandes bandas do New Wave of British Heavy Metal, como Iron e Judas, como disse um headbanger cabeça-branca presente.