O histórico de shows do Nirvana na América do Sul não é dos melhores. Os problemas não se deram apenas no Brasil: no ápice de seu sucesso, em outubro de 1992, o trio de Seattle desembarcou em Buenos Aires para apresentação única no Estádio José Amalfitani. Porém, Kurt Cobain foi surpreendido pela atitude sexista do público argentino e buscou transformar sua performance em uma grande lição para os hermanos.
O show tinha abertura da Calamity Jane, banda de punk rock inteiramente feminina, que foi alvo do assédio e da hostilidade da plateia. Em entrevista reproduzida no livro “Nirvana: The Chosen Rejects” (via Far Out Magazine), Cobain, que era aliado da luta pelos direitos das mulheres, revelou que considerou até mesmo cancelar a apresentação do Nirvana como protesto.
“Quando tocamos em Buenos Aires, levamos uma banda feminina de Portland chamada Calamity Jane. Durante todo o show, todo o público – foi um show enorme com umas sessenta mil pessoas – estava jogando nelas qualquer coisa que vinha do bolso, desde dinheiro a pedras, além de lama. No fim das contas, as meninas começaram a chorar. Foi terrível, uma das piores coisas que já vi, uma grande quantidade de machismo ao mesmo tempo. Krist [Novoselic, baixista], conhecendo minha atitude em relação a coisas assim, tentou me dissuadir de pelo menos me recusar a tocar. Acabamos nos divertindo, rindo deles [público].”
A resposta veio na escolha do repertório. Em um momento onde “Smells Like Teen Spirit” era a música de mais sucesso no rock, a banda optou por deixar o hit de lado. Além disso, focou em músicas menos conhecidas, como as presentes na coletânea de raridades “Incesticide” (1992), que na época do show ainda não tinha sido lançada. O frontman ainda afirmou que a experiência acabou sendo uma das melhores que teve no palco.
“Antes de cada música, eu tocava a introdução de ‘Smells Like Teen Spirit’ e depois parava. Eles não perceberam que estávamos protestando contra o que eles fizeram. Tocamos por cerca de quarenta minutos e a maioria das músicas eram do ‘Incesticide’, então eles não reconheceram nada. Acabamos tocando a música secreta [‘Endless, Nameless’] que está no final de ‘Nevermind’, e como estávamos muito furiosos e muito chateados com toda essa situação, aquela música e todo o set foram uma das melhores experiências que já tive.”
Apesar da lembrança de Cobain, o álbum “Nevermind” acabou sendo tocado quase que na íntegra. A única ausência mesmo foi “Smells Like Teen Spirit”. Em relação a outras apresentações do fim daquele ano, também diferenciou-se a opção de, na Argentina, executarem apenas uma música que entraria no disco seguinte, “In Utero” (1993): neste caso, “All Apologies”. Em outras datas do período, faixas como “Dumb” e “Tourette’s” já eram exibidas ao público.
A título de curiosidade, este foi o repertório tocado pelo grupo em Buenos Aires:
- Improvised Jam (geralmente chamada “Nobody Knows I’m New Wave”)
- Aneurysm (com vozes de fundo de “Beat It”, de Michael Jackson, cantadas por Dave Grohl)
- Breed (com introdução de “Smells Like Teen Spirit”)
- Drain You (com introdução de “Smells Like Teen Spirit”)
- Beeswax
- Spank Thru
- School
- Come as You Are
- Lithium
- Lounge Act
- Sliver
- About a Girl
- Polly
- Jam (solos de Krist e Dave)
- In Bloom
- Territorial Pissings
- Been a Son
- On a Plain
- Negative Creep
- Blew
Bis:
- All Apologies
- Endless, Nameless
Nirvana no Brasil
Poucos meses após passar pela Argentina, em janeiro de 1993, o Nirvana desembarcou no Brasil para duas apresentações no festival Hollywood Rock. O primeiro show, que aconteceu em São Paulo, entrou para a história como um dos maiores fiascos da carreira da banda, graças a um repertório inconsistente, performance fora do tempo e com várias improvisações mal-sucedidas.
Já a apresentação do Rio de Janeiro mostrou um Nirvana mais centrado e um Kurt Cobain menos instável. O grupo conquistou o público com um setlist trazend músicas que mais tarde entrariam para o álbum “In Utero” (1993).
Os shows na Argentina e no Brasil foram os únicos do Nirvana na América do Sul. Cobain morreu em abril de 1994, aos 27 anos.
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