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O Rush promovia protofascismo no álbum “2112”? Geddy Lee responde

Influência da filósofa Ayn Rand nos primeiros anos da banda voltou à tona com lançamento da autobiografia de Lee, que toca no assunto

No início da carreira, algumas letras do Rush foram inspiradas pelas ideias da filósofa russa Ayn Rand, considerada uma influência para políticos de extrema direita e seus adeptos. O ápice aconteceu no álbum “2112” (1976), cujo conceito é todo baseado em um livro de Rand chamado “Cântico”, uma distopia futurista lançada em 1938.

As citações à obra de Rand foram diminuindo com o tempo. Porém, ainda nos anos 1970, a banda foi confrontada sobre o assunto pelo repórter Barry Miles, do New Musical Express (NME). O jornalista acusou o Rush de promover o que chamou de “protofascismo” na época, não só pelo enredo de “2112”, mas também pela capa e outros elementos.

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Em 1978, Miles escreveu (via Classic Rock):

“O fato é que esses caras estão advogando essas coisas no palco e no disco e ninguém questiona isso. Ninguém liga para o caso. Todos os sinais clássicos de direita estão lá: a linguagem pseudo-religiosa… que se estende até à equipe de turnês: road masters ao invés de road managers; o uso de um símbolo quase místico – o homem nu confrontando a estrela vermelha do socialismo (pelo menos eu acho que é o que deveria ser). Está tudo lá.”

Agora, com a banda já inativa, o vocalista, baixista e tecladista Geddy Lee falou à revista Mojo sobre o tema. Vale lembrar que Lee é filho de um casal de judeus poloneses que esteve em campos de concentração nazistas durante a Segunda Guerra Mundial — logo, o assunto é especialmente importante para o músico.

“Parte da forma como usamos a inspiração de Ayn Rand era desafiadoramente anti-totalitarista, como acontece na trama sci-fi de ‘2112’. E é mais do que óbvio que nós nunca fomos fascistas. O ‘thatcherismo’ estava em alta na Inglaterra. A esquerda estava compreensivelmente assustada e eu não culpo Barry Miles por ter o sistema de crença que ele tinha. Mas sugerir que ‘2112’ estava atraindo jovens a um mantra de direita com contornos fascistas foi mal pensado e irresponsável.”

Arrependimentos?

Geddy Lee falou sobre o tema a outro veículo de comunicação recentemente, o Los Angeles Times. O músico foi perguntado sobre arrependimentos em relação à abordagem do Objetivismo, filosofia de Ayn Rand que teria inspirado políticos como o ex-presidente americano Donald Trump.

Na ocasião, Lee não manifestou arrependimento, mas revelou não concordar mais com as ideias da escritora.

“Obtivemos conforto com seu manifesto num momento em que estávamos diante de um abismo e pensávamos que poderíamos não sobreviver. Não me arrependo, porque ajudou a nos salvar. Reservo-me o direito de aprender com o que fiz no passado e de não concordar com o meu eu mais jovem.

Eu entendo o que você está dizendo e não quero nenhuma associação com esse tipo de pensamento, porque isso é fascismo. Garanto que Trump nunca leu Ayn Rand.”

Ayn Rand e Rush

Nascida em São Petersburgo, a escritora russa Alisa Zinov’yevna Rozenbaum, mais conhecida como Ayn Rand, se tornou conhecida por desenvolver um sistema filosófico chamado de Objetivismo. Sua linha de pensamento defendia a razão como único meio de conhecimento. Para tal, apoiava o egoísmo racional e ético, rejeitando o altruísmo.

Músicas dos primeiros álbuns do Rush contaram com referências, uma das mais conhecidas sendo “Closer to the Heart”, do álbum “A Farewell to Kings” (1977), além de “2112” (1976).

Em 1994, o baterista Neil Peart, responsável pelas letras do grupo, comentou em uma newsletter a respeito da obra de Rand e sua influência na banda.

“Para começo de conversa, a extensão de minha influência pelos escritos de Ayn Rand não deveria ser tão valorizada – não sou discípulo de ninguém. Sim, eu acredito que o indivíduo é essencial em questões de justiça e liberdade, mas na filosofia, como Aristóteles disse há muito tempo, o maior bem é a felicidade.”

A situação voltou à tona em 2020, logo após a morte de Peart. À época, conservadores e liberais se digladiaram com argumentações nas redes sociais.

Vale destacar que o músico se descreveu em algumas entrevistas como “um libertário com inclinação à esquerda”. Chegou a declarar que as ideias do Partido Republicano dos Estados Unidos eram “o exato oposto dos ensinamentos de Jesus”.

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André Luiz Fernandes
André Luiz Fernandes
André Luiz Fernandes é jornalista formado pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP). Interessado em música desde a infância, teve um blog sobre discos de hard rock/metal antes da graduação e é considerado o melhor baixista do prédio onde mora. Tem passagens por Ei Nerd e Estadão.

6 COMENTÁRIOS

  1. Falar de Ayn Rand e associá-la ao fascismo é ridículo. Como russa e com a família massacrada pelo comunismo soviético duas vezes, ela foi enviada para os EUA para SE SALVAR! Nos EUA ela se tornou uma grande porta-voz do anticomunismo. É que hoje, devido ao baixo grau de conhecimento da História e por uma característica leviana, qualquer pessoa acha que ser anticomunista é fazer apologia ao nazismo ou fascismo. Há alo muito além desses termos: chama-se liberdade, muito defendida por Rand.

  2. Segundo ponto que as pessoas não enxergam: o fascismo era uma ideologia socialista! O nome já diz tudo: a união de vários feixes aumentando a força do coletivo! Defender o individualismo cooperativo contra o assistencialismo coercitivo foi a mensagem de 2012 e de todos os reais libertários espalhados pelo mundo, incluindo Ayn Rand.

  3. O fascismo não foi uma ideologia socialista, ao contrário, o fascismo cresceu como resposta antagônica ao marxismo. Algumas das principais características atribuídas ao fascismo: nacionalismo, corporativismo, racismo, são respostas à ideia da luta de classes e ao igualitarismo das ideias socialistas.
    Fascismo e marxismo foram duas correntes que marcaram a política mundial na primeira metade do século XX. O antagonismo entre os seus defensores não precisa de muito mais ilustração do que os milhões de mortos, dos dois lados, na batalha de Estalinegrado.

  4. Fascismo, socialismo e nazismo são três cães raivosos, monstruosos, implacáveis, traiçoeiros, dominadores e centralizadores, que, fundamentalmente, se estraçalham pelo mesmo osso.
    Guiam as ovelhas para onde querem, por meio de mentiras, opressão e muito medo.
    Pregam uma frágil e subjetiva noção de igualdade, e uma força do coletivo à luz do dia, mas são os mais terríveis, piores e frios egoístas quando não há ninguém por perto.

  5. Fascismo não é exatamente “uma ideologia” marxista. Porém, o fascismo e o marxismo são fundamentalmente iguais. São dois cães famintos e implacáveis brigando pelo mesmo osso.
    Se houve confronto entre os dois cães, não foi por verdade, virtude, justiça ou liberdade, mas por domínio, legalidade e hegemonia.

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